Pequena História da Maçonaria no Brasil – Parte III

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A República Velha

Durante o período da República Velha – 1889/1930 – assistir-se-á a um changez de place na Presidência da República entre dois grupos maçônicos: a matriz positivista e militar de Benjamin Constant e o núcleo civil e liberal do Estado de São Paulo. O final desta época culmina também com a grande cisão do GOB de 1927, inicio do declínio institucional da Maçonaria brasileira, que perdura até os dias atuais. Antes de 1927 a história da Maçonaria estava imbricada com a história do Brasil, para não dizer que eram a mesma, a partir de então as duas se separam.

A 24 de fevereiro de 1891, o Congresso Constituinte aprovava e promulgava a primeira Constituição da República, a qual instituiu o presidencialismo, o laicismo e o federalismo. Dois dias depois, a assembleia elegia os governantes definitivos, colocando, portanto, fim ao Governo Provisório, que marcara a etapa de transição. Uma das chapas que se apresentaram à eleição tinha, como candidato à presidência, o marechal Deodoro, Grão-Mestre do Grande Oriente do Brasil, e, como candidato à vice-presidência, o também maçom almirante Eduardo Wandenkolk, enquanto a chapa de oposição era encabeçada pelo maçom Prudente de Moraes tendo, como candidato a vice-presidente o marechal Floriano Peixoto. Deodoro venceu por estreita margem de votos (129 a 97), enquanto Floriano derrotava Wandenkolk. A partir de então a Marinha iria contestar o Exército que detinha as rédeas da República.

Deodoro encontrou um Parlamento hostil, que só o elegera sob a ameaça de intervenção armada. Não poderia, portanto, governar com ele. E o dissolveu, a 3 de novembro de 1891. Com isso, perdeu todos os apoios, inclusive nos meios militares, pois uma ditadura seria uma mancha muito grande para um regime republicano que ainda engatinhava e que procurava sua consolidação. E quando, a 23 de novembro, o almirante Custódio de Melo, a bordo do encouraçado Riachuelo, declarou-se em revolta, em nome da Armada, Deodoro, encontrando-se só, renunciou, para não desencadear uma guerra civil, entregando o governo ao seu substituto constitucional, Floriano Peixoto.

Deodoro, desencantado, então, com tudo, renuncia também ao Grão-Mestrado, em carta de 18 de dezembro de 1891. No plano social, os maçons, diante dos problemas surgidos com a rápida industrialização do país, principalmente no estado de São Paulo, começavam a tratar dos interesses do incipiente operariado industrial, ainda sem organismos protetores. A 30 de junho de 1892, realizavam-se novas eleições para o Grão-Mestrado do Grande Oriente do Brasil, sendo eleito Macedo Soares.

Enquanto tudo isso ocorria internamente, no âmbito externo político-social, os maçons, como toda a sociedade, em geral, enfrentavam tempos agitados. Existia um conflito entre os maçons militares positivistas do estado do Rio de Janeiro e os maçons civis, principalmente do estado de São Paulo. Após um período de conflitos civis e armados, Floriano entrega o poder, no final do seu mandato ao seu sucessor paulista, o Ir. Prudente de Moraes, que era o representante das oligarquias rurais e, portanto, do federalismo, enquanto os militares positivistas retornavam à caserna, finda que estava a espinhosa missão de consolidar o regime.

Obviamente houve, durante esse período, certa confusão entre as classes mais politizadas da nação, incluindo-se a Maçonaria, dirigida pelo conselheiro Macedo Soares. Enquanto uma parte do mundo maçônico, encontrada, principalmente, entre os oficiais das forças armadas, apoiava quase geralmente os atos de Floriano, outra facção, ligada à política regional e às oligarquias rurais, promovia revoltas, como a guerra civil do Rio Grande do Sul, envolvendo os parlamentaristas do maçom Silveira Martins e os presidencialistas, liderados por Júlio de Castilhos, que tinha o apoio de Floriano.

Terminado o governo do Ir. Prudente de Morais, o poder permaneceria, pacificamente, nas mãos das oligarquias rurais – como, de resto, ocorreu até 1930 – com a eleição do Ir. Campos Sales, expoente da Maçonaria do estado de São Paulo, cujo governo foi caracterizado pelo grande realismo na política econômico-financeira do maçom Joaquim Murtinho, ministro da Fazenda.

Em fevereiro de 1901, realizadas novas eleições, no Grande Oriente do Brasil, era eleito, para o cargo de Grão-Mestre, Quintino Bocaiúva, que no dia da Proclamação da República, cavalgou ao lado do Mal. Deodoro, e tendo como adjunto Henrique Valadares, discípulo na Escola Militar de Benjamim Constant. A matriz positivista mantinha o seu controle sobre o GOB.

Quintino Bocaiúva, apesar de todo o trabalho efetuado, não podia se dedicar integralmente ao Grão-Mestrado, pois fora eleito e, a 31 de dezembro de 1900, empossado no cargo de presidente do estado do Rio de Janeiro, para um mandato de três anos, o que fez com que, em várias ocasiões, ele fosse substituído por Henrique Valadares. Mesmo assim, concluiu seu mandato no Grande Oriente, com grande saldo positivo, a 21 de junho de 1904, entregando o malhete de supremo mandatário da Maçonaria brasileira ao general Lauro Sodré, positivista, Senador da República por vários mandatos, candidato à Presidente da República contra o Ir. Campos Sales, e secretário de Benjamin Constant quanto este ocupou a Pasta da Guerra.

Esta matriz positivista, juntamente com os maçons, também positivistas, do estado do Rio Grande do Sul, entrará em conflito com os Presidentes da República da época, egressos da maçonaria liberal e civil do Estado de São Paulo. Lauro Sodré será até mesmo preso, enquanto Grão-Mestre do GOB, no encouraçado Deodoro por quase 6 meses.

Na política republicana brasileira, nessa década, entre outros maçons, sobressaiu-se o filho do visconde do Rio Branco, o barão do Rio Branco, patrono da diplomacia brasileira, que, em 1902, foi nomeado, pelo presidente Rodrigues Alves, ministro das Relações Exteriores do Brasil, ocupando o cargo até sua morte, em fevereiro de 1912, durante os governos dos IIr. Rodrigues Alves, Afonso Pena, Nilo Peçanha e Hermes da Fonseca, com grande destaque na resolução dos litígios com nações limítrofes.

No final do governo do Presidente Ir. Rodrigues Alves era eleito, para a presidência da República, o mineiro Ir. Afonso Pena, iniciando a alternância São Paulo–Minas Gerais no poder. Tendo sido eleito por uma coligação dos partidos situacionistas estadual – os verdadeiros donos da política da época –, que se havia oposto a um candidato da preferência de Rodrigues Alves, Afonso Pena encontraria o Congresso comandado por uma maioria liderada pelo senador Ir. Pinheiro Machado, líder político e maçônico, o que fazia supor que os problemas sucessórios deveriam ser submetidos, necessariamente, à apreciação desse grupo, composto por uma maioria de maçons de diversos estados. Tendo surgido a candidatura do Ir. Davi Campista, em 1908, suscitando grande resistência, pois ele se proclamava um intervencionista, o grupo liderado por Pinheiro Machado esposou a candidatura do maçom Hermes da Fonseca, que, em sua gestão no Ministério da Guerra, criara fama de grande administrador.

Ocorreria, então, o falecimento de Afonso Pena, no auge da crise, com a consequente ascensão, ao poder, de Nilo Peçanha, também líder maçônico, o qual iria ser Grão-Mestre do Grande Oriente do Brasil, de 1917 a 1919. Em torno dele, se oficializou o apoio político em relação à candidatura do Ir. Hermes da Fonseca, general e sobrinho de Deodoro da Fonseca, o que provocou, pela primeira vez na história da república, uma séria candidatura de oposição, por meio de Rui Barbosa. Hermes, todavia, seria eleito, pois tinha o apoio dos principais Estados.

Terminado o período de Hermes da Fonseca, os nomes mais cotados para a Presidência da República eram os do Ir. Pinheiro Machado e do Ir. Rui Barbosa: todavia, um acordo, entre os partidos republicanos dominantes de São Paulo e Minas Gerais traria à baila o nome do vice-presidente da República, o maçom Wenceslau Brás, o qual foi eleito sem oposição, enquanto o mundo se debatia na Primeira Guerra Mundial. Com a eleição de Lauro Sodré para governador do Estado do Pará, será eleito Grão-Mestre do GOB Nilo Peçanha em primeiro de junho de 1917. O Brasil entrará na guerra a 26 de outubro do mesmo ano.

No governo da República, acabado o mandato de Wenceslau Brás, em 1918 era eleito, para um novo mandato presidencial, Rodrigues Alves, que viria a falecer antes de tomar posse, o que fez com que o vice, Ir. Delfim Moreira assumisse até julho de 1919. Como este, cansado e doente, não tinha condições de comandar a política nacional, foi eleito, para completar o quatriênio, Epitácio Pessoa, que teria de enfrentar graves crises políticas.

Em 1919, a política maçônica, liderada por Nilo Peçanha, foi geralmente de oposição ao presidente Epitácio Pessoa, pois Nilo havia indicado Rui Barbosa para completar o período governamental de Rodrigues Alves. Essa posição seria mantida, embora com menor intensidade, durante o Grão-Mestrado do general Thomaz Cavalcanti de Albuquerque, que viria a suceder Nilo Peçanha, quando este renunciou ao seu mandato, a 24 de setembro de 1919. Enquanto o ambiente político estava agitado, diante da nova eleição presidencial e dos episódios que, supostamente, envolviam Arthur Bernardes, a situação do Grande Oriente também não era tranquila, pois iniciava a década com nova cisão, provocada por uma eleição fraudulenta.

Com a morte, a 28 de janeiro de 1921, do Grão-Mestre Adjunto Luis Soares Horta Barbosa realizou-se novas eleições, a 25 de abril daquele ano, para o preenchimento do cargo vago. A 3 de março, havia se realizado, no Rio de Janeiro, uma convenção para a escolha do candidato ao cargo; nessa reunião, com pouco mais de 40 convencionais, surgiram duas candidaturas: a de Mário Marinho de Carvalho Behring, sustentada por uma pequena maioria, que detinha o poder no Grande Oriente, e a do general José Maria Moreira Guimarães. Com o apoio de São Paulo, que não se fizera representar na convenção, Moreira Guimarães obteve a maioria dos votos. Manipulando, todavia, os dados, a junta apuradora anulou votos de ambos os lados, mas principalmente os do general, de tal maneira que Behring acabaria sendo eleito. Como se verá mais adiante Behring será o responsável por uma das maiores cisões que sofrerá o GOB no século XX e que perdura até os dias atuais.

Ao final da gestão do general Thomaz Cavalcanti, Nilo Peçanha era indicado, mais uma vez, para o Grão-Mestrado. Os acontecimentos políticos do país, nesse agitado período, todavia, acabariam por tornar inoportuna sua candidatura – ele fora, inclusive, ilegalmente preso, apesar de suas imunidades como Senador da República –, fazendo com que elementos ambiciosos saíssem da sombra e iniciassem o trabalho de intriga, visando galgar os altos postos do Grande Oriente do Brasil.

Os elementos que ambicionavam o Grão-Mestrado estavam ligados ao Ministério da Justiça de Artur Bernardes, então ocupado pelo maçom João Luis Alves. A 20 de maio de 1922, Mário Behring seria eleito Grão-Mestre do Grande Oriente do Brasil, com o beneplácito de João Luis Alves. Enquanto isso, ia agitado o ambiente político nacional, com a publicação das cartas, atribuídas Arthur Bernardes – e que se verificou, depois, serem falsas –, contendo insultos ao Exército. Liderando a revolta contra as cartas, encontrava-se o Clube Militar, presidido então por Hermes da Fonseca, o que provocaria a reação governamental, com o fechamento do Clube e a prisão de Hermes, fatos que provocariam o maior inconformismo das forças armadas e a revolta do Forte de Copacabana, a 5 de julho de 1922, no episódio conhecido como o “dos dezoito do Forte”, que iniciou a mística do movimento conhecido como “tenentismo”, o qual iria assumir o poder com o golpe de 1930.

Eleito e empossado na Presidência da República, Arthur Bernardes teve um dos mais agitados períodos presidenciais, só comparáveis ao de Floriano, governando, praticamente, sob estado de sítio e intervenção federal nos Estados, embora combatido por alguns poucos destemidos, como o maçom Nilo Peçanha, ex-Grão-Mestre do Grande Oriente. Em seu governo, eclodiu, em São Paulo, a revolta de 5 de julho de 1924 – durante a qual as Lojas maçônicas foram fechadas – chefiada pelo general Isidoro Dias Lopes e sufocada em 22 dias; no mesmo ano, em outubro, estouraria, no Rio Grande do Sul, outro movimento rebelde, liderado pelo capitão Luís Carlos Prestes, que, juntamente com os remanescentes da revolta paulista, formou a “Coluna Prestes”, que realizou a marcha de 30 mil quilômetros pelo interior do Brasil, sempre perseguida pelas forças governamentais.

Continua…

Autor: William Almeida de Carvalho

Fonte: Revista de Estudios Históricos de la Masonería Latinoamericana y Caribeña

Nota do blog

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