O tempo não existe

Físico fala sobre a física quântica e diz que o tempo não existe

“O tempo não existe. E eu tenho 15 minutos para convencê-los disso”

Assim começa uma palestra TEDx feita em 2012 pelo físico italiano Carlo Rovelli, que não costuma aparecer na imprensa internacional.

Uma das vezes em que ele ganhou destaque foi na revista britânica New Statesmannuma reportagem assinada por George Eaton intitulada “O físico rockstar Carlo Rovelli explica porque o tempo é uma ilusão”, em tradução livre.

“A determinação de Rovelli em tornar a física quântica acessível e suas prodigiosas vendas de livros o levaram a ser chamado de ‘o novo Stephen Hawking'”, destaca o artigo.

Em 2020, no evento “The Nature of Time” (A Natureza do Tempo), organizado pela revista New Scientist, o físico teórico pegou uma corda e a esticou de uma ponta a outra do palco. E pendurou uma caneta no meio da corda para marcar o presente.

Rovelli disse: “É aqui que estamos.”

Ele então ergueu o braço direito e apontou para a direita: “Esse é o futuro.” Na sequência, apontou para a esquerda: “E esse é o passado.”

“Esse é o tempo do nosso dia a dia: uma longa fila, uma sequência de momentos que podemos ordenar, que tem uma direção preferida, que podemos medir com relógios”, disse. “E todos nós concordamos com os intervalos de tempo entre dois momentos diferentes ao longo do caminho, ao longo desta linha.”

Depois acrescentou: “Quase tudo o que eu disse está errado. Em termos factuais, isso está incorreto. É como se eu dissesse que a Terra é plana”.

“O tempo não funciona assim, ele o faz de uma maneira diferente”, emendou.

E esclareceu: “Essas não são ideias especulativas que aparecem em sonhos estranhos de físicos. São fatos que medimos em laboratório, com instrumentos, e que podem ser verificados”.

Pura rebelião

Nascido em Verona, na Itália, em 1956, Rovelli confessa que sua adolescência foi “pura rebelião”. O mundo em que ele vivia era diferente do que considerava “justo e belo” e, em meio a essa decepção, a ciência veio ao seu encontro.

No mundo acadêmico, o jovem pesquisador descobriu “um espaço de liberdade ilimitada”, que ele relembra em um de seus livros.

“No momento em que meu sonho de construir um novo mundo colidiu com a realidade, me apaixonei pela ciência, que contém um número infinito de novos mundos”, descreve.

“Enquanto eu escrevia um livro com meus amigos sobre a revolução estudantil (um livro que a polícia não gostou e me custou uma surra na delegacia de Verona: ‘Diga-nos os nomes de seus amigos comunistas!), mergulhei cada vez mais no estudo do espaço e do tempo, tentando entender os cenários que haviam sido propostos até então.”

Gravidade quântica

Rovelli decidiu dedicar sua vida ao desafio de conciliar duas teorias: a mecânica quântica (que descreve o mundo microscópico) e a relatividade geral de Albert Einstein.

“Para chegar a uma nova teoria, devemos construir um esquema mental que não tenha a ver com nossa concepção usual de espaço e tempo”, diz. “Você tem que pensar em um mundo em que o tempo não é mais uma variável contínua, mas uma outra coisa.”

Ao buscar possíveis soluções para o problema da gravidade quântica, Rovelli foi um dos fundadores da teoria da gravidade quântica em loop, também conhecida como teoria do loop, que apresenta uma estrutura fina e granular do espaço.

Essa teoria tem aplicações em diferentes campos – por exemplo, o estudo do Big Bang ou as formas de abordar e entender os buracos negros.

O físico italiano tem uma carreira brilhante, que inclui inúmeros prêmios e livros. Uma dessas publicações, “Sete Breves Lições de Física” (Editora Objetiva), foi traduzida para 41 idiomas e vendeu mais de 1 milhão de cópias.

Ele também foi professor na Itália, nos Estados Unidos, no Reino Unido e atualmente é pesquisador do Centro de Física Teórica de Marselha, na França.

Rovelli respondeu por escrito a algumas perguntas da BBC Mundo, serviço em espanhol da BBC. Confira a seguir os principais trechos da entrevista.

BBC Mundo – O que é o tempo? Ele realmente existe?

Carlo Rovelli – Sim, claro que o tempo existe. Do contrário, o que é que sempre nos falta? Mas a ideia comum que temos sobre o que é o tempo e como ele funciona não serve para entendermos átomos e galáxias. Nossa concepção usual de tempo funciona apenas em nossa escala e quando vamos medir as coisas com muita precisão.

Se quisermos aprender mais sobre o universo, temos que mudar a nossa visão do tempo. Porque o que costumamos chamar de “tempo”, sem pensar muito sobre o que isso significa, é realmente um emaranhado de fenômenos diferentes. O tempo pode parecer simples, mas é realmente complexo: ele é feito de muitas camadas, algumas das quais são relevantes apenas para certos fenômenos, e não para outros.

BBC Mundo – O que o senhor descobriu quando se perguntou: por que só podemos conhecer o passado e não o futuro?

Rovelli – A razão de termos informações sobre o passado e não sobre o futuro é estatística. Tem a ver com o fato de não vermos os detalhes das coisas. Não vemos, por exemplo, as moléculas individuais que compõem o ar da sala em que estamos. Mas, no mundo microscópico, não há essa distinção entre o passado e o futuro.

BBC Mundo – O senhor falou sobre a elasticidade do tempo e sobre um dia em que “vivenciamos coisas diretamente, como encontrar nossos filhos mais velhos que nós mesmos no caminho de volta para casa”. Como isso pode acontecer?

Rovelli – A pergunta correta é a oposta: por que quando nos separamos e nos encontramos novamente, o seu e o meu relógio medem o mesmo intervalo de tempo?

Não há razão para que devam medir esse mesmo tempo. A experiência nos diz isso apenas porque nossas medições não são precisas o suficiente. Se fossem, veríamos que o tempo corre em velocidades diferentes para pessoas diferentes, dependendo de onde estão e como se movem. Portanto, eu poderia me separar de meus filhos e reencontrá-los em um tempo que significa apenas um ano para mim, mas 50 anos para eles. Nesse cenário, eu ainda sou jovem e eles envelheceram. Isso certamente é possível. O motivo pelo qual normalmente não vivenciamos esse tipo de experiência é apenas que nossa vida na Terra se move numa velocidade lenta entre nós e, nesse caso, as diferenças de tempo são pequenas.

BBC Mundo – Algum dia poderemos viajar ao passado?

Rovelli – Considero extremamente improvável. Viajar para o futuro, por outro lado, é o que fazemos todos os dias.

BBC Mundo – O que o senhor quer dizer com isso?

Rovelli – Viajar ao passado é difícil. Mas viajar para o futuro é muito fácil. Faça o que fizer, você está viajando sempre para o futuro: o amanhã é o futuro do hoje.

BBC Mundo – Sabemos que o senhor gosta muito de gatos e prefere não se referir ao gato de Schrödinger[1] e a discussão se ele está vivo ou morto (ou dormindo). O senhor poderia explicar por que, segundo esse famoso experimento, o animal pode estar vivo e morto ao mesmo tempo?

Rovelli – Acho que o gato não está realmente acordado e dormindo ao mesmo tempo. Considero que, com respeito a si mesmo, o gato está definitivamente acordado ou dormindo. Mas quando se trata de mim e de você, pode não haver nem um estado, nem outro. Porque eu acho que as propriedades das coisas (incluindo os átomos e os gatos) são relativas a outras coisas e só se tornam reais nas interações com elas. Se não houver interações, não há propriedades.

BBC Mundo – Como o senhor explicou, a discussão entre os físicos da mecânica quântica não é apenas sobre o gato estar vivo e morto ao mesmo tempo, mas também sobre o experimento com dois eventos, A e B, nos quais A vem antes de B, mas também B vem antes de A. Como isso pode ser possível?

Rovelli – Quando dizemos que um evento A é anterior a um evento B, o que queremos dizer é que pode haver um sinal indo de A para B. Por exemplo, sua pergunta é anterior à minha resposta, porque me chega antes que eu possa respondê-la.

No entanto, às vezes pode acontecer que seja realmente impossível enviar um sinal de A para B, mas também impossível enviar um sinal de B para A. Então, nenhum é anterior ao outro.

A razão de não estarmos acostumados com isso é porque a luz viaja muito rápido, então tendemos a pensar que podemos ver tudo “instantaneamente”. Mas a verdade é que não podemos. Portanto, sempre existem eventos que não são ordenados de acordo com esse tempo.

BBC Mundo – O que o senhor quer dizer quando afirma que existem muitas versões diferentes da realidade, embora todas pareçam iguais em grande escala?

Rovelli – As propriedades de todas as coisas são relativas a outras coisas. As propriedades do mundo em relação a você não são necessariamente as mesmas em relação a mim. Normalmente, não vemos essas diferenças nas propriedades físicas porque os efeitos quânticos são muito pequenos. Mas, em princípio, podemos ver mundos ligeiramente diferentes.

BBC Mundo – O senhor disse que temos que reorganizar a forma como pensamos a realidade. Como podemos fazer isso? O que estamos perdendo se não tentarmos seguir por esse caminho?

Rovelli – Podemos continuar vivendo nossas vidas ignorando a física quântica, mas se estamos curiosos sobre como a realidade funciona, temos que encarar que as coisas são realmente estranhas.

BBC Mundo – A metáfora que o senhor faz sobre a mecânica quântica e sua interseção com a filosofia, como se essas duas áreas do conhecimento fossem um casal se reunindo, se separando, depois voltando e se separando novamente, é fascinante. A mecânica quântica e a filosofia precisam uma da outra?

Rovelli – Creio que sim. No passado, a física fundamental também avançou graças à inspiração da filosofia.

Todos os grandes cientistas do passado eram leitores ávidos de filosofia. Não há razão para que as coisas sejam diferentes hoje.

Na minha opinião, o inverso também é verdadeiro: os filósofos que ignoram o que aprendemos sobre o mundo com a ciência acabam sendo superficiais.

BBC Mundo – Para o senhor, o livro “A Ordem do Tempo” é muito especial porque “finge ser sobre física, mas secretamente é o meu livro sobre o significado e a finitude da vida”. Qual é o sentido da vida para Carlo Rovelli?

Rovelli – O sentido da vida para Carlo Rovelli é o que penso ser o sentido da vida para todos nós: a rica combinação de necessidades, desejos, aspirações, ambições, ideais, paixões, amor e entusiasmo, que surgem em várias medidas e em diferentes versões naturalmente de dentro de nós. A vida é uma explosão de significado.

Alguns projetaram o significado da vida fora de si mesmos e ficam desapontados ao perceber que havia algo ilusório em esperar que o significado viesse de fora.

Uma das minhas respostas favoritas a essa pergunta foi atribuída a um antigo sioux [etnia indígena norte-americana]: o propósito da vida é abordar com uma canção qualquer coisa que encontrarmos pela frente.

BBC Mundo – O senhor assinalou que na ciência muitos erros são cometidos quando fingimos estarmos certos, quando na verdade muitas vezes não temos essa certeza toda. O novo coronavírus trouxe muitas incertezas para nossas vidas. Como o senhor lidou com isso?

Rovelli – Eu tenho me esforçado não apenas para minimizar o risco para mim e para as pessoas que amo, mas também para minimizar meu próprio papel na disseminação da infecção.

Mas sabendo bem que o risco foi e continua a ser real e que milhões de pessoas morreram e ainda estão morrendo, tenho em mente que isso ainda pode acontecer comigo e meus entes queridos.

Essa constatação não deve ser motivo para pânico, mas também não gosto de esconder a cabeça na areia.

BBC Mundo – Que reflexões o senhor fez nestes tempos desafiadores para milhões de pessoas ao redor do mundo?

Rovelli – O que fico pensando é simples: não seria o momento de a humanidade trabalhar em conjunto, em vez de continuarmos a ficar uns contra os outros? O Ocidente está construindo novos inimigos: China, Irã, Rússia…

Não podemos viver de forma respeitosa e colaborativa, sem a necessidade de subjugar uns aos outros, de prevalecer sobre os outros, de vencer, em vez de cooperar para o bem comum?

A humanidade está enfrentando uma pandemia, milhões de mortes, desastres ambientais e ainda não conseguimos aprender a nos vermos como membros de uma única família, que é o que realmente somos.

A mecânica quântica é a descoberta de que a realidade é tecida por relacionamentos, mas permanecemos cegos para o fato de que prosperamos em relação aos outros, não uns contra os outros. Posso ser ingênuo, mas é isso o que penso todos os dias quando vejo o noticiário.

BBC Mundo – O senhor disse que gostou de ler “O Amor em Tempos do Cólera”, de Gabriel García Márquez, porque “nestes tempos sombrios, é bom ler sobre o amor verdadeiro”. Você pode nos contar mais sobre o que gostou no livro?

Rovelli – É um livro cheio de graça e luz. Retrata as muitas formas de amar e partilhar, com um olhar que sorri diante de toda essa complexidade.

Uma forma de amor é a lealdade da personagem Fermina Daza ao marido. Outra é a intimidade e a amizade de Florentino Ariza com dezenas e dezenas de mulheres. Mas esse amor absoluto entre ele [Ariza] e ela [Daza] é uma bela forma de amor, que foi venerado e valorizado por décadas, até que conseguiu florescer de forma maravilhosa quando os dois já estavam mais velhos.

Reportagem de Margarita Rodríguez

Fonte: BBC News Mundo

Notas do Blog

[1] – O que é o Gato de Schrödinger? Leia mais em: https://super.abril.com.br/mundo-estranho/o-que-e-o-gato-de-schrodinger/

[2] – O futuro já aconteceu e o tempo é uma ilusão. Leia mais em: https://opontodentrocirculo.com/2015/12/10/o-futuro-ja-aconteceu-e-o-tempo-e-uma-ilusao/

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Perspectivas para a maçonaria pós-pandemia

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“Não há mal que sempre dure, nem bem que nunca acabe.” (Popular)

Em 2020, navegamos por mares turbulentos e aprendemos, na prática, o que é uma virose se transformar em pandemia, com reflexos em todos os setores da atividade humana. O cotidiano não foi mais o mesmo. Sem os merecidos rituais de despedida, entes queridos se foram. Vimos empresas e empregos sendo extintos da noite para o dia. Relações pessoais interrompidas, famílias divididas, lazer suspenso, países e cidades em isolamento, em frenéticas rotinas de abre e fecha. Tudo acompanhado com perplexidade, inquietação, insegurança e medo.

O espaço físico doméstico foi fortemente impactado ao enfrentar novas formas de organização, de suprimento e de conciliação entre atividades domésticas, escolares e profissionais. Isso sem falar no noticiário ameaçador, autoridades em conflito e no ambiente cada dia mais tóxico das redes sociais, contaminando mentes com as infindáveis fake news. No mesmo sentido, arroubos retóricos semeando a desinformação, abalando relações afetivas, provocando confrontos ideológicos, gerando intolerância e cizânia. Fortes emoções, porém com algumas conquistas, aprendizado e desafios superados. Sobrevivemos ao quase fim do mundo, a um custo muito alto.

Agora, já em meados de 2021, quando parecia que a “normalidade” estava retornando aos poucos, com a boa notícia da vacina, veio o revertério, com o recrudescimento da pandemia da Covid-19, frente a um sensível declínio dos afetados nos meses anteriores e agora apontando o aumento do número de infecções e óbitos, com a insegurança voltando a tomar conta de todos nós, mesmo com um grande número de pessoas vacinadas. Novos ataques, inclusive de novas variantes do coronavírus e outras pestes, que passam a ser prospectadas no radar, ressuscitando o fantasma de antigas profecias de sinais apocalípticos. Realmente, tempos difíceis!

Em meio às turbulências ora vivenciadas com a pandemia da Covid-19, conjecturar sobre o futuro é sempre tendencioso, certamente podendo descambar para exageros, mas é inevitável não especular a respeito de possíveis cenários. Muitas indagações e poucas afirmações, até então. Teremos nossas vidas de volta como anteriormente? O que se pode afirmar é que teremos que mudar para garantir nossa sobrevivência e segurança. De todos, sem exceção.

Por outro lado, com os gigantes Google, Facebook, Zoom e assemelhados no comando, as tecnologias disruptivas irão de fato alterar as medidas de segurança e estabelecer maiores controles sociais em um cenário orweliano. A realidade será mesmo virtual? Crises demandam mudanças e adiantam o futuro. Fica a dúvida, é só isso mesmo, ou vem mais por aí?

O consenso é de que nada será como antes e enfrentaremos, com certeza, novos paradigmas de comportamento individual e coletivo. Estaremos mais conectados e ao mesmo tempo mais isolados? Esse cenário será o mesmo para as demais atividades, onde nossas residências assumirão definitivamente a condição de extensão de escritórios, salas de aula e outras rotinas, de forma híbrida, para equilibrar trabalho remoto e presencial? Em principio, imagina-se que toda atividade que possa ser realizada sem a presença física será incentivada. Aquelas ora realizadas em ambientes propícios a transmitir algum tipo de vírus serão revistas ou minimizadas. A preocupação com a saúde passará a ser prioridade.

O que parecia ser especulação para um futuro distante, a pandemia encurtou os caminhos. Várias áreas sentem os efeitos e novos hábitos estão sendo rapidamente incorporados. O sistema de ensino, que dava passos largos no ensino a distância (EAD), estuda meios híbridos com incorporação de tecnologia envolvendo instrumentos de conteúdo presencial e digital. No mundo empresarial, o trabalho remoto é uma realidade e começa a ser incentivado por uma série de razões práticas expostas pela pandemia. Todos os ramos de atividades hoje trabalham com cenários alternativos. O porvir será vivido por trás de uma tela, é o que parece, pelo menos no que podemos especular por ora. A Covid-19 é uma realidade e a ciência ainda não tem uma resposta definitiva para os inúmeros desdobramentos possíveis.

No meio maçônico, é fato que, logo após a confirmação da pandemia, a Grande Loja Maçônica de Minas Gerais divulgou a Circular Nº 076, em 16.03.2020, comunicando a suspenção das atividades maçônicas presenciais, bem como “uma série de iniciativas tanto de interesse exclusivo da relação entre suas Lojas e Irmãos, quanto, de alcance e interesse da sociedade”.

Nesse mesmo diapasão, as atividades ritualísticas na Maçonaria foram suspensas mundo afora, conforme fartamente publicado nos meios de comunicação das Potências Regulares (vide Blogs Forthright Space e York), tendo como consequência a adaptação apressada desde então verificada, com o incentivo às reuniões virtuais. E a maçonaria passou, assim, a experimentar novos tempos e novas formas de reunião à distância, ensejando uma troca de experiências e de compartilhamento da cultura maçônica numa abrangência até então jamais imaginada.

Do que vimos até agora, não restam dúvidas de que essa solução “provisória” veio para ficar e se ressente de uma regulamentação via revisão de protocolos ritualísticos, que certamente ganharão novos contornos e regras de comportamento. Não podemos cultivar falsas ilusões. Caso isso não seja a linha mestra de atuação, o colapso da estrutura de sustentação da Ordem poderá ser entrevisto em cenário mais pessimista, o que não pode deixar de ser avaliado. A adaptação a novos hábitos deverá fazer parte do plano de gestão de cada uma das nossas Lojas, consideradas as particularidades. E já se sabe que gestão é a solução.

No cenário ainda de muitas incertezas, as tendências para o pós-pandemia indicam que a tecnologia será um forte aliado na preservação das tradições e fortalecimento da união entre os obreiros, dado que o retorno “normal” das atividades como era o costume encontrará fortes obstáculos, pois nossa Ordem continuará muito afetada com a necessidade do distanciamento social imposto pelas autoridades de saúde e até agora acatado por nossas lideranças.

O retorno às atividades normais após a cessação das medidas restritivas de reuniões enseja preocupações antes não vislumbradas, considerando-se que nosso grupo caminha para ser, majoritariamente, de obreiros com mais de 60 anos, com as vulnerabilidades impostas pela vida. A pesquisa “Maçonaria no Século XXI”, formulada pelo irmão Kennyo Ismail (2018, p. 5-6), demonstra que 37% da amostra participante da pesquisa são de maçons com mais de 60 anos, na categoria de idosos pela legislação vigente, “e, em apenas 5 anos, a maioria dos respondentes, aproximadamente 51%, será idosa”. Sem sombra de dúvidas, a maçonaria brasileira está envelhecendo e as baixas por causas naturais são inevitáveis.

Considerando a possibilidade de reuniões híbridas, presenciais e/ou por videoconferência, as Potências regulares terão o desafio de implantar plataformas específicas para as reuniões virtuais, com vistas a integrar bancos de dados para garantia da segurança e regularidade dos participantes, tanto os do quadro quanto dos visitantes, inclusive com nova cartilha de etiqueta e revisão de protocolos.

Na nova “Ordem do Dia”, essas e outras dúvidas começam a demandar um posicionamento mais efetivo de nossas lideranças, mas as resistências ainda são significativas, mesmo diante das evidências dos fatos. O pressuposto do diálogo em busca de soluções implica aceitação de que alguma medida precisa ser adotada com foco, inovação, resiliência e adaptabilidade. Sem isso não há chance de superação das dificuldades. John Maynard Keynes (1883-1946), economista britânico cujas ideias mudaram fundamentalmente a teoria e prática da macroeconomia, perguntava: “Quando os fatos mudam, eu mudo de opinião. E o senhor, o que faz?”.

Ainda parece-nos que as reuniões presenciais na maçonaria, mesmo a partir do segundo semestre de 2021, estão seriamente ameaçadas. Os obreiros mais pessimistas apostam que um dos legados da pandemia do coronavírus será a adoção das videoconferências como solução perene para o impasse entre as restrições impostas pelas autoridades de saúde quanto às aglomerações que envolvam pessoas pertencentes aos grupos de risco.

O questionamento que nos provoca é por que o impacto na maçonaria seria diferente quando comparada às demais atividades? Afinal, estamos em guerra contra um inimigo invisível que não escolhe vítimas e é mutante. Gostemos ou não, a dura realidade está determinando uma nova forma de viver, que definitivamente não será mais a mesma. Os números mais recentes demonstram que o número de baixas por morte em nossas fileiras é expressivo. Também a evasão maçônica, que fazia parte de nossos embates, ganha novos contornos. Esse cenário precisa ser avaliado, notadamente quanto à recomposição dos quadros de obreiros. E, o mais importante, por ora, é reter talentos e engajar equipes.

Nesse sentido, o recrutamento deve ser orientado na busca de um perfil adequado aos princípios da Maçonaria e objetivos da Loja, que devem ser bem claros para os padrinhos que se empenharem nessa missão. E esses novos iniciados devem ser explorados em todo o seu potencial de conhecimentos e habilidades, cabendo às Lojas ter um diagnóstico dos anseios e inquietudes notadamente da geração mais nova, no caso a “Z”, que enseja os valores modernos caracterizados pelo empreendedorismo, gosto por desafios, vontade de mostrar resultados práticos e de se sentirem prestigiados (Novaes, 2016), e que precisam, portanto, se identificarem com a Ordem.

Voltando ao problema da moda, que tudo isso passará, não restam dúvidas. Mas, a que preço? Talvez em 2022 as coisas melhorem, mas e agora? A pergunta que não quer calar é: tudo será como dantes? Correremos o risco de novas ondas e necessidade de repetidos isolamentos? No nosso caso, continuaremos a reunirmo-nos em Templos apertados e sem circulação de ar natural, para evitar os olhares indiscretos e quebra dos quesitos de segurança? Irmãos mais novos em idade correm menos risco, mas podem se tornar vetores de contaminação em futuras recaídas da espécie. Muito receio entre maçons com idade provecta e seus respectivos familiares, que vêm externando mensagens de preocupação com o retorno das reuniões presenciais pós-pandemia.

O ganho até agora, em termos de compartilhamento da cultura maçônica promovido pelas reuniões virtuais, é de um valor incalculável, porém, segundo estimativas, conta com a participação de algo em torno de apenas 1% dos maçons ativos no Brasil. Mas o barulho que fazem está sendo ouvido em nossas Lojas e além-fronteiras. De concreto, a conquista representada pela fundação de duas Lojas Virtuais: ARLS Virtual Lux In Tenebris nº 47, em 25.09.2020, ligada à GLOMARON, e ARLS Luz e Conhecimento nº 103, em 05.11.2020, da GLEPA, com sucesso de participantes e de temas cativantes, com debates envolvendo irmãos de todo o Brasil e de vários que vivem no exterior, assim como de outras nacionalidades, de uma forma até então impensável.

De outra parte, se podemos falar em benefício das crises, foram inúmeras as oportunidades abertas pelos convites de Lojas que abriram suas reuniões virtuais à participação para todos os maçons regulares, com a ampliação dos contatos entre irmãos de vários Orientes, novas amizades e a realização de proveitosos e inesquecíveis ágapes culturais. A perspectiva de fundação de novas Lojas Virtuais é promissora e uma consistente alternativa a ser avaliada com muito carinho e sem prejulgamentos, dependendo exclusivamente do empenho das lideranças das nossas Potências.

Ocorre que não houve unanimidade nas participações em reuniões por videoconferência, por parte de expressivo número de irmãos, com fortes resistências, haja vista que muitos não estão familiarizados com os recursos ora proporcionados pelas redes sociais. Outros, por questões de ponto de vista, mantiveram-se distanciados, por não aceitarem de bom grado os avanços tecnológicos e mudanças de comportamentos. Dentre esses, identificam-se aqueles mesmos que não são assíduos em Loja ou desaparecem ou se isolam sem declarar os motivos.

Porém, nosso tempo merece ser mais bem aproveitado. A força da maçonaria está no aprendizado constante. Os conhecimentos e experiências precisam ser compartilhados e precisamos, portanto, refletir sobre a realidade desses irmãos que resistem em participar das reuniões em videoconferência. Evidente que não podemos abrir mão das Sessões Magnas e outras que demandam a presença física, pelo menos, com a participação daqueles obreiros não pertencentes a grupos de risco.

Desnecessário tecer maiores reflexões sobre a importância de participar, marcar presença, ou daquela expressão de quem não é visto não é lembrado, mesmo em reuniões virtuais. O que se sabe é que a inação desmobiliza o engajamento, afasta. Cabe, sobremaneira aos dirigentes de nossas Lojas, zelar por manter acesa a chama e não deixar ao relento a ovelha desgarrada ou que, no caso vertente, ainda não tenha sido seduzida pela malha tecnológica, carecendo apenas de uma ajuda dos universitários. E essa união, hoje, independe de presença física se levarmos em consideração as várias alternativas de materialização de ideias.

Mudanças regulamentares começam a ser reclamadas, em face do novo normal que se nos apresenta. Queiramos ou não, a “hora h” chegou. Precisamos vencer as resistências, abandonar a inércia e fazer deste momento a alavanca para a revisão de nossas Constituições, Regulamentos Gerais, Landmarks, Protocolos Ritualísticos e construir uma visão de futuro e não apenas pensar no ano em curso, num eventual pós-pandemia imediato e incerto. Neste momento, a única certeza é a dúvida se a Maçonaria terá efetivamente a resiliência para desdenhar os efeitos da atual crise, sem sequelas e/ou perdas em suas fileiras. Encontramo-nos perante um desafio de vida ou morte. Vamos pagar para ver ou correremos conscientemente o risco de sermos referenciados no futuro como os “coveiros” da Maçonaria?

Enfim, enquanto privados dos encontros presenciais, podemos incentivar e incrementar nossas videoconferências com discussões dessa temática, agora enriquecida com um número cada vez maior de visitantes de diferentes Lojas, Ritos, Orientes e Potências, sem falar que estamos, com isso, participando de mais reuniões dentro do conforto de nossos lares e com interação virtual calorosa, antes impensável. Para encerrar, quem ainda não leu em nossos grupos de WhatsApp irmãos perguntando: onde tem live maçônica hoje? Novos tempos, novos desafios!

O que fazemos para nós mesmos morre conosco. O que fazemos pelos outros e pelo mundo, permanece e é imortal.” (Albert Pike)

Autor: Márcio dos Santos Gomes

Márcio é Mestre Instalado da Loja Maçônica Águia das Alterosas – 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte. Membro da Escola Maçônica Mestre Antônio Augusto Alves D’Almeida e da Academia Mineira Maçônica de Letras.

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Referências

Forthright Space, em https://forthright.space/2020/03/13/freemasonry-covid-19-updates-march-13-2020/. Acesso em 09.01.2021;

ISMAIL, Kennyo. CMI – Maçonaria no Século XXI. 2018. Disponível em: https://www.noesquadro.com.br/wp-content/uploads/2018/04/RELATÓRIO-CMI.pdf.  Acesso em 10.01.2021;

NOVAES, Tiago et al. Geração Z: Uma Análise sobre o Relacionamento com o Trabalho. 2016. Disponível em: http://www.ucs.br/etc/conferencias/index.php/mostraucsppga/xvimostrappga/paper/viewFile/4869/1569. Acesso em 08.01.2021;

Site da GLMMG: http://www.glmmg.org.br/novo/Covid-19;

York Blog, em https://york.blog.br/2020/03/16/maconaria-e-covid-19/. Acesso em 09.01.2021.

Disciplina

Reprogramação Mental - DISCIPLINA - YouTube

Não é no medo que assenta a disciplina: é no sentimento do dever. (Rui Barbosa)

Disciplina é a mãe do êxito. (Ésquilo)

A disciplina é a doutrina e instrução de uma pessoa, especialmente no campo da moral. O conceito também é usado para fazer referência à arte, à faculdade ou à ciência, bem como ao próprio instrumento de castigo (o chicote ou a régua, caídos entretanto em desuso e abolidos). No âmbito militar e eclesiástico, a disciplina é a observância (cumprimento/respeito) das leis e nos ordenamentos da profissão.

A disciplina tem fixação no conjunto de regras e normas que são estabelecidas por determinado grupo, embora possa se referir ao implemento de responsabilidades específicas de cada pessoa.

Exemplificando quanto grupo social: vamos descobrir um conjunto de normas e regras de conduta, que variam de acordo com os seus preceitos.

Deste modo, com enfoco na sociedade: a disciplina ainda representa a boa conduta do indivíduo, ou seja, a característica da pessoa que cumpre as ordens existentes na coletividade.

Indo além, anotamos o significado de disciplina no trabalho ou em atmosfera religiosa, por exemplo, são diferentes, visto que para cada parte as regras e comportamentos costumam variar, de acordo com aquilo que consigam ser considerada de maior importância.

Segundo o Pequeno Dicionário Enciclopédico Koogan Larousse:

Disciplina s.f. O conjunto dos regulamentos destinados a manter a boa ordem em qualquer assembleia ou corporação; a boa ordem resultante da observância desses regulamentos: a disciplina militar. / Submissão ou respeito a um regulamento. / Cada uma das matérias ensinadas nas escolas: é professor de duas disciplinas.

A disciplina é uma palavra que tem a mesma etimologia da palavra “discípulo”, que significa aquele que segue.

Segundo o Dicionário “online” Priberam de Português:

Discípulo – s. m. Pessoa que recebe instrução (em relação a quem lhe dá); aquele que aprende (aluno, Secretário) ou aquele que segue as doutrinas de outrem.

Em filosofia significa o conjunto de conhecimentos metódicos ou regra de conduta a disciplina dos costumes e é aplicada às organizações e as pessoas.

Decorrido sobre o tema do “título” registro a indisciplina como o oposto, quando há a falta de ordem, regra, comportamento ou de respeito pelos regulamentos.

NA MAÇONARIA

A disciplina constitui em uma rígida e irrestrita observância às normas, às Constituições, aos Landmarks, aos Regulamentos, às Obediências e às autoridades.

Sem disciplina nenhuma organização ou entidade domina seus interesses. Porque a indisciplina gera um grave mal, a exemplo da anarquia a qual combatemos, por produzir o caos. A indisciplina anda em voga no meio político: “quanto pior melhor” porque atende a seus méritos.

Originando de que a disciplina é irmã gêmea da liberdade, quando a usamos como direito, ou seja, o direito agindo para que a manifestação de liberdade seja garantia de todos. Essa afirmativa produz efeito quando se consegue respeitar os direitos alheios; que é diferente da liberdade pessoal, conseguida pela deferência espontânea das normas previamente estabelecidas e da obediência às autoridades constituídas.

O cidadão que pretende viver em sociedade, leva para seu convívio um dos deveres essenciais. A disciplina; sinalizada por juramentos, estudos, posturas, segurança nas determinações e ações; sob pena de, não o fazendo, gerar no grupo: dissabores, desentendimentos, egoísmo, divisões e não conseguir transmitir a paz nem a harmonia, tornando-se assim, um cidadão que não inspira segurança a seus companheiros.

Tomemos para nossas vidas, um exemplo de autodisciplina, a do artista. Sua arte se expressa pelo rígido método de disciplina, que espontaneamente impõe a si próprio, dentre outros; o de dormir, de meditar, de buscar inspiração e no tratar com a natureza, completado pelos instrumentos que utiliza: o pincel, a caneta, as chuteiras e os dedos. Pois, sem este cuidado disciplinar ele nunca passará de um artista mediano, de um péssimo sonhador.

Na sociedade em geral, quando aceitamos o convite para ser iniciado na Ordem Maçônica imaginamos uma gama de normas próprias a que seremos submetidos a cumprir; e quando aceitos, prometemos cumprir, através de juramentos, e preceitos outros que formarão o caráter e a moral do cidadão/irmão.

Portanto, sem a disciplina maçônica, a busca da perfeição correrá por trilhos difíceis de se alcançar. É fato que necessitamos de orientações escritas, bem como: dos conceitos orais ministrados pelo corpo de instrutores das Lojas Maçônicas.

NA PANDEMIA

Historiamos que saímos das reuniões presenciais para as virtuais. Consequências que deixaram um gigantesco grupo de irmãos inconformados com a proibição; não podendo se reunirem nos Templos Maçônicos.

Contanto, a maçonaria praticada nos dias atuais “no campo virtual”, tem alcançado um desenvolvimento importante quando o produto final: é a busca do “conhecimento”.

Evento que, os protocolos decorridos dos Órgãos (Governamentais, Estaduais e Municipais) determinaram normas e deveres, com um leque de procedimentos sanitários a serem cumpridos pelos corpos Administrativos das Potências Maçônicas.

Anotamos aqui importantes dificuldades no cumprimento da execução deste protocolo, que traz à tona o dever de cumprir as normas elencadas, mantendo uma correta disciplina.

Alterações foram necessárias. Aditamos uma quantidade de irmãos de nossos relacionamentos, que conseguem através dos sistemas eletrônicos “Lives Maçônicas” palestras/estudos da maçonaria no país e exterior.

Enfim, afirmo que este “novo sistema” vinculará a maçonaria brasileira a buscar novos modelos de administrar e de desenvolver a cultura maçônica.

Assim sendo, ficam assinalados que: os irmãos atuais (minoria) estabeleceram regras de atração pelo conhecimento -, com foco nas palestras, estudos e seminários (virtuais); realizados pelas Potências e Lojas Maçônicas no Brasil e países outros.

Contente pelo o desenvolvimento da maçonaria (atualmente) -, porém apreensivo sobre os demais irmãos, que não concordaram com a evolução existente “sem volta” -, para muitos deles, a maçonaria se pratica nos Templos Maçônicos.

Apresento pretextos a vistas: construímos uma lacuna para o desenvolvimento da desmotivação, que geram, às vezes, na consciência dos irmãos a vontade latente de deixar a Ordem.

Comento que são poucas as Lojas Maçônicas que estão se reunindo, ficam no anonimato “alimentando as esperanças de logo voltarem as reuniões presenciais” – logo, não desempenham “estes” os sólidos compromissos, morais, éticos e disciplinares. Descontinuando os ensinamentos que norteiam a nossa Instituição.

CONCLUSÃO

O trabalho particulariza com clareza que ser disciplinado é fundamental em diferentes aspectos da vida dos indivíduos que vivem ao redor do mundo, pois sem essa “disciplina” os indivíduos não seriam capazes de colocar seus projetos em práticas, lutar para cumprir desafios e buscar novos limites em todas as áreas da vida. Finalizando evidencio que sem disciplina no incremento da obediência as leis e regras, o diálogo da coletividade seria muito mais complexo sobre os tratados organizacionais de interação entre os indivíduos.

Autor: José Amâncio de Lima

Amâncio é Mestre Instalado da ARLS Estrela de Davi II – 242 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte, membro da Academia Mineira Maçônica de Letras, delegado da 1ª Inspetoria Litúrgica do REAA de Minas Gerais e, para nossa alegria, também um colaborador do blog.

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Podcast O Peregrino – Episódio 5 – O futuro já aconteceu e o tempo é uma ilusão

Existe um lugar em que o tempo passa diferente de pessoa para pessoa. Nesse lugar, nenhum relógio marca a mesma hora e passado, presente e futuro estão essencialmente congelados, e também aconteceram ao mesmo tempo. Também tudo o que aconteceu desde a origem do universo até o seu fim existe ao mesmo tempo. Mas, que lugar é esse?
(Music: Cool Rock by Kevin MacLeod. Link: https://incompetech.filmmusic.io/song/3552-cool-rock; License: https://filmmusic.io/standard-license)

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Para que amanhã não seja um ontem com um novo nome¹

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Quanto tempo temos antes de voltarem aquelas ondas
Que vieram como gotas de silêncio tão furioso
Derrubando homens entre outros animais
Devastando a sede desses matagais

(Eternas ondas – Zé Ramalho)

No ano de 1986, li pela primeira vez o livro Admirável mundo novo. Escrito por Aldous Huxley em 1931, essa obra é considerada um dos clássicos da literatura do século XX. Recentemente, como parte das atividades de uma das disciplinas do curso de História da PUC-MG, revisitei a utopia distópica criada pelo escritor inglês e me chamou atenção algo que Huxley escreveu no prefácio da edição que está em minha biblioteca. Segundo ele, os totalitarismos antigos, baseados na repressão dos cassetetes e pelotões de fuzilamento, se mostraram ineficientes, sendo então um “estado totalitário verdadeiramente eficiente” aquele em que o líder máximo controlaria a população sem necessidade de coação, uma vez que seria formada por escravos amantes da servidão.

O “admirável mundo novo” narrado por Huxley, e os recentes acontecimentos observados em alguns países, me lembraram então do Discurso sobre a servidão voluntária escrito por Étienne de La Boétie e publicado após sua morte em 1563. Entre pontos importantes do Discurso destacamos dois: as crenças religiosas são frequentemente usadas para manter o povo sob dominação e obediência; e, o poder que um só homem exerce sobre os outros é ilegítimo. La Boétie também alerta que

“é o povo que se escraviza, que se decapita, que, podendo escolher entre ser livre e ser escravo, se decide pela falta de liberdade e prefere o jugo, é ele que aceita o seu mal, que o procura por todos os meios”.

Tal afirmativa me levou a alguns questionamentos: o que leva o povo a fazer tal escolha? O que pode proporcionar uma tal ilusão, capaz de entorpecer mentes que até então se acreditava serem livres?

Talvez a resposta possa ser encontrada naquilo que o sociólogo  polonês  Zygmunt Bauman denominou como “modernidade líquida”, onde as instituições estão enfraquecidas, as relações são efêmeras e prevalece o individualismo. É possível que esse conjunto de características, somado à desilusão com instituições que, em certo ponto, falharam em cumprir o papel de garantidoras da estabilidade, tenham criado o ambiente ideal para essa nova onda de servidão voluntária. Nesse contexto ocorre o surgimento daqueles que apresentam-se como outsiders, e que, sabendo fazer uso do sentimento que toma conta de parcela significativa da população, utilizam-se de discursos carregados de ódio para incitar a divisão da sociedade entre “nós e eles”, através de uma rede estruturada que coloca em prática a estratégia de disseminação da desinformação, criação de pseudo-realidades, além do apoderamento de símbolos nacionais como forma de legitimar seu atos e suas falas aos olhos e ouvidos de cidadãos mais incautos .

Em 2016, o Dicionário Oxford elegeu “pós-verdade” como a palavra do ano. De acordo com Siebert e Pereira (2020, p. 240), pós-verdade está “relacionado a circunstâncias em que os fatos influenciam menos a opinião pública do que apelos à emoção ou às crenças pessoais”. Portanto, se refere ao momento em que a verdade já não é mais importante como já foi.​ No mundo da pós-verdade valem mais as mentiras confortáveis do que as verdades inconvenientes. Se em Admirável Mundo Novo as crianças eram condicionadas durante o sono, hoje as pessoas, em suas redes sociais, passam por algo que poderíamos classificar como semelhante ao narrado na obra de Huxley, uma vez que, apesarem de estarem acordadas, são submetidas constantemente a processos de desconstrução dos fatos e de reinterpretação da realidade.

No cenário desconcertante em que grande parcela da sociedade permanece 24 horas por dia conectada em pelo menos uma das inúmeras redes sociais existentes, em que as informações – e a desinformação – são compartilhadas em segundos, passou a prevalecer a “verdade seletiva”. Vivemos tempos em que se leva em conta apenas o que convém; tempos em que o que é considerado verdade deve estar em sintonia com os interesses do que é pregado na bolha digital na qual o sujeito está inserido.

Fatos são distorcidos; provas são ignoradas; falas são reinterpretadas. Tudo pretensamente feito para o bem da família e da nação.

Nessas duas décadas iniciais do século XXI, um número considerável de atores políticos parece ter observado que Huxley provavelmente tinha razão quando escreveu como se poderia alcançar o “totalitarismo eficiente”. Assim, dedicam-se a implantar um novo modo de cooptar seguidores, desta feita sem se valerem do uso de cassetetes e pelotões de fuzilamento. Na retórica utilizada por estes personagens, o ontem trasveste-se de amanhã.

É imperativo, portanto, que as mentes livres, presentes nas forças e organizações progressistas, se levantem em defesa da Liberdade de escolhas, da Igualdade de direitos e da Fraternidade entre os homens. É nosso dever, uma vez que juramos respeitar a nossa Constituição e os Poderes constituídos, além do nosso comprometimento a trabalhar pelo bem da humanidade, nos posicionarmos contra pensamentos reacionários e negacionistas, que fazem uso daqueles que o filósofo árabe Al-Farabi chamou de servos por natureza, cooptados para desempenhar o ignóbil papel de multiplicadores de factoides, desinformação e ódio, produzidos pela máquina que sustenta os tresloucados em seus devaneios de poder. Para nós, o “novo normal” não pode se resumir a permanecer “sentado no trono de um apartamento com a boca escancarada, cheia de dentes, esperando a morte chegar” (SEIXAS, 1973).

Talvez o mundo não seja, nesses tempos atuais, tão admirável; com certeza o perigo que o ronda não é novo. Mas, continua sendo o nosso mundo, e seu futuro é nossa responsabilidade.

“Se o teu amigo vento não lhe procurar, é porque multidões ele foi arrastar.” (Eternas ondas – Zé Ramalho)

Autor: Luiz Marcelo Viegas

Texto apresentado na Academia Mineira Maçônica de Letras, em reunião realizada no dia 01/12/2020.

Nota

[1] – Trecho da letra de AmarElo, música composta por Emicida em 2019.

REFERÊNCIAS

AL-FARABI, O caminho da felicidade, 2002: p. 62-63.

AMARELO. Intérprete: Emicida; Pablo Vittar; Majur. Compositor: Emicida; Belchior. In: AMARELO. Intérprete: Emicida. Brasil: Laboratório Fantasma, 2019. CD, faixa 10.

COSTA, Ricardo. A crítica da crítica: algumas considerações sobre a resenha “Os nórdicos e a academia”, do Prof. Johnni Langer. Disponível em: https://www.ricardocosta.com/direito-de-resposta-ricardo. Acesso em: 27 nov. 2020.

CUNHA, Carolina. Zygmunt Bauman – o pensamento do sociólogo da “modernidade líquida”. 2017. Disponível em: https://vestibular.uol.com.br/resumo-das-disciplinas/atualidades/zygmunt-bauman-o-pensamento-do-sociologo-da-modernidade-liquida.htm. Acesso em: 23 nov. 2020.

ETERNAS ondas. Intérprete: Zé Ramalho. Compositor: Zé Ramalho. In: ANTOLOGIA Acústica. Intérprete: Zé Ramalho. Brasil: BMG, 1997. CD 1, faixa 7.

HANCOCK, Jaime Rubio. Dicionário Oxford dedica sua palavra do ano, ‘pós-verdade’, a Trump e Brexit. El País. 17 nov. 2016. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2016/11/16/internacional/1479308638_931299.html?rel=mas%E2%80%8B. Acesso em: 23 nov. 2020.

HUXLEY, Aldous. Admirável Mundo Novo. São Paulo: Círculo do Livro, 1986.

LA BOÉTIE, Étienne de. Discurso sobre a servidão voluntária. Disponível em: https://opontodentrocirculo.com/2020/08/09/discurso-sobre-a-servidao-voluntaria/. Acesso em: 23 nov. 2020.

OURO de tolo. Intérprete: Raul Seixas. Compositor: Raul Seixas. In: KRIG-HA, Bandolo! Intérprete: Raul Seixas. Rio de Janeiro: Philips Records, 1973. Disco vinil, faixa 11.        

SIEBERT, Silvânia; PEREIRA, Israel Vieira. A pós-verdade como acontecimento discursivo. Ling. (dis)curso, Tubarão, v. 20, n. 2, p. 239-249, ago. 2020. Disponível em: https://www.scielo.br/pdf/ld/v20n2/1982-4017-ld-20-02-239.pdf. Acesso em: 23 nov. 2020.

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Revisitando o “Admirável Mundo Novo”

“Um Estado totalitário verdadeiramente eficiente seria aquele em que os chefes políticos de um Poder executivo todo-poderoso e seu exército de administradores controlassem uma população de escravos que não tivessem de ser coagidos porque amariam sua servidão. Fazer com que eles a amem é a tarefa confiada, nos Estados totalitários de hoje, aos ministérios de propaganda, diretores de jornais e professores.” – Aldous Huxley, 1946

Dentre as obras seminais na história da literatura de ficção científica no século XX,  Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley, é uma das que mais merece ser revisitada. Marco não apenas do sci-fi como gênero literário, mas de toda a literatura inglesa do século XX, centra-se na descrição de um Estado aparentemente utópico: uma Civilização de tecnologia ultra avançada, que se gaba de suas proezas de engenharia genética, estabilidade social, condicionamento neopavloviano do comportamento, divertimentos eletrônicos multimídia e paraísos artificiais disponíveis com a ingestão de poucos gramas de soma (“dez centímetro cubículos vencem mil pensamentos lúgubres”, escreve Huxley descrevendo a wonderdrug da época).

O estilo de sci-fi nesta obra de Huxley é inteiramente terreno: não há aliens, nem OVNIs, nem colonização de outros planetas. As estrelas distantes mal aparecem na trama. Trata-se, para Huxley, de imaginar o futuro da Terra, tentando prever  alguns dos perigos que nos ameaçam, mas também refletir sobre potenciais e esperanças que o presente encerra em seu ventre grávido de futuros. Trata-se, antes de mais nada, de fazer soarem os alarmes e denunciar os perigos de uma Utopia pretensamente tão bela, mas que revela uma podridão em seu âmago.

A Utopia, em Brave New World, é mais vilã do que mocinha. A epígrafe, de autoria do filósofo russo Nicolas Berdiaeff, lança-nos a um estranho problema em relação à utopia: “Comment éviter leur reálisation définitive?” (“Como evitar sua realização definitiva?”). Ou seja: evitar a utopia, ao invés de abraçá-la, passa a ser o ideal.

Huxley, como quem arranca um Véu de Maya que encobria os olhos da Utopia, cegando-a para sua própria obscenidade e terror, realiza em Brave New World uma distopia – ou seja, uma inversão da utopia, quase que uma Nietzschiana “reviravolta de todos os valores”. O que é cultuado como ídolo sofre a revolução que o torna desdenhável como um cisco no olho, impeditivo da lúcida visão. O adorável mundo novo revela-se como um grotesco escândalo para o Selvagem que é triturado por suas engrenagens grotescas. O romance de Huxley, portanto, longe de ser uma celebração entusiástica do “utopismo”, é uma denúncia satírica dos perigos que se escondem nas tentativas humanas de criar sociedades perfeitas.

Huxley parece querer nos mostrar que sempre há um certo descompasso entre o desenvolvimento tecnológico e a antiquíssima confusão, indecisão e discórdia humanas quanto aos sentidos-da-vida. Não há unanimidade entre a humanidade sobre qual seria o “Objetivo Último” dela mesma.

Uns isolam-se em eremitérios na mata, procurando por sabe-se lá que epifanias místicas, enquanto outros tornam-se homens-de-multidão, animais-de-manada, incapazes de suportar um grama que seja de solidão… Enquanto uns vão a missa e se mortificam, outros enchem a cara e caem na esbórnia; uns entram para mosteiros, outro viram militantes políticos; uns são carnívoros inveterados, outros vegetarianos convictos; há monogâmicos, adúlteros, polígamos, pedófilos, orgiásticos, perversos, celibatários, indecisos; há apolíneos, dionisíacos, socráticos, epicuristas, estoicos, pirrônicos, marxistas, nazis, céticos, agnósticos, fanáticos…

Uma utopia intenta acabar com a imperfeição de tudo o que é humano e instaurar uma sociedade homogênea, harmoniosa, em paz consigo mesma. O “estado” que a Utopia aspira a instaurar no Real consiste num estado de estabilidade, equilíbrio, estase. 

Uma vez concretizada a utopia, é como se as rodas da História cessassem de girar, como se a sociedade atingisse um ponto ótimo a partir do qual pode abandonar-se calmamente às delícias da inércia.

Em Admirável Mundo Novo, Huxley pinta o retrato de uma sociedade utópica onde “homens e mulheres padronizados, em grupos uniformes”, saem dos frascos das incubadoras e laboratórios de eugenia absolutamente idênticos uns aos outros, produzidos em série como bichos-de-pelúcia ou automóveis.

A perversidade do sistema econômico é escancarada por Huxley: as castas inferiores, os Ípsilons, são literalmente criados em laboratório e têm seus fetos judiados por procedimentos malignos: seus embriões recebem injeções de álcool e outras substâncias desestabilizantes, a fim de que nasçam semi-aleijados, com retardamentos mentais, crippled for life. “Quanto mais baixa é a casta… menos oxigênio se dá.” (p. 42). “Todo o pessoal de uma pequena usina constituído pelos produtos de um único ovo bokanovskizado”: “o princípio da produção em série aplicado enfim à biologia”! (p. 32)

Já os ministérios desta sociedade – como os da Predestinação Social e do Condicionamento Emocional… – são todos centrados em eliminar da vida social o imprevisível, programar corações e mentes para que ajam sempre da maneira desejável, sem indesejáveis desvios de conduta. Em Brave New World vigora o Império da Normopatia: os normais têm direitos de imperadores diante dos destoantes, dos anormais, dos desviantes, dos transviados, dos indivíduos demasiado… individualizados.

A utopia quer que cada indivíduo seja uma peça intercambiável de uma maquinaria social maior que ele; e uma peça que, ao quebrar, pode ser facilmente substituída por outra. Esta utopia deseja homens que ajam como abelhas na colmeia, formigas num formigueiro. E além do mais esforça-se para que… amemos nossa servidão, nosso sacrifício, nossa autoimolação nos altares do coletivo!

Que uma norma-de-conduta, imposta pelos poderosos de cima para baixo, seja aceita por toda uma sociedade… eis o sonho utópico cuja tentativa de edificação já fez nascerem tantos totalitarismos. O reinado da Utopia é um Absolutismo Moral. E absolutistas morais podem ser tanto os crentes quanto os ateus: de Hitler a Stálin, os utopistas muitas vezes derramam o sangue dos vivos em nome dos amanhãs cantantes. Se o fim da supremacia racial ariana pondo sob seu domínio toda a Europa, ou se o fim da abolição da sociedade cindida em classes em prol do comunismo-de-Estado, servem como justificação absoluta para a utilização de todos os meios, as estradas estão abertas para as barbáries mais atrozes…

Huxley também nos narra um obsceno sequestro da infância para fins de lavagem cerebral e programação comportamental. Ao invés de leite materno, os bebês bebem uma “secreção pasteurizada” (p. 232). Ao invés de crescerem no ventre das mães, amadurecem na penumbra subterrânea de um laboratório científico, dentro de frascos, rolando linha-de-montagem abaixo na industriosa fábrica-da-vida. Ao invés de irem à escola, vão ao centro de Condicionamento, onde são soterrados debaixo da repetição de slogans e programas-de-comportamento que visam a regular, controlar e submeter o trabalho e o lazer, a moral e a sexualidade, o misticismo e a criação.

A sociedade que nasce disto é uma em que os cidadãos foram ensinados a crer que “não há crime mais odioso do que a falta de ortodoxia na conduta” (p. 233). Morte à imprevisibilidade e à experimentação lúdica! Seguir em trilhos de ferro com o trem de opiniões tão convictas que nenhum vento de argumento as abale.

Não há respeito pela diferença nesta sociedade: tudo que foge à normalidade, qualquer um que recuse-se a vestir o uniforme, que não queira “fazer como faz todo mundo”, que se negue a ser uma “mariazinha-vai-com-as-outras”, que se revolte contra seu destino de “animal de rebanho”, como diria Nietzsche, este é estigmatizado e perseguido pelos poderes sacerdotais e políticos que gerem esta República da Homogeneidade.

Bernard Marx, no livro de Huxley, é condenado ao exílio na Islândia, tratado como um pária e um subversor (p. 234), por ousar destoar da normalidade civilizada. É ele uma espécie de homenagem de Huxley a estas figuras heroicas que ousam “desafinar o coro dos contentes”, para relembrar um verso de Torquato Neto, através da afirmação de uma individualidade, por mais imperfeita e dissonante que soe.

Em prol da estabilidade social, ou seja, para que não surjam desníveis entre os indivíduos, o Estado proclama uma lei que… proíbe Shakespeare! Que bane Beethoven! Que lança a filosofia na lata de lixo da História! De agora em diante, só se ensinará nas escolas, e só se doutrinará na mídia, sobre assuntos que dizem diretamente respeito à utopia da Estabilidade! Tudo será dito e tudo será feito em nome desta estabilização…

“Não se podia permitir que pessoas de casta inferior desperdiçassem o tempo da Comunidade com livros e que havia sempre o perigo de lerem coisas que provocassem o indesejável descondicionamento de algum dos seus reflexos.” (p. 55)

O condicionamento neo-pavloviano, os ovos bokanovizados, a hipnopedia, a ração diária de soma, a garantia de deleites sensórios no Cinema Sensível, tudo são torrões de açúcar dados pelo Estado para que cada casta sinta-se feliz com o status quo que lhe foi… predestinado.

“A flor do campo e as paisagens têm um grave defeito: são gratuitas. O amor à natureza não estimula a atividade de nenhuma fábrica. Decidiu-se que era preciso aboli-lo, pelo menos nas classes baixas: abolir o amor à natureza…” (p. 56)

“Cada um pertence a todos…” Esta é outra das doutrina enfiada na mente de todas as crianças, repetida milhares de vezes nos ouvidos das mentes hipnotizadas dos fedelhos, como se fosse a verdade absoluta e última sobre a afetividade e a sexualidade humanas: “ninguém é dono de ninguém!” Huxley problematiza (e isso umas três décadas antes do Movimento Hippie começar a despontar!) a questão do amor supostamente livre que estaria na ausência completa de vínculos duráveis.

” – Felizes jovens! – disse o Administrador. – Nenhum trabalho foi poupado para lhes tornar a vida emocionalmente fácil, para os preservar, tanto quanto possível, até mesmo de ter emoções.” (p. 85)

Brave New World contêm a descrição de baladas daquelas no Mundo do Futuro: regadas à embriaguez ocasionado pelo soma, que talvez não seja lá muito diferente daquela que o ecstasy ocasiona aos ravers de hoje em dia, estas baladas são orgias de pisoteação do dogma destronado, pisoteado e posto fora-de-cartaz do casamento monogâmico. Esta instituição social desapareceu por completo deste Admirável Mundo Novo onde as crianças não nascem mais de uma noite-de-amor entre seu pai e sua mãe, mas sim enfrascadas em provetas, desenvolvidas tubos de ensaio, rolando nos trilhos de ferro de uma linha-de-montagem… Huxley e seu pesadelo sinistro!

Pois nada desestabiliza mais uma sociedade humana dos que as paixões destas criaturas passionais que somos. Não são necessariamente assim inquietas as forças vitais, não é essencialmente móvel élan que nos anima? E os utopistas sonham com um coração em descanso. Com uma paz de impossível remanso. Que a correnteza não mais nos arrastasse, que paixões não mais nos inundassem, que tudo quedasse… estável e sereno. Sem correria nem esforço, sem insatisfação nem desejo. “No alarms and no surprises”, como canta Thom Yorke. Um coletivo em Nirvana.

O triste na condição existencial dos Alfas, Betas, Deltas, Gamas e Ípsilons de Huxley é que nenhum deles “podia ter ideias verdadeiramente singulares”. Seus cérebros foram cuidadosamente construídos e programados no sentido da obediência estrita a regras, padrões de comportamento, fés inquestionadas. E se há algo de heroico em Bernard Marx e seu amigo Helmholtz, está no fato de que eles “recusavam-se a abandonar o direito de criticar essa ordem” (p. 246).

Muitos dos males que hoje são presenças prementes em nossa realidade, como a obsolescência programada, já eram prefigurados por Huxley nesta sociedade que imaginou como descartando sem fim. A prática do descartismo é descritível na imagem de pessoas, em massa, jogando meias no lixo ao primeiro desfiado, condicionadas a seguir como preceito-de-vida que “mais vale dar fim que consertar” (p. 95).

Como atingir esta beatitude política que a Utopia encerra em sua imagem idealizada? Doutrinação ideológica, desde o berço; condicionamento severo de condutas; muita disciplina social e muito controle; eis aí os caminhos para a concretização do estado utópico! Que cidadão ousará discordar da veracidade absoluta de um slogan que lhe foi martelado na consciência 62 milhões de vezes?

Um tal papaguear ideológico é capaz de reduzir um cérebro mirim a uma papa de imbecilidade. 

Brave New World é o retrato de uma sociedade de submissos imbecis que sorriem tolamente dentro de uma sociedade de castas altamente injusta e hierarquizada. Uma sociedade que não se revoluciona pois todo mundo está tão dopado e reduzido à apatia normopata que não há disposição para a luta, para a mudança, a tentativa de novas vias.

Aqueles que buscam trilhar novas vias, ou que são arrastados, a despeito de si mesmos, para caminhos interditos e conclusões proibidas, são tratadas pelos Poderes Reinantes como perigosos párias que merecem ser mandados para uma ilha na Islândia… O stalinismo exilando oponentes políticos para a Sibéria é um exemplo histórico suficiente para mostrar o quanto Huxley, em sua obra de ficção científica, teve refinadíssima percepção da realidade histórica (inclusive em seus desdobramentos futuros)! Talvez por isso Admirável Mundo Novo seja uma obra literária à qual tão bem cabe o adjetivo honroso de visionária e que, escrita em 1930, segue nos provocando às vésperas de 2030!

Esta obra-prima na literatura do século 20 nos serve como permanente alerta sobre perigos que rondam a Humanidade prometeica que busca, através da intervenção técnico-científica, construir uma utopia com a utilização da eugenia, das drogas estupefacientes e do controle social hierárquico rígido. Politicamente, é uma denúncia do que hoje se conhece por Estado Totalitário, mas sobretudo uma cautionary tale a respeito das atrocidades inerentes a um sistema de castas rigidamente separadas pela sua própria produção tecnobiológica – neste sentido, pode entrar em diálogo fecundo com toda a problemática dos androides, que na obra de Philip K. Dick adaptada ao cinema por Ridley Scott, revoltam-se contra seus criadores por julgarem insuportável seu destino como escravos-de-casta.

Além de provar que a ficção científica está apta a refletir sobre os rumos e descaminhos da Humanidade, pintando retratos de outros mundos possíveis onde nossa espécie se afunda em abissais poços de confusão e ignorância, angústia e guerra, domínio totalitário e opressão generalizada, tornando o indivíduo uma espécie de joguete de forças maiores desde “seu primeiro vagido de horror e espanto” (p. 231).

Autor: Eduardo Carli De Moraes

Fonte: A Casa de Vidro

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Que caminhos a Maçonaria pode tomar?

Qual caminho a seguir?! - Jotônio Vianna

Estamos no limiar de 2020, um ano atípico, mas que vai ficando, a cada dia, normal, ou seja, típico, ao contrário do que se poderia imaginar há um ano apenas.

Nesse período nos refugiamos nas “lives” que se tornaram uma tremenda escola de Maçonaria para alguns que nunca tinham recebido uma carga de informações e conhecimentos tão grande em tão pouco tempo. Anos de Loja sem aprender absolutamente nada, porque não tinha quem desse uma boa palestra e tivesse algo de bom para ensinar. Por outro lado, muitos já estão saturados de tanta “live” por aí. Por preguiça mesmo, ou excesso de oportunidades.

É fato que elas ajudam muito, mas precisamos observar bem os temas e palestrantes para ver se são adequadas, principalmente a Aprendizes e Companheiros, Essa é uma tarefa dos Vigilantes e do Venerável, verificar se será um tema útil aos mais novos de Loja, por exemplo, podendo mais confundir do que explicar. Quando Mestre, ok, tem o direito e dever de conhecer de tudo, mas aí, estará mais expert para decidir.

Na verdade, esses palestrantes, mestres preparados geralmente, estavam lá o tempo todo, nas colunas das Lojas, mas ninguém sabia extrair o seu conhecimento para o bem comum porque as Lojas teimam em fazer só o ritual, algum ameaço de prece, alguns discursos vazios e correm para o ágape (copo d’água tradicional em algumas regiões).

Assim matam duas coelhas com uma cajadada, substituem a missa da semana porque já viram a Bíblia no meio do templo e recebem o alvará da cunhada para tomar aquela geladinha com os “manos”. E esses são os que ficam, porque muitos saem depois de algum tempo de muito, praticamente nada. Há muitos bons irmãos nas Lojas calados, por força de uma rotina insensata de não se fazer nada além de cumprir o ritual e perde-se qualidade a cada dia de silêncio no Período de Estudos.

Temos alertado sobre essa dinâmica vazia, a falta de uma boa pauta das Lojas nos últimos anos, agora até se explica, em parte, por causa da pandemia, mas o problema é antigo. Volta-se a insistir nesse tema, sobre a Maçonaria do Século XXI, que temos abordado em algumas palestras dadas também, porque, necessariamente, as Lojas maçônicas de todo o mundo, creio, mais precisamente no Brasil, precisam encontrar seu rumo, um Norte, ou um Oriente, se preferirem, e tomar esse caminho de imediato, ou, estaremos empurrando a Instituição para o buraco da decadência, de uma vez. Fim de linha em pouco tempo.

Porque não adianta ter um nome de “Maçonaria” e ser apenas uma sociedade de velhos chatos ou dorminhocos que não fazem ela cumprir sua missão, que é de reformar os homens, dando-lhes, à luz da Razão, o simbolismo das virtudes e do combate incessante aos vícios morais, depois disso, como exemplares cidadãos, participarmos ativamente das questões sociais que a circulam, com seus membros atuando positivamente, dando exemplos daquelas virtudes, através de ações beneficentes, sociais, políticas, em sentido amplo, enfim, tudo aquilo que será herdado pelos nossos familiares e pela nossa comunidade.

Difícil enxergar isso como a missão precípua da Maçonaria? Não há que se falar em entidade filantrópica como se fosse uma fabrica de esmolas, porque nesse sentido, perdemos feio de qualquer igreja. Não há que se falar, embora seja primordial, em sociedade filosófica, porque ninguém quase estuda filosofia ou outras ciências sociais.

Mas deveríamos, e muito. Porque é com a filosofia e outras ciências sociais que aprendemos a conhecer e lidar com o ser humano que nos circunda, como vivermos, que linha de pensamento termos, nossas ansiedades e necessidades. Se somos construtores da sociedade, temos que conhecer a nossa matéria prima, o ser humano.

Como tomar novos rumos e atingir esses objetivos? Claro que cada Loja deve encontrar seu caminho, mas algumas sugestões, podem ser lançadas na mesa. De que adianta criticar, sem apresentar soluções ou propostas de soluções?

A ideia é formar, em cada Loja, um centro de união de pessoas bem intencionadas, que queiram, primeiramente, estudar o simbolismo maçônico, sem se preocupar tanto com a ritualística, porque essa se aprende rapidamente, basta ler e cumprir fielmente seu ritual, e como somos inteligentes, não precisamos mais que três sessões para decorar os movimentos.

Outra coisa, não se preocupar tanto com a crença religiosa do candidato, isso é besteira, qualquer um pode mentir sobre crenças e ninguém pode contestar, mas se preocupar muito com a “folha corrida” do candidato. Moral é fundamental e precisamos saber com quem estamos lidando. Um sujeito com moral elevada, será sempre um bom irmão.

Outras condições são fundamentais para o sucesso do maçom, como a situação intelectual, porque o maçom não pode ser ignorante, tem que ter um excelente nível de compreensão do simbolismo, tem que ler e entender o texto de rituais e livros. A condição econômica também é importante, ou seja, para se manter na ordem sem dar prejuízos a ninguém e ainda poder contribuir em eventuais auxílios a irmãos e profanos.

As Lojas precisam se transformar também em salas de aula, literalmente, usando sua Ordem do Dia de forma inteligente e útil, com 80% dela para palestras e debates, além da apresentação de trabalhos dos irmãos da Loja. Com esses debates que se aprende muito e troca-se conhecimento. O Período de Estudos não pode se resumir a 15 minutos, mas deve ter, pelo menos, uma hora. É o mínimo. Em todas as sessões um Mestre deve propor um tema, apresentar uma peça e dela gerar perguntas e respostas, ou um debate organizado, onde opiniões e experiências devam ser expostos.

Assim, a sessão começa a ficar mais interessante, embora muitos irão reclamar do tempo. Mas esses são os que, geralmente, nada produzem e ainda querem atrapalhar os outros, querem comer, beber ou ir para casa mais cedo. São pesos mortos na Loja. Devem ser marcados e afastados se não querem participar do empreendimento.

Por outro lado, cada Loja deve assumir um trabalho social organizado, se possível com participação de cunhadas e sobrinhos, não só para eles fazerem e a Loja patrocinar, mas sim, todos se envolverem, como um orfanato, asilo, escola profissional ou de artes (música, dança, etc.). Com esse trabalho social e a utilidade da sessão trazendo mais conhecimento, haverá um expurgo dos preguiçosos em pouco tempo, mas outros que clamam por atividades, se aproximarão, acordarão do marasmo em que vivem e serão obreiros proativos. É certo que essa Loja, mantendo esse caminho, vai fazer sucesso porque seus irmãos estarão congregados em objetivos comuns, não se sentirão inúteis, ao contrário, como participes de uma sociedade em constante evolução.

É preciso que passemos por transformações internas, todos nós, abrindo mão de opiniões e posições inflexíveis, mudarmos em sentido positivo, avançarmos nas nossas ideais, sermos evolucionistas, de fato. Acabar com preconceitos de toda a espécie, sem deixarmos de ser nós mesmos, sem abrir mão de nossa personalidade, mas tudo pode ser debatido e acordado sem radicalismo, aproximando cada vez mais as ideias de uns e outros.

Tolerância é o remédio, no sentido de aceitar a possibilidade do próximo poder pensar diferente, das pessoas terem conhecimento relativo de algum tema e podermos nos abastecer desse conhecimento uns com os outros até chegarmos a um ponto comum. Impossível isso? Impossível uma convivência pacífica havendo discordância de pontos de vista dentro de uma ordem calcada no amor fraternal, tendo como divisa Liberdade, Igualdade e Fraternidade?

Não pode ser, como tem sido, um antro de discórdias e radicalismos, brigas políticas, tal qual o mundo profano a quem pretendemos dar exemplo. Temos que receber a todos, homens de qualquer espécie, gênero ou raça, cor, crença, etc., até que se abram as portas para as mulheres, e esse dia vai chegar, sabemos, com aval de ingleses inclusive. Basta que seja um ser de boa vontade e se preocupe com a evolução e progresso humano. Queremos pessoas boas, de princípios e objetivos.

Nós não precisamos de rótulos e marcas, de estereótipos, precisamos de inteligências para podermos fazer algo de grande pela humanidade. Pouco importa quem seja a pessoa que esteja na coluna, o que importa é que ela some pensamentos e esforços físicos para essa construção social da qual tanto falamos.

Hoje somos pedreiros com uma imensa obra em atraso e prazo se esgotando para entregarmos. Não podemos abrir mão dos bons artífices, temos que dispensar os maus obreiros e contratar novos com bom históricos e formá-los grandes profissionais. Assim a obra chegará ao seu final com a beleza esperada e no prazo determinado.

Mãos à obra!

Autor: Marco Piva

Fonte: Revista BIBLIOT3CA

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O aprendizado dos valores maçônicos em Loja

Educação e Aprendizado Psicólogo Educação Infantil

Faça da disciplina um lema, da dedicação uma bandeira e da paixão pelo trabalho um exemplo (comercial Ayrton Senna).

Desde sua estruturação iniciada na primeira metade do século XVIII, a Maçonaria vem defendendo princípios e valores morais, posicionando-se politicamente e identificando-se com causas nobres, lutas sociais e movimentos cívicos, revolucionários e libertários, que a fizeram prosperar até nossos dias, sempre combatendo a intolerância, os preconceitos, a ignorância, os privilégios e defendendo ideias inovadoras.

Ao longo de sua trajetória, a Maçonaria procurou atuar no sentido de educar seus obreiros para serem pessoas de uma convivência saudável, com sólida formação de espírito de luta para a busca do aperfeiçoamento individual e social.

E, para manter a conduta moral exigida pela Ordem, o obreiro deve exercer o domínio das paixões, reconhecer e corrigir defeitos, cultuar a inteligência e por em prática os rigorosos ensinamentos colocados à sua disposição.

Esse aprendizado se inspira na Ética Maçônica que, mais do que um simples dever, fundamenta suas ações nos conceitos de liberdade, igualdade e de fraternidade, em busca da concretização dos valores e regras morais inscritos em seus rituais e regulamentos, orientando a conduta de seus obreiros com ênfase na solidariedade humana e na justiça, em toda a sua plenitude.

Nesse sentido, o trabalho da Maçonaria em Loja visa a aprimorar o caráter de seus membros e a promover reflexões sobre a espiritualidade e elevação do nível de consciência e convivência irrestrita e fraternal, de forma que seja aperfeiçoada a capacidade de raciocínio e que os obreiros possam agir no mundo profano como construtores sociais aptos a influenciar a opinião pública e provocar mudanças qualitativas nas atitudes das pessoas, despertando a lucidez e mostrando a realidade, fomentando a importância de bons exemplos.

Para cumprir esse desiderato, o aprendizado dos valores maçônicos em Loja é proporcionado a partir de reflexões sobre o conteúdo das Instruções, Rituais, Constituição, Regulamento Geral, que pressupõem o autodesenvolvimento como processo contínuo, envolvendo aspectos éticos, morais, espirituais, culturais e sociais, onde tudo é harmonizado pelo esforço individual do obreiro e pelos princípios norteadores da filosofia maçônica, de forma livre, que não dita regras nem o ritmo, tornando o maçom o mestre de si mesmo, onde o seu maior símbolo é o autoconhecimento.

Como resultado desses ensinamentos, vislumbra-se o impulsionamento da capacidade de pensar e a prática de virtudes e de ações concretas no mundo profano, de forma transformadora, forjando um cidadão consciente que procura fazer tudo de forma justa para promoção do bem e para tornar feliz a coletividade, como consequência do seu aperfeiçoamento pessoal e influência na sua esfera de relacionamentos, com o reconhecimento de todos os que o rodeiam. A convivência com esse maçom aprimorado torna-se uma experiência prazerosa e inspiradora com efeito multiplicador incomensurável.

Com o propósito de perenizar esse valor e colher frutos sempre saborosos, temos no cotidiano de nossas Lojas exemplos daquelas que são bem geridas, disciplinadas na ritualística, ricas nas atividades e que observam o cumprimento das regras e fundamentos da Ordem, sendo bem reputadas e objeto de visitas constantes de irmãos de outras Oficinas, que procuram se inspirar para melhorar o desempenho, praticando o tradicional método do benchmarking, comparando ações, avaliando a gestão e clima de convivência.

Naqueles casos de amor à primeira vista, muitos obreiros impedidos de chegar ao ótimo individual em suas Lojas de origem, aí incluídos iniciados recentes, e munidos de coragem e em busca de desafios, partem para o pedido de transferência, vislumbrando a possibilidade de aprimoramento pessoal. Talvez seja prematuro especular, mas no retorno de nossas atividades presenciais, após esse período de pandemia, muitas mudanças poderão ocorrer, em especial naquelas Lojas que resistiram e não organizaram reuniões virtuais, fragilizando o culto aos valores vinculados aos laços fraternais e de estudos.

Dentre as Lojas que não conseguem reter seus obreiros e sentem minguar sua força de trabalho, com o enfraquecimento de suas Colunas, o diagnóstico desagua frequentemente em deficiência no processo de gestão, quando não é dada a devida importância ao aperfeiçoamento dos obreiros, contribuindo para o desinteresse, o desencanto e a deserção de muitos irmãos, pela falta de oportunidade de treinamento, de discussões de temas relevantes e de um ritualismo vazio, um teatro repetitivo apenas para cumprir tabela. Uma Loja não consegue evoluir com o freio de mão puxado.

Ocorre que, elaborar uma análise da Maçonaria como um observador acima do bem e do mal, sem o espírito de pertencimento e de corresponsabilidade para com os destinos de nossas Lojas, independente de cargos, graus e qualidades, confortavelmente instalados em ambientes aconchegantes – em especial nesse retiro domiciliar cumprindo o distanciamento social recomendado pelas autoridades de saúde -, pode ensejar tarefa aparentemente simples. Por sua vez, apresentar críticas sobre a gestão da Loja e sugerir medidas de correção pode recair em mais do mesmo, dependendo da forma e do poder de argumentação do avaliador.

Porém, quando se pensa no que individualmente podemos fazer para contribuir para a eficácia de nossas Lojas, para a efetiva aplicação dos valores maçônicos, aí o bicho pega. É o velho dilema de enfrentar o questionamento de que conseguimos avaliar e dar bons conselhos para os outros, mas não o conseguimos para nós mesmos, causando certo desconforto. É o conhecido “Paradoxo de Salomão”, uma situação em que temos bons argumentos para resolver os problemas dos outros e dificuldades em solucionar os nossos pessoais.

Dar apenas uma opinião, de longe é o melhor. A alternativa de argumentar que a Loja está com um projeto em discussão (eterna) ou ainda está colhendo sugestões é a melhor das desculpas. Quantas já superaram essa fase e já estão agindo efetivamente? O mundo lá fora continuará aguardando nossas providências? Como ficam os valores que cultuamos e a nossa credibilidade, em especial junto aos novos iniciados “ainda” cheios de esperanças?

O que não falta em nossas Lojas são manifestações do tipo: “já falei várias vezes e já dei diversos conselhos, mas ninguém prestou atenção!”, ou então a conclusiva e desanimadora: “minhas palavras foram levadas pelo vento, doravante não falo mais nada”, e por aí vai. De forma inapropriada, ouve-se nos átrios de distantes Potências comentários do tipo “eu faria diferente…”, característico dos “engenheiros de obras feitas” ou a “fácil sabedoria ex-post”. Onde estaria esse sabichão da Ordem na hora de fazer o que seria o certo?

Em muitas oportunidades, a eventual sugestão ocorreu de forma atabalhoada, carregada de emoções, em situações em que o obreiro atravessa a ritualística e quebra a harmonia dos trabalhos com comentários paralelos, julgando-se senhor do certo e do errado. Outros apontam deslizes de forma abrupta, como se donos fossem, com ar professoral e recorrendo à condição de “fundadores”, usurpando função dos titulares responsáveis, quando não reclamam de uma determinada circunstância, falando fora de hora e invocando “questão de ordem”, funcionando, enfim, como um antimodelo. Que valor estaria faltando?

Em tempos reuniões em videoconferências e de redes sociais agitadas como uma tormenta de verão, grupos de WhatsApp se transformam em verdadeiras Oficinas de trabalho, com total descumprimento das recomendações de que determinados assuntos fiquem restritos a sessões ritualísticas e que existe uma “Bolsa de Propostas e Informações” continuamente preparada e ávida para receber pranchas bem fundamentadas, com contribuições de todos e de que existe uma forma protocolar de encaminhamento. Continua faltando algo!

Precisamos adotar uma postura diferenciada e acolher a Maçonaria, em especial a nossa Loja, como um patrimônio, um valor pessoal, um tesouro a ser administrado, conservado, aprimorado e desfrutado com muito carinho, não apenas delegando ao Venerável e aos Vigilantes a responsabilidade para tal.

Torna-se imprescindível colocarmo-nos no lugar deles e ver os problemas de nossas Lojas de uma perspectiva diferente, pois o legado dos irmãos que nos antecederam precisa ser honrado e somos os únicos que poderão dar continuidade à obra e deixar nossa marca para as gerações que irão nos suceder, em especial a Geração “Z”, ocupando ou não um “cargo” de destaque[1].

Afinal, somos uma família ou não? Estamos apenas em busca de proveito pessoal ou para posarmos de “pavões misteriosos”? Somos agora apenas figuras carimbadas em lives maçônicas, tipo políticos em campanha em busca de projeção “nacional”, participando simultaneamente de vários eventos, apenas para marcar presença? Estamos efetivamente sintonizados com os valores maçônicos e prestigiando as atividades de nossas Lojas-mãe? Para melhor compreender e aprofundar a reflexão é aconselhável substituir o pronome “nós” pelo “eu” e aí a situação se complica. O que “eu” preciso fazer?

Nesse contexto, fica claro que o problema se circunscreve à seara da disciplina em Loja ou mesmo nas atuais videoconferências maçônicas. Ah, disciplina! É isso! Nunca é demais relembrar que, em termos gerais, o termo disciplina é definido nos principais dicionários como um conjunto de regras ou ordens que regem a conduta de uma pessoa ou coletividade ou aquelas destinadas a manter a boa ordem em qualquer assembleia ou corporação. A boa ordem, portanto, é presumida na observância e submissão ou respeito a um determinado regulamento que, no nosso caso, é precedido de um juramento de honra, um valor a ser preservado. É novidade?

Aplicada ao nosso dia a dia, a disciplina enseja conduta pautada por padrões éticos independentes de normas e regulamentos, envolvendo respeito e limites a serem observados, sob pena de gerar conflitos e dissabores. Aprendemos, desde criança, que respeito é um valor inestimável e, para conseguir realizar um objetivo, precisamos seguir regras e procedimentos disciplinares.

Nesse sentido, se sobressai o zelo que devemos ter em nossas Lojas para não nos deixarmos levar pela vaidade e arroubos de poder ao incentivar ou promover alterações desfigurativas em nossos Rituais ao arrepio dos Protocolos vigentes, dando provas inequívocas de arrogância e de falta de disciplina. As reuniões maçônicas têm o condão de despertar a importância da disciplina, como fator de educação, para que possamos encarar os desafios da vida. Esse valor nos é ensinado e temos boas referências de normativos a orientar nossas ações.

A autodisciplina é uma habilidade que requer consciência crítica e capacidade de observação amparada por procedimentos e hábitos que nos impomos com alguma finalidade. Então, sabemos o que fazer. É uma questão de atitude. A avaliação que precisamos enfrentar é: sou um apático, um reclamão nervosinho ou apenas um irmão bacana, oportunista, bom de retórica e em busca de projeção pessoal? Como “eu” posso contribuir para a Loja que me acolheu com tanto carinho?

Tratando-se de perenidade das instituições, 300 anos não é pouco, mas pode não ser suficiente para garantir outro período semelhante. Excetuando-se o Brasil, no mundo a Maçonaria está encolhendo em número de obreiros, mas ainda desfruta de bons motivos e um extenso legado a comemorar e não se pode deixar de dar destaque aos irmãos que defendem os valores ensinados pela Ordem e fazem-na respeitada e reconhecida, e que são a maioria. Por tudo isso, pergunto aos meus botões: isso se aplica a mim ou não?

Enfim, nunca é demais repetir e enfatizar que

a missão do Mestre no exercício da sua plenitude é transmitir aquilo que aprendeu, compartilhar informações e experiências, dar o exemplo, respeitar a ritualística, honrar o compromisso de ser um facilitador para os estudos dos novos Aprendizes e Companheiros, para que os mesmos sejam melhores do que aqueles que os treinaram.

O Maçom de valor (de raiz) é presente, incentivador, colaborativo, partícipe e disciplinado[2].

A disciplina é a mãe do êxito (Ésquilo).

Autor: Márcio dos Santos Gomes

Márcio é Mestre Instalado da Loja Maçônica Águia das Alterosas – 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte. Membro da Escola Maçônica Mestre Antônio Augusto Alves D’Almeida e da Academia Mineira Maçônica de Letras.

Notas

[1] – Ver artigo “Maçonaria e Geração ‘Z’ Pós-pandemia”. disponível em: https://opontodentrocirculo.com/2020/08/26/maconaria-e-geracao-z-pos-pandemia/.

[2] – Ver artigo “Plenitude Maçônica”, disponível em: https://opontodentrodocirculo.wordpress.com/2018/12/13/plenitude-maconica/.

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Zygmunt Bauman, o pensamento do sociólogo da “modernidade líquida”

Modernidade Líquida para política e religião - Expresso IlustradoExpresso  Ilustrado

Pontos-chave

  • A modernidade imediata é “líquida” e “veloz”, mais dinâmica que a modernidade “sólida” que suplantou. A passagem de uma a outra acarretou profundas mudanças em todos os aspectos da vida humana. A modernidade líquida seria “um mundo repleto de sinais confusos, propenso a mudar com rapidez e de forma imprevisível”.
  • Na sociedade contemporânea, emergem o individualismo, a fluidez e a efemeridade das relações.

“Vivemos em tempos líquidos. Nada foi feito para durar.”

Essa é uma das frases mais famosas do sociólogo polonês Zygmunt Bauman, falecido em janeiro de 2017, aos 91 anos. Ele deixou uma obra volumosa, com mais de 50 livros, e é considerado um dos pensadores mais importantes e populares do fim do século 20.

Bauman é um dos expoentes da chamada “sociologia humanística” e dedicou a vida a estudar a condição humana. Ele é visto por muitos como um teórico perspicaz e por outros como um ingênuo pessimista. Suas ideias refletem sobre a era contemporânea em temas como a sociedade de consumo, ética e valores humanos, as relações afetivas, a globalização e o papel da política.

Nascido na Polônia em 1925, Bauman serviu como militar durante a Segunda Guerra Mundial, foi militante do Partido Comunista polonês e professor da Universidade de Varsóvia. Filho de judeus, ele foi expulso da Polônia em 1968 por causa do crescente antissemitismo do Leste Europeu. Emigrou para Israel e se instalou na Inglaterra, onde desenvolveu a maior parte de sua carreira. Desde 1971 atuava como professor emérito de sociologia da Universidade de Leeds.

A modernidade sólida e a modernidade líquida

O tempo em que vivemos é chamado por muitos pensadores como “pós-modernidade”. O termo foi popularizado em 1979 pelo pensador francês Jean-François Lyotard (1924-1998). Para Lyotard, esse é o período em que todas as grandes narrativas (visões de mundo) entram em crise e os indivíduos estão livres para criar tudo novo.

Bauman não utiliza o termo pós-modernidade. Ele cunhou o conceito de “modernidade líquida” para definir o tempo presente. Escolheu a metáfora do “líquido” ou da fluidez como o principal aspecto do estado dessas mudanças. Um líquido sofre constante mudança e não conserva sua forma por muito tempo.

As formas de vida contemporânea, segundo o sociólogo polonês, se assemelham pela vulnerabilidade e fluidez, incapazes de manter a mesma identidade por muito tempo, o que reforça um estado temporário e frágil das relações sociais e dos laços humanos. Essas mudanças de perspectivas aconteceram em um ritmo intenso e vertiginoso a partir da segunda metade do século XX. Com as tecnologias, o tempo se sobrepõe ao espaço. Podemos nos movimentar sem sair do lugar. O tempo líquido permite o instantâneo e o temporário.

Em seu primeiro livro, “Mal-estar da pós-modernidade”, Bauman parodia Sigmund Freud (1856-1939), autor de “O mal-estar da civilização”. A tese freudiana é de que na idade moderna os seres humanos trocaram liberdade por segurança. O excesso de ordem, repressão e a regulação do prazer gerou um mal-estar, um sentimento de culpa.

Para Bauman,

“a modernidade sólida tinha um aspecto medonho: o espectro das botas dos soldados esmagando as faces humanas”.

Pela estabilidade do Estado, da família, do emprego ou de outras instituições, aceitava-se um determinado grau de autoritarismo. Segundo o sociólogo, a marca da pós-modernidade é a própria vontade de liberdade individual, princípio que se opõe diretamente à segurança projetada em torno de uma vida estável.

Bauman entende que na modernidade sólida os conceitos, ideias e estruturas sociais eram mais rígidos e inflexíveis. O mundo tinha mais certezas. A passagem de uma modernidade a outra acarretou mudanças em todos os aspectos da vida humana. A modernidade líquida seria

“um mundo repleto de sinais confusos, propenso a mudar com rapidez e de forma imprevisível”.

Bauman entende que a nossa sociedade teve uma maior emancipação em relação às gerações anteriores. A sensação de liberdade individual foi atingida e todos podem se considerar mais livres para agir conforme seus desejos. Mas essa liberdade não garante necessariamente um estado de satisfação. Ela também exige uma responsabilidade por esses atos e joga aos indivíduos a responsabilidade pelos seus problemas.

Na sociedade contemporânea emergem o individualismo, a fluidez e a efemeridade das relações. Se a busca da felicidade se torna estritamente individual, criamos uma ansiedade para tê-la, pois acreditamos que ela só depende de nós mesmos. Para Bauman, somos impulsionados pelo desejo, um querer constante que busca novas formas de realizações, experiências e valores. O prazer é algo desejado e como ele é uma sensação passageira, requer um estímulo contínuo.

À medida que o futuro se torna incerto, o sentimento coletivo dominante é que se deve viver o momento presente e exclusivamente para si. Dessa instabilidade e ausência de perspectiva também nasce uma angústia. A incerteza diante do futuro pode explicar o aumento do uso de antidepressivos e a intensa busca por entretenimento como formas de afastar essa sensação.

Em muitos casos, essa angústia resulta na paralisia da ação, na incapacidade de agir. Ao lidar com uma insegurança, muitas vezes o indivíduo se recusa a assumir responsabilidades ou assume o discurso do “eu não gosto de tomar decisões”. Somos livres, mas não conseguimos transformar o mundo – temos um sentimento de impotência. Em outros casos, essa frustração pode gerar um ódio intenso a tudo e a todos. Em entrevista ao jornal argentino Clarín, Bauman declarou:

“Escolhi chamar de ‘modernidade líquida’ a crescente convicção de que a mudança é a única coisa permanente e a incerteza a única certeza.”

Bauman entende a crise como sendo um tempo em que o velho já se foi, mas o novo não tem forma ainda. Em entrevista ao jornal italiano Il Messaggero, o sociólogo sinaliza que buscamos um estado de maior solidez.

“Ainda estamos em uma sociedade líquida, mas em que nascem sonhos de uma sociedade menos líquida.”

A sociedade do consumo

Bauman observa que o século 20 sofreu uma passagem da sociedade de produção para a sociedade de consumo. Isso não significa que não exista uma produção, mas que o sentido do ato de consumir ganhou outro patamar.

Se as grandes ideologias, alicerces e instituições se tornaram instáveis, o consumo se tornou um elemento central na formação da identidade. Muito além da satisfação de necessidades, consumir passa a ter um peso primordial na construção das personalidades. O ter se torna mais importante que o “ser”.

Temos inúmeras possibilidades de escolha e consumimos produtos que identifiquem um determinado estilo de vida e comportamento. Ao transformar tudo em mercadoria, nossa identidade também se constitui a partir da satisfação do prazer pelo consumo. Marcas e grifes se tornam um símbolo de quem somos. Sua compra também significa um status social, o desejo de um reconhecimento perante os outros.

Satisfazer por completo os consumidores, na realidade, significaria não ter mais nada para vender. Consumir também significa descartar. Temos acesso a tudo o que queremos e ao mesmo tempo as coisas se tornam rapidamente obsoletas.

“O problema não é consumir; é o desejo insaciável de continuar consumindo”, diz Bauman.

Tanto que o descarte do lixo é um grande problema na sociedade.

Bauman escreve:

“Rockefeller pode ter desejado construir suas fábricas, estradas de ferro e torres de petróleo altas e volumosas e ser dono delas por um longo tempo […], Bill Gates, no entanto, não sente remorsos quando abandona posses de que se orgulhava ontem; é a velocidade atordoante da circulação, da reciclagem, do envelhecimento, do entulho e da substituição que traz o lucro hoje – não a durabilidade e a confiabilidade do produto.”

As pessoas também precisam se reinventar para que não se tornem obsoletas. Elas precisam ter identidades fluidas. Segundo Bauman,

“na sociedade de consumidores, ninguém pode se tornar sujeito sem primeiro virar mercadoria, e ninguém pode manter segura sua subjetividade sem reanimar, ressuscitar e recarregar de maneira perpétua as capacidades esperadas e exigidas de uma mercadoria vendável.”

As relações líquidas

Na modernidade líquida, os vínculos humanos têm a chance de serem rompidos a qualquer momento, causando uma disposição ao isolamento social, onde um grande número de pessoas escolhe vivenciar uma rotina solitária. Isso também enfraquece a solidariedade e estimula a insensibilidade em relação ao sofrimento do outro.

Esse tipo de isolamento parece ser uma contradição da globalização, que aproxima as pessoas com a tecnologia e novas formas de comunicação. Mas se tudo ocorre com intensa velocidade, isso também se reflete nas relações pessoais. As relações se tornam mais flexíveis, gerando níveis de insegurança maiores. Ao mesmo tempo em que buscam o afeto, as pessoas têm medo de desenvolver relacionamentos mais profundos que as imobilizem em um mundo em permanente movimento.

Bauman reflete sobre as relações humanas e acredita que os laços de uma sociedade agora se dão em rede, não mais em comunidade. Dessa forma, os relacionamentos passam a ser chamados de conexões, que podem ser feitas, desfeitas e refeitas – os indivíduos estão sempre aptos a se conectarem e desconectarem conforme vontade, o que faz com que tenhamos dificuldade de manter laços a longo prazo.

O sociólogo acredita que as redes sociais significam uma nova forma de estabelecer contatos e formar vínculos. Mas que elas não proporcionam um diálogo real, pois é muito fácil se fechar em círculos de pessoas pensam igual a você e evitar controvérsias.

Para Bauman, a rede é mantida viva por duas atividades: conectar e desconectar. O contato no meio virtual pode ser desfeito ao primeiro sinal de descontentamento, o que denota uma das características da sociedade líquida.

“O atrativo da ‘amizade Facebook’ é que é fácil conectar, mas a grande atração é a facilidade de desconectar”, diz Bauman.

Política, segurança e economia

Na modernidade líquida, existe uma maior separação do poder e a política. O Estado perde força, os serviços públicos se deterioram e muitas funções que eram do Estado são deixadas para a iniciativa privada e se tornam responsabilidade dos indivíduos. É o caso do fim do modelo do Estado de Bem-Estar Social na Europa.

Bauman identifica uma crise da democracia e o colapso da confiança na política.

“As pessoas já não acreditam no sistema democrático porque ele não cumpre suas promessas”, diz o sociólogo.

Para ele, a vitória eleitoral de candidatos como Donald Trump nos EUA é um sintoma de que a retórica populista e autoritária ganha espaço como solução para preencher esses vazios.

No campo econômico, Bauman cita a fluidez dos mercados e o comportamento do consumo a crédito, que evita o retardamento da satisfação.

“Vivemos a crédito: nenhuma geração passada foi tão endividada quanto a nossa – individual e coletivamente (a tarefa dos orçamentos públicos era o equilíbrio entre receita e despesa; hoje em dia, os “bons orçamentos” são os que mantêm o excesso de despesas em relação a receitas no nível do ano anterior)”.

Para ele, as desigualdades sociais aumentaram. Ao mesmo tempo em que se aumentam as incertezas, os indivíduos devem lutar para se inserir numa sociedade cada vez mais desigual econômica e socialmente. Os empregos estão mais instáveis e a maioria das pessoas não pode planejar seu futuro muito tempo adiante.

Para o sociólogo, não existe mais o conceito tradicional de proletariado. Emerge o “precariado”, termo que Bauman usou para se referir a pessoas cada vez mais escolarizadas, mas com empregos precários e instáveis. Agora a luta não é de classes, mas de cada pessoa com a sociedade.

No mundo líquido, a sensação de segurança também é fluida.

“O medo é o demônio mais sinistro do nosso tempo”, alerta Bauman.

O medo do terrorismo e da violência que pode vir de qualquer parte do globo (inclusive virtualmente, como os hackers e haters das redes) cria uma vigilância constante, à qual aceitamos nos submeter para ter mais segurança.

Escreve Bauman no livro “Confiança e Medo na Cidade”:

“Essa obsessão deriva do desejo, consciente ou não, de recortar para nós mesmos um lugarzinho suficientemente confortável, acolhedor, seguro, num mundo que se mostra selvagem, imprevisível, ameaçador.”

No mundo off-line, a arquitetura das cidades está sendo cada vez mais projetada para promover o afastamento: muros, condomínios fechados e sistemas de vigilância estão em alta.

No livro “Estranhos à Nossa Porta”, Bauman escreve:

“a ignorância quanto a como proceder, como enfrentar uma situação que não produzimos nem controlamos é uma importante causa de ansiedade e medo”.

Ele relaciona a situação de desemprego dos europeus ao aumento do ódio contra os imigrantes. Ao mesmo tempo, manter esse medo aceso seria uma estratégia de poder para determinados grupos, como políticos de discursos nacionalistas e xenófobos.

Por Carolina Cunha, da Novelo Comunicação

Para saber mais

O mal-estar da pós-modernidade, Zygmunt Bauman. Ed. Zahar, 1998.
Modernidade Líquida, Zygmunt Bauman. Ed. Zahar, 2001.
A condição pós-moderna, Jean-François Lyotard. Ed. José Olympio, 2002.
Amor Líquido: Sobre a fragilidade dos laços humanos, Zygmunt Bauman. Ed. Zahar, 2004.
Confiança e Medo na Cidade, Zygmunt Bauman. Ed. Zahar, 2009.
Estranhos à Nossa Porta, Zygmunt Bauman. Ed. Zahar, 2017.

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Maçonaria e Geração “Z” Pós-Pandemia

O gestor da geração Z | Mundo Carreira

A moderna Maçonaria se identificou nos últimos 300 anos com causas nobres, lutas sociais e movimentos cívicos, revolucionários e libertários, que a fizeram prosperar até nossos dias, continuamente combatendo a intolerância, os preconceitos, os privilégios e defendendo novas ideias. Por isso angariou a antipatia de poderosos e de pessoas que simplesmente ignoram como ela funciona de fato.

Não obstante os percalços enfrentados até então, aliados ao respeito que a sua história inspira e é sobejamente decantada pelos seus obreiros mais dedicados e orgulhosos do status conferido pelo sentimento de pertencimento, a Maçonaria ainda é desconhecida por significativa parte da população brasileira e é vista por muitos com certo grau de desconfiança, apesar de todo o capital intelectual e consciência de sua importância para as transformações necessárias à promoção da justiça social.

Entre seus pontos fortes, cabe destacar o desenvolvimento de uma resiliência conferida pelo empenho na valorização do seu papel perante a sociedade, fazendo-se reconhecer como Oficina do saber, onde ideias e opiniões circulam sem nenhuma restrição, com estímulo ao livre debate, não deixando de exaltar suas características de acolhimento e sociabilidade.

No trabalho denominado “Evasão Maçônica: Análise da situação da GLMMG” (Silva, 2018, p.2) é enfatizado que

“toda organização necessita estar se reavaliando constantemente com a finalidade de conhecer suas potencialidades e suas fraquezas, de forma a continuar se mantendo perante a sociedade e, principalmente, a cumprir com os objetivos a que se propõe”.

Com a Maçonaria não poderia ser diferente.

Cabe, portanto, aos atuais membros ativos da Ordem honrar o legado recebido dos irmãos do passado e concentrar o foco nos enormes desafios que ela enfrenta na atualidade, notadamente em relação aos reflexos da pandemia do coronavírus, e que deverão balizar suas ações para o futuro, com vistas a reter seus atuais colaboradores e tornar-se atraente para o cidadão educado e com amplo acesso às informações, em função dos crescentes avanços tecnológicos.

O momento atual enseja uma sociedade e um tempo onde tudo é volátil e adaptável, denominados por Bauman (2001) de “modernidade líquida”, contrapondo-se a um recente período no qual imperava a modernidade sólida, que se apresentava ordenada, coesa, estável e previsível.

“Essa transição afetou os mais variados aspectos de nossa vida”.

Segundo ele,

“o advento do telefone celular serve bem como ‘golpe de misericórdia’ simbólica na dependência em relação ao espaço: o próprio acesso a um ponto telefônico não é mais necessário para que uma ordem seja dada e cumprida. Não importa mais onde está quem dá a ordem – a diferença entre ‘próximo’ e ‘distante’, ou entre o espaço selvagem e o civilizado e ordenado, está a ponto de desaparecer” (p.19).

Testemunhamos uma crescente

“elite dos residentes do ciberespaço que prosperam na incerteza e na instabilidade de todas as coisas mundanas…” (p.194).

Bauman afirma:

“vivemos em tempos líquidos, de conceitos e instituições instáveis e cambiantes”.

Isso fica demonstrado com o advento das redes sociais e os avanços científicos e tecnológicos que determinam novos feitios de interação, como o uso e abuso no tempo presente das videoconferências e do trabalho remoto, com o destaque para a atuação das gigantes Google, Facebook, Zoom e assemelhados, que aceleram a destruição de formas tradicionais de emprego, de comercialização de produtos, serviços, formas de ensino e aprendizagem, acelerando a obsolescência de hábitos, valores, dogmas, instituições e o surgimento de novos paradigmas. Nessa “era da informação”, a única certeza é a de que inovações hoje consideradas promissoras certamente desaparecerão antes de atingirem o potencial a que se propõem.

O protagonismo desse cenário cabe à Geração Z[1], compreendendo pessoas nascidas a partir de meados dos anos de 1990, considerada totalmente digital, e que demonstra valores profundamente diferentes, com demandas sociais e ambientais específicas e maior capacidade de reinventar a forma como trabalhar e solucionar problemas, comunicar-se e reunir-se, impondo diferentes hábitos de vida e de consumo, com apoio a modelos econômicos alternativos e desenvolvimento sustentável.

Esses nativos digitais não conhecem o mundo sem os meios de comunicação atuais e o veem de uma forma pequena e sem fronteiras, exigindo agilidade e praticidade em tudo na vida, como relacionamentos, educação e relações de trabalho. Na área da educação, demonstram maior conhecimento quando comparado às gerações anteriores. Concordando ou não com essa realidade, não se enxerga possibilidade de retorno. Para a professora e neurocientista britânica Susan Greenfield (apud Novaes, 2016), “estamos diante de uma mudança mental global”.

Citando matéria da Revista Exame (2006), a pesquisa de Novaes (2016) confirma que pelo lado profissional a Geração Z é multitarefa, ou seja, consegue fazer e entender várias coisas simultaneamente, habilidade essa que nenhuma geração anterior demonstrou, realizando tarefas online ou não, sem perder a atenção. Outra característica importante é que essa geração é caracterizada pelo imediatismo e chega ao mercado procurando empresas que valorizem a conectividade, a abertura ao diálogo, a velocidade e a globalidade. 

Não restam dúvidas de que é nessa safra de novas cabeças que a Maçonaria deverá depositar suas esperanças e garimpar seus futuros obreiros, cabendo aos dirigentes atuais ter em mente que esses jovens encaram a diversidade de uma forma natural e essencial na sociedade e enxergam além do que parece ditar o momento, ensejando, em certas situações, ausência de orientação ideológica clara. Têm o perfil flexível, adaptável e criatividade como habilidade principal, aliando tecnologia e aprendizado. A questão é:

Estamos preparados para recrutá-los e recebê-los em nossas Oficinas?

Nessa toada, a perspectiva futura da Maçonaria demanda um novo olhar e contínua inquietação do pensamento, em busca dos progressos necessários, envolvendo todo um universo que espera ser explorado. Precisamos efetivamente valorizar um ponto forte que a Maçonaria aprimorou ao longo da sua caminhada e contempla em seus fundamentos, que é o do protagonismo dos indivíduos, do papel do Maçom junto à sociedade e que se consubstancia nos novos tempos como tendência das organizações do século XXI, que para manterem-se competitivas investem em programas de ajuda aos profissionais para o desenvolvimento das habilidades de liderança embasadas na busca da autoconsciência e da reflexão. Isso é uma realidade e não podemos ficar indiferentes a esse valor da Ordem, que se vislumbra como um fortíssimo apelo para encantar a Geração Z.

A proposta cativante de trabalho da Maçonaria para atrair e engajar essa nova geração deverá demonstrar uma série de desafios e oportunidades de crescimento pessoal, voltados para a formação de lideranças, da ampliação de conhecimentos, de educação cidadã e de desenvolvimento de capacidades que expandam o poder de visão, análise e discernimento, que lhes permitirão lidar com situações da vida cotidiana e conscientização acerca de ações decisivas e transformadoras para que façam a efetiva diferença no seu meio social, em benefício da Família, da Pátria e da Humanidade. Despiciendo ressaltar nosso conceito de fraternidade, que é cartão de visita e marca indissolúvel da Maçonaria, conforme demonstramos no trabalho denominado “O Capital Social da Maçonaria”, que pode ser consultado clicando AQUI .

Por outro lado, um ponto fraco da Maçonaria, merecedor de profunda atenção, é a forma como muitas Lojas são geridas, sem dar a devida importância ao aperfeiçoamento de seus obreiros, descurando na formação de lideranças que apontem caminhos, deixando de explorar toda a base de conhecimentos e instruções disponíveis, contribuindo para o desinteresse, o desencanto e eventuais deserções, resultantes do descompromisso para com os propósitos da Maçonaria.

Na análise dos dados que apontaram as cinco maiores causas de abandono da Ordem, apurados por Silva (2018, p. 20-21), destacam-se a falta de um objetivo definido para a Ordem e que seja obrigatório o seu cumprimento por todos os Maçons e Lojas, a vaidade e o orgulho de alguns irmãos, além de motivos profissionais (transferência/incompatibilidade de horários, etc.) e a existência de discussões inúteis e sem objetivos práticos. Será essa uma barreira intransponível?

Não é segredo maçônico que em algumas Lojas dirigentes com deficiência na habilidade de gestão não permitem que obreiros se destaquem, principalmente os mais jovens, esses da tal Geração Z.

Alguns veteranos, não especificamente mais adiantados em idade, contaminados pela síndrome do “esse cara sou eu”, ensejando uma pompa sabichona, têm dificuldades em continuar a aprender e sair da zona de conforto, pois fazem o que fazem da mesma maneira há anos e continuam a gozar de relativo sucesso entre os pares. Precisam de uma Loja para chamar de sua. E são felizes nesse autoengano, em especial quando ouvem que são repositórios de incomensurável saber maçônico e festejados exemplos a serem seguidos. Possuindo um fraco por elogios, e por vezes protagonizando momentos de fofura, adoram afagos e sempre esboçam um sorriso brejeiro e uma falsa expressão de encabulamento.

Pesquisas no mundo corporativo revelam que o fator idade não é determinante para indicar competência ou a sua falta. Quando bem administrado, o choque de gerações pode ser positivo, notadamente pelo intercâmbio de conhecimentos. Ademais, não existe uma geração melhor que outra, sabendo-se que atitudes, mentalidades abertas e flexíveis compõem os requisitos para superação de adversidades. O importante é não se acomodar e ficar atento às inovações.

No âmbito da Maçonaria, a ampla pesquisa “Maçonaria no Século XXI”, formulada pelo irmão Kennyo Ismail (2018, p.26) evidencia no item 4.3

“a teoria de duas grandes gerações distintas no meio maçônico brasileiro, sendo a mais jovem, de até 46 anos de idade, de aproximadamente 1/3 dos maçons brasileiros atuais”.

Esse segmento, segundo a pesquisa,

“incentiva o questionamento, o exercício da antítese, o que parece ser, de certa forma, mal visto pela geração mais velha. A geração mais jovem também apresenta características mais críticas, tem uma média maior de nível de escolaridade e de hábito de leitura…”.

No grupo mais velho, o estudo verificou que há

“uma preocupação extremamente maior com uma melhor seleção de membros do que o observado na geração mais jovem, atualmente minoritária, o que pode ser um indício da preocupação com o fim da hegemonia”.

O trabalho apresenta uma série de contribuições que deveriam ser avaliadas com carinho pelas nossas Lojas.

Não são raras as situações em que alguns veteranos quando questionados por um Aprendiz ou Companheiro da Geração Z, sobre alguma questão específica, respondem com ar triunfalista que não chegou a hora do consulente saber. Na realidade não sabem exatamente como responder, criando um clima de constrangimento e desânimo daqueles que se mostram inicialmente entusiasmados e ávidos pelo saber maçônico. Tal situação encontra amparo na pesquisa elaborada pelo irmão Kennyo Ismail (2018, p.23), onde ele registra que

“menos de 5% dos maçons brasileiros sabem o que é a Maçonaria”,

com o agravante de que esses desconhecedores “são os mesmos que convidam, sindicam, escrutinam, iniciam e instruem novos membros na Ordem…” (p. 24).

Em nossa realidade dinâmica, temos a concorrência de Lojas que atraem bons obreiros por estarem acima da média e não se contentarem com pouco, sabendo aproveitar as oportunidades na divulgação de suas atividades, como a recente onda de convites e mais convites para reuniões em videoconferências, com uma variedade de temas em discussão. Isso ocorre porque são bem geridas, disciplinadas, ricas nas atividades e observam o cumprimento das regras. Como as notícias correm, e impedidos de chegar ao ótimo individual, muitos iniciados recentes, em especial da Geração Z, munidos de coragem e em busca de desafios, quando possível, procuram outras Oficinas, como acontece frequentemente no mercado de trabalho. O pior é quando, desiludidos, abandonam a Ordem, pois uma eventual propaganda negativa desmotiva a captação de candidatos potenciais.

É reiteradamente repercutida a situação de novos irmãos que demandam mudanças e recebem críticas por sonharem com melhorias e sofrem do descrédito daqueles que apenas desejam uma Loja tranquila, com sessões rápidas, sem muitos desafios e, de preferência, que elimine aqueles que de uma forma ou de outra incomodam com suas presenças ou não sejam lá muito simpáticos, por serem visionários e portadores de um espírito crítico mais aguçado. Tudo muito bem articulado e reverberado na cabeça do Venerável por um restrito grupo dominante, que tenta sob todas as formas manter o nível de influência e controle dos destinos da Loja. Nesse grupo temos aqueles que ameaçam frequentemente deixar a Loja, mas não escondem a carência de bajulação. Esse grupo é incansável e sempre recebe novos adeptos, para desespero do Venerável da vez que começa logo a sonhar com o término de sua gestão.

Mas a história não termina aqui. Como toda moeda tem dois lados, não poderíamos deixar de registrar a situação daqueles irmãos que não conseguem acompanhar o ritmo das Lojas de alto desempenho e logo saem à procura de uma Loja tradicional, amiga, sossegada, que não exige trabalhos e estudos, para se acomodarem à sombra das colunas e apenas curtir o lado social da Maçonaria, o companheirismo. Não raras vezes irmãos com esse perfil costumam levar junto outros que já deram o que tinham que dar ou perderam o prestígio, restringindo-se a decantar feitos do passado, e não se sentem à vontade junto às novas gerações que entram com toda força e vigor. Sem preconceitos e com todo o respeito, que sejam ambos felizes, pois continuamos irmãos!

A prática da Maçonaria Especulativa ensina que o debate é essencial, tanto em Loja quanto nas redes sociais ou círculos de estudos presenciais ou online.

Instruções ministradas burocraticamente, apenas para cumprir tabela e textos lidos eventualmente em nossas reuniões não agregam valor se não são sucedidos de reflexões. Ao não incrementar ou valorizar os temas para estudos e debates, restringimo-nos à perenidade da ritualística e expectativa do ágape que vem após as reuniões presenciais, deixando de explorar toda a base de conhecimentos e instruções disponíveis, que representam um riquíssimo tesouro colocado à disposição de todos.

Pensando na força da Geração Z que dará continuidade aos ossos trabalhos, o Quarto de Horas de Estudos em Loja e as Instruções Maçônicas merecem atenção mais disciplinada por parte dos atuais gestores, dado o alcance e a importância no sentido de preparar o quadro de obreiros, vez que disponibilizam todo um sistema onde se permite explorar variados assuntos, mediante promoção de debates sobre questões sociais de relevo, por meio de ensinamentos que levem ao aprendizado e ao progresso por meio da troca de experiência, que variam de acordo com as competências individuais e em face das vivências e descobertas proporcionadas pelos trabalhos apresentados.

Com as novas facilidades proporcionadas pelos recursos das videoconferências, com alcance inédito, e respeitadas as regras de segurança e o sigilo no que couber, os resultados positivos serão incomensuráveis. Sobre o alcance das instruções, permitimo-nos sugerir a leitura do artigo ‘A instrução maçônica” clicando AQUI .

Inúmeros temas que são caros à Geração Z e inundam o noticiário nacional poderiam ser discutidos sem a necessidade de encontros presenciais, cabendo aos Mestres no exercício da tão propalada Plenitude[2] empenharem-se para enriquecer a Ordem do Dia e tornar os trabalhos mais dinâmicos e atrativos. O escritor Yuval Noah Harari, em sua obra “21 Lições para o Século 21” (2018), apresenta uma resenha de problemas globais e temas palpitantes quando aborda a rapidez das mudanças que se divisam para os próximos anos, a ansiedade geral com relação ao compartilhamento de experiências e informações, novas oportunidades, com a tecnologia transformando vidas e seus riscos potenciais e a forma de trabalhar, os desafios políticos, o desafio de educação das crianças, como reagir e entender o volume de informações produzidas diariamente, com ênfase para a propagação dos discursos de ódio, os avanços e ameaças da inteligência artificial, a disrupção tecnológica e guerras cibernéticas, o colapso ecológico e mudanças climáticas, o conceito de liberdade, o crescimento das desigualdades e a situação de vulnerabilidade econômica de quem já sofre com a pobreza, o isolamento nacionalista, secularismo, e as disputas entre crenças, verdade e pós-verdade.

Harari dá realce às provações difíceis que a humanidade terá que enfrentar com relação às revoluções gêmeas na tecnologia da informação e na biotecnologia, que poderão excluir bilhões de humanos do mercado de trabalho, criando

“uma nova e enorme classe sem utilidade, levando a convulsões sociais e políticas com as quais nenhuma ideologia existente está preparada para lidar” (p.38-39).

Para ele, teremos de explorar novos modelos de sociedade pós-trabalho, de economias pós-trabalhos e de política pós-trabalho [e podemos hoje acrescentar o cenário pós-pandemia], pois os modelos sociais, econômicos e políticos que herdamos do passado são inadequados para lidar com tal desafio (p.59). Para apimentar um pouco mais, acrescenta:

“ou a democracia se reinventa com sucesso numa forma radicalmente nova, ou os homens acabarão vivendo em ‘ditaduras digitais” (p.95).

Não podemos deixar de destacar também a recaída do populismo e formas de governos autoritários que se insinuam. Isso afeta a Maçonaria de alguma forma? É assunto para ser discutido em Loja? Podemos agendar uma “live” para repercutir essas ideias? Isso é viajar na maionese ou passa longe dos nossos interesses quanto a tornar feliz a humanidade? Precisamos estar antenados. É um caso a pensar…..

Outro assunto de suma importância no mundo real e que causa arrepio no meio maçônico é a questão Política. Esse tema pode ser, ao contrário do que se pensa, agregador e cativar a Geração Z, se bem estruturado e conduzido com sabedoria. Conforme abordamos recentemente em artigo apresentado junto à GLMMG, no bojo do “Programa Cultural – Filosofando sobre a Ordem”, cujos resultados serão brevemente publicados, a Maçonaria, como instituição, não pode continuar na velha cantilena de que não deve envolver-se diretamente em temas políticos e nas decisões de interesse do Brasil, candidamente delegando aos Maçons que o façam individualmente, pois um regramento de 1723, editado em outro momento histórico, impede ações mais decisivas em pleno século XXI.

O cuidado é não envolver-se no círculo vicioso da politicagem tradicional e sim na Política com “P” maiúsculo.

O escritor maçônico Raimundo Rodrigues, no seu livro “Sutilezas da Arte Real” (2003), faz uma provocação corajosa ao afirmar:

“Precisamos, isso sim, de algumas mudanças, uma vez que estamos no século XXI e certos Landmarques não mais se coadunam com as nossas necessidades atuais”.

E continua:

“Precisamos, nós, os Maçons, envidar esforços para evitar o marasmo, evitar o dolce far niente” (p.145).

Não podemos olvidar que até a própria Igreja Católica está avaliando mudanças de rumo para não perder fiéis.

A postura de somente caprichar na retórica e bradar que alguém tem que tomar uma providência é muito confortável. Esse comodismo e o obsequioso silêncio político da Maçonaria do Brasil precisam ser quebrados. Afinal, sabemos ou não dialogar? Temos medo de expor nossas ideias e vê-las contestadas? Se sim, então tudo é um faz de conta. Falta o básico, a essência.

Aqueles gestores que são lentos, míopes ou orgulhosos demais para enfrentar a realidade e adaptarem-se aos novos tempos certamente serão responsabilizados pelas sequelas que deixarão como herança.

Sem sofisma, equivoco ou reserva mental que possam criar obstáculos à revisão de conceitos, é chegada a hora de a Maçonaria repensar sua atuação, decretar a sua independência e de agir com responsabilidade, assumindo o papel que já foi sua marca registrada e encantou a juventude no seu passado glorioso: revolucionária, decisiva, incomodativa, marginal em outros momentos.

Defender que a Maçonaria seja apenas uma escola de pensamento recheada de sábios, onde se cultive exclusivamente moral e ética e acalente o sonho de que seus princípios e valores sejam amplamente conhecidos e que forças do além inspirem os tomadores de decisão, sem se envolver diretamente, apenas divulgando moções de censura ou de apoio, e ficando na torcida para que a justiça e os bons costumes prevaleçam, é mais do mesmo. Como se diz no popular: é continuar a encher linguiça e fartar-se em banquetes ritualísticos. Bauman (2001, p.167) faz uma provocação:

A mais pungente e menos respondível das questões dos nossos tempos de modernidade líquida não é “o que fazer?” (para tornar o mundo melhor ou mais feliz), mas “quem vai fazê-lo?”.

Portanto, para atrairmos a atenção das novas gerações impõe-se fixar nossas esperanças e expectativas no potencial dos nossos quadros de obreiros, que representam a força da qual dispomos neste momento e que precisam ser mantidos, reforçados e motivados constantemente, para fazerem o trabalho de recrutamento junto a essa força jovem que viceja em nossa sociedade e enfrentarem as provocações que teremos pela frente.

No trabalho sobre “Maçonaria do Futuro: Gestão Maçônica” (Silva et al., 2019, p. 18), os autores reproduzem a opinião de um entrevistado que remete à questão da motivação:

“A Maçonaria, ao contrário do que muitos acreditam, é uma instituição voluntária e depende da participação ativa de seus integrantes para poder cumprir com seus objetivos. Para uma entidade desta natureza, o grande desafio é ser atraente para captar talentos e capaz de manter o nível de motivação para retê-los, compreendendo que não é um ato, mas um processo continuado”.

Então, em frente!

Vale sublinhar no referido estudo uma afirmação que nos serve de alento e também de preocupação:

“é muito improvável que ela [a Maçonaria] possa vir a deixar de existir, mas seus valores e fraternidade não podem ser negligenciados, sob pena de comprometer os pilares de sustentação que a mantém durante séculos, e ela se tornar obsoleta tanto para os Maçons, quanto para a sociedade, aproximando-se das atividades de um clube de serviço” (p. 44).

Por oportuno, contrariando expectativas e os críticos de plantão, o Mestre Raimundo Rodrigues (2003), do alto de sua sapiência, faz um alerta:

“Atenção, Críticos! é preciso que os erros sejam vistos, mas é necessário também que as virtudes sejam colocadas em relevo” (p.146).

E com a sua indiscutível autoridade afirma:

“Não temos dúvida de que a Maçonaria cresce em número de Lojas, em número de membros, sobretudo, isto é inegável, cresce em qualidade cultural dos Maçons brasileiros, haja vista o número de obras publicadas nos últimos 20 anos” (p. 133).

Confirmando esse sucesso, o Site da CMSB (https://cmsb.org.br) registra que as 27 Grandes Lojas já contam com mais de 3.000 Lojas Regulares e número superior a 120.000 membros ativos.

Reforçando seu argumento, Mestre Raimundo Rodrigues enfatiza uma realidade animadora:

“Um outro ponto que nos mostra a pujança da Maçonaria brasileira é o interesse que as Lojas de vários recantos do Brasil mostram pelo aprimoramento cultural de seus Obreiros. Seminários, cursos, palestras são realizados por toda a parte e já é expressivo o número de palestrantes que viajam de um lado para o outro do Brasil, atendendo ao chamado que lhes é feito por Potências e por Lojas” (p.134).

Ou seja, temos trabalho sério e competente sendo realizado e agora, pela experiência dos novos tempos, nem é mais necessário o deslocamento de um Oriente a outro, nem mesmo entre Lojas, tendo em vista as facilidades dos alegres e prestigiados encontros virtuais.

Como fartamente reconhecido na literatura maçônica e nos discursos de autoridades do meio, indispensável investir nas entidades paramaçônicas, incorporar nossas famílias, incrementar a convivência dentro e foras das Lojas, compartilhar atividades sociais, incentivar a participação de maçons em organizações de relevo social, realizar seminários e debates públicos sobre temas de interesse da sociedade civil, promover e apoiar campanhas filantrópicas, publicar manifestos, levar os princípios da Maçonaria junto ao ninho da Geração Z, os centros acadêmicos, torná-la visível e atrair candidatos potenciais, idôneos, de reputações ilibadas e tementes a Deus, já que não dispomos de um guichê de inscrições, sabendo-se que a juventude simboliza futuro e esperança.

Assim, cabe a cada um de nós avaliarmos erros e acertos do passado e meditar a respeito da real Maçonaria que pretendemos legar às futuras gerações, que certamente colherão os frutos que hoje plantarmos, caso ela sobreviva, se e somente se superarmos os obstáculos atuais.

É uma questão de atitude, pois o momento de que dispomos para agir é o agora, pois a nossa geração pode ser a última a ter a oportunidade de fazer as mudanças necessárias. Não podemos nos dar ao luxo de pedir ao mundo que espere ou pouco, pois nós os maçons ainda estamos decidindo.

Veronica A. Shoffstall, em um belo poema denominado “Depois de um tempo”, indevidamente atribuído a Shakespeare, afirmou:

“um dia você aprende….a construir todas as estradas hoje porque o terreno de amanhã é demasiado incerto para planos e futuros têm o hábito de cair no meio do voo….”

Apenas para reforçar o sentido da urgência que se nos afigura, permitimo-nos agregar mais uma metáfora muito bem colocada por Bauman (2001, p.70), sobre uma fala da Rainha Vermelha em Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carrol:

“Agora, aqui, veja, é preciso correr o máximo que você puder para permanecer no mesmo lugar. Se quiser ir a algum outro lugar, deve correr pelo menos duas vezes mais depressa do que isso!”.

Sabe-se que tempo é o nosso recurso mais escasso.

Considerando a afirmação do físico dinamarquês Niels Borh de que “fazer previsões é difícil, especialmente sobre o futuro”, sendo certo que um dia ele chega,

não podemos arregar e permitir que nossas Lojas se engessem e criem resistência a mudanças e permaneçamos aferrados a uma forma de pensar, de olhos fechados à evidência dos fatos e de que viveremos felizes para sempre, manipulando e sendo manipulados, permanecendo sorrateiramente “à ordem” no aguardo de reconhecimentos e glórias, certificados, homenagens, fotos bacanas em revistas e poses vitoriosas no Facebook, exibindo nossas alfaias coruscantes, e comprometendo seriamente a dinâmica das Lojas e o futuro da Maçonaria.

Evidentemente, não podemos descurar das tradições, do legado recebido e a entregar às próximas gerações.

Reiterando reflexão contida no artigo acima citado, dentro do “Programa Cultural – Filosofando sobre a Ordem”, da GLMMG, evidencia-se imprescindível termos consciência de que as instituições hoje não agem solitárias. A estratégia são as parcerias, habilidades e talentos se associando e potencializando esforços. Depreende-se crucial a aproximação entre as Potencias Regulares para desenvolverem um plano conjunto, não penas com foco em resultados de curto prazo, mas de construir uma Maçonaria vibrante e um país melhor para a ávida geração de brasileiros que aumenta dia a dia, com demandas inéditas.

Para isso precisamos sair da nossa caverna confortável e aquecida e mostrar a cara, pois

“ninguém acende uma lâmpada para cobri-la com uma vasilha ou colocá-la debaixo da cama. Ele a coloca no candeeiro, a fim de que todos os que entram vejam a luz” (Lc 8, 16).

Levemos, portanto, nossa luz ao mundo. Enfim, está em nossas mãos pavimentar o caminho que será trilhado pelos futuros obreiros. Portanto, para que sejam superadas as barreiras que hoje se apresentam para a efetiva melhoria de desempenho, mantendo a credibilidade até então conquistada e valorizar ainda mais a Maçonaria, permitimo-nos sugerir, como dever de casa e ponto de partida, o acolhimento e discussão sobre o diagnóstico e as propostas para minimizar eventuais deficiências, conforme o excelente trabalho “Maçonaria do Futuro: Gestão Maçônica” (Silva et al., 2019 – disponível no Site da CMSB – cmsb.org.br), que certamente ensejarão melhores perspectivas na longa e desafiadora jornada que teremos pela frente.

Autor: Márcio dos Santos Gomes

Márcio é Mestre Instalado da Loja Maçônica Águia das Alterosas – 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte. Membro da Escola Maçônica Mestre Antônio Augusto Alves D’Almeida e da Academia Mineira Maçônica de Letras.

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Notas

[1] Geração X: nascidos após o baby boom, pós-Segunda Guerra Mundial, a partir dos anos 1960 até o final dos anos 1970; Geração Y: nascidos após o início da década de 1980 e até 1995, igualmente conhecida como geração do milênio. (Fonte Wikipédia)

[2]Sugestão de leitura do artigo “Plenitude Maçônica”, em: https://opontodentrodocirculo.wordpress.com/2018/12/13/plenitude-maconica/

Referências Bibliográficas

A BÍBLIA SAGRADA. Edição Pastoral: São Paulo: Paulus, 1990;

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. RJ: Zahar, 2001;

GLMMG. Ritual Grau 1 – R ∴E ∴A ∴A ∴ Belo Horizonte: 2017;

GOMES, Márcio dos Santos. O Capital Social da Maçonaria. 2015. Disponível em: https://opontodentrodocirculo.wordpress.com/2015/09/04/o-capital-social-da-maconaria/. Acesso em 13.01.2020;

______________________________ A Instrução Maçônica. 2016. Disponível em: https://opontodentrodocirculo.wordpress.com/2016/02/23/a-instrucao-maconica. Acesso em 13.01.2020;

HARARI. Yuval Noah. 21 Lições para o Século 21. São Paulo: Companhia das Letras, 2018;

ISMAIL, Kennyo. CMI – Maçonaria no Século XXI. 2018. Disponível em: https://www.noesquadro.com.br/wp-content/uploads/2018/04/RELATÓRIO-CMI.pdf.  Acesso em 12.01.2020;

NOVAES, Tiago et al. Geração Z: Uma Análise sobre o Relacionamento com o Trabalho. 2016. Disponível em:

http://www.ucs.br/etc/conferencias/index.php/mostraucsppga/xvimostrappga/paper/viewFile/4869/1569. Acesso em 16.01.2020;

RODRIGUES, Raimundo. Sutilezas da Arte Real. Londrina: Ed. Maçônica “A Trolha”, 2003;

SILVA, José Eduardo. Evasão Maçônica: Análise da situação da GLMMG. 2018. Disponível em: http://www.glmmg.org.br/Gestao.Macons/assets/files/Pesquisa-evasao-GLMMG.pdf. Acesso em 12.01.2020;

SILVA, José Eduardo et al. Maçonaria do Futuro: Gestão Maçônica. 2019. Disponível em: http://www.glmmg.org.br/Gestao.Macons/assets/files/Gestao_Maconica_final.pdf. Acesso em 12.01.2020. Disponível na Biblioteca da CMSB em: https://cmsb.org.br/biblioteca/.

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