Tiradentes e a semente da independência: a quebra de dormência aconteceu em Minas (Parte II)

Do grupo de intelectuais que se revelaram na literatura, três poetas tiveram participação decisiva na Conjuração – Cláudio, Gonzaga e Alvarenga Peixoto, ao lado de juristas formados em Coimbra, além de padres, comerciantes e militares, alimentando um fervedouro cultural e social orientado pelo sonho de independência do Brasil do domínio português, principalmente após a repercussão da independência dos EUA em 1776, com a ajuda de liberais franceses, quando “exemplares da Constituição Americana, em traduções francesas, tendo como preâmbulo a Declaração de Direitos, andavam às escondidas, como livros heréticos, sendo lidos e comentados, em segredo, pelos grupos de iluministas disfarçados e alojados em toda a parte, nos navios, na tropa, nas repartições públicas, nos conventos e seminários” (LIMA JÚNIOR, 2010). Repercutia-se a notícia de que, dos 56 homens que assinaram a Declaração de Independência dos Estados Unidos, em 4 de julho de 1776, muitos eram maçons, incluindo Benjamin Franklin e o próprio George Washington.

A moderna Maçonaria tem como referência o ano de 1717 (ou 1721 para os puristas), quando se estabeleceu Londres, em seguida estendendo-se por toda a Europa[1]. No que se refere à maçonaria no contexto do Brasil, inobstante pilhérias e manifestações desrespeitosas de luminares lacradores, atualmente turbinadas pelos componentes de um etéreo tribunal das redes sociais, é recorrente o argumento de que ela não teria atuado na Inconfidência Mineira pela inexistência de Lojas regulares à época, já que a instalação da primeira Loja Simbólica reconhecida teria ocorrido apenas em 1801, com o nome de “Reunião”, no Rio de Janeiro, filiada a uma Obediência francesa. É por demais sabido que a maçonaria naquele tempo era uma sociedade secreta e clandestina, não admitida em território brasileiro, assim como na Metrópole, onde seus membros eram perseguidos e presos.

Qualquer tentativa de regularização de uma “Loja” local junto a uma das Obediências Inglesa ou Francesa naquele período poderia ser considerada um ato suicida. Segundo vários registros, bastaria ter livros escritos em francês ou possuir a constituição dos Estados Unidos para que um cidadão fosse perseguido, preso e processado por alta traição. Merece destaque a observação de JARDIM (1989), no sentido de que “a atuação da Maçonaria foi importante, mas, paradoxalmente, secundária, porque seu papel foi apenas o de aglutinar elementos e ideias predispostos por condições estruturais ao movimento de independência”.

Daquele grupo de estudantes mineiros que frequentavam cursos de universidades europeias, alguns foram iniciados na maçonaria francesa por volta de 1776 e passaram a arquitetar a libertação da sua terra natal, com destaque para José Álvares Maciel, José Joaquim da Maia, Domingos Vital Barbosa, José Pereira Ribeiro, José Mariano Leal…. “todos de vinte e poucos anos, que iam e vinham portadores de ideias contagiosas, que pegavam nos outros” (OLIVEIRA, 1985). Para CASTELLANI (1992) “Consta que Maia, Maciel e Vital Barbosa, entre outros, foram maçons, o que é plausível, pois a Maçonaria europeia já era bastante pujante, principalmente na França e na Inglaterra”. Complementa, afirmando que “Em 1776, na França, já existiam 547 Lojas, dez das quais estavam localizadas em Montpellier, que, por sua grande atividade universitária, tinha, também, grande atividade maçônica, pois a Maçonaria da época reunia o topo da intelectualidade europeia”.

Na sua obra “Gonzaga e a Inconfidência Mineira”, ALMIR DE OLIVEIRA (1985) comenta que “na Vila Rica daqueles tempos havia um grupo de literatos, que formava a Arcádia Ultramarina. Eram intelectuais, que se reuniam em sessões, onde se debatiam coisas do espírito. Poetas e juristas. E clérigos. É natural que, num ambiente de inteligências polidas, afeitas ao trato de problemas humanos, surgisse a ideia de fazer-se de Minas, quiçá do Brasil, um Estado livre, nos moldes da República americana do norte”. PEDRO CALMON (História do Brasil, 4º Vol. p. 1.248), citado em nota por ROBERTO LETTIÈRE (2001), registra que “o ‘clima’ do fim do século era nefasto aos congressos intelectuais. Nem estes eram apenas intelectuais. A Maçonaria repontara, instalava-se, estendia-se. Não seria de admirar que as esdrúxulas Academias….fossem… conventículos de pedreiros-livres…”.

A Comarca de Vila Rica, perto dos anos 1780, passou a ser dominada pelas ideias sobre progresso das ciências, necessidade de se estudarem as riquezas do país e a possibilidade de se construir uma nação separada de Portugal. Mas, as efetivas tratativas pelo grupo mais restrito dos conjurados tiveram curta duração, iniciando-se em meados de 1788 com a chegada “ao Rio de Janeiro, de regresso da Universidade de Coimbra, de uma larga viagem por alguns países da Europa, entre eles a Inglaterra, o jovem José Álvares Maciel, que se filiara à maçonaria e que participara das conversações para que se obtivesse o apoio de alguns países para o levante no Brasil” (LIMA JÚNIOR, 2010).

Tiradentes, nas suas andanças, expunha as muitas queixas que os mineiros tinham de seus governadores e acrescentava, sem restrições, que eles assolavam a Capitania e a garroteavam com seu despotismo, demonstrando que vinham aqui para enriquecer-se à custa do povo, conforme esclarecimento prestado pelo Padre Manoel Rodrigues da Costa, em depoimento na Devassa (Vol. 1º, pag.154). Argumentava que estes ficavam abastados ou então voltavam com grandes haveres à Metrópole, enquanto os mineradores, ainda quando senhores de muitas catas, não conseguiam a prosperidade que lhes era lícito ambicionar, pois eram despojados pela nefanda política dos quintos do ouro (JOSÉ, 2019). Os habitantes de Minas Gerais estavam asfixiados política e economicamente. Distantes dos portos achavam-se “fechados, encurralados numa estrutura econômica que precisava ser mudada, a fim de dar vazão à sua capacidade empresarial, cujos interesses são eram mais os da Metrópole, nem se atinham apenas e exclusivamente à atividade mineradora” (JARDIM, 1989).

Às vésperas do malogro da conjuração, a Tiradentes foram ainda atribuídos os apelidos de “República e Liberdade”, “Corta-vento e Gramaticão”, como resultado do entusiasmo e insistência com que empregava essas palavras nas conversações pré-revolucionárias, demonstrando como era do conhecimento amplo sua pregação, aberta, livre de receios, destemerosa. A propósito dos apelidos de Tiradentes, segundo OILIAM JOSÉ (2019), desde os primeiros momentos de sua atribulada civilização, apreciavam os mineiros o hábito de atribuir apelidos aos que viviam em sua sociedade, ora por certas semelhanças e do exercício de profissões, ora os tiravam de vícios e virtudes possuídos ou de hábitos, filiação e outros elementos. A alcunha “o Tiradentes” atribuída a Joaquim José da Silva Xavier é um exemplo.

O Visconde de Barbacena, Luís Antônio Furtado de Mendonça, como governador e Capitão-General da capitania de Minas Gerais, assumira o cargo em 11 de julho 1788, sucedendo a Luiz da Cunha Meneses, e recebera instruções da Corte Portuguesa para superar a herança maldita daquele momento, representada pela queda da arrecadação dos impostos resultante da decadência da mineração, e a viabilizar a urgente necessidade de cobrança dos atrasados. Nesse contexto entra em cena a ameaça da trágica derrama e aceleram-se as tratativas sobre a conjura. A insatisfação representava o clima espiritual da Capitania.

Curiosamente, nas instruções recebidas pelo Visconde constava o alerta de Martinho de Melo e Castro, então Primeiro Ministro e secretário de Estado da Marinha e do Ultramar entre 1770 e 1795, que já tinha conhecimento da predisposição das gentes de Minas para uma revolta, quando alertou: ”Entre todos os povos de que se compõem as diferentes capitanias do Brasil, nenhum talvez custaram mais a se sujeitar e reduzir à devida obediência e submissão de vassalos ao seu soberano, como foram os de Minas Gerais”. Outro Ministro Ultramarino, Antônio Rodrigues da Costa, bem antes, em 1732, já havia assinalado: “Essas imensas riquezas são que naturalmente fazem aqueles soberbos, inquietos, mal sofridos e desobedientes” (BRANT, 1991). A semente já fora detectada no solo mineiro desde longa data.

Nos preparativos da rebelião, nas casas de Cláudio Manuel e Tomás Gonzaga tratavam-se programas de doutrina e planos de organização política do projetado Estado. A casa do Tenente-Coronel Francisco de Paula Freire de Andrade era o quartel-general onde se traçavam as operações militares do levante.

Porém, como resultado da traição de Silvério dos Reis, todo o sonho da independência em Vila Rica encerrou-se em maio de 1789, transformando-se em pesadelo com a prisão dos envolvidos. Com a destruição dos documentos antes da apreensão dos conjurados e a adulteração de muitos depoimentos pelos juízes, a verdadeira história do movimento “tornou-se muito obscura e difícil de reedificada”.

Resumiu-se, assim, aos papeis oficiais contidos nos Autos da Devassa de natureza sumária e inquisitorial, eivadas de vício, sem ter havido qualquer contraditório, pela impossibilidade de arrolar e fazer ouvir testemunhas, e prestando-se, portanto, aquele período a especulações de toda ordem. Vitoriosa a repressão, resta-nos o consolo de saber que a beleza da germinação e a verdade, símbolos do perene anseio de libertação da alma humana, estavam ao lado dos derrotados, mas não vencidos. E esse é um desafio aberto aos pesquisadores e muito existe ainda a ser esclarecido, inclusive no que se refere ao efetivo rol dos conjurados.

As narrativas existentes sobre a Conjuração Mineira não identificam uma liderança em especial por parte de algum membro. Tiradentes chegou a declarar que o movimento não tinha chefe. Todos os envolvidos negaram participação no movimento, exceto o próprio Tiradentes que, conservando extrema dignidade durante os longos meses de interrogatório, afinal assumiu toda a responsabilidade de chefia, imolando-se por uma pátria livre e demostrando um grandioso gesto de fraternidade.

Rematando o processo, ficou a sentença aos réus da Conjuração, fruto das devassas iniciadas, a primeira no Rio de Janeiro em 7 de maio e, a segunda, em Minas, em 12 de junho de 1789, com duração de quase três anos, com o encerramento na capital, no Rio de Janeiro, em 18 de abril de 1892, com 11 conjurados condenados à morte, o sequestro de bens e familiares declarados infames e todo o sofrimento daí decorrente. O simples envolvimento, mesmo que superficial, e nada reportar às autoridades, era considerado crime de lesa-majestade, isto é, de traição contra a pessoa do Soberano ou de seu Real Estado, conforme definido no Título VII, do Livro V, das Ordenações Filipinas, sancionadas em 1595, punível com execução pública e sequestro de bens, além de ter os familiares condenados à infâmia. “Inconfidência” significava crime de lesa-majestade.

Entretanto, um decreto de D. Maria I (que já estava pronto e aguardando o momento apropriado) anunciado no dia seguinte, comutou a pena de morte de todos em degredo, à exceção de Tiradentes, que foi executado em 21 de abril de 1792 (sábado), às onze horas e vinte minutos, tendo seu corpo tratado com crueldade, como o fora Filipe dos Santos, exemplo para os moradores da Província e advertência para que ninguém ousasse tramar contra o reino de Portugal. Enforcaram e esquartejaram o homem Tiradentes, mas não as suas ideias e sonhos.

Pagou-se, naquele momento, o preço pela audácia de vislumbrar a data da derrama, estrategicamente suspensa no dia 23 de março de 1789, como sonho para deflagrar a frustrada revolta emancipadora contra a opressão e a exploração por parte da Coroa Portuguesa, interrompida pelo gesto da traição, permitindo a reação violenta do governo.

Faltou ousadia aos conjurados, dizem alguns críticos, que teriam colocado nas mãos do inimigo o estopim do levante ao fazer da Derrama o início da rebelião. Por outro lado, nas palavras de CELSO BRANT (1991):

 “a Inconfidência Mineira não é um movimento episódico, mas essencial: é um dos grandes momentos da multissecular luta da libertação dos povos e dos indivíduos. Ao lado das razões objetivas que então surgiram, entre as quais se incluíam, naturalmente, a insatisfação dos que criavam riquezas e as viam levadas para a metrópole, encontravam-se as razões essenciais, eternamente presentes na história humana: o desejo que cada povo tem de se autodeterminar, isto é, de escolher a sua forma de governo e os seus governantes”….”Admitir que a Inconfidência tenha chegado ao fim com o sacrifício de Tiradentes, seria o mesmo que aceitar que o Cristianismo terminou com a morte de Cristo na cruz quando, na realidade, foi ali que começou”.

Naquele grandioso episódio, prelúdio da independência nacional, a emergência e florescimento da semente da liberdade já era uma realidade, quando foram então edificadas as bases para as mudanças que se tornaram realidade com a frutificação da liberdade apenas 30 anos depois, proclamada por D. Pedro, neto de Dona Maria I, em 1822, e que neste ano temos o privilégio de comemorar o bicentenário.

E para não dizer que não falamos das flores (Vandré), raízes dessa semente não ficaram contidas e se disseminaram, com emergências na Revolução dos Alfaiates ou Conjuração Baiana (1798) e na Revolução Pernambucana de 1817. Para o escritor, filósofo e poeta estadunidense Ralph Waldo Emerson (1803-1882), “o pensamento é a semente da atividade”. Diz um Provérbio Latino: “a esperança da colheita reside na semente” (spes messis in semine).

Dissertando sobre o valor do sacrifício, OILIAM JOSÉ (2019), afirma que o mesmo foi utilíssimo à causa da Independência, pois fez crepitar, com maior intensidade, na alma brasileira, a chama emancipadora que, no momento propício, separado da execução do líder da Conjuração Mineira por apenas 30 anos, nos deu a liberdade para orientar nosso destino político.

Ainda segundo esse autor: O esmagamento da Conjuração e os excessos com que feriram seus revolucionários se colocam entre as causas que mais direta e poderosamente antecipa o triunfo do 7 de setembro…. E, para a compreensão dessa cadeia de causas e consequências, basta lembrar a poderosa influência exercida pelos mineiros José Joaquim da Rocha e Pe. Belchior Fernandes Pinheiro, respectivamente nos episódios do Fico e do Grito do Ipiranga. Eles trazem consigo os mesmos ideais que haviam animado a ação revolucionária de Tiradentes e procuraram concretizá-la em vitoriosa ação política, ao poderem influir sobre o ânimo de D. Pedro, o Regente.

O primeiro [José Joaquim da Rocha] aparece como sendo o verdadeiro responsável pelo Fico e é inegável que esse episódio marcou praticamente a separação política entre Brasil e Portugal. Conspirou com outros ilustres brasileiros em prol da independência nacional.

José Joaquim da Rocha (1777-1848), mineiro de Mariana, que ocupou influentes posições sociais e políticas no Rio de Janeiro, organizou em sua casa da Rua da Ajuda, 64, em dezembro de 1821, o “ardoroso Grupo da Independência, formado para convencer o Príncipe Regente a ficar no Brasil em cuja composição estava pelo menos mais cinco mineiros: Tenente Coronel Joaquim José de Almeida, Innocêncio Maciel da Rocha, Juvencio Maciel da Rocha, Pedro Dias Paes Leme e Paulo Barbosa da Silva” (JOSÉ, 2019). Com a chegada ao Rio de Janeiro das novas ordens de Lisboa para o retorno do Príncipe Regente a Portugal, José Joaquim da Rocha criou o Clube da Resistência, enviando emissários às províncias de São Paulo e Minas Gerais em busca de apoio; José Clemente Pereira, presidente do Senado da Câmara do Rio de Janeiro, começou a colher assinaturas pedindo ao príncipe que ficasse. A partir de então, nova página se abre na nossa História, marcando o início do processo da efetiva Independência.

Ao segundo [Padre Belchior], mineiro decidido, pertence o conselho dado a Dom Pedro, às margens do Ipiranga, de que não era mais possível recuar no processo de desligar nosso País da tutela do soberano luso. Conforme registra LAURENTINO GOMES (1822, p.36): Quatro anos mais tarde, em depoimento por escrito, padre Belchior registrou o que havia testemunhado a seguir: “E agora, padre Belchior?” – Eu respondi prontamente: “Se vossa alteza não se faz rei do Brasil, será prisioneiro das cortes e, talvez, deserdado por elas. Não há outro caminho senão a independência e a separação…”.

No que se refere ao reconhecimento da figura de Tiradentes, o Decreto nº 155-B, de 14 de janeiro de 1890, do Governo Provisório, declarou os dias de festa nacional, decretando, dentre outras datas, o 21 de abril, no aniversário da morte Tiradentes (1746-1792), precursor da independência, dia de festa nacional e resgatando a sua importância na história brasileira, na condição de Herói Nacional.

Em nove de dezembro de 1965, pela Lei 4897, Tiradentes foi proclamado Patrono Cívico da Nação Brasileira, evidenciando que “a sentença condenatória de Joaquim José da Silva Xavier não é labéu que lhe infame a memória, pois é reconhecida e proclamada oficialmente pelos seus concidadãos, como o mais alto título de glorificação do nosso maior compatriota de todos os tempos”.

Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, figura emblemática e reconhecida como Protomártir da Independência, Patrono das Polícias Militares e Civis do Brasil e Patrono Cívico da Nação Brasileira, foi o primeiro personagem a estrear, em 21 de abril de 1992, o “Livro dos Heróis e das Heroínas da Pátria”, produzido com páginas de aço e que registra os nomes dos heróis oficialmente reconhecidos pelo Brasil, instalado no Panteão da Pátria Tancredo Neves, localizado na Praça dos Três Poderes, em Brasília.

A semente se mantém viável por longo período, aguardando condições adequadas para germinar, o que ocorre em diferentes pontos, momentos e locais.

Finis

Autor: Márcio dos Santos Gomes

Márcio é Mestre Instalado da Loja Maçônica Águia das Alterosas Nº 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte; Membro Academia Mineira Maçônica de Letras e da Academia Maçônica Virtual Brasileira de Letras; Membro da Loja Maçônica de Pesquisas “Quatuor Coronati” Pedro Campos de Miranda; Membro Correspondente Fundador da ARLS Virtual Luz e Conhecimento Nº 103 – GLEPA, Oriente de Belém; Membro Correspondente da ARLS Virtual Lux in Tenebris Nº 47 – GLOMARON, Oriente de Porto Velho; colaborador do Blog “O Ponto Dentro do Círculo”.

*Trabalho apresentado em 02.04.2022, na solenidade de comemoração de 29 anos de fundação da Academia Mineira Maçônica de Letras – A Casa de Tiradentes, como parte do Ciclo de Palestras Sobre a Inconfidência Mineira, em parceria com o Instituto Histórico e Geográfico de Minas Gerais – A Casa de João Pinheiro, Polícia Militar do Estado de Minas Gerais, Grande Loja Maçônica de Minas Gerais, IHG de Congonhas, IHG de Tiradentes e Academia de Letras Guimarães Rosa da PMMG.


[1] Ver artigos publicados em 23 e 26.04.21 em:

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Referências

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ALENCAR, Francisco. História da Sociedade Brasileira, 3ª Edição. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1985;

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BARROSO, Gustavo. História Secreta do Brasil – Volume 1. Porto Alegre: Editora Revisão, 1990.

BRANT, Celso. Tiradentes e a Libertação Nacional. Rio de Janeiro: Editora da Mobilização Nacional, 1991;

CÁCERES, Florival. História do Brasil. São Paulo: Moderna, 1995.

CASTELLANI, José. A Maçonaria e o movimento republicano brasileiro. São Paulo: Editora Traço, 1989;

CASTELLANI, José; COSTA, Frederico Guilherme. A Conjuração Mineira e a Maçonaria que não houve. Londrina: Editora A Gazeta Maçônica, 1992.

D’ALBUQUERQUE, A. Tenório. A Maçonaria e a Inconfidência Mineira.  Rio de Janeiro:  Aurora, 1960.

DÓRIA, Pedro. 1789: A História de Tiradentes e dos contrabandistas, assassinos e poetas que lutaram pela independência do Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2014;

FERREIRA, Tito Lívio; Manoel Rodrigues. A Maçonaria na Independência Brasileira – Volume I. São Paulo: Gráfica Biblos, Ltda.- Editora, 1972;

FURTADO, João Pinto. O Manto de Penélope: história, mito e memória da Inconfidência Mineira de 1788-9. São Paulo: Companhia das Letras, 2002;

GOMES, L. 1822: como um homem sábio, uma princesa triste e um escocês louco por dinheiro ajudaram Dom Pedro a criar o Brasil, um país que tinha tudo para dar errado. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2010;

GOMES, Márcio dos Santos. Tiradentes: o legado de um herói em xeque. Revista Libertas Nº 22, janeiro a abril de 2021, da AMML: em https://drive.google.com/file/d/1FamQOVX8-OrXzfls8nkx8p1tI2h2_qWu/view;

_______________________. A Inconfidência Mineira, a Maçonaria e a Arcádia Ultramarina.

https://opontodentrodocirculo.wordpress.com/2017/04/18/a-inconfidencia-mineira-a-maconaria-e-a-arcadia-ultramarina-parte-i/; https://opontodentrodocirculo.wordpress.com/2017/04/19/a-inconfidencia-mineira-a-maconaria-e-a-arcadia-ultramarina-parte-ii/;

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MAXWELL, Kenneth. A Devassa da Devassa – A Inconfidência Mineira: Brasil e Portugal 1750-1808. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977;

OLIVEIRA, Almir de. Gonzaga e a Inconfidência Mineira. Belo Horizonte: Itatiaia, São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1985.

https://pt.wikipedia.org/wiki/Inconfid%C3%AAncia_Mineira, acesso em 10.02.2022.

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Tiradentes e a semente da independência: a quebra de dormência aconteceu em Minas (Parte I)

“… O primeiro compromisso de Minas é com a liberdade. Liberdade é o outro nome de Minas.…” (Tancredo Neves: discurso de posse no governo de Minas Gerais em 15 de março de 1983).

A expansão territorial do que viria a contribuir para a delimitação do domínio português na maior parte do Brasil como hoje conhecemos deu-se a partir dos séculos XVII e XVIII, por obra de vaqueiros, dos jesuítas e das entradas e bandeiras. Até então, a colonização se restringia à região costeira, onde vários fortes foram construídos para afastar os invasores provenientes das nações que foram excluídas do Tratado de Tordesilhas, que dividiu o Novo Mundo descoberto e por descobrir entre portugueses e espanhóis.

Até meados do século XVII, a autonomia política dos colonos era relativamente grande. O Brasil era um Estado da monarquia portuguesa, chamado de “Província do Brasil”. A partir da Restauração em 1668 – independência de Portugal em relação à Espanha, a soberania da nova dinastia governante foi estabelecida. Os colonos, sentindo-se explorados, mudaram a visão em face da dominação portuguesa, aflorando sentimentos de revolta contra a nova política para o Brasil.

Com a queda das exportações do açúcar nordestino, frente à concorrência da produção dos espanhóis e ingleses, e dos holandeses e franceses (expulsos do Nordeste) nas Antilhas, no final do século XVII, deu-se início ao chamado ciclo do ouro, gerando grande fluxo de pessoas do litoral nordestino e de Portugal para o garimpo na região produtora das minas, referenciado como montanhoso solo onde o ouro “se desprendia dos ricos veios e se derramava abundante pelos caldeirões e areias dos regatos”. Para custear suas importações, a Coroa portuguesa necessitava do ouro e prata de suas colônias. As primeiras descobertas de ouro ocorreram na região do atual Estado de Minas, em 1695, quando as bandeiras então se dirigiram para a área e, em seguida, para o Centro-Oeste.

Em 1702 foi criada a Intendência de Minas, com a função de controlar e fiscalizar a distribuição, o arrendamento e a produção das jazidas e cobrar o quinto, ou seja, os 20% da produção total. Com o contrabando do ouro em pó correndo solto, a Coroa criou as Casas de Fundição, em 1720. O ouro passou a ser fundido em barras, assegurando a cobrança do imposto. As descobertas de ouro e diamantes no Distrito Diamantino levaram o rei de Portugal, dom João V, a criar a Intendência dos Diamantes logo a partir de 1729, decretando o monopólio da Coroa.

Os primeiros conflitos já em fins do século XVII e nas primeiras décadas do século XVIII ainda não eram movidas pelo desejo de autonomia, mas por questões meramente regionais contra a política de exploração, do monopólio das privilegiadas companhias de comércio, além de conflitos entre senhores de engenho e comerciantes ou da disputa com os bandeirantes paulistas pelo domínio das minas. O Brasil era uma extensa e despovoada colônia, com regiões isoladas e sem comunicação.

A revolta de Beckman, no Maranhão em fevereiro de 1684, provocada pelos altos preços cobrados pelos produtos importados e os baixos valores pagos à produção local, culminou em prisões, degredos e o enforcamento do principal líder. Por sua vez, a chamada Guerra dos Mascates, movimento ocorrido em Pernambuco entre 1709 e 1710, colocou em lados opostos os senhores de engenho e os comerciantes portugueses moradores de Recife, tendo como uma de suas causas a crise açucareira. A rebelião terminou com a punição dos envolvidos e Recife permaneceu na condição de vila independente de Olinda. No mesmo período, entre 1709 e 1710, na região de Minas, então pertencente à Capitania de São Vicente, eclodiu o conflito pela disputa da posse de jazidas de ouro, que ficou conhecida como Guerra dos Emboabas. Vencido o conflito, a Coroa resolveu criar a Capitania de São Paulo e Minas de Ouro, desmembrada da Capitania de São Vicente, preservando a capacidade de fiscalizar a distribuição das jazidas e cobrar os impostos.

Aqui pelas bandas das Minas de Ouro merece destaque a Revolta de Vila Rica, também conhecida como Revolta de Filipe dos Santos, em 1720, que levou o nome do personagem à frente do movimento que se opunha ao fisco português com a criação das Casas de Fundição. Filipe dos Santos, tropeiro e rancheiro no povoado de Antônio Dias, liderou um motim de quase 2.000 mineiros. Acuado, o odiado governador português da região, sediado em Vila do Carmo (atual Mariana), o Conde de Assumar (Pedro de Almeida), negociou com os revoltosos prometendo o perdão e a suspensão da criação das Casas de Fundição. Tudo não passou de um artifício para ganhar tempo e articular a repressão aos rebeldes.

Com a desarticulação do movimento, foram presos os líderes e Filipe dos Santos foi enforcado em julho de 1720 e seu corpo atado a quatro cavalos, sendo dilacerado. Partes de seu corpo (cabeça, pernas e braços) foram colocadas em pedaços de madeira e espalhadas pela cidade, para mostrar à população o destino de quem desafiasse a Corte. Para justificar a justiça sumária contra portugueses perante o monarca, o Conde de Assumar, que não tinha jurisdição para tal ato, alegou que se tratara de crime de lesa-majestade e que o movimento encobriria ideal de liberdade e de formação de uma república. Indiretamente, e com a licença de puristas e céticos, uma semente de liberdade fora então lançada a terra. Sangue de mártir é semente.

A Revolta de Filipe dos Santos teve como consequência a cisão da Capitania de São Paulo e Minas de Ouro, materializando-se a autonomia administrativa da Capitania de Minas Gerais, por ato do rei Dom João V, em 2 de dezembro de 1720, com a capital em Vila Rica. Fora então criada mais uma Comarca: Serro Frio (com sede em Vila do Príncipe). Dessa forma, o território mineiro ficou dividido em quatro Comarcas: Vila Rica (Centro e Leste), Rio das Mortes (Sul), Rio das Velhas (Oeste) e Serro Frio (Norte/Nordeste).

Em 1735, a Coroa instituiu o “Imposto de Capitação”, por acreditar que o contrabando estaria comprometendo a arrecadação. O mecanismo consistia no pagamento, pelo minerador, de uma quantia de 17 gramas de ouro por cada um de seus escravos. Pelo Alvará de 3 de dezembro de 1750, foi alterada a cobrança com a imposição do pagamento de 100 arrobas anuais de ouro pela região de Minas. Com a queda da mineração e devido ao atraso, sob a ameaça de penhora de bens, foi instituída a “derrama”, em 1760. Outros impostos também recaiam sobre a região mineradora, como o das “entradas”, semelhante ao imposto sobre circulação de mercadorias. Pagava-se sobre a importação e a exportação de quaisquer produtos, mesmo de outras Capitanias e seu fato gerador era a entrada e saída do território mineiro. Havia ainda o “dízimo” como sua fonte de custeio e depois transformado num imposto sobre rendimentos de pessoa física e sobre a entrada e saída de mercadorias. Isso sem falar em outros impostos menores como o pedágio, taxas dos ofícios de justiça etc., onerando sobremaneira o custo de vida local.

Portugal não tinha nenhuma política colonial, tendo como única a estratégia de arrancar o máximo com o mínimo de despesas, indiferente ao bem-estar dos povos sujeitos ao seu domínio, impedindo de todas as formas que a população criasse riquezas e melhorasse as condições de vida. Naquele período, os contratadores da cobrança de tributos e comerciantes que vendiam a crédito tinham grandes valores a serem recebidos dos detentores das grandes fortunas. Essa situação deixava os contratadores comprometidos junto à Coroa. Na realidade, era uma economia de endividados cujos bens pessoais não eram suficientes para quitar as dívidas.

A dispersão da semente da liberdade ocorreu em outros momentos, pontos e locais da capitania de Minas Gerais, que fora ainda palco de outras sedições, desde a primeira metade do século XVIII, afrontando a imposição da soberania régia. Foi o caso da sedição do sertão do Rio São Francisco, ocorrida em 1736 e que se voltou contra as autoridades reais e a capitação — cobrança dos quintos reais realizada com base no número de escravos. Durante o reinado de D. José I (1750–1777), eclodiram inconfidências em locais isolados de Minas — Curvelo (1760-1763), Mariana (1768), Sabará (1775) e de novo Curvelo (1776) —, sempre em função de atritos com autoridades e seus aliados. Ao contrário da Inconfidência Mineira, esses motins anteriores implicavam manifestações concretas de violência, com a população na rua, arruaças, vivas à liberdade e referência a apoios de outras potências colonizadoras (Wikipédia).

Desde meados do século XVIII fazia-se sentir o declínio da produção aurífera na Capitania de Minas Gerais. A Comarca de Vila Rica havia se transformado, em poucos anos, graças ao ouro, na maior metrópole do Brasil. Em meados do Século XVIII, todo o território português possuía 2.900.000 habitantes, sendo 200 mil em Lisboa; na mesma época, só em Vila Rica havia 100 mil, ou seja, metade da população da capital do Reino. A Capitania contava com 320.000 habitantes em 1776. Dez anos depois, em 1786, a população de Minas Gerais era de aproximadamente 400.000 habitantes, sendo 206.000 livres e 190.000 escravos; a população do Brasil alcançava o número de 3.500.000, sendo 2/5 de escravos (JARDIM, 1989).

Por essa razão, na segunda metade desse século, a Coroa portuguesa intensificou o controle fiscal sobre a sua Província na América do Sul, proibindo, em 1785, as atividades fabris e artesanais, tendo em vista a necessidade de mais braços para a mineração, além de aumentar as taxas dos produtos vindos da metrópole.

Como visto, a partir da segunda metade do século XVIII, os valores do sistema colonial começaram a ser questionados, não só por pessoas de baixa condição social, mas também, com mais vigor, pelos grandes proprietários. Valores necessários à segurança do Estado absolutista português e da exploração colonial suscitavam controvérsias, como a ideia de bom pagador da Fazenda Real, o respeito à monarquia, a condição de vassalo zeloso, o direito divino do rei, que tinha o poder de vida e de morte sobre seus súditos. Temas como o luxo e a ostentação da Corte, grandes propriedades, escravidão, república, liberdade e separação de Portugal, ganharam relevo.

Com as transformações decorrentes da urbanização, cresciam a camada de comerciantes, funcionários públicos, professores, letrados, militares, artesãos e homens livres em geral, tornando a sociedade mais complexa. Embora precárias as comunicações, já se colhia um sentimento de incômodo com a prepotência das autoridades coloniais e a legislação metropolitana cada vez mais rígida e que dificultava a vida dos colonos.

Naquela quadra da história, constituía-se tradição as famílias abastadas enviarem seus filhos para estudar em Coimbra, cujo ensino havia sido reformado pelo Marquês de Pombal. Alunos também eram aceitos na França (Montpellier e Bordeaux) e no Reino Unido (Londres e Edimburgo). Na Europa tiveram a oportunidade de estudar o pensamento dos filósofos iluministas que combatiam o absolutismo, o mercantilismo e os monopólios, conhecidos como ideias francesas. Entre os anos de 1768 e 1788, vinte anos, portanto, 157 estudantes das diversas capitanias luso-brasileiras foram diplomados na Universidade de Coimbra (FERREIRA, 1972).

Nos portos brasileiros o contrabando trazia livros dos melhores autores e pensadores da época, como Rousseau, Voltaire, Montesquieu, enciclopedistas como Diderot e D’Alembert e Adam Smith, dentre outros. Naquele período, o Brasil não possuía universidades, imprensa e bibliotecas eram proibidas, a circulação de livros estava submetida a três instâncias de censura, de modo que os mecanismos de exploração e opressão não fossem fragilizados. A política oficial permitia o funcionamento das escolas religiosas, dominadas pelos jesuítas até suas expulsões, em 1759, depois assumidas por outros padres e mestres laicos. O ambiente sociocultural se apoiava nas realizações de caráter artístico, expressos através da religiosidade popular, da escultura, da música e da arquitetura. Em 1768, o Marquês de Pombal instalou a Real Mesa Censória, centralizando e organizando o trabalho da seleção do que podia ou não ser lido (DÓRIA, 2014). O direito de reunião era vigiado. De cada cem brasileiros, menos de dez sabiam ler e escrever.

As ideias revolucionárias que por aqui aportaram propiciaram grande crescimento cultural e tinham relevo nas reuniões e saraus musicais e literários então promovidos pelas famosas academias. Por isso, as academias se revestiram de alguma importância cultural e mesmo política. Nesse meio, os livros passavam de mãos em mãos. Seus rituais acadêmicos eram uma maneira de passar o tempo de forma mais agradável nas cidades provincianas como Salvador, Vila Rica e Rio de Janeiro.

Sem dúvida, naqueles eventos discutiam-se poesias, literatura, e, claro, filosofia e política. Em meados do século XVIII, surgiu a primeira escola literária brasileira – o Arcadismo. “Nessa época, portugueses e jesuítas deixaram de monopolizar a cultura. Liam-se também, principalmente em Minas Gerais, autores franceses e ingleses que eram críticos do absolutismo, do mercantilismo e da intolerância religiosa, louvadores da natureza, do progresso e da liberdade” (CÁCERES, 1995).

Efetivamente, o movimento árcade se desenvolveu no Brasil com a fundação, em Vila Rica, no ano de 1768, da “Arcádia Ultramarina”, tendo como referência a publicação, por Cláudio Manuel da Costa, de suas “Obras Poéticas”, constituindo o embrião de uma geração literária brasileira. Além de Cláudio Manuel, vários escritores se destacaram no Arcadismo brasileiro, como Tomás Antônio Gonzaga (autor de “Cartas Chilenas” e “Marília de Dirceu”), Frei José de Santa Rita Durão (autor do poema “Caramuru”), Inácio de Alvarenga Peixoto (autor de “A poesia dos inconfidentes: poesia completa”), José Basílio da Gama (autor de “O Uruguai”), Manuel Inácio da Silva Alvarenga (autor de “O Desertor das Letras”, “Glaura – Poemas Eróticos”). (GOMES, 2016).

No campo das expressões artísticas, Minas atingiu um dos mais altos pontos de sua civilização. “Só a arquitetura é um atestado indiscutível das proporções do progresso daquela sociedade, o que desmente a tendência preconceituosa de diminuir as possibilidades do movimento revolucionário de 1789 baseadas na existência de capacidade para a construção de um novo país” (JARDIM, 1989). Outra premissa falsa é a de que sendo o interior brasileiro uma região extremamente atrasada, de arraiais incipientes, não poderia comportar um movimento político de importância considerável.

O pensamento iluminista de caráter burguês e anticlerical pregava conceitos considerados subversivos pela Corte Portuguesa, por envolverem “abomináveis ideias francesas” ligadas a separatismo, república e legitimidade do poder, por considerar que a finalidade do governo era a de atender ao bem comum. Os iluministas defendiam a liberdade como elemento fundamental e inalienável para a realização do destino humano. Tinham como meio de difusão as Academias, a Enciclopédia, a Maçonaria, os Clubes, Cafés e Salões e as Universidades.

Em virtude da situação política, econômica e social, em especial dos interesses dos grandes proprietários de terras, minas e escravos, deu-se início à articulação do movimento que passou à história como a Inconfidência Mineira, como o primeiro a “compreender e criticar a exploração do sistema colonial e fazer a ligação entre essa exploração e a decadência das minas dos grandes proprietários. A Conjuração Mineira foi o primeiro movimento a propor objetivamente o rompimento do pacto colonial, ao tentar criar uma nação independente e a ver nessa independência um futuro de progresso” (CÁCERES, 1995). Neste movimento, em Vila Rica, podemos vislumbrar a quebra de dormência da semente da independência que fora lançada por ocasião do suplicio de Filipe dos Santos, germinando na mesma região, onde encontrou o terreno fértil como na parábola do semeador.

Continua….

Autor: Márcio dos Santos Gomes

Márcio é Mestre Instalado da ARLS Águia das Alterosas – 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte, membro da Loja de Pesquisas “Quatuor Coronati” Pedro Campos de Miranda, da Academia Mineira Maçônica de Letras e, para nossa alegria, um colaborador do blog.

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A Verdade do Conjurado Cláudio Manuel da Costa – Parte II

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A Devassa montada em Minas em 12 de junho de 1789 era composta pelos Desembargadores Araújo Saldanha e José Caetano César Manitti, ouvidores de Vila Rica e de Sabará, respectivamente. Segundo Castellani (1992), Manitti era descrito como arbitrário e amoral (p.51). Ainda segundo o autor,

Ambos serviam, perfeitamente, aos desígnios de Barbacena, pois Saldanha era fraco e dominável, enquanto que Manitti era influenciado pela fortuna – embora comprometido pelas dívidas – dos grandes contratantes envolvidos no movimento e que mantinham negócios com o governador, como era o caso de [João Rodrigues] Macedo, principalmente”.

O Contratador “João Rodrigues Macedo foi tido como o grande financiador da Inconfidência, sendo um dos que, devido ao tráfico de influência e uma teia de corrupção, benesses e proteções, conseguiram escapar dos processos das devassas. Seu nome apareceu poucas vezes nas inquirições e isso graças à amizade com Manitti”. Nas reuniões subversivas ocorridas em sua casa[5], em dezembro de 1788, com a presença dos conjurados, foram entabuladas conversas sobre o lançamento da derrama (Rodrigues, 2010).

Quando ao envolvimento do Desembargador Manitti, Castellani (1992, p. 136) destaca um acontecimento bastante emblemático representado por uma visita que aquele magistrado teria feito ao também conjurado Francisco Antônio de Oliveira Lopes, na prisão, antes do seu interrogatório oficial, propondo-lhe um “tratamento especial e mais brando, se ele não mencionasse, em seu depoimento, o envolvimento de Macedo [João Rodrigues] e Inácio Pamplona na conjura”. Acrescenta Castellani, “como se sabe, Macedo jamais foi incomodado durante o processo”.

Outra “Cortina de Fumaça” produzida por Barbacena foi o impedimento dos magistrados enviados pelo vice-rei que, ao chegarem a Vila, não tiveram acesso ao processo da devassa mineira e não puderam agir. Somente em 23 de julho é que

Barbacena concordou, embora contra a vontade, em suspender a devassa de Minas, ao mesmo tempo em que comprometia a fornecer, aos magistrados do Rio de Janeiro, uma cópia do relatório original – que jamais foi fornecido – e concordava com o novo depoimento das testemunhas já ouvidas. E, embora Torres e Pereira Cleto houvessem começado a interrogar, pessoalmente, réus e testemunhas, o processo já estava irremediavelmente viciado e as cartas embaralhadas.” (Castellani, 1992, p. 136/137).

Na obra do escritor Carlos Guilherme Mota (1986) é relatada uma passagem envolvendo articulações suspeitas do Visconde de Barbacena ainda na fase de produção do inquérito, quando foram blindados alguns figurões:

Em Vila Rica, o governador torceu e retorceu o inquérito, com a finalidade de fazer ‘desaparecer’ dos autos alguns magnatas que conseguiram comprar sua proteção. Por isso, antes da chegada dos magistrados enviados pelo vice-rei, o governador Barbacena e seus aliados trataram de apresentar uma devassa capaz de omitir nomes e simplificar as coisas. Foi nesse contexto, no qual não faltaram torturas e violências físicas, que morreu o velho poeta Cláudio Manuel da Costa”.

Considerando-se que Cláudio Manuel tinha destaque no cenário político, pois fora secretário de governo, Procurador da Coroa e da Ordem Terceira de São Francisco, Desembargador, além de advogado dos principais negociantes da capitania, já citado anteriormente, comprovadamente um jurista culto, renomado e chamado de “doutor”, seus detratores não se contentaram somente em desacreditá-lo e por isso procuraram atacar sua memória. Foi-lhe também maldosamente atribuída suspeita de covardia e traição aos amigos.

Na realidade, os depoimentos e informações contidos nos documentos produzidos pelas autoridades portuguesas de plantão tinham o único objetivo de concluir pela condenação dos envolvidos, não podendo ser descartada a possibilidade de estarem eivadas de vícios, omissões e tendenciosidades. E o interessante é que muitas análises abalizadas são feitas com base nesses relatos imprecisos, resultante da farsa judicial montada pelo Visconde de Barbacena.

Mesmo atualmente, muitos tentam minimizar a participação de Cláudio Manuel na conjuração, sob o argumento de que teria se aproximado de Tomaz Antônio Gonzaga e de Inácio José de Alvarenga Peixoto por interesses sociais e afinidades intelectuais, convidando-os frequentemente para os saraus e tertúlias que promovia. Porém, era indiscutível a sua influência intelectual, e os conhecimentos jurídicos que detinha dariam respaldo no sentido de construir a base legal para o novo modelo de governo então sonhado pelos conjurados.

A participação efetiva de Cláudio no movimento foi reconhecida pelos entendidos da Conjuração Mineira. Na documentação constante dos Anais da Biblioteca Nacional, o Juiz nomeado para a Devassa em 1789, José Pedro Machado Coelho Torres, afirmou que

O dr. Cláudio Manuel da Costa era o sujeito em casa de quem se tratou de algumas coisas respeitantes à sublevação, uma das quais foi a respeito da bandeira e algumas determinações do modo de se reger a República…”.

Cláudio Manuel, juntamente com cônego Vieira e Tomaz Antônio Gonzaga, compunha o grupo dos ideólogos. Eram homens bem informados e estavam encarregados de elaborar as leis e a Constituição da república e de justificar ideologicamente o rompimento com Portugal.

De fato, foi ele quem concebeu a bandeira dos conjurados, para simbolizar a sonhada república, que mais tarde serviu de inspiração para a confecção da bandeira oficial de Minas Gerais. O lema “Libertas quae  sera  tamen”, entendido por “Liberdade ainda que tardia“, foi cunhado por Claudio e Alvarenga Peixoto, a partir de um texto em latim retirado da primeira Écloga de Virgílio, que faz parte do diálogo entre Meliboeus e Tityrus – “Libertas quae  sera  tamen  respexit  inertem“, que pode ser traduzido por “A Liberdade, que embora tardia, contudo, olhou favoravelmente para mim, inerte”.

Por seu turno, a sua alegada tentativa de minimizar a própria importância no movimento seria uma estratégia de defesa frente ao juiz da devassa, conhecedor que era das reduzidas chances de sucesso do movimento e sabedor das consequências da acusação de crime de lesa-majestade, isto é, de traição ao Reino de Portugal.  É sabido que todos negaram participação no movimento, exceto Tiradentes, que afinal assumiu toda a responsabilidade de chefia, demostrando um grandioso gesto de fraternidade.

É oportuno que se destaque a colocação de Florival Cáceres (1995), no livro “História do Brasil”, acerca da documentação que envolve a conjuração:

Um dos maiores problemas no estudo da Inconfidência Mineira é a falta de documentos. Com medo da repressão, os inconfidentes não deixaram documento escrito, nenhum plano militar ou de governo. As investigações históricas baseiam-se nos interrogatórios feitos pela justiça portuguesa e em depoimentos dos acusados. Os riscos quanto a sua interpretação são grandes”.

Prossegue o historiador:

Os acusados podem ter sido pressionados a falar o que as autoridades queriam ouvir; para se inocentar, muitos acusados imputaram a sua culpa a outros. Como se tratava de homens importantes, nomes e detalhes podem ter sido omitidos através de suborno ou atendendo aos interesses das autoridades, na ânsia de proteger alguém; corre-se o risco de tomar a versão das autoridades pelos acontecimentos em si. Esse é o grande risco. A metrópole estava interessada em esconder a verdade relacionada aos movimentos anticoloniais para não incentivar outras tentativas, e pode ter tentado manipular os fatos”.

Sobre o destino dos planos dos conjurados, relata Kenneth Maxwell (1977) que em 17 de maio de 1789, sabendo-se em Minas que o alferes Tiradentes estava sendo seguido,

Cláudio Manuel viu gente à sua porta, em Vila Rica, sendo abordado por um tipo misterioso que lhe contou que houvera prisões no Rio de Janeiro e recomendou-lhe a queima dos papéis incriminadores” (p. 179).

Quanto ao alerta recebido por Cláudio Manuel, o escritor A. Tenório D’Albuquerque, no livro “A Maçonaria e a Inconfidência Mineira”, comenta no capítulo “O Misterioso Embuçado” que esse é um episódio inexplicável e que consta dos Autos da Devassa. Questiona o citado autor: “Quem seria capaz de disfarçar-se, correndo grave risco, para ir avisar aos inconfidentes que se precatassem?”. O que se sabe pelos documentos é que o Visconde quando se inteirou do aparecimento do tal personagem determinou novas inquirições, mas nada conseguiu esclarecer.

Alguns críticos comentam que a participação de Cláudio Manuel no movimento da Conjuração Mineira é cercada de “uma dúbia aura de infortúnio e fraqueza humana”, o que pode ter contribuído para o “relativo descaso com que sua obra foi tratada há até não muito tempo”.  Cláudio Manuel era uma espécie de oráculo, em Vila Rica. Todos lhe ouviam os conselhos e liam suas obras. Foi uma das figuras centrais da capitania e também mecenas de Antônio Francisco Lisboa, o Aleijadinho.

Levando-se em conta que entre as montanhas de Minas produziram-se e ainda se produzem muitas especulações e “causos”, acredita-se que a obra dos doze profetas em pedra-sabão feita por Aleijadinho (1730-1814), em Congonhas (MG), teria uma ligação com os conjurados. Em virtude da relação de amizade com Cláudio Manuel e Tomas Antônio Gonzaga, acredita-se que o escultor teria homenageado vários deles retratando-os nos profetas, cabendo a Cláudio Manuel a inspiração do rosto do profeta Jeremias.

A carreira literária de Cláudio Manuel iniciou-se em 1768, com a publicação de “Obras Poéticas“, livro que marca o início do arcadismo no Brasil. Na poesia lírica o tema é a desilusão amorosa, na épica sua poesia é inspirada na descoberta das minas, na saga dos bandeirantes e nas revoltas locais.

Segundo Laura de Mello e Souza (2011), “as Obras de Cláudio não mereciam, em Lisboa, que se gastasse a vista com elas. Em Vila Rica e em toda a capitania de Minas, contudo, o poeta foi ganhando fama e prestígio, chefe de orquestra da plêiade dos bardos locais, como o qualificou Sérgio Buarque de Holanda”, salienta a historiadora.

Foi um poeta de transição, pois como ele próprio afirma no prólogo das “Obras”, sofreu influência do Barroco, mas abraçou a causa árcade. Em Minas Gerais, ajudou a fundar a Arcádia Ultramarina com os poetas Manuel Inácio da Silva e Tomás Antônio Gonzaga, entre outros, sobre os quais exerceu forte influência.  Esses intelectuais começaram a criar poemas que trabalhavam com o tema da liberdade, da fuga do entorno burguês, que estava em embate com o poder despótico, para um ambiente idealizado e bucólico onde somente a mitologia grega poderia imaginar: a Arcádia, locus amoenus (um lugar ameno), um campo sublime, refúgio ameno em oposição aos centros urbanos.

O Arcadismo foi um estilo literário que perdurou pela maioria do século XVIII, tendo no bucolismo a principal característica, destacando a vida despreocupada e idealizada nos campos.  Cláudio adotou, no ano de 1773, o pseudônimo árcade de Glauceste Satúrnio, um personagem pastor que se inspirava em sua musa denominada Nise, revelando-se frustrado com sua própria obra, conforme citado na abertura deste trabalho: “vejo e aprovo o melhor, mas sigo contrário na execução“.

Sua obra envolve poemas épicos como “Memória histórica e geográfica da descoberta das Minas”, poesias que envolvem a problemática política, social e moral e inúmeros sonetos, distinguindo-se entre seus principais trabalhos as “Obras Poéticas” (1768), os versos “Munúsculo métrico” (1751), “Epicédio em memória de Frei Gaspar da Encarnação” (1753), “Labirinto de amor” (1753) e a épica “Vila Rica”, publicada postumamente em 1839.

Uma particularidade que envolve Cláudio Manuel são as famosas Cartas Chilenas, poemas satíricos que circularam em Vila Rica pouco antes da Conjuração Mineira. Foram escritas sob o manto do anonimato e são atribuídas a Tomás Antônio Gonzaga (1744-1810), com a colaboração de Cláudio, mais tarde identificados como “Critilo” (o emissor) e “Doroteu” (o destinatário), respectivamente.  O “Fanfarrão Minésio” era o governador Luís Cunha Meneses, que antecedera o Visconde de Barbacena no governo de Vila Rica.

O filólogo português e historiador da literatura Manuel Rodrigues Lapa, que em 1957 exilou-se no Brasil, onde leccionou em várias universidades, assegura ser Cláudio Manuel o autor da “Epístola a Critilo” que abre as Cartas Chilenas.

As 13 Cartas contavam a história de “Fanfarrão Minésio”, governador de uma hipotética cidade cognominada “Chile” (no caso, a comarca de Vila Rica), reconhecido como um administrador arbitrário, imoral e narcisista. Nas Cartas eram relatadas maracutaias em geral, como desmandos, atos corruptos, nepotismo, abusos de poder, falta de conhecimento e tantos outros erros administrativos, jurídicos e morais quanto pudessem ser relatados em versos decassílabos, funcionando como panfleto político e veículo de desmoralização do governo. Lembramos que era proibido imprimir textos na colônia.

Tais “Cartas” poderiam muito bem representar o embrião de uma futura mídia conservadora acusada de denegrir imagem de governantes ou de uma incômoda imprensa acusada de marronzista, virulenta e reacionária pelos que se locupletam quando assumem o poder político. O que não poderiam imaginar ainda, e talvez jamais acreditar, é que aquelas práticas condenáveis do “Fanfarrão” seriam características de governos vindouros, uma marca de nascença dos herdeiros do patrimonialismo implantado pelo Estado colonial português, em conluio e com respaldo do voto popular estrategicamente manipulado.

A historiadora Laura de Mello e Souza (2011) comenta que Cláudio era considerado um poeta obsessivo, um cultor da forma perfeita, mas um dado instigante é o fato de que sua poesia conquistou pouco espaço na lírica brasileira e, embora seus sonetos sejam belíssimos, não têm uma característica de universalidade e, pelo contrário, apresentam uma linguagem muito marcada por sua época. Acrescenta que os extraordinários poemas que ele compôs e reescreveu obsessivamente anos a fio e que foram referência obrigatória para Manuel Bandeira, Vinícius de Morais e Carlos Drummond de Andrade, são poucos conhecidos ainda hoje.

Em outra passagem, cometa a historiadora que a obra de Cláudio não dá margem a dúvidas:

lia compulsivamente, de tudo, e a cultura abrangente aparece nos vasto leque de interesses que manifestou. Além de poeta, reconhecido ainda em vida, foi cartógrafo, tradutor, historiador, dramaturgo e, dizem alguns, compositor musical”.

Cláudio Manuel da Costa é Patrono da cadeira nº 8 da Academia Brasileira de Letras.

Enfim, as várias biografias existentes têm pontos controversos, com interpretações conflitantes, porém, frente a todas as contradições envolvendo a vida dos conjurados e, em especial a do mártir Cláudio Manuel da Costa, o consenso entre os historiadores se resume no grande legado da Conjuração Mineira, que foi o primeiro movimento a criticar a exploração do sistema colonial e a propor o rompimento do pacto colonial, de forma a criar uma nação independente e ver nessa independência um futuro de progresso.

Nesse contexto, Cláudio Manuel, conjurado, poeta e patriota, tem o seu lugar glorificado na história, pois ousou pensar em fazer uma república livre e independente, articulando junto aos demais conjurados a oposição ao domínio português e assentando as bases para a construção de um projeto de nacionalismo e dos ideais de liberdade dos quais somos beneficiários e herdeiros.

Nessas condições, o tema da “Inconfidência Mineira”, melhor dizendo, “Conjuração Mineira” – termo esse que melhor representa a perspectiva de uma conspiração contra o governo então estabelecido e não à ideia de falta de fidelidade – continua a desafiar-nos e, nesse particular, a Academia Mineira Maçônica de Letras tem o mérito de manter o compromisso de estudá-la, de defender sua memória histórica, a verdade dos conjurados, de seus ideais e de exaltar seus efetivos e reconhecidos partícipes, refutando, no campo do debate e das pesquisas, análises tendenciosas ou que desqualifiquem esse legado e enfrentando, também de forma corajosa, os detratores de sempre.

Finis

Autor: Márcio dos Santos Gomes

Márcio é Mestre Instalado da ARLS Águia das Alterosas – 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte, membro da Escola Maçônica Mestre Antônio Augusto Alves D’Almeida, da Academia Mineira Maçônica de Letras, e para nossa alegria, também um colaborador do blog.

(*) Defesa do Patrono da Cadeira nº 2, da Academia Mineira Maçônica de Letras, apresentada na reunião de 03.03.2015

*Para ler a primeira parte do artigo, clique AQUI

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Notas

[5] – Como devedor da Fazenda Real e para saldar suas dívidas, dom Rodrigo de Sousa Coutinho, responsável pelo Erário Régio, ordenou, em 1802, que se procedesse ao confisco dos bens de Macedo, incluindo-se o mais valioso deles, a Casa dos Contos (Rodrigues, 2010).

Fontes de Pesquisa

Academia Mineira Maçônica de Letras – A Casa de Tiradentes. A Verdade dos Inconfidentes. Belo Horizonte: Imprensa Oficial de Minas Gerais, 2013;

Autos de Devassa da Inconfidência Mineira, 2ª Edição. Brasília: Câmara dos Deputados; Belo Horizonte: Imprensa Oficial de Minas Gerais, 1978;

CÁCERES, Florival. História do Brasil. São Paulo: Moderna, 1995;

CASTELLANI, José; COSTA, Frederico Guilherme. A Conjuração Mineira e a Maçonaria que não Houve. Londrina: Editora A Gazeta Maçônica, 1992

D’ALBUQUERQUE, A. Tenório. A Maçonaria e a Inconfidência Mineira.  Rio de Janeiro:  Aurora, 1960;

FURTADO, João Pinto. O Manto de Penélope – História, mito e memória da Inconfidência Mineira de 1788-9. São Paulo: Companhia das Letras, 2002;

LIMA JÚNIOR, Augusto de. História da Inconfidência de Minas Gerais.  Belo Horizonte: Itatiaia, 2010;

MAXWELL, Kenneth. A Devassa da Devassa – A Inconfidência Mineira: Brasil e Portugal 1750-1808. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977,

MOTA, Carlos Guilherme. Tiradentes e a Inconfidência Mineira.  São Paulo: Ática, 1986;

RAMOS, Péricles Eugênio da Silva. Poemas de Cláudio Manuel da Costa (Introdução, seleção e notas de Péricles Eugênio da Silva Ramos).  São Paulo: Cultrix, 1966;

RODRIGUES, André Figueiredo. A fortuna dos inconfidentes: caminhos e descaminhos dos bens de conjurados mineiros (1760-1850). São Paulo: Globo, 2010;

SOUZA, Laura de Mello. Cláudio Manuel da Costa – O Letrado Dividido.    São Paulo: Companhia das Letras, 2011;

Suplemento Cultural integrante da Revista da Associação Paulista de Medicina nº 208, de novembro de 2009:

http://apm.org.br/imagens/Pdfs/suplementocultural/Suplemento_Novembro2009.pdf

Sites de História da Internet.

A verdade do conjurado Cláudio Manuel da Costa – Parte I

Cláudio Manuel da Costa: obras, vida e características - Toda Matéria

“É infelicidade que haja de confessar que vejo e aprovo o melhor, mas sigo o contrário na execução.” (Cláudio)

O poeta e advogado Cláudio Manuel da Costa viveu entre 1729 e 1789, a maior parte do tempo na antiga comarca de Vila Rica, hoje Ouro Preto, à época a capital da capitania de Minas Gerais. Nascido em Minas, próximo a Mariana, filho de pai português e mãe paulista, estudou no colégio jesuíta do Rio de Janeiro e graduou-se na Universidade de Coimbra, em 1753. Regressou a Mariana, fixando-se, posteriormente, em Vila Rica.

Na sua educação europeia, Cláudio foi influenciado pelos filósofos iluministas e pelas teorias econômicas inglesas. Era simpatizante da política reformista do Marquês de Pombal, déspota Português, porém tinha discurso liberal.  Dominava o latim, o francês, o espanhol e cogita-se que lia em inglês. Deixou, ainda, dezenas de poemas escritos em italiano.

Especula-se que ele tenha traduzido a “A Riqueza das Nações”, de Adam Smith, obra esta publicada pela primeira vez em Londres em março de 1776, e que teria ligações com os Illuminati, sociedade secreta de cunho iluminista criada na Baviera e que influenciou inúmeras revoluções, fraternidades, arcádias literárias e associações com os mais diversos propósitos. Outra influência de época foi a Independência dos Estados Unidos da América (1776).

A historiadora Laura de Mello e Souza no seu livro “Cláudio Manuel da Costa – O Letrado Dividido” (2011) comenta que o conjurado morreu solteiro, mas viveu por trinta anos com Francisca Arcângela de Sousa (Francisca Cardoso ou Cardosa), nascida escrava e alforriada quando deu à luz o primeiro filho de Cláudio.  Ressalta que ela foi companheira de sua vida toda e mãe de seus cinco filhos,

um indelével indicativo de que o costume suplantou a legislação, mas não na íntegra, porque segundo a letra da lei, os bacharéis a serviço do Império não podiam casar-se com mulheres ‘da terra’. Cláudio Manuel da Costa não era português, mas sim luso-brasileiro, e não conseguiu superar sua formação jesuítica e escolástica, que de certo modo o aprisionava às leis, para de fato desenvolver coragem suficiente e assumir publicamente sua relação com uma negra”.

Em outra passagem do livro, a historiadora cita um comentário de João Caetano Soares Barreto, então Provedor da Fazenda, onde afirmava que

a capacidade e literatura do dr. Cláudio Manuel da Costa era bem conhecida de todos, e não só nos ‘estudos de direito’, mas igualmente no de outras ciências, seguindo sempre  o ensinamento dos melhores autores, ‘e mais modernos’. ‘Creio que nesta capitania não há quem o exceda’, prosseguia o provedor: só aceitava causas justas, consoante às leis do Reino, rejeitando todas as que só se poderiam defender com sutilezas e artimanhas”.

Esse é, pois, um bom testemunho do caráter do nosso Patrono.

Os registros históricos demonstram que Cláudio Manuel da Costa teve relativo sucesso profissional e projetou-se no campo político e literário de seu tempo, além de acumular significativo patrimônio material, sendo reputado como fazendeiro abastado, fatos que o colocavam na condição de membro da elite da então comarca de Vila Rica.

Em um tempo em que não existiam bancos, os negócios funcionavam à base do “fiado”, e a prática de solicitar empréstimo era usual entre as pessoas, o enriquecimento de Claudio Manuel também é atribuído à sua condição de banqueiro privado, um financista, como revelado no número de operações financeiras registrada no sequestro de seus bens. Levantamentos realizados demonstram que ele foi um dos profissionais do Direito mais requisitados nas Câmaras de Mariana e Vila Rica, havendo, ainda hoje, a confirmação de sua atuação em 68 ações judiciais.

O conjurado era um dos anfitriões constantes de poetas, militares, bacharéis e homens de negócio que, movidos pelas mais diversas razões, acorriam à capital. Oferecia chás, jantares, reuniões para conversas, declamações de poesias, recitais de músicas.  De acordo com a narrativa de Augusto de Lima Júnior (2010), em casa de Cláudio Manuel reuniam-se os homens mais eminentes que se divertiam em zombar de Luís da Cunha Meneses (o Fanfarrão Minésio das Cartas Chilenas), ridicularizado nas sátiras que nesses encontros literários se compunham contra ele.

Em “Nota Biográfica” contida na 2ª edição dos Autos da Devassa da Inconfidência Mineira (1978), volume II (p. 124/125), novos detalhes da vida de Cláudio Manuel foram agregados. Destacamos a informação sobre a sua saúde e o fato de ter sobrevivido à tuberculose,

que lhe roubou todos, ou quase todos, os irmãos homens, na juventude. Ao tempo da Inconfidência, andava achacado de reumatismo – razão de sua menor participação, não fosse ele também de formação conservadora”.

No volume VIII (p. 148), consta a nota dizendo que “o estado de saúde de Cláudio não lhe permitia sair à noite”. Como a terceira idade naqueles tempos chegava mais cedo, Cláudio Manuel foi considerado um dos membros mais idosos do grupo dos conjurados.

Era fato que o Visconde de Barbacena, Luís Antônio Furtado de Mendonça, como governador e Capitão-General da capitania de Minas Gerais, que assumira o cargo em 11 de julho 1788, sucedendo ao desastrado Luiz da Cunha Meneses, recebera instrução da Corte Portuguesa para superar a herança maldita do momento, representada pela queda da arrecadação dos impostos resultante da decadência da mineração, e a viabilizar a urgente necessidade de cobrança dos atrasados.

Conhecendo os planos dos conjurados, o Visconde decidira anunciar a suspenção em 14 de março de 1789 do pacote de medidas tributárias, conhecida como “derrama” [1], que esteve na origem da revolta, cuja cobrança estava anteriormente prevista para fevereiro daquele ano.

O clima na comarca era de desconsolo, provocado pelo regime opressivo e por fatores relacionados à espoliação pela Coroa, à proibição de instalação de indústrias e outras restrições econômicas, além da carestia, do atraso dos soldos, do desvio de recursos não contabilizados para a Fazenda Real, do contrabando que corria solto e da roubalheira generalizada, como nunca antes na história da Província[2].

O projeto político dos revoltosos era separatista e previa a instalação de uma república em Minas. A ideia da liberdade deixava muita gente entusiasmada, especialmente outra elite golpista de antanho. A data escolhida para deflagração da revolta seria estratégica, o dia da “derrama”, pelo apoio popular com o povo na rua como se esperava em função do descontentamento geral que a cobrança forçada dos impostos atrasados geraria.

Por outro lado, o resultado previsto da arrecadação dos “quintos” daria fôlego em decorrência de estar a Fazenda Real revigorada, o que permitiria o pagamento das tropas de apoio.

A conjura havia sido denunciada ao Visconde pelo Coronel Joaquim Silvério dos Reis, que almejava um tipo de delação premiada com perdão de suas dívidas para com a Coroa. No rastro da traição deixaram suas pegadas os aloprados Tenente-Coronel Basílio de Brito Malheiro e o Capitão-do-campo Inácio Correia Pamplona.

Em 12 de junho de 1789, visando a neutralizar depoimentos comprometedores diante dos magistrados do vice-rei, o Visconde mandou instaurar açodadamente em Vila Rica uma “Devassa”, que era o nome dado às investigações oficiais sumárias de caráter inquisitorial. Tal decisão ocorreu assim que tomou conhecimento de processo semelhante que já havia sido aberto no Rio de Janeiro em 7 de maio, com a prisão de Tiradentes logo três dias depois.

O Visconde, resguardando-se para que também os seus negócios não viessem à tona, nutria até então a esperança de que todo o assunto fosse tratado, sigilosamente, mediante acordo com o vice-rei, com o banimento dos cabeças da conspiração, sem que houvesse a necessidade de instaurar um inquérito judicial (Castellani, 1992).

No Volume VIII dos Autos da Devassa (p. 282), consta informação de que o Sargento-Mor da Cavalaria José de Vasconcelos Parada e Souza (o ‘Padela’ das Cartas Chilenas), em junho de 1789, no Quartel de seu Regimento, criticara o Visconde de Barbacena por ainda não ter mandado prender Cláudio, “notório amigo do Ouvidor Gonzaga”. Sabendo disso por intermédio de seus “olheiros”, o Visconde incumbiu-o de efetuar a prisão, que ocorreu em 25 de junho de 1789.

Cláudio Manuel se encontrava acamado, doente de reumatismo, quando arrancado do leito e conduzido para a Casa dos Contratos[3], sendo metido em um dos segredos preparados pelo Visconde de Barbacena. O local era considerado uma “cela especial”, diriam os mais otimistas, já lançando as sementes para o futuro tratamento diferenciado para os indigitados portadores de diploma de curso superior. A expressão “preso em segredo” tinha o entendimento de preso incomunicável na linguagem moderna, a popular “solitária”.

Para alguns críticos, pesa sobre Claudio Manuel a condição de ter se envolvido de forma colateral naquele movimento, já aos 60 anos, sendo ele interrogado uma só vez pelos juízes da Alçada, em 2 de julho de 1789, o que o teria deixado apavorado com as consequências da acusação, ocorrendo em seguida a sua morte em circunstâncias obscuras, oficialmente por suicídio na prisão, dois dias depois, no dia 4 de julho, em Vila Rica.

Não se tem notícias quanto ao local do enterro de seu corpo, prevalecendo a hipótese de que sua companheira Francisca teria se empenhado em conseguir-lhe sepultura, enterrando-o em fazenda de sua propriedade. Também na supracitada 2ª edição dos Autos da Devassa, em Nota contida na página 139 do Volume II, segue o seguinte comentário:

E corre a lenda que foi ocultamente sepultado na Matriz do Pilar, terceira sepultura ao pé do altar esquerdo, junto ao arco do cruzeiro”.

Outros historiadores afirmam que o vigário Vidal, íntimo amigo do finado, não querendo ou tendo razões para não acreditar no apregoado suicídio, ajudado pelo sacristão, foi ao lugar onde o corpo teria sido enterrado anteriormente, exumaram-no e o trasladaram para a Matriz de Vila Rica, dando-lhe uma das sepulturas abaixo do presbitério do lado esquerdo.

Não obstante a proibição de cultos para os suicidas, constam anotações de que a alma do poeta teria recebido dezenas de missas, tendo em vista sua reconhecida religiosidade e do título da “Ordem de Cristo” recebida do Rei de Portugal. O mesmo registro citado anteriormente acrescenta que “As modestas Irmandades a que pertencia pagaram-lhe o seguro do além: as trinta missas de praxe”.  Na realidade, a Fazenda Real arcou com as despesas dos ditos sufrágios, o que leva à dedução de que as coisas não ocorreram nos termos dos escritos oficiais.

A 2ª edição dos Autos da Devassa, Volume II, Apenso IV (p. 123/139), registra o teor da Inquirição e o auto do Corpo de Delito. Na Nota comentada que se segue na página 135, a respeito do depoimento do conjurado, consta que

A assinatura de Cláudio no documento original é trêmula, cansada pela idade e pela emoção. Mas é legítima, não tendo qualquer valor a alegação grafológica de que teria falsificado a própria assinatura…”. Prossegue a Nota acrescentando: “Ocorre que, no formalismo processual da época, a inquirição se tornou nula, pois faltava-lhe a formalidade do juramento aos Santos Evangelhos, assim como faltou, a seguir, a ratificação e segundo juramento em presença de um tabelião”.

Em certo aspecto, é de todo coerente assegurar que a morte de Claudio foi consequência de seu interrogatório, pois era conveniente aos seus algozes afastá-lo para dar consequência ao depoimento consignado, que, provavelmente, não seria ratificado por ele.  Laura de Mello e Souza (2011) destaca que havia

interesses importantes em jogo, sendo melhor que o poeta linguarudo se calasse de vez”, restando indagações que se respondem por si próprias, quais sejam:  “Por que o aprisionaram em Vila Rica e não o conduziram para o Rio de Janeiro como os demais? Barbacena o queria por perto para controlar-lhe a fala perigosa quanto a seu governo e à sua simpatia pelo movimento?”

Para Castellani (1992),

Cláudio, por seu próprio temperamento, poderia, encarcerado, ter perdido o controle de suas emoções. Mas por que não nos oito dias que precederam o interrogatório, mas, sim, apenas dois dias depois dele?”.

Em outra passagem da mesma obra afirma:

Foi um suicídio conveniente demais e no momento mais oportuno, para que deixe de suscitar dúvidas sobre sua veracidade”.

No que se refere ao falar sem atentar para possíveis consequências, vale destacar a observação do historiador Márcio Jardim, citado por vários autores, quanto a

acreditar que a morte de Cláudio tenha sido (junto com toda repressão que se abateu sobre a Capitania) um dos fatores que ajudaram na formação de uma das características dos mineiros: a prudência em falar de política”.

Algumas avaliações asseguram que Cláudio teria sofrido um duro golpe para o seu temperamento brando e para a sua idade, sobretudo pelo desgaste da inquirição a que fora submetido. Ademais, a sua especial sensibilidade de poeta e os conhecimentos jurídicos que detinha permitiam-lhe vislumbrar o cenário que se descortinava em função dos desdobramentos dos fatos. Torna-se importante realçar que contra os réus da conjuração todas as pressões eram permitidas, todas as ações justificáveis e era imperativo que os algozes mostrassem dedicação ao Reino de Portugal, daí o empenho em levar os conjurados à forca.

Uma passagem curiosa relatada no livro de Carlos Guilherme Mota (Tiradentes e a Inconfidência Mineira, 1986) demonstra a perspicácia e a preocupação de Cláudio Manuel naquela conjuntura.  Diz o texto:

Certa vez, falando com amigos, Cláudio Manuel havia dito: Nas Minas Gerais não há gente. Os americanos ingleses foram bem sucedidos porque acharam três homens capazes para a campanha de sua independência [Benjamin Franklin, Thomas Jefferson e George Washington], mas nas Minas Gerais não há nenhum. Só o Alferes Joaquim José da Silva Xavier, por alcunha Tiradentes, anda feito corta-vento. Mas ainda lhe hão de cortar a cabeça”.

Segundo o autor, foi o que aconteceu, mas Cláudio morreu primeiro.

Outra preocupação de Cláudio Manuel, citada pelo brasilianista e controvertido historiador britânico Kenneth Maxwell (1977), diz respeito à loquacidade de Tiradentes que levou o poeta a criticá-lo “por estar pondo em perigo o sigilo dos planos com sua falta de cautela…”. Mas a admiração do poeta ao alferes também é refletida na frase “tomara que existissem mais homens desta têmpera!”.

A corrente que defende a linha do suicídio de Claudio Manuel se apoia nas alegações de que ele estaria em profundo estado de depressão às vésperas da sua morte, o que teria sido confirmado pelo frade confessor, conforme depoimento apensado aos Autos da Devassa. Muitos argumentam que foi uma reação de dignidade pela recuperação da lucidez e reconhecimento de que teria fraquejado diante dos juízes que sempre amoleciam o caráter dos conjurados antes de submetê-los a interrogatório. E, por estar velho, doente, alquebrado, decidira pelo suicídio. Outros, que advogam a tese do assassinato, contestam a autenticidade do documento e a declaração do frade.

Surpreendentemente, Laura de Mello e Souza (2011) assim se manifesta com relação à morte do conjurado: “se entendi o homem que foi Cláudio Manuel da Costa, sou levada a afirmar que decidiu pôr um termo a sua vida”. A injusta conclusão da renomada historiadora se baseia em análise de “vestígios deixados pela ficção e pela história”. Em outra parte de seu trabalho ela afirma ter vislumbrado traços de melancolia no poeta. Se assim o fora, os autores que escrevem romances trágicos deveriam ser cautelarmente vigiados pelos familiares ou autoridades por representarem uma ameaça a si e à sociedade.

A propósito da melancolia da qual estaria acometido nosso poeta é bom que se diga que esse e inúmeros outros traços culturais, como a discrição, prudência, desconfiança, introspecção e outros modos de ser dos mineiros, como o jeito ”pacífico e malicioso”, descrito por Amoroso Lima, formam um conjunto de valores largamente decantados pelos estudiosos desse emaranhado simbólico da mineiridade.  Hipócrates (460-370 a.C) definia a melancolia como uma doença sagrada. Aristóteles (384-322 a.C.) se perguntava: “Por que razão todos aqueles que foram homens de exceção no que concerne à Filosofia, à Ciência de Estado, à Poesia ou às Artes foram manifestamente melancólicos?”. Sem esse excesso, segundo ele, a genialidade não manifestaria sua criatividade.

Contudo, referências à religiosidade e ao bom humor do conjurado não faltam. Augusto de Lima Júnior (2010) relata:

Cláudio se constituíra uma grande e respeitada figura na vida social da Capitania das Minas Gerais, sendo ainda muito querido por seu gênio folgazão, sempre bem humorado, conforme ele próprio declarou aos seus inquiridores nas Devassas de Vila Rica”.

Afirma ainda que Cláudio era um homem rico, com grandes rendas em vista da grande quantidade de ouro que detinha. Esses valores desapareceram de sua casa depois de sua prisão, tendo sido a causa de seu assassinato, que muito interessava aos ladrões que o foram prender, sendo o principal suspeito o Sargento-Mor da Cavalaria José de Vasconcelos Parada e Souza.  Na condenação, o restante de seus bens foi confiscado para o Fisco e Câmara Real.

Aos que defendiam a tese do assassinato, o próprio laudo pericial era motivo de suspeita, em face da conclusão simplória de que o poeta teria se enforcado usando os cadarços do calção, amarrados em uma prateleira, em condição julgada impossível para que alguém pudesse lograr êxito em tais circunstâncias. A convicção era de que Cláudio Manuel fora assassinado premeditadamente e seu corpo posteriormente suspenso a fim de simular um enforcamento voluntário.

Retornando ao locus horribilis onde o nosso Poeta Árcade enfrentou o seu fim, e para uma melhor avaliação do discutível “Auto de Corpo de Delito”, transcrevemos a conclusão constante do Volume II dos Autos da Devassa, item IV. 2.3 (p.137):

E examinado mais todo o corpo pelos referidos cirurgiões, em todo ele não se acha ferida, nódoa, ou contusão alguma, assentando, uniformemente, que a morte do referido Dr. Cláudio Manuel da Costa só fora procedida daquele mesmo laço e sufocação, enforcando-se voluntariamente por suas mãos – como denotava a figura e posição em que o dito cadáver se achava”, conclui o documento[4].

O Suplemento Cultural integrante da Revista da Associação Paulista de Medicina nº 208, de novembro de 2009, ao apresentar artigo de Arnaldo Amado Ferreira intitulado “A morte do inconfidente Cláudio Manuel da Costa”, apresenta a seguinte análise:

O auto de exame de corpo de delito do ilustre inconfidente poderia ter melhor esclarecido a causa da morte, não fosse ele falho e incompleto, sem obedecer às regras e a técnica médico-legal para esses documentos. A sua insuficiência, entretanto, pode ser creditada não só à falta de qualificação dos profissionais que o elaboraram, bem como aos modestos conhecimentos médico-legais daquela época”.

Em relação às circunstâncias da morte do conjurado, o Mestre em Sociologia e Doutor em História, João Pinto Furtado, sob outro discutível enfoque, comenta em seu livro “O Manto de Penélope” (2002, p. 67):

Também a morte de Cláudio Manuel da Costa, em julho de 1789, é muito ilustrativa. Um dos mais seriamente envolvidos nas atividades ilícitas de contrabando, ele poderia ter ameaçado expandir o raio de ação da devassa incluindo informações sobre a rede que, supostamente, articulava os membros do movimento e, por isso, sua morte seria uma espécie de ‘queima de arquivo’ avant la  lettre”. Continua o autor: “De fato, os temas do contrabando e da proeminência de algumas das principais lideranças do levante, em especial Cláudio Manuel da Costa e Tomás Antônio Gonzaga, embora pujantemente citados na formação de culpa, desapareceram por completo ao longo das demais inquirições. É verossímil que possam ter ocorrido acertos nesse sentido…”, conclui.

Dentro da linha das “conspirações” João Pinto Furtado (2002) teoriza:

é lícito afirmar que homens como Cláudio Manuel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga, o cônego Vieira e Alvarenga Peixoto provavelmente pretendiam a reforma no sistema de poder nas Minas, mas antes no que se refere à troca de alguns nomes e funções do que em seus pilares e fundamentos. Assim, o foco da luta seria muito mais interno ao mundo luso-brasileiro do que aos grandes e mais revolucionários temas iluministas”.

Em parágrafo anterior o referido autor já havia concluído que

o volume total do sequestro dos inconfidentes praticamente correspondeu à arrecadação do quinto real sobre o ouro no ano de 1789. Além disso, o processo, do qual não se pode dizer que Barbacena atuou como observador distante afastou de uma vez por todas da estrutura de poder das Minas aqueles que seriam os únicos, talvez, em condições de rivalizar com o visconde em prestígio, luzes e talento para a gestão dos negócios coloniais, quais sejam Tomás Antônio Gonzaga e Cláudio Manuel da Costa” (p. 206 e 223/224).

No sequestro dos bens dos conjurados, a casa de Cláudio, localizada em Vila Rica, teria passado por três processos de sequestro: em 25 de junho e 31 de julho de 1789 e 21 de março de 1791. Os Autos de Inventário foram coordenados pelo ouvidor José Caetano César Manitti (Rodrigues, 2010).

Ainda com relação aos desdobramentos da morte, no ensaio denominado “Inconfidência Mineira – As Várias faces“, Júlio José Chiavenato desmonta a tese do autoextermínio ao relatar que na tarde do mesmo dia em que Cláudio foi preso, foram mortos sua filha, o genro e outros familiares, bem assim alguns escravos, além de terem sido roubados todos os seus bens.

Augusto de Lima Júnior (2010) relata que na mesma tarde da prisão do conjurado, o Sargento-Mor Vasconcelos Parada e Souza despachou emissários para o Sítio da Vargem onde residia o genro e a filha de Cláudio, quando todos foram assassinados, incluindo os escravos, e se apossaram de barras de ouro consideradas o tesouro da revolução. Posteriormente, quando a casa foi demolida, foram encontrados sete esqueletos debaixo do assoalho da sala de jantar.

Consta, ainda, que o governador da capitania, Visconde de Barbacena, somente reportou a Lisboa sobre a morte de Cláudio em 15 de julho, onze dias depois de o fato ter ocorrido. A leitura do episódio é a de que, se a morte do Alferes Tiradentes não causaria embaraços em Lisboa, a de Cláudio e da sua família poderia causar, daí a necessidade de a farsa ser montada.

Outra referência quanto aos acontecimentos daqueles dias, Kenneth Maxwell (1977) aduz que

Em correspondência para Lisboa, a 11 de julho, o governador não se referiu à morte de Cláudio Manuel da Costa, embora comentasse o depoimento do prisioneiro. O governador falou no ‘suicídio’ em outra correspondência, datada de 15 de julho que incluía o relatório dos médicos. Muito mais tarde um destes médicos veio a declarar que em seu primeiro relatório não atestara a causa da morte como sendo suicídio – e sim assassinato. No dia seguinte ao do exame, afirmou ele, o ajudante de campo do governador, Antônio Xavier de Resende, disse-lhe que seu relatório fora inadvertidamente destruído, aconselhando-o a elaborar outro que dissesse ter o prisioneiro se matado” (p. 182).

Muitos entendidos especulam que o conjurado estaria disposto a revelar nomes de importantes autoridades envolvidas no movimento. Intrigas de ocasião sugeriam que Cláudio teria sido assassinado por ordem do Visconde de Barbacena, que supostamente teria relações com os envolvidos e nutria alguma simpatia pelo movimento e temia ser denunciado.  Contribuíam para isso insinuações feitas por Tiradentes a companheiros mais próximos de que teria “pessoa muito grande” a apoiá-lo. Não obstante tal afirmativa não parecer verossímil é certo que o poeta Tomaz Antônio Gonzaga gozava da intimidade com o Visconde, tendo escrito dois sonetos para celebrar o nascimento de seu filho. Acredita-se que Gonzaga contaria com o Visconde de Barbacena nos planos de uma nova ordem.

Sabia-se também que o conjurado José Álvares Maciel era amigo e por vezes hóspede do Visconde.  Corriam notícias de que o Visconde de Barbacena devia muito dinheiro a Cláudio Manuel, que era credor de extraordinária clientela.  De acordo com Kenneth Maxwell (1977), o Visconde de Barbacena teria sido no mínimo conivente com os planos de conjuração. Essa suspeita tem fundamento, vez que a atuação do governador durante o processo judicial enseja muitas contradições.

Mas, o fato é que o Visconde pôs a viola no saco e saiu gritando “pega ladrão”, iniciando a repressão e agindo com presteza e muita disposição contra o movimento, pois havia uma preocupação das autoridades portuguesas com a possibilidade de o levante atingir as vizinhas capitanias do Rio de Janeiro e de São Paulo.

Em relação às suspeitas que recaíam sobre o Visconde quanto à morte de Cláudio Manuel, relata Kenneth Maxwell (1977):

Certamente o poeta não poderia ser assassinado sem a conivência ou, ao menos a concordância do governador. Em seu depoimento, além do mais, Cláudio afirmou recordar-se de ter ouvido de Gonzaga, certa vez, que o General… o Visconde (de Barbacena) sempre dizia que estaria na primeira linha, no caso de uma revolta…” (p. 184).

Ainda segundo o autor, o mistério que cercava o falecimento de Cláudio e a farsa crescente do processo em Vila Rica são exemplos muito ilustrativos do pantanal em que afundava todo o caso. Sendo a morte um ato premeditado (não descartando tal possibilidade), serviu de advertência aos demais até que ponto certos interessados estariam dispostos a ir para se protegerem da incriminação.

Continua…

Autor: Márcio dos Santos Gomes

Márcio é Mestre Instalado da ARLS Águia das Alterosas – 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte, membro da Escola Maçônica Mestre Antônio Augusto Alves D’Almeida, da Academia Mineira Maçônica de Letras, e para nossa alegria, também um colaborador do blog.

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Notas

[1] – A “derrama” foi uma medida fiscal cogitada em 1788, para complementar os débitos que os mineradores acumulavam junto à Coroa Portuguesa, que estipulava a cobrança de um imposto adicional aos vinte por cento de praxe, então alardeada como uma escorchante alíquota chamada de “quintos”, de forma a se atingir a cota anual de 150 arrobas (1.500 quilos) de ouro, que seria completada com o confisco de bens e objetos de ouro.

[2] – O Brasil era Província da Monarquia Portuguesa (Estado do Brasil). A capitania de Minas Gerais, no período de 1720 a 1815, era dividida em quatro comarcas: Vila Rica, Rio das Mortes, Rio das Velhas e Serro Frio.

[3] – A Casa dos Contratos era propriedade de João Rodrigues Macedo, um rico contratador e amigo muito próximo do Visconde, prédio hoje conhecido por Casa dos Contos. Os contratadores naquele tempo eram os “empreiteiros” de negócios que arrematavam os contratos para arrecadação dos direitos reais e exploração de atividades comerciais.

[4] – A propósito, tal criatividade pode ter inspirado as autoridades envolvidas em caso semelhante ocorrido 183 anos mais tarde, em 25 de outubro de 1975, com o jornalista Vladmir Herzog, cujo “Laudo de Encontro de Cadáver”, expedido pela Polícia Técnica de São Paulo, registrava que ele se enforcara com uma tira de pano – a “cinta do macacão que o preso usava” – amarrada a uma grade a 1,63 metros de altura. Na condição de judeu, Herzog foi enterrado no centro do Cemitério Israelita do Butantã, o que significava desmentir publicamente a versão oficial de suicídio

Tiradentes: um maçom, ainda que tardio

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Pois seja feita a vontade de Deus !
Mil vidas eu tivesse, mil vidas eu daria
pela libertação da minha Pátria !”
Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes

Depois de trinta anos da execução de Tiradentes, Dom Pedro I, o herdeiro da coroa portuguesa que o enforcara e esquartejara, proclamava a Independência do Brasil. Prova irrefutável de que os propósitos de Joaquim José da Silva Xavier haviam sido plantados em terra fértil e frutificados. A semeadura não só proporcionou a conquista da nossa independência, como deu um imenso passo adiante na marcha da Humanidade, algo que lhe devemos, até hoje, por alguns dos benefícios políticos que gozamos.

Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, também tinha outras alcunhas como “o Corta Vento”  e “o Liberdade”. Foi taxado traidor pelo governo português da época, porém, para os brasileiros é um  dos maiores heróis nacionais, idealista e líder, com caráter ímpar em face do julgamento e da morte, apesar de alguns historiadores considerarem-no simples figurante numa conspiração de bacharéis ricos e poderosos, que ficou conhecida como Inconfidência Mineira. Na verdade, o que se atesta, é que foi um homem leal, de espírito inquieto. Joaquim José da Silva Xavier, reapresenta um arquétipo simbólico do mito do herói, com uma ação política que o tornaria exemplo para todos aqueles que no curso dos anos se dispuseram a libertar o Brasil do jugo de Portugal. A imagem, do fenômeno Tiradentes, está implantada no âmago do povo como um mito de origem e do herói de Vila Rica. É, oficialmente, o Patrono Cívico da Nação Brasileira!

A maioria dos movimentos rebeldes, que eclodiram no Brasil Colonial, não teve por objetivo central a independência, mas sim, outros objetivos, principalmente relativos a impostos e confiscos. Três desses movimentos, entretanto, tinham interesses separatistas e republicanos, e, os três foram denunciados por traidores: Inconfidência Mineira, que obteve maior notoriedade, a Inconfidência Carioca e a Inconfidência Baiana, menos conhecidas. Inconfidência quer dizer crime de lesa-majestade; os vassalos juram defender o seu rei e dar a vida por ele e, quando o vassalo cometia perjúrio ou faltava ao juramento, praticava crime de inconfidência. Sabe-se, contudo, que nenhum dos movimentos chamados “nativistas” tinha ambições nacionais entre seus integrantes, pelo simples motivo de que não existia ainda, um sentimento de “nação brasileira”, já que essa ideia só foi construída durante o governo e D. Pedro II (1840-1889). Entende-se porém, que esses movimentos são um momento de expressiva beleza na luta pela independência do Brasil, ocorrido nas duas últimas décadas do século XVIII, vistos pela ótica ufanista.

A Inconfidência Mineira ou Conjuração Mineira é uma das mais controversas passagens da história do Brasil. Não restam muitas informações e documentos a respeito de seus participantes, a não ser alguns relatos oficiais produzidos pelos juízes do governo colonial de então. Muito existe ainda a ser esclarecido acerca dos fatos ocorridos, em 1789, em Vila Rica, envolvendo pessoas de grande fortuna e alta posição na cidade, numa conspiração contra Portugal. Há também o agravante das versões apaixonadas produzidas por monarquistas e republicanos nos anos que se sucederam aos acontecimentos, as quais comprometem uma visão isenta sobre como tudo de fato aconteceu. Podemos, entretanto, dizer que pela condição de movimento nativista como pela ação desenvolvida, em nome de uma ideologia liberal, por alguns dos seus participantes, a Inconfidência Mineira constitui página de especial menção na evolução histórica do Brasil. Alguns pretendiam, mesmo, eliminar a dominação portuguesa e criar um país livre. Para os ensinamentos didáticos, a imagem de Tiradentes ficou sagrada como mártir e a ideia de que o movimento de rebeldia fora precursor da Independência do Brasil.

O movimento foi uma conspiração elaborada por parte da oligarquia de Minas Gerais entre os anos 1788 e 1789. Aprofundada em altas dívidas, sem condições de saldar os tributos, e, descontentes com a reforma administrativa a ser promovida na capitania pela Coroa Portuguesa, que lhe tiraria os privilégios, a elite mineira antevia na independência uma solução para os problemas. Boa parte dessas pessoas tinham educação e cultura acima dos padrões comuns à época, quase todos, contudo, cheios de ambição e muito habituados à prática de atos de corrupção e suborno que comprometiam as próprias autoridades locais. Esse grupo, que incluía homens de negócio, proprietários rurais, clérigos, militares e vários políticos, se protegiam clandestinamente e davam apoio aos idealistas: caso estes fossem descobertos, seriam eles os punidos pela repressão colonial portuguesa.

Havia outros fatores que contribuíam com a situação crítica da economia. Um deles se relacionava com o apetite fiscal da Coroa Portuguesa ser tão grande quanto a dificuldade em pagar suas dívidas com a Inglaterra. Portugal quase nada produzia além de vinhos e quinquilharias. O governo português comprava dos britânicos quase tudo o que consumia. O ouro do Brasil era a principal moeda de pagamento, mas, a partir da segunda metade do século XVIII, já dava mostras de esgotamento. A influência das ideias do Iluminismo e a notícia da Declaração de Independência do Estados Unidos da América (1776) serviram, igualmente, para alimentar os sentimentos de revolta contra os governantes. A tática, para atrair a simpatia do povo, pregava que o levante deveria ocorrer quando o governo colonial aplicasse a derrama (cobrança extraordinária de impostos, tributos em atraso e confisco de bens).

A voracidade fiscal e a tirania do governo revoltavam o povo, que sofria as consequências indiretas do confisco que atingia os mais ricos. Comércio, lavoura e pecuária também eram tributados. Os que não pagavam podiam ser presos e até degredados. Entretanto, antes de levar a efeito a rebelião, propriamente dita, a oligarquia mineira passou alguns anos tentando negociar com a Corte uma solução econômica e a manutenção dos privilégios na administração da capitania (um contra-senso, pois esses privilégios onerariam, ainda mais, a população).  Sem, contudo, obter êxito, tramaram um levante separatista, inspirado nos ideais do Iluminismo, propondo a constituição de um estado republicano. A insurreição previa a mobilização de tropas, que estavam sob o comando dos militares que aderiram à conspiração, para a tomada do governo da capitania. Todavia, aconteceu algo inesperado: a suspensão da derrama, pelo governo colonial, e a traição cometida por um dos inconfidentes. Todos os participantes foram presos!

Dentre todas as personalidades importantes do Brasil, Tiradentes é, inegavelmente, um dos seus maiores heróis! É citado com frequência como mártir, porém, o melhor adjetivo para esse homem é herói! Líder da Inconfidência Mineira, seu verdadeiro nome era Joaquim José da Silva Xavier. Nasceu na Fazenda Pombal, em Vila de São José (atual Tiradentes) em 12 de Novembro de 1746, entretanto foi criado na cidade de Vila Rica (atual Ouro Preto). Seus pais foram Domingos da Silva Santos e Maria Antônia da Encarnação Xavier. A família de Tiradentes possuía terras e lavras de ouro e pertencia à nobreza mineira, classe que dirigia a região. Tiradentes fez de tudo antes de ser ativista político: foi ourives, mascate, tropeiro, negociador de ouro, dentista, topógrafo e militar como alferes, posto hoje equivalente ao de subtenente; apesar de instrução muito sumária, tinha o dom da oratória e era, também, um autodidata. Tiradentes nunca se casou, mas manteve caso com duas mulheres e deixou descendentes: João, com a mulata Eugênia Joaquina da Silva, e Joaquina, com a ruiva Antônia Maria do Espírito Santo.

Em Primeiro de Dezembro de 1775, Tiradentes conseguiu ingressar, diretamente, no posto de alferes no Regimento dos Dragões de Minas Gerais, cavalaria, nomeado comandante de patrulha, cujo soldo era pago pela coroa portuguesa. Suas tarefas, como comandante de patrulha, incluíam viagens pelo interior nas quais constatou a situação de miséria em que viviam os moradores por onde passava. Isso foi um dos argumentos que lhe serviu, mais tarde, para propagar o seu idealismo.

Com licença do governo da Capitania, Tiradentes vai ao Rio de Janeiro para tratar com o Vice-Rei sobre propostas relativas à melhorias para a cidade de Vila Rica. Enquanto aguardava o despacho da papelada por parte do Vice-Rei, começou a travar conhecimento com inúmeros compatriotas que regressavam da Europa, cheios de entusiasmo com ideias absorvidas da Revolução Francesa e do iluminismo (Iluminismo foi um movimento que surgiu como uma filosofia de crítica ao Antigo Regime, na França, que pregava a razão como método, defendia a igualdade perante a lei, e a liberdade de mercado e criticava o absolutismo de direito divino). Dentre essas pessoas achava-se o Dr. José Alves Maciel, formado em Ciências Naturais pela Universidade de Coimbra, fervoroso orador e que estava imbuído em incutir, na população mineira, as ideias republicanas. A França desse período era, juntamente com os Estados Unidos da América, um dos centros irradiadores das ideias de democracia contemporânea, embora ainda escravistas independentes desde 1776.  Foi a Revolução Francesa quem inventou a democracia moderna e com a Revolução Industrial, na Grã Bretanha, marcou o início do mundo moderno. O ideário de revolução se espraiava pelo mundo, inclusive na América do Sul. Em Montpellier, França, os estudantes brasileiros José Mariano Leal e José Joaquim Maia, se dirigiam ao próprio Thomas Jefferson para pedir apoio americano à causa da Inconfidência Mineira. As orientações que recebiam, eram retransmitidas aos inconfidentes. Ainda na França, vários estudantes brasileiros filiavam-se à Maçonaria, vital centro de propagação das ideias libertárias. O inconformismo com a situação econômica, as informações sobre as revoltas na França e na América do Norte e a ideologia iluminista infiltrada pela Maçonaria na comunidade mineradora, fazem nascer no seio de Vila Rica a consciência revolucionária. Várias camadas da sociedade conspiram e tramam a conjuração mineira em favor do ideal libertário, com vistas à separação da colônia de Portugal opressor e à proclamação da independência do Brasil. Embora não seja explorado devidamente nos livros de historia, há fortes indícios da contribuição da Maçonaria na formação do país.

À insatisfação com a carreira militar, Tiradentes somava as novas ideias absorvidas. Passou a frequentar a biblioteca do cônego Luís Vieira da Silva, e, ali conheceu as teses dos franceses Rousseau, Montesquieu e outros iluministas, que secundavam o pensamento do inglês John Locke. Ao retornar a Vila Rica, aproveita a ocasião para fazer propaganda sobre os planos que havia idealizado. Procurou os companheiros que compartilhavam de seu pensamento e daí em diante foi se formando, assim, a ideia da Conspiração Mineira. Os principais elementos contatados foram: Francisco de Paula Freire de Andrade (chefe da Força Pública), Dr. Álvares Maciel, Dr. Inácio José de Alvarenga Peixoto, Desembargador Thomas Antonio Gonzaga (que viria ser o chefe do golpe), Padre Carlos Correia de Toledo, Padre José de Oliveira Rolim, Cláudio Manoel da Costa, Cônego Luís Vieira da Silva, Joaquim Silvério dos Reis, este contra a vontade de Tiradentes que o considerava um homem falso e sem caráter, fato provado mais tarde tendo sido traidor dos inconfidentes. Havia outros mais e todos considerados homens íntegros e de valor. Presume-se que havia Maçons entre eles. A estratégia, elaborada pelo grupo previa o levante para o dia que se anunciasse a derrama, isto é, no dia da cobrança dos impostos.

Certo de ter deixado semeado a ideia do movimento e muito animado com a ajuda que estava recebendo dos companheiros, Tiradentes volta para o Rio de Janeiro acompanhado apenas de um mulato, seu escravo. Sua intenção era de manter-se atualizado sobre as informações que vinham do exterior, recebendo orientações para retransmiti-las para os confrades do seu grupo em Vila Rica.

Em março de 1789, Joaquim Silvério dos Reis compareceu ao Palácio da Cachoeiro do Campo, residência do Visconde de Barbacena (Luís Furtado de Mendonça 1754-1830), governador da Capitania e se torna o primeiro delator da conspiração. Logo em seguida apareceram outros delatores: Coronel Basílio de Brito Malheiro do Lago e o mestre de Campo Inácio Correa Pamplona. O governo, entretanto, exigiu de todos que fizessem a denúncia por escrito. E assim foi feito!

Fato pouco mencionado nisso tudo, é sobre a personagem desconhecida: o Embuçado.  Foi uma pessoa que, quando Barbacena descobriu o golpe, saiu na calada da noite, envolto num balandrau negro com capuz que lhe cobria o rosto, batendo de porta em porta ou nas janelas de casas dos membros do movimento avisando aos inconfidentes para que fugissem, pois o plano havia sido descoberto. Nunca se soube quem era o Embuçado. Atitude puramente de maçom, pois, ao bater nas portas e nas janelas empregava um sinal convencionado para depois dar a senha secreta pré-estabelecida, provavelmente na Loja Maçônica. Alguns pesquisadores afirmam ser “UAI”, a palavra secreta, que era as inicias de União, Amor e Independência; posteriormente, “UAI”, acabou virando expressão entre o povo das Alterosas.  Vários inconfidentes conseguiram escapar, mas Barbacena sabia muito bem como encontrá-los, com a ajuda dos traidores.

Com o plano revelado, a primeira  providência do governador foi suspender a derrama com o objetivo de retardar o levante. Quando Tiradentes chegou ao Rio de Janeiro percebeu que estava sendo vigiado, e, desesperado, via correr o tempo sem nenhum sinal do levante em Minas Gerais. Procurou, então, esconder-se e tentar encontrar um meio de chegar a Vila Rica. Mas foi descoberto! O próprio delator, Joaquim Silvério dos Reis, o deteve e entregou ao Vice-Rei, Dom Luís de Vasconcelos.

O processo contra a conspiração durou cerca de três anos, até se formular a sentença condenatória. Durante os interrogatórios, Tiradentes sempre reivindicou para si a exclusiva culpa pela iniciativa da sedição, inocentando todos seus companheiros de outros crimes que não fosse o de ouvir suas ideias. Uma atitude tipicamente de maçom!

Outro indício, nos interrogatórios, que faz pensar que Tiradentes era maçom, é a de ao ser perguntado sobre o significado do triângulo na bandeira dos inconfidentes, ele ter respondido “Sagrada Trindade” e não “Santíssima Trindade”, detalhe que, supostamente, passou despercebido pelo escrivão.

Há, entre os pesquisadores e historiadores, um consenso muito forte da participação da Maçonaria na Conspiração Mineira e há também muitos que discordam dessa ingerência. As hipóteses vão desde o papel central na elaboração dos planos até a negação de sua influência na conjuração. Os que defendem que houve participação da Sublime Ordem, ressaltam que o seu papel é percebido como importante elemento de ligação e comunicação dos inconfidentes com grupos de apoio do Rio de Janeiro e Europa. Em contraponto, os que não acreditam, lembram que nos Atos da Devassa não há nenhum vestígio de ação propriamente Maçônica. Considerando o modus operandi da Sublime Ordem, das operações serem feitas em segredo, compreende-se.

Mais uma conotação Maçônica, com o movimento, está na Sociedade Literária do Rio de Janeiro, entidade fundada pelo poeta Manuel Inácio da Silva Alvarenga, na última década do século XVIII, com estatutos oficiais aprovados pelo Vide-Rei. Posteriormente, nos papéis sequestrados do Poeta Manuel Alvarenga, havia um rascunho de estatutos em que num dos itens exigia-se “a boa fé e jurando absoluto segredo, de modo que ninguém saiba do que se trata na Sociedade”. Tal documento foi interpretado como indício Maçônico. Nas atas das sessões secretas, havia registros de que se lia com entusiasmo, livros e gazetas francesas que citavam a Sublime Ordem. Havia manuscritos, para colocação em vários pontos da cidade, nos quais se denunciava com veemência o despotismo de Portugal e se exaltava a França e a Liberdade. E não os atemoriza o malogro de outros movimentos. Com tudo isso vindo à tona, D. Maria I foi inexorável: negou todos os pedidos de comutações de pena. Proclamou a sentença como exemplo, para que ninguém mais ousasse afrontar o governo português.

A Devassa, processo oficial da Inconfidência, promoveu a acusação de 34 pessoas, que tiveram suas sentenças definidas em 19 de abril de 1792, com onze dos acusados condenados à morte: Tiradentes, Francisco de Paula Freire de Andrade, José Álvares Maciel, Luís Vaz de Toledo Piza, Alvarenga Peixoto, Salvador do Amaral Gurgel, Domingos Barbosa, Francisco Oliveira Lopes, José Resende da Costa (pai), José Resende da Costa (filho) e Domingos de Abreu Vieira. Desses, apenas Tiradentes, que chamou para si toda a responsabilidade, foi executado; os demais tiveram a pena comutada para degredo perpétuo e foram deportados para a África.

Na manhã de 21 de Abril de 1792, cercado pela tropa do governo, Tiradentes é conduzido pelas ruas do Rio de Janeiro, partindo da prisão até o patíbulo, que fora instalado no largo da Lampadosa. Tem a cabeça e a barba raspadas, coberto por um manto de confecção tosca, portando uma imagem de Cristo crucificado. Ao chegar no cadafalso, sobe calmamente os degraus, acompanhado do padre que lhe dava amparo espiritual, com orações e frases de reflexões, até a hora da morte. Em volta da cena, a multidão assistia com consternação. Já no patamar, Tiradentes se dirige ao carrasco e pede-lhe que abrevie o sofrimento. O carrasco pede perdão e diz que está apenas cumprindo a Lei. Todavia, tão logo o corpo ainda vivo projeta-se no vazio, o carrasco jogou-se sobre seus ombros, forçando seu peso sobre o de Tiradentes para apressar sua morte. A mando da rainha D. Maria I e por ordem da Corte de Justiça da Coroa Portuguesa, depois da morte, com todos os requintes atrozes de perversidade, decapitaram-no. Sua cabeça ficou espetada num poste de Vila Rica e o seu corpo em pedaços foi espalhando pelas cidades vizinhas. D. Maria I acabou morrendo louca.

A origem da bandeira do Estado de Minhas Gerais é outra história onde se procura dar, como prova, o envolvimento da Maçonaria na Inconfidência Mineira. A princípio era um projeto para uma bandeira nacional e acabou sendo instituída como bandeira oficial do Estado de Minha Gerais. Foi baseada na bandeira dos inconfidentes e de onde foi copiada a frase LIBERTAS QUAE SERA TAMEN (Liberdade, ainda que tardia). Os que defendem essa teoria dizem que bastaria contemplar a bandeira, fixando-se no seu triângulo, que estaria vendo a sagrada trindade da Maçonaria: Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

Há estudiosos maçons que lembram que era uso em voga, naquela época, de se conceder o título de maçom por comunicação, com aval de uma Loja francesa. Não seria impossível, portanto, que Tiradentes tivesse recebido tal concessão através de seus companheiros iniciados na França. Infelizmente nunca foi encontrado esse possível registro. Assim como Abraham Lincoln foi eleito maçom sem ter sido, Tiradentes é assim considerado pelos maçons, face à sua figura ímpar e impoluta, que o faz merecer o heroísmo a ele atribuído! Por analogia do que está inserido na bandeira de Minas Gerais, é possível inferir Tiradentes, maçom, ainda que tardio…

Autor: E. Figueiredo

E. Figueiredo é jornalista – Mtb 34 947 e pertence ao CERAT – Clube Epistolar Real Arco do Templo; Integra o GEIA – Grupo de Estudos Iniciáticos Athenas; Membro do GEMVI – Grupo de Estudos Maçônicos Verdadeiros Irmãos; Integrante do Grupo Maçonaria Unida; Obreiro da ARLS Verdadeiros Irmãos – 669 – (GLESP).

Nota do Blog

Agradecemos ao autor por ter gentilmente nos encaminhado o artigo para que pudéssemos publicá-lo.

Bibliografia

Castellani, José  – Os Maçons que Fizeram a História do Brasil

Faraco, Sérgio – Tiradentes: Alguma Verdade

Fernandes, Paulo de Tarso – Raízes de Liberdade (Palestra)

Ferreira, Manoel Rodrigues e Tito Lívio – A Maçonaria na Independência Brasileira

Figueiredo, E.  – A Ideia de Igualdade

Figueiredo E. – UAI!

Furtado, João Pinto – O Manto de Penélope

Hobsbawm, Eric . – A Era das Revoluções (1789 – 1848)

Hobsbawm, Eric – Ecos da Marselhesa

Maxwell, Kenneth  – A Devassa da Devassa: Inconfidência Mineira

Oliveira, Carolina Rennó Ribeiro de – Biografias de Personalidades Célebres

Scantimburgo, João de  – O Brasil e a Revolução Francesa

A Inconfidência Mineira, a Maçonaria e a Arcádia Ultramarina – Parte II

Ficheiro:Antônio Parreiras - Prisão de Tiradentes, 1914.jpg ...A Prisão de Tiradentes, por Antônio Parreiras

“Existem dois tipos de história mundial: uma é a oficial, mentirosa, própria para as salas de aula; a outra é a história secreta, que esconde a verdadeira causa dos acontecimentos”. (Honoré de Balzac, escritor e filósofo francês)

O escritor Tenório D’Albuquerque (1960), sempre tripudiado por Castellani (1992), lembra que causava temor até proferir a palavra “maçonaria”, tamanho o fanatismo e a ignorância do povo, não havendo liberdade para promover reuniões e tampouco registrá-las em qualquer tipo de ata. Vale comentar que era proibido imprimir textos na Província. As reuniões de cunho maçônico eram feitas nas residências dos envolvidos e em outros locais improvisados, de forma que os assuntos discutidos ficassem protegidos das autoridades e dos curiosos. Roberto Letière (2001), cotando Pedro Calmon (História Social do Brasil), transcreve:

“A Maçonaria teve a maior parte das responsabilidades naqueles acontecimentos. Foi o sigilo maçônico a alma da revolução de 1789…”.

Quanto ao alerta recebido por Cláudio Manuel sob as prisões que se avizinhava (vide Autos da Devassa – Vol. II – fls. 237/240), Tenório D’Albuquerque (1960) comenta no capítulo “O Misterioso Embuçado”, que esse é um episódio inexplicável da Inconfidência Mineira. Questiona o citado autor:

Quem seria capaz de disfarçar-se, correndo grave risco, para ir avisar aos inconfidentes que se precatassem?”.

O também criticado Gustavo Barroso (1990) acrescenta que

era o poder oculto que procurava salvar o segredo do movimento e a melhor gente que dele participava, no intuito de reservar forças para melhor oportunidade...”.

O que se sabe pelos documentos é que Luiz Antônio Furtado de Mendonça, o Visconde de Barbacena, Governador e Capitão-General da Capitania de Minas Gerais e sobrinho do vice-rei Dom Luiz de Vasconcelos e Souza, quando se inteirou do aparecimento do tal personagem determinou novas inquirições, mas nada conseguiu esclarecer.

O controvertido brasilianista, professor e pesquisador da Universidade de Colúmbia (EUA), Kenneth Maxwell (1977), e sempre festejado por Castellani, também ao comentar o destino dos planos dos conjurados relata que em 17 de maio de 1789, sabendo-se em Minas que o alferes Tiradentes estava sendo seguido,

Cláudio Manuel viu gente à sua porta, em Vila Rica, sendo abordado por um tipo misterioso que lhe contou que houvera prisões no Rio de Janeiro e recomendou-lhe a queima dos papéis incriminadores” (p. 179).

Acerca da documentação que envolve o movimento em Vila Rica, Florival Cáceres (1995) conclui que

um dos maiores problemas no estudo da Inconfidência Mineira é a falta de documentos. Com medo da repressão, os inconfidentes não deixaram documento escrito, nenhum plano militar ou de governo. As investigações históricas baseiam-se nos interrogatórios feitos pela justiça portuguesa e em depoimentos dos acusados. Os riscos quanto a sua interpretação são grandes”.

Por sua vez, de forma surpreendente, Castellani (1992) afirma que prefere

ficar com a pesquisa nos Autos da Devassa, que representam o instrumento básico, essencial, de informações sobre a conjura…” (p. 168).

O Bispo de Elvas, D. José Joaquim da Cunha Azeredo Coutinho, publicou em 1794, junto à Academia Real das Ciências em Portugal, o seu “Ensaio econômico sobre o comércio de Portugal e suas colônias”, onde no prefácio ataca a Maçonaria, denominada por ele de “seita”, nos seguintes termos:

Há mais de trinta anos que esta mesma Seita principiou a espalhar a semente das revoluções, para separar as Colônias das suas Metrópoles, principalmente as de Portugal e Espanha, as mais ricas do mundo…. passaram a traçar planos para que a separação, que eles chamavam emancipação necessária para o bem da humanidade, fosse menos dolorosa e menos violenta”.

Aí está bem clara a denúncia do Bispo ao afirmar que a Maçonaria, na década de 1760, começou a espalhar nas Américas Inglesa, Espanhola e Portuguesa, a semente das revoluções emancipadoras, “em nome da Liberdade e da Humanidade” (Ferreira, 1972).

As narrativas existentes sobre a Inconfidência Mineira não identificam uma liderança em especial por parte de algum conjurado. Tiradentes chegou a declarar que o movimento não tinha chefe. Todos os envolvidos negaram participação no movimento, exceto o próprio Tiradentes que, conservando extrema dignidade durante os longos meses de interrogatório, afinal assumiu toda a responsabilidade de chefia, imolando-se por uma pátria livre e demostrando um grandioso gesto de fraternidade. O simples envolvimento, mesmo que superficial, e nada reportar às autoridades, era considerado crime de lesa-majestade, isto é, de traição contra a pessoa do Rei ou de seu Real Estado, conforme definido pelas Ordenações Filipinas, sancionadas em 1595, punível com execução pública e sequestro de bens, além de ter os familiares condenados à infâmia. “Inconfidência” significava crime de lesa-majestade.

Comparando-se aquele contexto com os episódios recentes de nossa história no que se refere à captação de evidências e provas nos esquemas do “Mensalão” e da “Operação Lava Jato”, constata-se que, não obstante toda a tecnologia hoje existente, ainda é extremamente intricado todo o processo de apuração. As evidências são baseadas em denúncias, depoimentos, cruzamento e obtenção das provas documentais, que foram intencionalmente destruídas, codificadas ou estão em lugar incerto. As pesquisas e investigações são fruto de trabalho árduo e demorado. Inicialmente, os envolvidos alegavam que não houve “Mensalão” nem “Petrolão”, pois não havia prova cabal, sendo tudo intriga da oposição e da imprensa. Agora, volte-se o raciocínio para quase 230 anos atrás, em ambiente tecnologicamente primitivo e onde tudo era vetado, menos a corrupção já vicejante, nascida das propinas pagas pelos contratadores ou pelo contrabando, e façam-se as avaliações.

Portanto, evidencia ingenuidade ou ironia os reiterados argumentos triunfalistas de alguns escritores e mesmo os detratores de sempre sobre a inexistência de prova cabal para desacreditar o movimento maçônico articulado em Vila Rica naquele exíguo espaço de tempo, como documentos originais, atas com registro de decisões e assinaturas em planos para “derrubar o governo”, dado o cenário de época. Os conjurados eram estruturalmente fracos, portanto, grandes planos não foram muito além das salas de reunião. Ademais, estavam “isolados da grande massa do povo e pensando em armas para o levante só no último momento” (Alencar, 1985). Entretanto, as evidências das ações de cunho maçônico na Inconfidência Mineira no campo dos ideais iluministas são inquestionáveis.

Vila Rica, perto dos anos 1780, passou a ser dominada pelas ideias sobre progresso das ciências, necessidade de se estudarem as riquezas do país e a possibilidades de se construir uma nação separada de Portugal. Mas, as efetivas tratativas pelo grupo mais restrito dos conjurados tiveram curta duração, iniciando-se em meados de 1788 com a chegada

ao Rio de Janeiro, de regresso da Universidade de Coimbra, de uma larga viagem por alguns países da Europa, entre eles a Inglaterra, o jovem José Álvares Maciel, que se filiara à maçonaria e que participara das conversações para que se obtivesse o apoio de alguns países para o levante no Brasil” (Lima Júnior, 2010).

Nas casas de Cláudio Manuel e Tomás Gonzaga tratavam-se programas de doutrina e planos de organização política do projetado Estado. A casa do Tenente-Coronel Francisco de Paula Freire de Andrade era o quartel-general onde se traçavam as operações militares do levante.

Tomando como referência os autos da Inconfidência Mineira, temos apenas, e tão-somente, a versão dos julgadores, não podendo ser considerado um relato histórico, vez que era facultada a obtenção de confissões de culpa por todos os meios, mediante constrangimento físico, psicológico e legal. Todos os réus tiveram um único defensor, o advogado da Santa Casa de Misericórdia José de Oliveira Fagundes. A defesa mostrou os conjurados como insanos (caso de Tiradentes), ou ingênuos, para livrá-los da pena máxima (Castellani, 1992). Segundo Tenório D’Albuquerque “o processo tinha sido secreto e arbitrário, e o tribunal supremo gozava das prerrogativas absolutas da Coroa”. O que se sabe é que contra os réus da inconfidência todas as pressões eram permitidas, todas as ações justificáveis e era imperativo que os algozes mostrassem dedicação à Rainha, daí o empenho em levá-los à forca.

É de se considerar, por outro lado, que havia uma preocupação das autoridades portuguesas com a possibilidade de o levante atingir as vizinhas Capitanias do Rio de Janeiro e de São Paulo, cuja elite também simpatizava com a ideia de independência. Por isso a repressão contra o movimento. Segundo a entrevista de Isolde Helena Brans, por ocasião do Bicentenário de Tiradentes, contida no Apêndice Nº 3 (p. 240) do livro de Castellani (1992),

À Coroa lusa, porém, não convinha divulgar a extensão daquele movimento libertário, nem a importância da obra de seus líderes ou ‘cabeças’. A versão oficial, portanto, sempre foi a de minimizar os fatos. Até hoje, em nossos livros escolares ainda é possível encontrarmos a Inconfidência descrita como um ‘devaneio de poetas’. Os nomes de seus líderes caíram no esquecimento – como convinha a Portugal”.

Com relação a vários dos envolvidos exsurgem ainda questionamentos se alguns teriam de fato participado da Inconfidência como membros voluntários e conscientes dela. Até mesmo os vínculos estreitos entre o Governador Visconde de Barbacena, também formado na Universidade de Coimbra, e vários dos idealizadores do movimento, colocam em xeque o seu desconhecimento sobre o que ocorria ao seu redor, suspeitando-se de que, sabedor das consequências de sua omissão, teria decidido reagir de última hora ao receber a denúncia escrita e pressionado pelo seu tio e vice-rei do Estado do Brasil, que já havia aberto um processo judicial no Rio de Janeiro. Em Portugal, Barbacena fora aluno e protegido do italiano Domenico Vandelli, pertencente à maçonaria e um dos que levou a instituição para aquele país e que se mudou para Portugal em 1764 a convite do Marquês de Pombal. Quando Vandelli estava doente, o futuro Visconde de Barbacena o substituía (Doria, 2014). Sabe-se que o Visconde “teria sido o primeiro secretário-geral da iluminista Academia de Ciências de Lisboa, no início da década de 1780” (Furtado, 2002).

Porém, todo o sonho da independência em Vila Rica encerrou-se em maio de 1789, transformando-se em pesadelo com a prisão dos envolvidos. Com a destruição dos documentos antes da apreensão dos conjurados e a adulteração de muitos depoimentos pelos juízes, a verdadeira história do movimento “tornou-se muito obscura e difícil de ser reedificada”, resumindo-se aos papeis oficiais contidos nos Autos da Devassa de natureza inquisitorial e prestando-se, portanto, aquele período a especulações de toda ordem. E esse é um desafio aberto aos pesquisadores e muito existe ainda a ser esclarecido, inclusive no que se refere ao efetivo rol dos conjurados.

De concreto, registrou-se logo de início o assassinato de Cláudio Manuel da Costa em uma cela improvisada na Casa dos Contos, de propriedade de João Rodrigues Macedo, rico contratador e amigo bem próximo do Visconde de Barbacena. Cláudio era o decano da Plêiade Mineira, conforme defendemos em Trabalho apresentado junto à Academia Mineira Maçônica de Letras, em três de março de 2015, cujas circunstâncias da morte intencional não é acolhida pela Professora Laura de Mello e Souza (2011), que acoberta como outros a tese do suicídio. Constam, ainda, as mortes de Francisco José de Melo e Manuel Joaquim de Sá Pinto do Rego fortes, no cárcere.

Rematando o processo, ficou a sentença aos réus da Inconfidência, fruto da devassa iniciada em Minas, que durou quase três anos, e encerrou-se na capital, no Rio de Janeiro, em 18 de abril de 1792, com 11 conjurados condenados à morte, o sequestro de bens e familiares declarados infames e todo o sofrimento daí decorrente. Entretanto, um decreto de D. Maria I, que já estava pronto e aguardando momento apropriado, emitido no dia seguinte, comutou a pena de morte de todos em degredo, à exceção de Tiradentes, “que foi executado em 21 de abril de 1792 (sábado), às onze horas e vinte minutos, tendo seu corpo tratado com requintes de crueldade, exemplo para os moradores da Província e advertência, para que ninguém ousasse tramar contra o reino de Portugal”.

Com muita paciência e compulsando diversas obras e sítios da internet sobre temas maçônicos, é possível colher todo tipo de comentário abalizado e contraditório acerca da condição maçônica de alguns dos conjurados, bem assim sobre dúvidas da participação efetiva de um ou outro na conjuração. Críticos, em declarados esforços de contrainformação, asseveram que a maçonaria procura se mostrar presente há tempos na história do Brasil e na sua cultura, construindo a narrativa da Inconfidência como um movimento que poderia ser denominado de “’tradição inventada”, que indicaria a criação de um passado com o qual se busca estabelecer uma continuidade, conforme artigo de Françoise Jean de Oliveira Souza (2007)[NB – link para o artigo disponível nas Referências Bibliográficas].

É possível admitir que, na abordagem e tratamento de fatos, um escritor ou um pesquisador que não tenha “familiaridade” com a maçonaria, não vislumbre padrões nas linhas de pensamento dos líderes da Inconfidência, podendo algumas sutilezas passar despercebidas por aqueles que são desenvolveram um olhar mais apurado conforme características dos simbolismos apresentados aos iniciados na Arte Real. Nesse particular, é sempre necessário realçar que todo trabalho, em qualquer tempo, sempre foi feito por maçons e não pela Maçonaria como instituição, que apenas prepara seus obreiros para que exerçam influência e atuem como construtores sociais. Ressaltando o velho mantra: a Maçonaria inspira, os maçons transpiram.

Por outro lado, sem um exame mais aprofundado dos valores aceitos pela sociedade no século XVIII, alguns autores chegam a promover um julgamento moral dos conjurados, destacando particularidades da vida social de alguns, apurando argumentos para denegrir reputações, ou para os “deslustrar”, aproveitando o termo utilizado por João Pinto Furtado (2002), para logo em seguida cair na contradição da ausência de documentos, porém desqualificando os méritos do movimento ou quase reedificando as conclusões dos “Autos da Devassa”.

Esses mesmos autores consideram irrelevantes os fatos objetivos e, influenciados por emoções, preconceitos e crenças pessoais, transformam acontecimentos em opinião e denigrem a ação dos conjurados, criando uma nova versão de pós-verdade, para não dizer o termo apropriado. Para construir os cenários de época e diálogos se valem desses mesmos documentos produzidos pelos juízes sabidamente tendenciosos. Felizmente, para a maioria, o legado se consubstancia na construção de um sentimento nacionalista e que frutificou no devido tempo.

Sabe-se que as interpretações mudam no curso da história, à medida em que novos fatos vêm à tona. Até mesmo dúvidas absurdas sobre a real morte do “Tiradentes original” são irresponsavelmente levantadas, não obstante todo o aparato e ritualística montados para sua execução, compreendendo as inúmeras autoridades civis, militares e eclesiásticas e uma enorme multidão como testemunhas, tudo como se se tratasse de uma grande festividade, conforme depoimento do Frei Raimundo da Anunciação Penaforte (Apêndice 5, do livro de Castellani – 1992). Voltando à entrevista de Isolde Helena Brans, citada acima,

A vida e obra do Alferes Joaquim José da Silva Xavier cumpre ainda a sentença de D. Maria I, que determinava o esquartejamento de seu corpo e de sua memória, para sempre.” (destaque da entrevistada – p. 240).

Nessa seara, cabe a cada um formar sua convicção e é livre para acreditar no que quiser e especular sobre a teoria da conspiração que melhor lhe aprouver. Como sói acontecer, muitos estão convictos de que o homem não chegou à Lua, outros já viram o “ET de Varginha”, outros tantos alegam manter contatos extraterrestres e um grupo de fãs tem certeza de que Elvis Presley não morreu. Em Belo Horizonte, a “Loira do Bonfim” não é uma lenda urbana, garante um bom número de pessoas.

É certo que muito ainda há de ser escrito e especulado sobre essa parte da história do Brasil. Não pode ser olvidado, entretanto, é que a Arcádia Ultramarina funcionou como efetivo portal de entrada e manto de proteção poético para os conjurados, alguns deles maçons iniciados no exterior, dando-lhes um ar de inocência, porém na clandestinidade servindo como terreno culturalmente fértil para que o ideal maçônico, focado no pensamento de autonomia da sua Terra, fosse difundido junto aos grandes proprietários, intelectuais e outros setores, contribuindo para a conscientização sobre a injustiça do pacto colonial e da necessidade de que o Brasil se separasse de Portugal, e com isso disseminar as sementes de uma república com anseios de democracia e liberdade, forjados na Europa e trazidos para as terras brasileiras pelos pioneiros maçons visionários.

Enfim, pagou-se, naquele momento, o preço pela audácia de vislumbrar a data da derrama, estrategicamente suspensa, como sonho para deflagrar a frustrada revolta emancipadora contra a opressão e a exploração por parte da Coroa Portuguesa, interrompida pelo gesto da traição, permitindo a reação violenta do governo. Naquele grandioso episódio, entretanto, foram edificadas as bases para as mudanças que se tornaram realidade com a Liberdade apenas 30 anos depois, proclamada por D. Pedro I, neto de Dona Maria I, em 1822, e a República, em 1889, tendo ambos os eventos o protagonismo de maçons como personagens sempre presentes e atuantes em momentos marcantes de nossa história, em busca da consolidação dos avanços iluministas como fruto de uma consciência cidadã.

Finis

Autor: Márcio dos Santos Gomes

Márcio é Mestre Instalado da ARLS Águia das Alterosas – 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte, membro da Escola Maçônica Mestre Antônio Augusto Alves D’Almeida, da Academia Mineira Maçônica de Letras, e para nossa alegria, também um colaborador do blog.

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Referências Bibliográficas

Academia Mineira Maçônica de Letras – A Casa de Tiradentes. A Verdade dos Inconfidentes. Belo Horizonte: Imprensa Oficial de Minas Gerais, 2013;

ALENCAR, Francisco. História da Sociedade Brasileira, 3ª Edição. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1985;

Autos de Devassa da Inconfidência Mineira, 2ª Edição. Brasília: Câmara dos Deputados; Belo Horizonte: Imprensa Oficial de Minas Gerais, 1978;

BARROSO, Gustavo. História Secreta do Brasil – Volume 1. Porto Alegre: Editora Revisão, 1990.

CÁCERES, Florival. História do Brasil. São Paulo: Moderna, 1995;

CASTELLANI, José. A Maçonaria e o movimento republicano brasileiro. São Paulo: Editora Traço, 1989;

CASTELLANI, José; COSTA, Frederico Guilherme. A Conjuração Mineira e a Maçonaria que não Houve. Londrina: Editora A Gazeta Maçônica, 1992.

D’ALBUQUERQUE, A. Tenório. A Maçonaria e a Inconfidência Mineira. Rio de Janeiro: Aurora, 1960;

DÓRIA, Pedro. 1789: A História de Tiradentes e dos contrabandistas, assassinos e poetas que lutaram pela independência do Brasil. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2014;

ENCICLOPÉDIA MIRADOR INTERNACIONAL – Volume 17. São Paulo: Enciclopédia do Brasil Publicações Ltda., 1981;

FERREIRA, Tito Lívio; Manoel Rodrigues. A Maçonaria na Independência Brasileira – Volume I. São Paulo: Gráfica Biblos, Ltda.- Editora, 1972;

FURTADO, João Pinto. O Manto de Penélope: história, mito e memória da Inconfidência Mineira de 1788-9. São Paulo: Companhia das Letras, 2002;

LETTIÈRE, Roberto. A Inconfidência Mineira e a Maçonaria Brasileira. 1ª ed. Londrina: Gráfica e Editora Boa Vista, 2001;

LIMA JÚNIOR, Augusto de. História da Inconfidência de Minas Gerais.  Belo Horizonte: Itatiaia, 2010;

MAXWELL, Kenneth. A Devassa da Devassa – A Inconfidência Mineira: Brasil e Portugal 1750-1808. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977;

OLIVEIRA, Almir de. Gonzaga e a Inconfidência Mineira. Belo Horizonte: Itatiaia, São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 1985;

RAMOS, Péricles Eugênio da Silva. Poemas de Cláudio Manuel da Costa (Introdução, seleção e notas de Péricles Eugênio da Silva Ramos).  São Paulo: Cultrix, 1966.

Revista SUPERINTERESSANTE. Maçonaria: A Ordem, publicação de31.08.2005, em

http://super.abril.com.br/historia/maconaria-a-ordem/

SOUZA, Françoise Jean de Oliveira. Em Busca de uma Tradição Inventada artigo publicado em História Viva Uol, edição 47 – Setembro 2007, acessível em “O Ponto dentro do Círculo:

https://opontodentrodocirculo.wordpress.com/2017/01/13/em-busca-de-uma-tradicao-inventada/

SOUZA, Laura de Mello. Cláudio Manuel da Costa – O Letrado Dividido. São Paulo: Companhia das Letras, 2011.

A Inconfidência Mineira, a Maçonaria e a Arcádia Ultramarina – Parte I

Tiradentes esquartejado”, de Pedro Américo: uma leitura crítica ...Leitura da sentença de Tiradentes, por Leopoldino Faria

Com que figura ou legenda?
Coisas da Maçonaria,
do Paganismo ou da Igreja?
A Santíssima Trindade?
Um gênio a quebrar algemas?
Atrás de portas fechadas,
à luz de velas acesas,
entre sigilo e espionagem,
acontece a Inconfidência.

(Extraído do livro “Romanceiro da Inconfidência”, de Cecília Meireles: Romance XXIV ou da Bandeira da Inconfidência)

O arcadismo, escola literária conhecida também como setecentismo ou neoclassicismo, surgiu no Século XVIII na Europa, tendo como objeto a exaltação da natureza, onde poetas adotavam com frequência pseudônimos de pastores gregos ou latinos. A denominação é uma referência a uma região grega pastoril do Peloponeso, conhecida como Arcádia, considerada como de inspiração poética.

A escola árcade experimentava forma literária simplificada, produzindo poesias de motivos pastorais, com características ingênuas e idílicas, com enfoque em temas mais ligados ao dia-a-dia, expressando uma visão mais sensualista da existência, como o amor e o abandono pela pessoa amada, a morte, a tristeza, o casamento, a solidão, celebrando a poesia, a música e a vida natural, sempre em contraposição aos exageros e rebuscamento do Barroco, recorrendo a uma literatura liricamente menos sofisticada, em contraste com a realidade e a razão. Os autores árcades valorizavam a vida no campo, o “locus amoenus”, como contraponto à vida nos centros urbanos.

A “Arcádia Lusitana”, que tinha por lema a frase latina “Inutilia truncat” (“acabe-se com as inutilidades”), reunia artistas e intelectuais portugueses para discutir a Arte e teve seu desenrolar entre os anos de 1756 e 1825, quando a fase então se encerrou com a publicação do poema Camões, de Garrett, dando início ao Romantismo. Dentre os nomes inseridos na escola árcade, em Portugal, destacam-se Bocage, António Diniz Cruz e Silva, Pedro António Correia Garção, Francisco José Feire e Marquesa de Alorna.

O Brasil, ao tempo do início do movimento árcade, era Província da Monarquia Portuguesa (Estado do Brasil) e Vila Rica reconhecida como centro econômico de grande importância, em decorrência da mineração e do ciclo do ouro. A Capitania de Minas Gerais, no período de 1720 a 1815, era dividida em quatro Comarcas: Vila Rica, Rio das Mortes, Rio das Velhas e Serro Frio.

Naquele período minerador, em meados do século XVIII, surgiu a primeira escola literária brasileira – o Arcadismo.

Nessa época, portugueses e jesuítas deixaram de monopolizar a cultura. Liam-se também, principalmente em Minas Gerais, autores franceses e ingleses que eram críticos do absolutismo, do mercantilismo e da intolerância religiosa, louvadores da natureza, do progresso e da liberdade” (Cáceres, 1995).

Por isso, algumas produções literárias tiveram como forte inspiração cidades históricas mineiras, episódios da história do país nas poesias heroicas, o índio como tema literário e a sátira política como crítica à exploração portuguesa e à corrupção sempre contemporânea e já devastadora desde então. Daí a expertise do Brasil que passou a exportar exemplos desta técnica desonesta de desvios de recursos públicos, com maestria, para toda a América Latina, África e a antiga metrópole.

Efetivamente, o movimento árcade se desenvolveu no Brasil com a fundação, em Vila Rica, no ano de 1768, da “Arcádia Ultramarina”, tendo como referência a publicação, por Cláudio Manuel da Costa, de suas “Obras Poéticas”, constituindo o embrião de uma geração literária brasileira. Cláudio Manuel foi um poeta de transição, pois como ele próprio afirma no prólogo das “Obras” sofreu influência do Barroco, mas abraçou a causa árcade. Publicou ainda, “Culto Métrico”, “Munúsculo Métrico”,“Epicédio”, “O Parnaso Obsequioso e Obras Poéticas”, “Vila Rica” e “Poesias Manuscritas”.

Além de Claudio Manuel, vários escritores se destacaram no Arcadismo brasileiro, como Tomás Antônio Gonzaga (autor de “Cartas Chilenas” e “Marília de Dirceu”), Frei José de Santa Rita Durão (autor do poema “Caramuru”), Inácio de Alvarenga Peixoto (autor de “A poesia dos inconfidentes: poesia completa”), José Basílio da Gama (autor de “O Uruguai”), Manuel Inácio da Silva Alvarenga (autor de “O Desertor das Letras”, “Glaura – Poemas Eróticos”).

Naquela quadra da história, constituía-se tradição as famílias com mais recursos enviarem seus filhos para estudar em Portugal (Coimbra), França (Montpellier e Bordeaux) e Reino Unido (Londres e Edimburgo), onde as ideias revolucionárias eram fermentadas pelo iluminismo, propiciando grande vivência cultural, que inevitavelmente era trazida para a Província e tinha relevo nas reuniões e saraus musicais e literários então promovidos, as famosas academias. Sem dúvida, naqueles eventos discutiam-se poesias, literatura, e, claro, filosofia e política. Entre os anos de 1768 e 1788, vinte anos portanto, 157 estudantes das diversas capitanias luso-brasileiras foram diplomados na Universidade de Coimbra (Ferreira, 1972).

Tomás Antônio Gonzaga era

um homem que se encantava com ideias”. Estudou em Coimbra e “meteu-se nos grupos de estudantes que se reuniam secretamente para ler e discutir Locke, Hobbes, Montesquieu e Voltaire, os ícones iluministas”. “Na universidade, um de seus melhores amigos era brasileiro e se tornaria companhia para a vida: Alvarenga Peixoto” (Dória, 2014).

Cláudio Manuel graduou-se na Universidade de Coimbra e especula-se que teria ligações com os Illuminati, sociedade secreta de cunho iluminista criada na Baviera e que influenciou inúmeras revoluções, fraternidades, arcádias literárias e associações com os mais diversos propósitos.

Naquele período, o Brasil não possuía universidades, imprensa e bibliotecas eram proibidas, a circulação de livros estava submetida a três instâncias de censura, de modo que os mecanismos de exploração e opressão não fossem fragilizados. A política oficial permitia o funcionamento das escolas religiosas, dominadas pelos jesuítas até sua expulsão em 1759, depois assumidas por outros padres e mestres laicos. O ambiente sociocultural se apoiava nas realizações de caráter artístico, expressos através da religiosidade popular, da escultura, da música e da arquitetura. Em 1768, o Marquês de Pombal instalou a Real Mesa Censória, centralizando e organizando o trabalho da seleção do que podia ou não ser lido (Dória, 2014). O direito de reunião era vigiado. De cada cem brasileiros, menos de dez sabiam ler e escrever.

As academias literárias foram incentivadas na gestão do Marquês de Pombal em Portugal, durante o reinado de D. José I, entre 1750 e 1777. Pretendia-se ampliar o público leitor, que, no Brasil, se resumia a poucos escritores e literatos e ao reduzido número de pessoas da elite aos quais eles estavam ligados por laços familiares, econômicos, funcionais ou de amizade (Cáceres, 1995). Por isso, as academias se revestiram de alguma importância cultural e mesmo política. Nesse meio, os livros passavam de mãos em mãos. Seus rituais acadêmicos eram uma maneira de passar o tempo de forma mais agradável nas cidades provincianas como Salvador, Vila Rica e Rio de Janeiro.

Do grupo de intelectuais que se revelaram na literatura, três poetas tiveram participação decisiva no movimento da Inconfidência Mineira – Cláudio, Gonzaga e Alvarenga Peixoto, ao lado de juristas formados em Coimbra, além de padres, comerciantes e militares, alimentando um fervedouro cultural e social orientado pelo sonho de independência do Brasil do domínio português, principalmente após a repercussão da independência dos EUA em 1776, com a ajuda de liberais franceses, quando

exemplares da Constituição Americana, em traduções francesas, tendo como preâmbulo a Declaração de Direitos, andavam às escondidas, como livros heréticos, sendo lidos e comentados, em segredo, pelos grupos de iluministas disfarçados e alojados em toda a parte, nos navios, na tropa, nas repartições públicas, nos conventos e seminários” (Lima Júnior, 2010).

Repercutia-se a notícia de que, dos 56 homens que assinaram a Declaração de Independência dos Estados Unidos em 4 de julho de 1776, muitos eram maçons, incluindo Benjamin Franklin e o próprio George Washington.

As ideias iluministas, fruto do movimento cultural da elite intelectual europeia do século XVIII, visavam reformar a sociedade, opondo-se ao conhecimento herdado da cultura medieval, buscando propagar a ciência, o saber e o progresso, com base na crença de que o bem-estar coletivo somente poderia advir da razão. O pensamento iluminista de caráter burguês e anticlerical pregava conceitos considerados subversivos pela Corte Portuguesa, por envolverem “abomináveis ideias francesas” ligadas ao separatismo e república. Tinham como meio de difusão as Academias, a Enciclopédia, a Maçonaria, os Clubes, Cafés e Salões e as Universidades.

A Maçonaria era uma sociedade eminentemente secreta porque não podia lutar abertamente contra o absolutismo. Seus trabalhos eram rigorosamente proibidos. E daí o seu caráter misterioso (Ferreira, 1972).

Segundo Pedro Doria (2014),

“a perspectiva de ser iniciado neste mundo e conhecer algo desconhecido por quase todos era, desde o início, boa propaganda”.

Para Andrew Prescott, diretor do Centro de Estudos da Maçonaria da Universidade de Sheffield, na Inglaterra,

“ser maçom nos séculos 18 e 19 era um pouco como ser de esquerda no começo do século 20. Em geral, eram pessoas liberais, receptivas a novas ideologias e preocupadas em reorganizar a sociedade”.

Como consequência óbvia dessa atuação a ordem frequentou os primeiros lugares da lista de maiores inimigos das monarquias absolutistas (Revista Superinteressante 2005).

Publicações chegavam ao Brasil de forma clandestina. Os membros da elite na Província liam Rousseau, Voltaire, Montesquieu, enciclopedistas como Diderot e D’Alembert e outros. Novas palavras e conceitos como colônia, decadência, classe, história, levante, plebe, revolução e república passaram a ser utilizadas com frequência cada vez maior pelos maçons iniciados na Europa e que divulgavam a ideologia revolucionário-burguesa (Alencar, 1985). O periódico “A Gazeta de Lisboa”, que circulou entre 1715 e 1820, chegava a Minas com as últimas notícias do reino e do mundo. Com isso, aqueles homens tomaram conhecimento da independência americana,

sobre a opulência da Corte Portuguesa, e era inevitável que contrastassem todos os acontecimentos com o que viam em sua terra” (Dória, 2014).

No que se refere à maçonaria no contexto do Brasil de então, é recorrente o argumento de que a mesma não teria atuado na Inconfidência Mineira pela inexistência de Lojas regulares à época, já que a instalação da primeira Loja Simbólica reconhecida teria ocorrido apenas em 1801, com o nome de “Reunião”, no Rio de Janeiro, filiada a uma Obediência francesa. Conforme registro acima, é por demais sabido que a maçonaria naquele tempo era uma sociedade secreta e clandestina, não admitida em território brasileiro, assim como na Metrópole, onde seus membros eram perseguidos e presos.

Qualquer tentativa de regularização de uma “Loja” local junto a uma das Obediências Inglesa ou Francesa naquele período poderia ser considerado um ato suicida. Segundo vários registros, bastava ter livros escritos em francês ou possuir a constituição dos Estados Unidos para que um cidadão fosse perseguido, preso e processado por alta traição.

Em Portugal, “Lojas” funcionaram sigilosamente durante o governo de D. José I (1750-1777). Com o Marquês de Pombal abriram-se em todas as cidades do Reino filiais da loja de Lisboa e a Maçonaria tivera seu prestígio na década de 1760-70. Com a morte do rei, em fevereiro de 1777, sucedeu-lhe no trono D. Maria I, que depôs Pombal, e as perseguições contra os maçons foram deflagradas pelo Intendente-Geral da Polícia Diogo Inácio de Pina Manique, que acumulava vários cargos, tornando-se o grande senhor do governo de D. Maria I.

Durante sua gestão, Pina Manique

reprime com ferocidade tudo quanto possa lembrar a Revolução Francesa e perigar o regime absoluto; persegue, constantemente, afrancesados, jacobinos e pedreiros-livres, proíbe a circulação de livros, prende, tortura e castiga qualquer sombra de pensamento independente, compele ao exílio numerosos escritores, sábios, poetas e artistas” (Mirador, 1981).

Nos 25 anos que esteve à frente da Intendência da Polícia, desenvolveu perseguição sistemática contra as lojas maçônicas, que passaram a atuar na clandestinidade. Assim, o clima na Província não poderia ser diferente.

Entretanto, os ideais maçônicos já estavam arraigados, e isso acontecia pelos reflexos da independência dos Estados Unidos da América e pelos antecedentes da Revolução Francesa, onde a maçonaria funcionou como extraordinário veículo político das ideias liberais (Castellani, 1989). A Revolução Francesa, tendo como marco a queda da Bastilha, não influenciou os conjurados mineiros, pois, quando o fato ocorreu, eles já estavam presos, mas dois anos antes, com uma reação dos notáveis franceses – clérigos e nobres – contra o absolutismo, inspirados em ideias iluministas, o movimento já vinha sendo construído e gerando seus frutos.

Na França, onde o Grande Oriente fora fundado em 1773, a maçonaria ajudou a promover a aproximação social e até política da nobreza dominante e da burguesia ascendente, pois os elementos mais brilhantes e mais ativos da aristocracia faziam parte dela. Apesar da sua influência decisiva na Revolução, esta também orientou fortemente os rumos da maçonaria.

Influenciados por esses movimentos, estudantes mineiros que frequentavam cursos de universidades europeias, foram iniciados na maçonaria francesa por volta de 1776 e passaram a arquitetar a libertação da sua terra natal, com destaque para José Álvares Maciel, José Joaquim da Maia, Domingos Vital Barbosa, José Pereira Ribeiro, José Mariano Leal….

“todos de vinte e poucos anos, que iam e vinham portadores de ideias contagiosas, que pegavam nos outros” (Oliveira, 1985). Para Castellani (1992) “consta que Maia, Maciel e Vital Barbosa, entre outros, foram maçons, o que é plausível, pois a Maçonaria europeia já era bastante pujante, principalmente na França e na Inglaterra”. Complementa, afirmando que “em 1776, na França, já existiam 547 Lojas, dez das quais estavam localizadas em Montpellier, que, por sua grande atividade universitária, tinha, também, grande atividade maçônica, pois a Maçonaria da época reunia o topo da intelectualidade europeia”.

Documentos comprovam que chegou a ser discutido um possível apoio dos Estados Unidos, que tomaram conhecimento da conspiração a partir de um contato entre Thomas Jefferson, seu embaixador na França, e o estudante José Joaquim da Maia. Referido encontro ocorreu em Nímes, “longe dos estudantes portugueses a serviço do Intendente Geral de Polícia Pina Manique” (Castellani, 1992). Na carta enviada por Maia a Jefferson, em 1787, surge pela primeira vez a palavra “brasileiro”, como designativo de natural do Brasil (Ferreira, 1972). Até então o termo era associado apenas ao comerciante de pau-brasil.

Álvares Maciel frequentou em Londres os meios políticos maçônicos liderados por Francisco Miranda, interessados na independência dos países latino-americanos e que viriam a formar a Grande Reunião Americana. No seu retorno ao Brasil, juntamente com seus companheiros, trouxe a ideia do movimento emancipador, encontrando campo fértil na Capitania de Minas Gerais (Castellani, 1989). José Álvares Maciel é considerado por todos os estudiosos o intelectual da Inconfidência Mineira. Após sua condenação declarou-se maçom em confissão ao frade franciscano Raimundo da Anunciação Penaforte (Nota 17 – Apêndice 5 – Castellani, 1992).

Na sua obra “Gonzaga e a Inconfidência Mineira”, Almir de Oliveira (1985) comenta que

“na Vila Rica daqueles tempos havia um grupo de literatos, que formava a Arcádia Ultramarina. Eram intelectuais, que se reuniam em sessões, onde se debatiam coisas do espírito. Poetas e juristas. E clérigos. É natural que, num ambiente de inteligências polidas, afeitas ao trato de problemas humanos, surgisse a ideia de fazer-se de Minas, quiçá do Brasil, um Estado livre, nos moldes da República americana do norte”. Pedro Calmon (História do Brasil, 4º Vol. p. 1.248), citado em nota por Roberto Lettière (2001), registra que “o ‘clima’ do fim do século era nefasto aos congressos intelectuais. Nem estes eram apenas intelectuais. A Maçonaria repontara, instalava-se, estendia-se. Não seria de admirar que as esdrúxulas Academias….fossem… conventículos de pedreiros-livres…”.

Foram atraídos por essas ideias vários intelectuais, militares e sacerdotes, aí considerados os poetas árcades Cláudio Manuel, Alvarenga Peixoto e Tomás Gonzaga, além do cônego Luiz Vieira, padre Rolim, padre Carlos Toledo, tenente-coronel Freire de Andrade, sargento-mór Luiz Piza e o Alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, e tantos outros. Em outra Nota, de número 4 (Apêndice 5 – Castellani, 1992 – p. 276), registra Penaforte que “quase todos cabeças ou eram poetas que tinham assento no parnaso português, ou aprendizes”.

O integralista e escritor Gustavo Barroso, em “A História Secreta do Brasil” (1990), conta que

em Vila Rica, sede do governo da capitania, havia uma roda de homens cultos, participantes duma Arcádia Literária, a qual facilmente se tornaria o centro diretor de qualquer movimento de ideias a se objetivar em ação”.

Citando o monarquista convicto e depreciador de Tiradentes, Joaquim Norberto de Souza e Silva, em “História da Conjuração Mineira”, ressalta que “tornou-se, com efeito, e envolto em tanto mistério que mal sabiam os conjurados do que nele se tratava, nem ao certo as pessoas de que se compunha”. Mencionando ainda Joaquim Felício, em “Memórias do distrito diamantino”, destaca que “a inconfidência de Minas tinha sido dirigida pela maçonaria”, afirmação esta combatida por Castellani em seu livro “A Conjuração Mineira e a Maçonaria que não Houve” (1992), dando munição aos detratores, mas recepcionada em outra obra de sua autoria (1989), conforme abaixo.

Ainda segundo Barroso (1990), notório antissemita e anti-maçom, esses movimentos

criaram um meio social propício à guerra do que está em baixo contra o que está em cima…” (p. 26). Assevera que o Marquês de Pombal principiou “no reino lusitano a era dos maçons, que não passavam de cristãos novos, tanto que as duas palavras eram sinônimos e, no campo, pedreiro-livre era sinônimo de judeus” (p. 151).

Segundo Castellani, no seu livro “A Maçonaria e o Movimento Republicano Brasileiro” (1989), contrariamente ao que afirma em “A Conjuração Mineira e a Maçonaria que não Houve” (1992), e naquela obra resumindo a Inconfidência Mineira, comenta que

a participação maçônica no movimento deve ser ressaltada, já que as ideias iniciais e o espírito de libertação chegaram a Minas na palavra de homens iniciados na maçonaria europeia”. Acrescenta, entretanto, que “nem todos os conjurados eram maçons, como querem fazer crer alguns historiógrafos maçônicos mal informados, que desejam, talvez por entusiasmo pela sua Ordem, fazer, de cada grande homem, um maçom perante a história”.

Aqui cabe um parêntesis para destacar a forma bastante deselegante com a qual o escritor Castellani (1992) se refere ao seu irmão Tenório D’Albuquerque, não poupando argumentos para depreciar sua obra “A Maçonaria e a Inconfidência Mineira” (1960), referindo-se a ele, dentre outras qualificações, como “um compilador altamente tendencioso” (p. 147, 148, 168, 175, 183, 185, 201, 202).

Sobre Tiradentes, comenta Castellani a respeito da inexistência de documentos que comprovem sua condição de maçom e das conclusões precipitadas tiradas por muitos autores, aproveitando-se do fato de terem sido destruídos pelos conjurados os escritos relativos à insurreição, e que alegam que ele “deve ter sido iniciado numa das lojas que devem ter existido em Minas e na Bahia...”. Muitos apologistas da maçonaria afirmam que o Alferes teria funcionado como intermediário entre os maçons de Vila Rica e os do Rio de Janeiro.

Continua…

Autor: Márcio dos Santos Gomes

Márcio é Mestre Instalado da ARLS Águia das Alterosas – 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte, membro da Escola Maçônica Mestre Antônio Augusto Alves D’Almeida, da Academia Mineira Maçônica de Letras, e para nossa alegria, também um colaborador do blog.

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Em busca de uma tradição inventada

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A história é continuamente reescrita. À medida que a realidade presente muda, as interpretações acerca de um fato passado também são alteradas, buscando respostas que correspondam melhor às necessidades do tempo atual. Foi assim com a Inconfidência Mineira (1789). Poucos momentos foram tão debatidos, reescritos e apropriados quanto esse.

Durante boa parte do século XIX, a Inconfidência não assumiu lugar de destaque na historiografia brasileira. Tal situação modificou-se apenas na segunda metade do século, quando o princípio da nacionalidade tornou-se uma questão premente a ser resolvida. Urgia ao Brasil a construção de laços de pertencimento capazes de criar um sentimento nacionalista, e era fundamental encontrar os elementos fundadores da nação, construindo uma identidade que pudesse particularizá-la. Com o golpe militar que inaugurou a República em 1889, essas necessidades foram reforçadas. O regime instaurado de cima para baixo estava longe de apresentar-se como uma demanda da população em geral. Assim, era preciso legitimá-lo perante o povo, apresentando-o não como um elemento estranho à sociedade, mas sim como um desejo histórico presente havia muito tempo.

A solução para essas questões passava pela criação de um mito fundador que estabelecesse uma ideia de continuidade entre o fato presente e o passado brasileiro. Era necessário criar uma tradição republicana para a nação por meio de heróis que já tivessem ansiado pela implantação desse regime. Nessa ocasião, a Inconfidência Mineira e Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes, assumiram com propriedade o papel de precursores da República.

A escolha de Tiradentes como herói nacional não é difícil de ser explicada. Com a publicação da obra de Joaquim Norberto de Souza e Silva, História da Conjuração Mineira (1873), que ressaltava o fervor religioso do personagem nos últimos momentos de sua vida, inúmeras representações simbólicas tornaram-se possíveis, aproximando-o à figura de Cristo. Outro fator importante para essa opção foi que o movimento não aconteceu efetivamente, o que poupou os inconfidentes do derramamento de sangue e os manteve imaculados. Eles foram apenas vítimas da violência, nunca agentes.

A Inconfidência como objeto passível de ser novamente apropriado permitiu à historiografia refazer as linhas gerais do levante sempre que a conjuntura política brasileira teve necessidade de reavivar o sentimento nacional. Seu legado simbólico foi retomado de tempos em tempos, mais especificamente nos momentos de rupturas históricas no decorrer do século XX. Getúlio Vargas, Juscelino Kubitschek e até mesmo os militares de 1964, auto-intitulados “os novos inconfidentes”, apropriaram-se do fato histórico em favor de seus interesses políticos. Sob novas roupagens, o mito repetia-se incessantemente.

Contudo, não foram apenas os governos que utilizaram a influência do movimento e de seu herói. Muitas instituições também procuraram um “lugar ao sol” nessa festa de apropriações simbólicas. Foi o caso da maçonaria, que tomou Tiradentes como seu símbolo maior no Brasil ainda no século XIX. A partir de 1870, ocorreu um crescimento acelerado do número de lojas maçônicas no país e muitas delas foram batizadas de “Tiradentes”. Frequentemente, suas bibliotecas tinham o inconfidente por patrono e até mesmo os jornais maçônicos carregavam seu nome. Já no século XX, Tiradentes pareceu ganhar em definitivo um lugar de destaque no panteão maçônico, tornando-se patrono da Academia Maçônica de Letras.

Mas por que esse mineiro poderia representar a maçonaria? Que legitimidade haveria nisso? “Simples”, responderiam os historiadores ligados a essa organização: Tiradentes teria sido maçom, e a Inconfidência Mineira, uma conspiração maçônica em prol da libertação nacional!

Muitos maçons, historiadores ou não, aventuraram-se a escrever sobre o episódio para desvendar sua “verdadeira” história e demonstrar o papel crucial da maçonaria na definição dos acontecimentos de 1789. Em geral, essas narrativas começam demonstrando que a Inconfidência não foi um episódio regional. Tal movimento teria feito parte de um projeto internacional elaborado para tornar livres todos os povos oprimidos. A Inconfidência, a Revolução Francesa e a Independência dos Estados Unidos seriam expressões de um mesmo fenômeno: o do anseio revolucionário por independência, democracia e liberdade que sacudiu a Europa e a América por meio das atividades maçônicas.

Desse modo, o sentimento nativista não seria suficiente para explicar os anseios dos inconfidentes pela República. Acreditar apenas nisso, segundo os escritores da maçonaria, seria “ingenuidade e romantismo”. Os conspiradores mineiros agiriam inspirados não só pela ideia de nação brasileira, mas, principalmente, pelos sentimentos de sua organização. “Mirando-se no exemplo vitorioso da revolução americana guiada por George Washington, Thomas Jefferson, etc., (…) os líderes inconfidentes questionaram o que a metrópole impunha como sendo inquestionável”, escreve o maçom Raymundo Vargas. Eles não teriam planejado uma revolta se não tivessem certeza de que os “irmãos” americanos prestariam auxílio ao restante do continente. O projeto também incluía a Europa, e a França foi o palco escolhido para os contatos que uniriam o Brasil “a essa corrente universal de liberdade”.

A narrativa maçônica apresenta-se confusa para aqueles que sabem que a instituição foi fundada no Brasil em 1801. A Inconfidência poderia caracterizar-se como um movimento maçônico se ainda não havia lojas no Brasil? De acordo com seus escritores, haveria, sim, centenas de maçons organizados em lojas, mas estas funcionavam clandestinamente, já que a ordem se encontrava proibida pela legislação portuguesa.

O relato que inaugurou a crença em uma Inconfidência de caráter maçônico partiu de Joaquim Felício dos Santos, que, curiosamente, não era maçom. Em sua obra Memórias do distrito diamantino da comarca do Serro Frio (1924), ele escreve que a “Inconfidência de Minas tinha sido dirigida pela maçonaria, Tiradentes e quase todos os conjurados eram pedreiros-livres”. Com base nessa passagem, estudiosos, maçons ou não, começaram a associar automaticamente a Inconfidência à maçonaria. Surgiu a crença de que Tiradentes, que ia muito à Bahia para refazer o sortimento de mercadorias de seu negócio, acabou, numa de suas viagens, tornando-se maçom. Ele seria o responsável pela criação de uma loja maçônica, local onde os conjurados teriam sido iniciados na organização, “introduzida por Tiradentes quando por aqui passava vindo da Bahia para Vila Rica”, escreve Tenório D’Albuquerque.

Prova maior da importância do triângulo como símbolo maçônico teria se dado no momento da execução de Tiradentes, quando o maçom e capitão Luiz Benedito de Castro não distribuiu as tropas em círculo como de costume, e sim formou um triângulo humano em torno do patíbulo. A multidão “não poderia compreender o significado simbólico daquele triângulo, mas Tiradentes, no centro dele, compreendia aquela última e singela homenagem”, descreve Raymundo Vargas.

Finalmente, as narrativas maçônicas encontram explicação também para um instigante mistério: o sumiço da cabeça de Tiradentes. A urna funerária contendo a cabeça do herói da Inconfidência teria sido retirada secretamente às altas horas da noite pelos irmãos maçons remanescentes do movimento. O roubo da cabeça seria, segundo Raymundo Vargas, uma das primeiras afrontas da maçonaria às autoridades repressoras portuguesas, mostrando-lhes que “a luta só começava”. Segundo autores maçons, não teria sido por acaso que, no mesmo local onde a cabeça de Tiradentes fora exposta, o então presidente da província mineira e grão-mestre da maçonaria brasileira em 1874 Joaquim Saldanha Marinho, em 3 de abril de 1867 ergueu uma coluna de pedra em memória do mártir maçom.

Vários outros aspectos da Inconfidência foram trabalhados pelos autores ligados à organização, tais como a personalidade maçônica do Visconde de Barbacena ou as “irrefutáveis” provas da viagem de Tiradentes à Europa para fazer contato com seus irmãos da ordem. Percebe-se que a maçonaria, por meio de seus intelectuais, construiu uma série de argumentos para não deixar dúvida quanto ao papel de destaque dessa instituição no desenrolar de todos os fatos da Conjuração. Recentemente, surgiram alguns trabalhos elaborados por historiadores maçons mais criteriosos que refutam muitas das teses aqui apresentadas. Contudo, estes ainda não foram suficientes para derrubar do imaginário maçônico a figura do herói mineiro.

De fato, existem vestígios de que maçons passaram pelas Minas setecentistas. Analisando os processos inquisitoriais luso-brasileiros de fins do século XVIII e início do XIX, encontram-se denúncias contra mineiros de Vila Rica e do Tijuco, acusados de libertinos, heréticos e maçons. Sabe-se também que muitos estudantes brasileiros em Coimbra e Montpellier iniciaram-se na maçonaria europeia e trouxeram seus valores e ideias para o Brasil. Alguns deles, como José Álvares Maciel e Domingos Vidal, ajudaram nos planos dos inconfidentes.

Para além da discussão da veracidade ou não desses relatos acerca da Inconfidência, é interessante perceber de que maneira a elaboração de tal narrativa histórica favorece a instituição dos pedreiros livres. Em diversos momentos, a presença da maçonaria em território brasileiro foi questionada. Com a proclamação da República, por exemplo, a Igreja Católica perdeu o título de religião oficial do Estado e, para tentar reaver sua influência política, reforçou o combate à organização. O catolicismo oficial passou a apresentar a maçonaria como uma sociedade “estranha” à cultura brasileira, vinda de fora, representante do imperialismo e, logo, uma ameaça à soberania nacional. Mais tarde, com esses argumentos, Getúlio Vargas a colocaria na ilegalidade.

Diante de situações como essas, tornou-se fundamental para a maçonaria apresentar-se à sociedade brasileira como uma instituição que, ao contrário do que dizem seus opositores, mostra se presente há tempos em nosso território e em nossa cultura. Assim, a narrativa da Inconfidência como um movimento maçônico pode ser denominada de “’tradição inventada”, expressão cunhada por Eric Hobsbawm que indica a criação de um passado com o qual se busca estabelecer uma continuidade. Construir por meio de uma historiografia uma tradição na qual os maçons teriam feito parte do momento fundador da nação brasileira é, sem dúvida, uma maneira de assegurar sua presença no Brasil. Ao associar a imagem de Tiradentes à sua, essa ordem passa a ser lembrada como a defensora dos nobres valores carregados pelo herói nacional. Mais do que uma forma de defesa, a apropriação maçônica da simbologia da Inconfidência lhe dá legitimidade perante a sociedade. Por ora, a estratégia teve êxito na medida em que a insurreição de 1789 e a atuação maçônica encontram-se, ainda hoje, intimamente associadas no imaginário popular.

Autora: Françoise Jean de Oliveira Souza

Françoise é doutora em história pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro e autora da dissertação Vozes maçônicas na Província Mineira – 1869-1889, UFMG, 2004.

Notas

A bandeira mineira – A origem da bandeira de Minas Gerais é mais uma prova, para os maçons, do envolvimento desta organização na Inconfidência. “Se ainda ao mais incrédulo dos incrédulos restasse um resquício de dúvida quanto à origem maçônica da Inconfidência Mineira, bastaria contemplar-lhe a bandeira”, afirma Tenório D’Albuquerque, em A bandeira maçônica dos inconfidentes. Utilizando como disfarce a ideia da Santíssima Trindade, o triângulo representaria, na verdade, a sagrada trindade da maçonaria: liberdade, igualdade e fraternidade. No interrogatório relatado nos autos da devassa, ao ser perguntado sobre o significado da bandeira, Tiradentes teria respondido “sagrada trindade” e não “santíssima”. Tal detalhe supostamente passou despercebido ao escrivão.

Discordância entre historiadores – A historiografia acadêmica encontra-se longe de um consenso acerca da participação ou não da maçonaria na Inconfidência. As hipóteses vão desde o papel central dos maçons na elaboração dos planos do levante até a negação total de sua influência na Conjuração.

Augusto de Lima Júnior ressalta o papel da maçonaria ao percebê-la como um importante elemento de ligação e comunicação dos inconfidentes com os grupos de apoio no Rio de Janeiro e na Europa. Em posição oposta está Lúcio José dos Santos, alegando que o fato de não haver nenhum vestígio da ação propriamente maçônica nos autos da devassa seria a maior prova da ausência dessa sociedade na Inconfidência. Também argumenta que, se a maçonaria possuísse prestígio suficiente a ponto de ser a idealizadora do movimento, ela teria tido forças para impedir a condenação de seus membros. Finalmente, a meio-termo entre as duas opiniões encontra-se Márcio Jardim, para quem a atuação maçônica teria sido importante, mas secundária: seu papel seria apenas o de aglutinar pessoas e ideias. O autor observa, ainda, como a maçonaria dos dias atuais se apropria da figura de Tiradentes, o que revelaria um desejo de mostrar poder acima do comum, causando lhe surpresa o fato de “boatos sobreviverem ao tempo e à evidência das provas contrárias”.

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Tiradentes, maçom iniciado?

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Introdução

Logo após a iniciação na Maçonaria, muitos são os que tomam conhecimento das inúmeras Lojas Maçônicas que adotam o nome de Tiradentes como patrono, em suas diferentes formas: “Tiradentes”, “Alferes Tiradentes”, “Joaquim José da Silva Xavier”, dentre outras. De plano, surge a dúvida: são homenagens ao mártir da Independência ou Tiradentes teria sido maçom?

Com certa tristeza temos presenciado uma discussão pouco acadêmica acerca do assunto, mais próxima da paixão rancorosa, a qual, sem dúvida, conduz ao caminho certo para a perpetuação da dúvida. Alguns maçons historiadores, em seus livros e artigos publicados, já se excederam e, não raro, trocaram até ofensas públicas.

Nesse sentido, desenvolvemos o presente artigo, esperando que possa, com o auxílio do Grande Arquiteto do Universo, com base na pesquisa científica, longe de qualquer sectarismo, oferecer aos maçons e interessados a verdade, ou, se esta não for encontrada, que tenhamos contribuído para alargar os horizontes da cultura maçônica.

Breves dados pessoais de Tiradentes

Joaquim José da Silva Xavier nasceu em Minas Gerais, na Fazenda do Pombal, à margem direita do Rio das Mortes, entre a Vila de São José, hoje cidade de Tiradentes, e São João d’El Rey, tendo como pais, o português Domingos da Silva Santos e a brasileira Antônia da Encarnação Xavier, sendo o quarto filho entre seis a sete irmãos.

Foi batizado pelo padre João Gonçalves Chaves, na Capela de São Sebastião do Rio Abaixo, em 12 de novembro de 1746, tendo como padrinho o “Tiradentes” Sebastião Ferreira Leitão. O assentamento do seu batizado foi encontrado pelo historiador Augusto de Lima Júnior (1955), nos livros da Matriz de Nossa Senhora do Pilar, na Vila de São João d’El Rey, o qual calculou a sua data de nascimento como 16 de agosto de 1746, já que não há notícias de seu registro de nascimento.

Aos nove anos de idade, ele residia em São João d’El Rey, em casa de parentes, quando sua mãe veio a falecer. Aos 15 anos perdeu seu pai, tendo então retornado a Pombal para trabalhar na lavoura, com o seu padrinho, que também lhe ensinou o então raro ofício de “por e tirar dentes”.

Na idade adulta foi mascate em Minas Novas, antes de entrar para a Companhia dos Dragões de Villa Rica, sede da Capitania das Minas Gerais, atual Ouro Preto. Foi então promovido de Comandante de Patrulha a Alferes em março de 1775 e, no ano seguinte, destacado para a 6ª Companhia do recém criado Regimento de Cavalaria Regular de Minas Gerais, sediado em Villa Rica.

Em dezembro de 1781 esteve no Rio de Janeiro, sendo nomeado para o cargo de Comandante do Destacamento do Caminho do Rio, com a finalidade de vigiar a estrada da Mantiqueira, dar proteção aos viajantes e reprimir o contrabando de ouro e diamantes.

O Alferes Xavier, como era conhecido na época, não foi promovido a oficial em face da sua pouca instrução, por manter a atividade de “arrancador de dentes” e ter a “língua solta” e, finalmente, após ter sido destituído do cargo de Comandante do Destacamento do Caminho do Rio, começou a falar mal, abertamente, do governo português.

Em maio de 1786 retirou da casa dos pais a menor Antônia Maria do Espírito Santo, que, em fevereiro de 1787, deu a luz a uma menina. No mês imediato, o Alferes abandona a companheira, que tinha à época 16 anos de idade, e viaja para o Rio de Janeiro, licenciando-se da Tropa, permanecendo lá por um ano, para tentar uma nova sorte, porém, sem êxito.

No ano seguinte, 1788, ainda no Rio de Janeiro, conheceu o engenheiro de minas, José Alvares Maciel Filho, cunhado do capitão-mor de Villa Rica, e Domingos José Barbosa, recém formados em Coimbra, Portugal.

Em agosto do mesmo ano, o Tiradentes retornou para Villa Rica, encontrando o povo em profunda inquietação, pois, em 18 de julho, o Visconde de Barbacena, governador da Capitania das Minas Gerais, anunciara a cobrança, com rigor, do débito da derrama.

Juntou-se, então, ao grupo formado pelas seguintes personalidades da região: tenente coronel Francisco de Paula Freire de Andrade, comandante do Alferes; José Alvares Maciel Filho; vigário e latifundiário Carlos Correia de Toledo e Mello; Inácio José de Alvarenga Peixoto; padres José da Silva e Oliveira Rolim; cônego Luiz Vieira da Silva; poeta Cláudio Manoel da Costa; e outros militares, fazendeiros e negociantes, que já conspiravam contra a Coroa Portuguesa.

Outras imposições do governo português também traziam grande descontentamento à população: exigência de que todos deveriam trabalhar nas minas de ouro; proibição de instalação de engenhos na região das minas; exclusividade na retirada do sal para poucos comerciantes; fechamento das fábricas de tecido, para que todos fossem obrigados a comprar tecidos fabricados em Portugal; proibição do uso das estradas para o interior, por receio do contrabando de ouro. Tais medidas, aliadas ao anúncio da derrama, trouxeram forte descontentamento junto à classe dominante da região, principalmente os endividados, caso também de Tiradentes.

O clube inicialmente era conhecido como o Arcádia Ultramarina. Segundo Monteiro (1961), o clube foi fundado com a finalidade de sublevar a população a não pagar a derrama, as côngruas e o quinto sobre o ouro minerado. Discutia-se, também, a proclamação de um território independente de Portugal.

O lema da bandeira do Clube dos Poetas foi proposto por Cláudio Manoel da Costa, verso de Virgílio: “Libertas Quae Sera Tamem”, Liberdade, Ainda que Tardia.

O Coronel Joaquim Silvério dos Reis, que ouvira inconfidências de Tiradentes, denunciou a insurreição que se planejava ao Visconde de Barbacena, que imediatamente suspendeu a derrama, uma vez que o movimento armado iria ter início no dia da cobrança dos impostos atrasados. Deu-se início à devassa da Inconfidência Mineira ou Conjuração Mineira, com a prisão de seus líderes.

Dias antes, Tiradentes, que tinha a incumbência de divulgar o movimento, viajara para o Rio de Janeiro, com a finalidade de angariar fundos para a empreitada, vindo a ser preso no dia 12 de maio de 1789, na rua dos Latoeiros, hoje denominada rua Gonçalves Dias, sem oferecer maior resistência.

Tiradentes não negou sua participação no movimento, denominado de “Inconfidência Mineira”. Os demais envolvidos abjuraram e a Rainha Dona Maria I de Portugal, no dia 20 de abril de 1792, comutou as suas penas de morte para o degredo perpétuo, deportando-os para a África. Já os religiosos tiveram processos à parte e, após condenados, foram enviados a Portugal. Enquanto que Cláudio Manoel da Costa, que se defendera em cartas, acusando os companheiros da conspiração, suicidou-se na prisão.

Tiradentes foi enforcado às 11 horas do dia 21 de abril de 1792, três anos após sua prisão. Foi então esquartejado, sendo que a cabeça foi para Villa Rica e os seus membros foram fincados em postes na estrada entre Minas e Rio de Janeiro. A casa dele foi destruída e sobre a terra foi jogado sal.

A suposta iniciação de Tiradentes

A Universidade de Coimbra era o berço das ideias liberais, onde os filhos de brasileiros ilustres, ricos e poderosos estudavam, constando que Cláudio Manoel da Costa, Tomás Antônio Gonzaga e Inácio Alvarenga Peixoto foram iniciados na Maçonaria naquela cidade, enquanto estudantes, embora haja quem afirme que Cláudio Manoel da costa não era maçom.

Naquela época, o absolutismo e o sistema colonial europeu estavam em crise, os ideais de liberdade e princípios liberais estavam aguçados entre os universitários, em face da recente guerra da independência americana (1776) e a Revolução Francesa (1789). Alguns autores afirmam que José Alvares Maciel Filho também teria sido iniciado na Maçonaria, em Coimbra, com 28 anos de idade, tendo chegado a Villa Rica no segundo semestre de 1788.

No tocante à probabilidade da iniciação de Tiradentes na Maçonaria ou à sua vida de maçom, não existe qualquer registro e, nos sete volumes dos Autos Devassa da Inconfidência Mineira, publicados pela Biblioteca Nacional (1936), não há qualquer referência à iniciação de Tiradentes ou sua condição de maçom.

Por outro lado, o estudioso maçom José Castellani, em artigos publicados na revista “A Verdade”, números 298 e 300, abril e junho de 1992, afirmou que “profanos e principalmente maçons irresponsáveis inventaram, não apenas sobre o Tiradentes, mas de modo geral tudo quanto é fato maçônico”.

O autor Joaquim Felício dos Santos (1868), no livro “Memórias do Distrito de Diamantino da Comarca do Serro Frio”, afirmou que “os conjurados eram todos iniciados na Maçonaria, introduzida por Tiradentes, quando por aqui passou, vindo da Bahia, para Villa Rica” e mais “quando Tiradentes foi removido da Bahia, trazia instruções secretas da Maçonaria para os patriotas de Minas Gerais”.

Marcelo Linhares (1988), no seu livro “A Maçonaria e a Questão Religiosa do Segundo Império”, escreveu que “de Tiradentes se diz haver iniciado na Bahia, quando em seus primeiros tempos de vida profissional mascateou no eixo Minas-Bahia”. Mas, demonstrando não ter muita convicção, afirmou que “o certo é que a Maçonaria brasileira dos séculos XVIII e XIX era essencialmente política”.

Porém, tais afirmações encontram forte oposição, no fato de que a primeira Loja Maçônica brasileira que se tem registro surgiu em Recife, Pernambuco, apenas em 1796, por iniciativa do botânico Manuel de Arruda Câmara, após chegar da Europa, e denominava-se Areópago de Itambé. Há autores que afirmam que não se tratava de uma Loja Maçônica, mas de outra sociedade secreta, nos moldes da Maçonaria, e integrada por maçons e não maçons.

Tiradentes, como se sabe, morreu no dia 21 de abril de 1792, quando ainda não existia Loja Maçônica regular no Brasil. Tiradentes jamais esteve em Salvador, Bahia, onde há a teoria da primeira Loja Maçônica naquele território, fundada em 14 de julho de 1797, na Barra, a qual denominava-se “Cavaleiros da Luz”, fato que também não encontra unanimidade. Também é sabido que não existia estrada para os 1800 quilômetros que separam Salvador de Villa Rica.

Portanto, meu entender é de que Tiradentes não poderia ter sido iniciado na Maçonaria na Bahia enquanto mascateava ao norte de Minas, por volta de 1774, uma vez que esta ainda não existia. A propósito, José Castellani, em “Os Maçons na Independência do Brasil” (1993, p. 20- 21), é taxativo ao afirmar:

“Muito já se falou e muito já se escreveu sobre a participação maçônica na independência do Brasil.

De confiável, todavia, muito pouco. Como geralmente acontece, quando autores maçons tratam da História, entra em jogo o ufanismo, a parcialidade, a tendência, que os leva a exagerar os feitos maçônicos e as virtudes dos maçons envolvidos, ocultando ou escamoteando os defeitos e dourando a pílula, quando o seu aspecto não é muito recomendável.

Isso acabou criando uma História distorcida, inventada e maquinada, que viria a influenciar algumas gerações de maçons, que passaram a repetir balelas, as quais, com tanta repetição, quase chegaram a ter foros de verdade – uma mentira repetida muitas vezes, acaba sendo considerada uma verdade – fazendo com que a historiografia maçônica nacional chegasse a ser motivo de descrédito, de desconsideração e até de chacota, para a comunidade universitária brasileira e para as instituições ligadas à História e que tratam com a seriedade que ela merece e não com o despojamento de certos autores maçons.”

Mais adiante (p. 25), foi contundente ao tratar especificamente de Tiradentes:

Existem, todavia, autores, que, aproveitando um período nebuloso e de grande carência de registros históricos, falam da existência de Lojas, principalmente na Bahia, nos meados do século XVIII, o que, por falta de qualquer prova documental, é uma afirmação tão temerária quanto aquela dos que apontam os conjurados mineiros, principalmente o Tiradentes, como Maçons, sem que haja qualquer apoio histórico documental para tal afirmação.

Não se pode negar que há indícios de que maçons se envolveram na Inconfidência Mineira e em outros acontecimentos históricos que se sucederam. Gustavo Barroso (1990), historiador pátrio dos mais afamados, afirmou que “a Maçonaria estava envolvida na Conjuração Mineira”. Ele só não disse como e por quais representantes.

Outro historiador, Pedro Calmon (2002) afirmou que maçons participaram da Inconfidência Mineira, da Independência, da Abolição da Escravatura e da Proclamação da República. Porém, não citou Tiradentes como maçom.

Já Lima Júnior (1955, p.136-137) afirma que: “Iniciado na Maçonaria, tomava parte nas reuniões desta, no Rio de Janeiro e pregava suas doutrinas onde quer que se encontrasse” e também confirma que “…depois de ouvir minucioso relatório do alferes Joaquim José, que regressara do Rio de Janeiro onde mantivera contatos decisivos com os confrades das Lojas Maçônicas, e que lá dirigiam o movimento da insurreição…”. No entanto, nos idos de 1788/89, não existia Loja Maçônica no Rio de Janeiro, o que torna temerá- ria tal afirmação, sendo que a primeira só veio a ser fundada naquele Oriente em 1801, denominada Loja Maçônica Reunião, filiada ao Grande Oriente de França, segundo o manifesto do Grão-Mestre José Bonifácio de Andrada, publicado em 1832 (BUCHAUL, 2011).

Ainda, José Castellani, em “Os Maçons da Independência”, relaciona a fundação das primeira Lojas Maçônica no Brasil:

Resumindo: os primeiros tempos da Maçonaria brasileira, até a fundação do Gr. O., seguem aproximadamente – já que a época é nebulosa, do ponto de vista documental – a seguinte cronologia dos principais fatos:

1796 – Fundação, em Pernambuco, do “Areópago de Itambé”, que não era uma verdadeira Loja, pois, embora criado sob inspiração maçônica, não era totalmente composto por Maçons;

1801 – Criação, em Niterói, da Loja “União”;

1801 – Instalação da Loja “Reunião”, sucessora da “União”;

1802 – Criação, na Bahia, da Loja “Virtude e Razão”; 

1804 – Fundação das Lojas “Constância” e “Filantropia”;

1806 – Fechamento, pela ação do Conde dos Arcos, das Lojas “Constância” e “Filantropia”; 

1807 – Criação da Loja “Virtude e Razão Restaurada”, sucessora da Loja “Virtude e Razão”; 

1809 – Fundação, em Pernambuco, da Loja “Regeneração”. 

Mário Verçosa (1985), em seu livro “Registros Maçônicos”, acrescenta a Loja “Cavaleiros da Luz”, em Salvador, Barra, como fundada em 1797, filiada ao Grande Oriente de França.

Em 1955, Tenório d’Albuquerque, baseado na afirmação de Canêco Amassado, começou a escrever seguidamente sobre Tiradentes-Maçom, passando a surgirem daí inúmeras Lojas Tiradentes, com a adoção do mártir da Inconfidência Mineira, como mártir maçom-brasileiro. Para se comprovar tal afirmativa, basta levantar em cada Oriente a data de fundação das Lojas Tiradentes.

Para Kurt Prober (1984), Tenório d’Albuquerque criou o que chamou de “Herói Maçom”, denominando de “fábula Tiradentes-Maçom” tudo que se refere a sua vida maçônica. Para alguns, a assinatura de Tiradentes é uma prova da sua condição de maçom. Kurt Prober contradiz, afirmando que a mesma possui cinco pontos: o primeiro está depois da abreviação de Joaquim; o segundo é solto, depois de J, de José; o terceiro está abaixo da letra A, da abreviatura AS, de Silva; o quarto está ao lado de X, de Xer, Xavier abreviado; e o quinto, no fim do nome, como ponto final.

Os três pontos, que acompanham as assinaturas dos maçons, foram utilizados pela primeira vez num documento maçônico, no Grande Oriente de França, em 1774 (RAGON, 2006). No Brasil, somente após 1815 e, com certeza, em 1822.

José Carlos Gentil (19–), atual Presidente da Academia de Letras de Brasília, ao publicar um opúsculo intitulado “Tiradentes e a Maçonaria”, apresenta-se como um ferrenho defensor da tese de que Tiradentes era um maçom iniciado, chegando ao despropósito de afirmar: “Ora, pretender negar que Tiradentes tenha sido Maçom constitui-se pelo menos numa irracionalidade, porquanto as evidências traduzem o contrário”.

Naturalmente, Gentil deixou-se levar pelo entusiasmo, ao taxar de irracionais aqueles que não se contentam com as evidências que esposa, já que usa a expressão evidência como uma certeza. A verdade, principalmente a verdade que busca a Maçonaria, vai mais além. Se há dúvida, desaparece a certeza, de verdade ou de falsidade. Afinal, temos uma longa escada a galgar. Evidências por evidências, de verdade ou de falsidade, as contrárias à tese Tiradentes-Maçom são mais consistentes e mais racionais, contradizendo o modo de entender o último autor referido.

Considerações Finais

Essa indagação, se Tiradentes era maçom iniciado, permanecerá ad eternum, enquanto a própria Maçonaria, como instituição, não tomar a iniciativa de buscar a resposta, o que tem sido feito até hoje, exclusivamente, por maçons estudiosos e preocupados com a história da Maçonaria brasileira.

Sugere-se a designação, pelos órgãos ma- çônicos competentes, de um grupo de trabalho, constituído por historiadores, maçons e profanos, para num prazo compatível com a importância e a complexidade do tema, buscar e oferecer a verdade que todos nós almejamos. Ou, quem sabe, instituir-se um prêmio relevante dentro de um concurso aberto a professores e pesquisadores de todos o país, abordando-se a questão. Só a análise de fatos históricos, ainda que de difícil catalogação, será capaz de trazer a verdade ou dela se aproximar.

Autor: Marco Antônio de Moraes

Marco Antônio é professor e advogado aposentado. Mestre Instalado, MRA, 33º do REAA, membro das Lojas Maçônicas Atlântida No. 06 e Abrigo do Cedro No. 08, ambas da GLMDF.

Fonte: Revista Ciência e Maçonaria

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Referências Bibliográficas
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