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Ser Mestre Maçom é…

… mais do que uma chegada, uma nova partida; não um objetivo atingido mas um projeto sempre em execução. A Exaltação à Mestria possibilita que o Obreiro atento o entenda desde logo.
Simplesmente, enquanto até aí o maçom teve guias e apontadores de caminhos, quando a Loja concede a ele a sua “carta” de Mestre, este sente-se um pouco como aquele que, após as suas lições e o seu exame de condutor, recebe a sua carta de condução: está habilitado a conduzir (a conduzir-se…) mas… inevitavelmente que sente alguma ansiedade por estar por sua conta e risco, sem rede que ampare suas quedas em possíveis erros.
Assim, apesar de serem as mais visíveis manifestações da mudança de estado conferida pela Exaltação à Mestria, não são o seu direito à palavra e o seu direito ao voto que são importantes. Importante é a sua total capacidade de exercer o seu verdadeiro e pleno direito ao seu caminho. O direito a trilhar o seu caminho por si, só, se assim escolher ou assim tiver que ser, ou acompanhado por quem quiser que o acompanhe e que o queira acompanhar, se assim for de vontade dos interessados, pelo tempo que quiser, por onde quiser, como quiser, para o que quiser.
O direito ao seu caminho enquanto cidadão já o tinha desde que atingiu a idade adulta e como adulto foi pela lei do Estado considerado. O direito ao seu caminho enquanto maçom, ou seja, o caminho do aperfeiçoamento, da busca da excelência, da proximidade tão próxima quanto humanamente possível for, da Perfeição, a ser trilhado por si só, como quiser, quando quiser, pela forma que quiser, adquire-o o Maçom com a sua Exaltação à Mestria, após o tempo de preparação que necessário foi para que não seja em vão que esse direito lhe seja conferido, para que efetivamente o exerça. Porque é um direito que o Mestre Maçom deve exercer como um dever, com a diligência do cumprimento de uma obrigação.
Ser Mestre Maçom é, assim, essencialmente cumprir o dever de exercer o seu direito de escolher e percorrer o seu caminho para a excelência.
Para quem andou longo tempo a ser guiado, não é fácil ver-se, de um momento para o outro, responsável pelo seu caminho, sem ajuda, sem orientação, sem rede.
Responsável, porque livre, porque pronto, porque assim é o destino do homem que busca o brilho da Luz, da sua Luz. Mas, após uma pausa para ganhar orientação e pesar as suas escolhas, todos os Mestres Maçons seguem o seu caminho – porque para isso foram preparados, por isso são Maçons, com isso são verdadeiramente Mestres.
O caminho que cada Mestre Maçom decide escolher tem em conta a primacial pergunta que faz a si mesmo: Que fazer, como fazer, para ser melhor? A essa pergunta cada Mestre Maçom vai obtendo a sua resposta, pessoal, íntima, tão diferente das respostas de outros quanto diferente dos demais ele é. E é na execução da resposta que vai obtendo, no traçar do trabalho que essa resposta propõe, que o Mestre Maçom constrói, porque construtor é, o seu percurso. E a cada estação conquistada, novamente a mesma pergunta de sempre se lhe coloca: que fazer, como fazer agora para ser de novo melhor? E nova resposta e novo percurso e nova paragem, com nova e sempre a mesma pergunta, com outra resposta e outro percurso, incessantemente se apresentam.
Mas o Mestre Maçom não sabe apenas buscar a resposta à sua pergunta. Sabe também que, embora cada um trilhe o seu solitário caminho, os caminhos dos maçons têm muito de comum e sobretudo são postos por eles muito em comum.
O Mestre Maçom sabe assim que o que adquire, o que ganha, o que aprende, o que consegue, não é para ser avaramente fruído apenas por si, antes é para ser posto em comum com a Loja, pois também é do comum da Loja que recolhe contributos, ajudas, meios, ferramentas, para melhor e mais frutuosamente obter respostas às suas perguntas.
Ser Mestre Maçom é, assim, sempre, dar o seu contributo à Loja, seja no que a Loja lhe pede e ele está em condições de dar, seja no que ele próprio considera poder tomar a iniciativa de proporcionar à Loja. Porque ser Mestre Maçom é também saber que, quanto mais der, mais receberá, que a sua parte contribui para o todo mas também aumenta em função do aumento desse todo e que, afinal, não é vão o dito de que “dar é receber”.
Ser Mestre Maçom é portanto saber que o seu percurso pessoal será mais bem e mais facilmente percorrido se o for com a Loja, pela Loja, a bem da Loja. Porque o bem da Loja se traduz em acrescido ganho para o maçom, que assim consegue realizar o paradoxo de ser um individualista gregário, porque integra e contribui para um grupo que é gregário porque preza e impulsiona a individualidade dos que o compõem.
Ser Mestre Maçom é descobrir que a melhor forma de aprender é ensinar e assim escrupulosamente executar o egoísmo de ensinar os mais novos, os que ainda estão a trilhar caminhos que já trilhou, dando-lhes o valor das suas lições e assim ganhando o valor acrescido do que aprende ensinando – e sempre o homem atento aprende mais um pouco de cada vez que ensina.
Ser Mestre Maçom é comparecer e trabalhar na Loja, mas sobretudo trabalhar muito mais fora da Loja. Porque o que se faz em Loja não passa de “serviços mínimos” que apenas permitem a sobrevivência da Loja e o nível mínimo de subsistência do maçom. O trabalho em Loja é apenas um princípio, uma partícula, uma gota, uma pequena parte do trabalho que o Mestre Maçom deve executar em cada um dos momentos da sua existência.
Ser Mestre Maçom é portanto mais do que aguardar que algo lhe seja pedido, antes tomar a iniciativa de fazer algo – não para ser reconhecido pela Loja, mas essencialmente por si, que é o que verdadeiramente interessa.
Ser Mestre Maçom não é necessariamente fazer grandes coisas, excelsos trabalhos, admiráveis construções. Mais válido e produtivo é o Mestre Maçom que dedica apenas cinco minutos do seu dia a fazer algo muito simples em prol da sua Loja, da Maçonaria, afinal de si próprio, desde que o faça efetivamente todos os dias, do que aqueloutro que uma vez na vida faz algo estentório, notado, em grande estilo, mas sem continuidade. Porque a vida não se esgota num momento, nem numa hora, nem num dia. A vida dura toda a vida e é para ser vivida todos os dias de toda a vida.
Ser Mestre Maçom não é necessariamente ser brilhante, mas é imprescindivelmente ser persistente E o Mestre Maçom que persistentemente realize dia a dia, pouco a pouco, o seu trabalho, pode porventura passar despercebido, não receber méritos nem medalhas nem honrarias, mas tem seguramente o maior mérito, a maior honra, a melhor medalha, o maior reconhecimento a que deve aspirar: o de ele próprio reconhecer que fez sempre o seu trabalho, deu o seu melhor, persistiu na sua tarefa e, de cada vez que olhou para si próprio, viu-se um pouco, um poucochinho que seja, melhor do que se vira da vez anterior. E assim sabe que, pouco a pouco, no íntimo do seu íntimo, sem necessidade que outros o honrem por tal, ganhou um pouco mais de brilho, está um passo mais próximo do seu objetivo, continua frutuosamente percorrendo o seu caminho para o que sabe ser inatingível e, no entanto, persiste em procurar estar tão próximo de atingir quanto possível: a Perfeição!
Em suma, ser Mestre Maçom define-se com o auxílio de uma frase que li há algum tempo e que foi dita por alguém que creio até que nem sequer foi maçom, Manuel António Pina, jornalista, escritor, poeta, laureado com o Prémio Camões em 2011, falecido em 19 de outubro de 2012: o Mestre Maçom é aquele que aprendeu e que pratica que o mínimo que nos é exigível é o máximo que podemos fazer.
Autor: Rui Bandeira
Fonte: A Partir da Pedra

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Maçonaria e Geração “Z” Pós-Pandemia

A moderna Maçonaria se identificou nos últimos 300 anos com causas nobres, lutas sociais e movimentos cívicos, revolucionários e libertários, que a fizeram prosperar até nossos dias, continuamente combatendo a intolerância, os preconceitos, os privilégios e defendendo novas ideias. Por isso angariou a antipatia de poderosos e de pessoas que simplesmente ignoram como ela funciona de fato.
Não obstante os percalços enfrentados até então, aliados ao respeito que a sua história inspira e é sobejamente decantada pelos seus obreiros mais dedicados e orgulhosos do status conferido pelo sentimento de pertencimento, a Maçonaria ainda é desconhecida por significativa parte da população brasileira e é vista por muitos com certo grau de desconfiança, apesar de todo o capital intelectual e consciência de sua importância para as transformações necessárias à promoção da justiça social.
Entre seus pontos fortes, cabe destacar o desenvolvimento de uma resiliência conferida pelo empenho na valorização do seu papel perante a sociedade, fazendo-se reconhecer como Oficina do saber, onde ideias e opiniões circulam sem nenhuma restrição, com estímulo ao livre debate, não deixando de exaltar suas características de acolhimento e sociabilidade.
No trabalho denominado “Evasão Maçônica: Análise da situação da GLMMG” (Silva, 2018, p.2) é enfatizado que
“toda organização necessita estar se reavaliando constantemente com a finalidade de conhecer suas potencialidades e suas fraquezas, de forma a continuar se mantendo perante a sociedade e, principalmente, a cumprir com os objetivos a que se propõe”.
Com a Maçonaria não poderia ser diferente.
Cabe, portanto, aos atuais membros ativos da Ordem honrar o legado recebido dos irmãos do passado e concentrar o foco nos enormes desafios que ela enfrenta na atualidade, notadamente em relação aos reflexos da pandemia do coronavírus, e que deverão balizar suas ações para o futuro, com vistas a reter seus atuais colaboradores e tornar-se atraente para o cidadão educado e com amplo acesso às informações, em função dos crescentes avanços tecnológicos.
O momento atual enseja uma sociedade e um tempo onde tudo é volátil e adaptável, denominados por Bauman (2001) de “modernidade líquida”, contrapondo-se a um recente período no qual imperava a modernidade sólida, que se apresentava ordenada, coesa, estável e previsível.
“Essa transição afetou os mais variados aspectos de nossa vida”.
Segundo ele,
“o advento do telefone celular serve bem como ‘golpe de misericórdia’ simbólica na dependência em relação ao espaço: o próprio acesso a um ponto telefônico não é mais necessário para que uma ordem seja dada e cumprida. Não importa mais onde está quem dá a ordem – a diferença entre ‘próximo’ e ‘distante’, ou entre o espaço selvagem e o civilizado e ordenado, está a ponto de desaparecer” (p.19).
Testemunhamos uma crescente
“elite dos residentes do ciberespaço que prosperam na incerteza e na instabilidade de todas as coisas mundanas…” (p.194).
Bauman afirma:
“vivemos em tempos líquidos, de conceitos e instituições instáveis e cambiantes”.
Isso fica demonstrado com o advento das redes sociais e os avanços científicos e tecnológicos que determinam novos feitios de interação, como o uso e abuso no tempo presente das videoconferências e do trabalho remoto, com o destaque para a atuação das gigantes Google, Facebook, Zoom e assemelhados, que aceleram a destruição de formas tradicionais de emprego, de comercialização de produtos, serviços, formas de ensino e aprendizagem, acelerando a obsolescência de hábitos, valores, dogmas, instituições e o surgimento de novos paradigmas. Nessa “era da informação”, a única certeza é a de que inovações hoje consideradas promissoras certamente desaparecerão antes de atingirem o potencial a que se propõem.
O protagonismo desse cenário cabe à Geração Z[1], compreendendo pessoas nascidas a partir de meados dos anos de 1990, considerada totalmente digital, e que demonstra valores profundamente diferentes, com demandas sociais e ambientais específicas e maior capacidade de reinventar a forma como trabalhar e solucionar problemas, comunicar-se e reunir-se, impondo diferentes hábitos de vida e de consumo, com apoio a modelos econômicos alternativos e desenvolvimento sustentável.
Esses nativos digitais não conhecem o mundo sem os meios de comunicação atuais e o veem de uma forma pequena e sem fronteiras, exigindo agilidade e praticidade em tudo na vida, como relacionamentos, educação e relações de trabalho. Na área da educação, demonstram maior conhecimento quando comparado às gerações anteriores. Concordando ou não com essa realidade, não se enxerga possibilidade de retorno. Para a professora e neurocientista britânica Susan Greenfield (apud Novaes, 2016), “estamos diante de uma mudança mental global”.
Citando matéria da Revista Exame (2006), a pesquisa de Novaes (2016) confirma que pelo lado profissional a Geração Z é multitarefa, ou seja, consegue fazer e entender várias coisas simultaneamente, habilidade essa que nenhuma geração anterior demonstrou, realizando tarefas online ou não, sem perder a atenção. Outra característica importante é que essa geração é caracterizada pelo imediatismo e chega ao mercado procurando empresas que valorizem a conectividade, a abertura ao diálogo, a velocidade e a globalidade.
Não restam dúvidas de que é nessa safra de novas cabeças que a Maçonaria deverá depositar suas esperanças e garimpar seus futuros obreiros, cabendo aos dirigentes atuais ter em mente que esses jovens encaram a diversidade de uma forma natural e essencial na sociedade e enxergam além do que parece ditar o momento, ensejando, em certas situações, ausência de orientação ideológica clara. Têm o perfil flexível, adaptável e criatividade como habilidade principal, aliando tecnologia e aprendizado. A questão é:
Estamos preparados para recrutá-los e recebê-los em nossas Oficinas?
Nessa toada, a perspectiva futura da Maçonaria demanda um novo olhar e contínua inquietação do pensamento, em busca dos progressos necessários, envolvendo todo um universo que espera ser explorado. Precisamos efetivamente valorizar um ponto forte que a Maçonaria aprimorou ao longo da sua caminhada e contempla em seus fundamentos, que é o do protagonismo dos indivíduos, do papel do Maçom junto à sociedade e que se consubstancia nos novos tempos como tendência das organizações do século XXI, que para manterem-se competitivas investem em programas de ajuda aos profissionais para o desenvolvimento das habilidades de liderança embasadas na busca da autoconsciência e da reflexão. Isso é uma realidade e não podemos ficar indiferentes a esse valor da Ordem, que se vislumbra como um fortíssimo apelo para encantar a Geração Z.
A proposta cativante de trabalho da Maçonaria para atrair e engajar essa nova geração deverá demonstrar uma série de desafios e oportunidades de crescimento pessoal, voltados para a formação de lideranças, da ampliação de conhecimentos, de educação cidadã e de desenvolvimento de capacidades que expandam o poder de visão, análise e discernimento, que lhes permitirão lidar com situações da vida cotidiana e conscientização acerca de ações decisivas e transformadoras para que façam a efetiva diferença no seu meio social, em benefício da Família, da Pátria e da Humanidade. Despiciendo ressaltar nosso conceito de fraternidade, que é cartão de visita e marca indissolúvel da Maçonaria, conforme demonstramos no trabalho denominado “O Capital Social da Maçonaria”, que pode ser consultado clicando AQUI .
Por outro lado, um ponto fraco da Maçonaria, merecedor de profunda atenção, é a forma como muitas Lojas são geridas, sem dar a devida importância ao aperfeiçoamento de seus obreiros, descurando na formação de lideranças que apontem caminhos, deixando de explorar toda a base de conhecimentos e instruções disponíveis, contribuindo para o desinteresse, o desencanto e eventuais deserções, resultantes do descompromisso para com os propósitos da Maçonaria.
Na análise dos dados que apontaram as cinco maiores causas de abandono da Ordem, apurados por Silva (2018, p. 20-21), destacam-se a falta de um objetivo definido para a Ordem e que seja obrigatório o seu cumprimento por todos os Maçons e Lojas, a vaidade e o orgulho de alguns irmãos, além de motivos profissionais (transferência/incompatibilidade de horários, etc.) e a existência de discussões inúteis e sem objetivos práticos. Será essa uma barreira intransponível?
Não é segredo maçônico que em algumas Lojas dirigentes com deficiência na habilidade de gestão não permitem que obreiros se destaquem, principalmente os mais jovens, esses da tal Geração Z.
Alguns veteranos, não especificamente mais adiantados em idade, contaminados pela síndrome do “esse cara sou eu”, ensejando uma pompa sabichona, têm dificuldades em continuar a aprender e sair da zona de conforto, pois fazem o que fazem da mesma maneira há anos e continuam a gozar de relativo sucesso entre os pares. Precisam de uma Loja para chamar de sua. E são felizes nesse autoengano, em especial quando ouvem que são repositórios de incomensurável saber maçônico e festejados exemplos a serem seguidos. Possuindo um fraco por elogios, e por vezes protagonizando momentos de fofura, adoram afagos e sempre esboçam um sorriso brejeiro e uma falsa expressão de encabulamento.
Pesquisas no mundo corporativo revelam que o fator idade não é determinante para indicar competência ou a sua falta. Quando bem administrado, o choque de gerações pode ser positivo, notadamente pelo intercâmbio de conhecimentos. Ademais, não existe uma geração melhor que outra, sabendo-se que atitudes, mentalidades abertas e flexíveis compõem os requisitos para superação de adversidades. O importante é não se acomodar e ficar atento às inovações.
No âmbito da Maçonaria, a ampla pesquisa “Maçonaria no Século XXI”, formulada pelo irmão Kennyo Ismail (2018, p.26) evidencia no item 4.3
“a teoria de duas grandes gerações distintas no meio maçônico brasileiro, sendo a mais jovem, de até 46 anos de idade, de aproximadamente 1/3 dos maçons brasileiros atuais”.
Esse segmento, segundo a pesquisa,
“incentiva o questionamento, o exercício da antítese, o que parece ser, de certa forma, mal visto pela geração mais velha. A geração mais jovem também apresenta características mais críticas, tem uma média maior de nível de escolaridade e de hábito de leitura…”.
No grupo mais velho, o estudo verificou que há
“uma preocupação extremamente maior com uma melhor seleção de membros do que o observado na geração mais jovem, atualmente minoritária, o que pode ser um indício da preocupação com o fim da hegemonia”.
O trabalho apresenta uma série de contribuições que deveriam ser avaliadas com carinho pelas nossas Lojas.
Não são raras as situações em que alguns veteranos quando questionados por um Aprendiz ou Companheiro da Geração Z, sobre alguma questão específica, respondem com ar triunfalista que não chegou a hora do consulente saber. Na realidade não sabem exatamente como responder, criando um clima de constrangimento e desânimo daqueles que se mostram inicialmente entusiasmados e ávidos pelo saber maçônico. Tal situação encontra amparo na pesquisa elaborada pelo irmão Kennyo Ismail (2018, p.23), onde ele registra que
“menos de 5% dos maçons brasileiros sabem o que é a Maçonaria”,
com o agravante de que esses desconhecedores “são os mesmos que convidam, sindicam, escrutinam, iniciam e instruem novos membros na Ordem…” (p. 24).
Em nossa realidade dinâmica, temos a concorrência de Lojas que atraem bons obreiros por estarem acima da média e não se contentarem com pouco, sabendo aproveitar as oportunidades na divulgação de suas atividades, como a recente onda de convites e mais convites para reuniões em videoconferências, com uma variedade de temas em discussão. Isso ocorre porque são bem geridas, disciplinadas, ricas nas atividades e observam o cumprimento das regras. Como as notícias correm, e impedidos de chegar ao ótimo individual, muitos iniciados recentes, em especial da Geração Z, munidos de coragem e em busca de desafios, quando possível, procuram outras Oficinas, como acontece frequentemente no mercado de trabalho. O pior é quando, desiludidos, abandonam a Ordem, pois uma eventual propaganda negativa desmotiva a captação de candidatos potenciais.
É reiteradamente repercutida a situação de novos irmãos que demandam mudanças e recebem críticas por sonharem com melhorias e sofrem do descrédito daqueles que apenas desejam uma Loja tranquila, com sessões rápidas, sem muitos desafios e, de preferência, que elimine aqueles que de uma forma ou de outra incomodam com suas presenças ou não sejam lá muito simpáticos, por serem visionários e portadores de um espírito crítico mais aguçado. Tudo muito bem articulado e reverberado na cabeça do Venerável por um restrito grupo dominante, que tenta sob todas as formas manter o nível de influência e controle dos destinos da Loja. Nesse grupo temos aqueles que ameaçam frequentemente deixar a Loja, mas não escondem a carência de bajulação. Esse grupo é incansável e sempre recebe novos adeptos, para desespero do Venerável da vez que começa logo a sonhar com o término de sua gestão.
Mas a história não termina aqui. Como toda moeda tem dois lados, não poderíamos deixar de registrar a situação daqueles irmãos que não conseguem acompanhar o ritmo das Lojas de alto desempenho e logo saem à procura de uma Loja tradicional, amiga, sossegada, que não exige trabalhos e estudos, para se acomodarem à sombra das colunas e apenas curtir o lado social da Maçonaria, o companheirismo. Não raras vezes irmãos com esse perfil costumam levar junto outros que já deram o que tinham que dar ou perderam o prestígio, restringindo-se a decantar feitos do passado, e não se sentem à vontade junto às novas gerações que entram com toda força e vigor. Sem preconceitos e com todo o respeito, que sejam ambos felizes, pois continuamos irmãos!
A prática da Maçonaria Especulativa ensina que o debate é essencial, tanto em Loja quanto nas redes sociais ou círculos de estudos presenciais ou online.
Instruções ministradas burocraticamente, apenas para cumprir tabela e textos lidos eventualmente em nossas reuniões não agregam valor se não são sucedidos de reflexões. Ao não incrementar ou valorizar os temas para estudos e debates, restringimo-nos à perenidade da ritualística e expectativa do ágape que vem após as reuniões presenciais, deixando de explorar toda a base de conhecimentos e instruções disponíveis, que representam um riquíssimo tesouro colocado à disposição de todos.
Pensando na força da Geração Z que dará continuidade aos ossos trabalhos, o Quarto de Horas de Estudos em Loja e as Instruções Maçônicas merecem atenção mais disciplinada por parte dos atuais gestores, dado o alcance e a importância no sentido de preparar o quadro de obreiros, vez que disponibilizam todo um sistema onde se permite explorar variados assuntos, mediante promoção de debates sobre questões sociais de relevo, por meio de ensinamentos que levem ao aprendizado e ao progresso por meio da troca de experiência, que variam de acordo com as competências individuais e em face das vivências e descobertas proporcionadas pelos trabalhos apresentados.
Com as novas facilidades proporcionadas pelos recursos das videoconferências, com alcance inédito, e respeitadas as regras de segurança e o sigilo no que couber, os resultados positivos serão incomensuráveis. Sobre o alcance das instruções, permitimo-nos sugerir a leitura do artigo ‘A instrução maçônica” clicando AQUI .
Inúmeros temas que são caros à Geração Z e inundam o noticiário nacional poderiam ser discutidos sem a necessidade de encontros presenciais, cabendo aos Mestres no exercício da tão propalada Plenitude[2] empenharem-se para enriquecer a Ordem do Dia e tornar os trabalhos mais dinâmicos e atrativos. O escritor Yuval Noah Harari, em sua obra “21 Lições para o Século 21” (2018), apresenta uma resenha de problemas globais e temas palpitantes quando aborda a rapidez das mudanças que se divisam para os próximos anos, a ansiedade geral com relação ao compartilhamento de experiências e informações, novas oportunidades, com a tecnologia transformando vidas e seus riscos potenciais e a forma de trabalhar, os desafios políticos, o desafio de educação das crianças, como reagir e entender o volume de informações produzidas diariamente, com ênfase para a propagação dos discursos de ódio, os avanços e ameaças da inteligência artificial, a disrupção tecnológica e guerras cibernéticas, o colapso ecológico e mudanças climáticas, o conceito de liberdade, o crescimento das desigualdades e a situação de vulnerabilidade econômica de quem já sofre com a pobreza, o isolamento nacionalista, secularismo, e as disputas entre crenças, verdade e pós-verdade.
Harari dá realce às provações difíceis que a humanidade terá que enfrentar com relação às revoluções gêmeas na tecnologia da informação e na biotecnologia, que poderão excluir bilhões de humanos do mercado de trabalho, criando
“uma nova e enorme classe sem utilidade, levando a convulsões sociais e políticas com as quais nenhuma ideologia existente está preparada para lidar” (p.38-39).
Para ele, teremos de explorar novos modelos de sociedade pós-trabalho, de economias pós-trabalhos e de política pós-trabalho [e podemos hoje acrescentar o cenário pós-pandemia], pois os modelos sociais, econômicos e políticos que herdamos do passado são inadequados para lidar com tal desafio (p.59). Para apimentar um pouco mais, acrescenta:
“ou a democracia se reinventa com sucesso numa forma radicalmente nova, ou os homens acabarão vivendo em ‘ditaduras digitais” (p.95).
Não podemos deixar de destacar também a recaída do populismo e formas de governos autoritários que se insinuam. Isso afeta a Maçonaria de alguma forma? É assunto para ser discutido em Loja? Podemos agendar uma “live” para repercutir essas ideias? Isso é viajar na maionese ou passa longe dos nossos interesses quanto a tornar feliz a humanidade? Precisamos estar antenados. É um caso a pensar…..
Outro assunto de suma importância no mundo real e que causa arrepio no meio maçônico é a questão Política. Esse tema pode ser, ao contrário do que se pensa, agregador e cativar a Geração Z, se bem estruturado e conduzido com sabedoria. Conforme abordamos recentemente em artigo apresentado junto à GLMMG, no bojo do “Programa Cultural – Filosofando sobre a Ordem”, cujos resultados serão brevemente publicados, a Maçonaria, como instituição, não pode continuar na velha cantilena de que não deve envolver-se diretamente em temas políticos e nas decisões de interesse do Brasil, candidamente delegando aos Maçons que o façam individualmente, pois um regramento de 1723, editado em outro momento histórico, impede ações mais decisivas em pleno século XXI.
O cuidado é não envolver-se no círculo vicioso da politicagem tradicional e sim na Política com “P” maiúsculo.
O escritor maçônico Raimundo Rodrigues, no seu livro “Sutilezas da Arte Real” (2003), faz uma provocação corajosa ao afirmar:
“Precisamos, isso sim, de algumas mudanças, uma vez que estamos no século XXI e certos Landmarques não mais se coadunam com as nossas necessidades atuais”.
E continua:
“Precisamos, nós, os Maçons, envidar esforços para evitar o marasmo, evitar o dolce far niente” (p.145).
Não podemos olvidar que até a própria Igreja Católica está avaliando mudanças de rumo para não perder fiéis.
A postura de somente caprichar na retórica e bradar que alguém tem que tomar uma providência é muito confortável. Esse comodismo e o obsequioso silêncio político da Maçonaria do Brasil precisam ser quebrados. Afinal, sabemos ou não dialogar? Temos medo de expor nossas ideias e vê-las contestadas? Se sim, então tudo é um faz de conta. Falta o básico, a essência.
Aqueles gestores que são lentos, míopes ou orgulhosos demais para enfrentar a realidade e adaptarem-se aos novos tempos certamente serão responsabilizados pelas sequelas que deixarão como herança.
Sem sofisma, equivoco ou reserva mental que possam criar obstáculos à revisão de conceitos, é chegada a hora de a Maçonaria repensar sua atuação, decretar a sua independência e de agir com responsabilidade, assumindo o papel que já foi sua marca registrada e encantou a juventude no seu passado glorioso: revolucionária, decisiva, incomodativa, marginal em outros momentos.
Defender que a Maçonaria seja apenas uma escola de pensamento recheada de sábios, onde se cultive exclusivamente moral e ética e acalente o sonho de que seus princípios e valores sejam amplamente conhecidos e que forças do além inspirem os tomadores de decisão, sem se envolver diretamente, apenas divulgando moções de censura ou de apoio, e ficando na torcida para que a justiça e os bons costumes prevaleçam, é mais do mesmo. Como se diz no popular: é continuar a encher linguiça e fartar-se em banquetes ritualísticos. Bauman (2001, p.167) faz uma provocação:
A mais pungente e menos respondível das questões dos nossos tempos de modernidade líquida não é “o que fazer?” (para tornar o mundo melhor ou mais feliz), mas “quem vai fazê-lo?”.
Portanto, para atrairmos a atenção das novas gerações impõe-se fixar nossas esperanças e expectativas no potencial dos nossos quadros de obreiros, que representam a força da qual dispomos neste momento e que precisam ser mantidos, reforçados e motivados constantemente, para fazerem o trabalho de recrutamento junto a essa força jovem que viceja em nossa sociedade e enfrentarem as provocações que teremos pela frente.
No trabalho sobre “Maçonaria do Futuro: Gestão Maçônica” (Silva et al., 2019, p. 18), os autores reproduzem a opinião de um entrevistado que remete à questão da motivação:
“A Maçonaria, ao contrário do que muitos acreditam, é uma instituição voluntária e depende da participação ativa de seus integrantes para poder cumprir com seus objetivos. Para uma entidade desta natureza, o grande desafio é ser atraente para captar talentos e capaz de manter o nível de motivação para retê-los, compreendendo que não é um ato, mas um processo continuado”.
Então, em frente!
Vale sublinhar no referido estudo uma afirmação que nos serve de alento e também de preocupação:
“é muito improvável que ela [a Maçonaria] possa vir a deixar de existir, mas seus valores e fraternidade não podem ser negligenciados, sob pena de comprometer os pilares de sustentação que a mantém durante séculos, e ela se tornar obsoleta tanto para os Maçons, quanto para a sociedade, aproximando-se das atividades de um clube de serviço” (p. 44).
Por oportuno, contrariando expectativas e os críticos de plantão, o Mestre Raimundo Rodrigues (2003), do alto de sua sapiência, faz um alerta:
“Atenção, Críticos! é preciso que os erros sejam vistos, mas é necessário também que as virtudes sejam colocadas em relevo” (p.146).
E com a sua indiscutível autoridade afirma:
“Não temos dúvida de que a Maçonaria cresce em número de Lojas, em número de membros, sobretudo, isto é inegável, cresce em qualidade cultural dos Maçons brasileiros, haja vista o número de obras publicadas nos últimos 20 anos” (p. 133).
Confirmando esse sucesso, o Site da CMSB (https://cmsb.org.br) registra que as 27 Grandes Lojas já contam com mais de 3.000 Lojas Regulares e número superior a 120.000 membros ativos.
Reforçando seu argumento, Mestre Raimundo Rodrigues enfatiza uma realidade animadora:
“Um outro ponto que nos mostra a pujança da Maçonaria brasileira é o interesse que as Lojas de vários recantos do Brasil mostram pelo aprimoramento cultural de seus Obreiros. Seminários, cursos, palestras são realizados por toda a parte e já é expressivo o número de palestrantes que viajam de um lado para o outro do Brasil, atendendo ao chamado que lhes é feito por Potências e por Lojas” (p.134).
Ou seja, temos trabalho sério e competente sendo realizado e agora, pela experiência dos novos tempos, nem é mais necessário o deslocamento de um Oriente a outro, nem mesmo entre Lojas, tendo em vista as facilidades dos alegres e prestigiados encontros virtuais.
Como fartamente reconhecido na literatura maçônica e nos discursos de autoridades do meio, indispensável investir nas entidades paramaçônicas, incorporar nossas famílias, incrementar a convivência dentro e foras das Lojas, compartilhar atividades sociais, incentivar a participação de maçons em organizações de relevo social, realizar seminários e debates públicos sobre temas de interesse da sociedade civil, promover e apoiar campanhas filantrópicas, publicar manifestos, levar os princípios da Maçonaria junto ao ninho da Geração Z, os centros acadêmicos, torná-la visível e atrair candidatos potenciais, idôneos, de reputações ilibadas e tementes a Deus, já que não dispomos de um guichê de inscrições, sabendo-se que a juventude simboliza futuro e esperança.
Assim, cabe a cada um de nós avaliarmos erros e acertos do passado e meditar a respeito da real Maçonaria que pretendemos legar às futuras gerações, que certamente colherão os frutos que hoje plantarmos, caso ela sobreviva, se e somente se superarmos os obstáculos atuais.
É uma questão de atitude, pois o momento de que dispomos para agir é o agora, pois a nossa geração pode ser a última a ter a oportunidade de fazer as mudanças necessárias. Não podemos nos dar ao luxo de pedir ao mundo que espere ou pouco, pois nós os maçons ainda estamos decidindo.
Veronica A. Shoffstall, em um belo poema denominado “Depois de um tempo”, indevidamente atribuído a Shakespeare, afirmou:
“um dia você aprende….a construir todas as estradas hoje porque o terreno de amanhã é demasiado incerto para planos e futuros têm o hábito de cair no meio do voo….”
Apenas para reforçar o sentido da urgência que se nos afigura, permitimo-nos agregar mais uma metáfora muito bem colocada por Bauman (2001, p.70), sobre uma fala da Rainha Vermelha em Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carrol:
“Agora, aqui, veja, é preciso correr o máximo que você puder para permanecer no mesmo lugar. Se quiser ir a algum outro lugar, deve correr pelo menos duas vezes mais depressa do que isso!”.
Sabe-se que tempo é o nosso recurso mais escasso.
Considerando a afirmação do físico dinamarquês Niels Borh de que “fazer previsões é difícil, especialmente sobre o futuro”, sendo certo que um dia ele chega,
não podemos arregar e permitir que nossas Lojas se engessem e criem resistência a mudanças e permaneçamos aferrados a uma forma de pensar, de olhos fechados à evidência dos fatos e de que viveremos felizes para sempre, manipulando e sendo manipulados, permanecendo sorrateiramente “à ordem” no aguardo de reconhecimentos e glórias, certificados, homenagens, fotos bacanas em revistas e poses vitoriosas no Facebook, exibindo nossas alfaias coruscantes, e comprometendo seriamente a dinâmica das Lojas e o futuro da Maçonaria.
Evidentemente, não podemos descurar das tradições, do legado recebido e a entregar às próximas gerações.
Reiterando reflexão contida no artigo acima citado, dentro do “Programa Cultural – Filosofando sobre a Ordem”, da GLMMG, evidencia-se imprescindível termos consciência de que as instituições hoje não agem solitárias. A estratégia são as parcerias, habilidades e talentos se associando e potencializando esforços. Depreende-se crucial a aproximação entre as Potencias Regulares para desenvolverem um plano conjunto, não penas com foco em resultados de curto prazo, mas de construir uma Maçonaria vibrante e um país melhor para a ávida geração de brasileiros que aumenta dia a dia, com demandas inéditas.
Para isso precisamos sair da nossa caverna confortável e aquecida e mostrar a cara, pois
“ninguém acende uma lâmpada para cobri-la com uma vasilha ou colocá-la debaixo da cama. Ele a coloca no candeeiro, a fim de que todos os que entram vejam a luz” (Lc 8, 16).
Levemos, portanto, nossa luz ao mundo. Enfim, está em nossas mãos pavimentar o caminho que será trilhado pelos futuros obreiros. Portanto, para que sejam superadas as barreiras que hoje se apresentam para a efetiva melhoria de desempenho, mantendo a credibilidade até então conquistada e valorizar ainda mais a Maçonaria, permitimo-nos sugerir, como dever de casa e ponto de partida, o acolhimento e discussão sobre o diagnóstico e as propostas para minimizar eventuais deficiências, conforme o excelente trabalho “Maçonaria do Futuro: Gestão Maçônica” (Silva et al., 2019 – disponível no Site da CMSB – cmsb.org.br), que certamente ensejarão melhores perspectivas na longa e desafiadora jornada que teremos pela frente.
Autor: Márcio dos Santos Gomes
Márcio é Mestre Instalado da Loja Maçônica Águia das Alterosas – 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte. Membro da Escola Maçônica Mestre Antônio Augusto Alves D’Almeida e da Academia Mineira Maçônica de Letras.

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Notas
[1] Geração X: nascidos após o baby boom, pós-Segunda Guerra Mundial, a partir dos anos 1960 até o final dos anos 1970; Geração Y: nascidos após o início da década de 1980 e até 1995, igualmente conhecida como geração do milênio. (Fonte Wikipédia)
[2]Sugestão de leitura do artigo “Plenitude Maçônica”, em: https://opontodentrodocirculo.wordpress.com/2018/12/13/plenitude-maconica/
Referências Bibliográficas
A BÍBLIA SAGRADA. Edição Pastoral: São Paulo: Paulus, 1990;
BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. RJ: Zahar, 2001;
GLMMG. Ritual Grau 1 – R ∴E ∴A ∴A ∴ Belo Horizonte: 2017;
GOMES, Márcio dos Santos. O Capital Social da Maçonaria. 2015. Disponível em: https://opontodentrodocirculo.wordpress.com/2015/09/04/o-capital-social-da-maconaria/. Acesso em 13.01.2020;
______________________________ A Instrução Maçônica. 2016. Disponível em: https://opontodentrodocirculo.wordpress.com/2016/02/23/a-instrucao-maconica. Acesso em 13.01.2020;
HARARI. Yuval Noah. 21 Lições para o Século 21. São Paulo: Companhia das Letras, 2018;
ISMAIL, Kennyo. CMI – Maçonaria no Século XXI. 2018. Disponível em: https://www.noesquadro.com.br/wp-content/uploads/2018/04/RELATÓRIO-CMI.pdf. Acesso em 12.01.2020;
NOVAES, Tiago et al. Geração Z: Uma Análise sobre o Relacionamento com o Trabalho. 2016. Disponível em:
RODRIGUES, Raimundo. Sutilezas da Arte Real. Londrina: Ed. Maçônica “A Trolha”, 2003;
SILVA, José Eduardo. Evasão Maçônica: Análise da situação da GLMMG. 2018. Disponível em: http://www.glmmg.org.br/Gestao.Macons/assets/files/Pesquisa-evasao-GLMMG.pdf. Acesso em 12.01.2020;
SILVA, José Eduardo et al. Maçonaria do Futuro: Gestão Maçônica. 2019. Disponível em: http://www.glmmg.org.br/Gestao.Macons/assets/files/Gestao_Maconica_final.pdf. Acesso em 12.01.2020. Disponível na Biblioteca da CMSB em: https://cmsb.org.br/biblioteca/.
A Maçonaria Simbólica e a Filosofia
Introdução
O que se entende por Filosofia Maçônica? Como ela exercita seus postulados, normas, constituições, regulamentos e regimentos maçônicos? É esclarecido ou informado ao profano que ele vai fazer parte de uma Instituição Filosófica, ou simplesmente exigimos dele uma boa conduta “moral”? Será o suficiente para o que pretende a Instituição que tem a filosofia do “ser livre e de bons costumes” como seu postulado? Ao Aprendiz são apresentadas as diretrizes para que ele possa exercitar a arte do pensar, procurando, primeiro, “conhecer a si mesmo” e, depois, praticar a caridade, que é peculiar a todos aqueles que, mergulhados em seu “EU”, encontram respostas para os seus questionamentos e, posteriormente, exercitar esse aprendizado? O que dizer, então, do Companheiro e do Mestre Maçom?
Para ser admitido na Maçonaria, todo homem deve possuir um caráter ilibado, ser livre e de bons costumes. Mas isso não é tudo, não é estanque. Espera-se, ainda, que todo Maçom, além desses pré-requisitos, seja um pensador, uma fonte inquietante em busca do saber. Entretanto, nas Lojas, em reuniões, pouco se tem enfatizado essa premissa. Não há nenhum ensinamento prático filosófico na arte de desbastar a Pedra Bruta. A instrução limita-se aos símbolos como se ali estivesse contida toda a sabedoria maçônica, situação que vem se arrastando através dos tempos, fazendo parte da conduta histórica da Instituição.
Daí se conclui que vem ocorrendo uma inversão de valores, ocasionando uma constante evasão nos quadros de obreiros das Lojas. O principal motivo é que as reuniões estão limitadas às leituras dos rituais e ao bater dos malhetes. Desse modo, quando o obreiro chega a Mestre, tem uma visão equivocada de que não há mais nada a fazer ou aprender, muito menos a ensinar aos neófitos sobre o que pretende a Maçonaria, por desconhecimento da sua base filosófica ou por simples acomodação. É o retrocesso… O conhecimento, que se arrasta durante séculos, aos poucos, vai ficando no ostracismo.
O que permanecem são os sinais, toques, palavras e a marcha, como instrução para cada grau, e que, muitas vezes, são ensinados equivocadamente. Basta verificar nas Lojas o que se ensina quando há uma Iniciação, Elevação ou Exaltação. No Terceiro Grau é uma miscelânea de informações; as instruções nesse sentido são desencontradas, principalmente no toque do grau.
A Maçonaria está perdendo o norte que orienta os seus membros à prática do filosofar; por que não dizer, perdendo a essência dos significados maçônicos, esquecendo de praticar a Arte Real, debruçando-se sobre trabalhos que nada acrescentam à Instituição; quando não, colocando irmãos em situação constrangedora, diante de uma assembleia despreparada e alheia ao que se propõe a Maçonaria Universal. Ao final da apresentação, parabeniza-se o obreiro com uma breve salva de palmas pelo excelente trabalho, o que chega a ser lamentável para a Instituição.
Não se pretende com o assunto ora abordado dar soluções às questões apresentadas, mas alertar todos os Maçons que venham a ter acesso ao conteúdo aqui escrito, para uma reflexão inconteste da sua conduta, enquanto Maçom que preza a Instituição. Não é justo que todo o aprendizado filosófico construído pelos grandes pensadores que engrossaram as colunas da Maçonaria, durante séculos, se perca em tão pouco tempo, sem nenhuma reflexão, sem nenhuma compreensão dos significados que atravessaram centenas de anos até os nossos dias, aos quais, hoje, não se tem dado a devida importância, por pura acomodação, ou simplesmente por desconhecimento do que realmente é a Maçonaria e a que ela se propõe.
Filosofia
“A filosofia é a totalidade do conhecimento.” Aristóteles
A palavra Filosofia, “Philosophia”, é derivada de duas palavras gregas: Philo, que ainda se deriva de Philia, que significa amizade, amor fraterno, respeito entre os iguais; e Sophia, que quer dizer sabedoria, a qual é derivada da palavra Sophos, sábio ou alguém que admira e busca a sabedoria.
Segundo o dicionário Aurélio, filosofia é o estudo que se caracteriza pela incessante intenção de ampliar a compreensão da realidade, no sentido de apreendê-la na sua totalidade, quer pela busca da realidade capaz de abranger todas as outras, o Ser (ora realidade suprema, ora causa primeira, ora fim último, ora absoluto, espírito, matéria etc.), quer pela definição do instrumento capaz de apreender a realidade, o pensamento, tornando-se o homem tema inevitável de consideração. Também, no Aurélio, se descreve a filosofia como um conjunto de estudos ou de considerações que tendem a reunir uma ordem determinada de conhecimentos, limitando o seu campo de pesquisa à natureza, ou à sociedade, ou à história, ou a relações numéricas, em um número reduzido de princípios que lhe servem de fundamento e lhe restringem o alcance.
O filósofo Pitágoras de Samos foi quem usou pela primeira vez esse termo Filosofia, por volta do século V a.C, ao responder a um de seus discípulos que ele não era um “Sábio”, mas apenas alguém que amava a Sabedoria.
Como campo de conhecimento, a filosofia ocidental surgiu na Grécia Antiga com a figura de Tales de Mileto, sendo ele o primeiro a buscar uma explicação para os fenômenos da natureza, usando a Razão e não os Mitos, como era de costume, na época.
Portanto, aquele que ama a sabedoria, tem amizade pelo saber e deseja saber, é um filósofo. Assim, a Filosofia indica um estado de espírito da pessoa que ama, isto é, daquela que deseja o conhecimento, que o estima, o procura e o respeita.
Pode-se interpretar, também, que Filosofia é o estudo da vida; pode ser ciência, fé, religião ou simplesmente a mente ou a razão em pleno funcionamento. Toda a arte e toda ciência têm partes filosóficas. Quando a mente dedica-se a decifrar os enigmas da vida, estará filosofando.
Consta que Pitágoras de Samos teria afirmado:
“A sabedoria plena e completa pertence aos deuses, mas que os homens podem desejá-la ou amá-la, tornando-se filósofos.”
Deve-se, aqui também, distinguir os significados de filosofar e filosofia. Para tanto, os aspectos fundamentais da Interpretação, Compreensão e a Realidade estão intrinsecamente contidos na conceituação do “FILOSOFAR” e “FILOSOFIA”.
Compreender a realidade, elucidando as suas interpretações é o que se entende por filosofar. Assim, a Filosofia se caracteriza pela intenção de ampliar a compreensão da realidade em questão.
Historicamente, a Filosofia envereda pelas teorias que procuram encontrar algum tipo de compreensão, sabedoria ou conhecimento sobre as questões fundamentais, como por exemplo, a realidade, o significado, o valor, o ser e a verdade.
Em Filosofia o fazer é uma constante na arte de construir conhecimento, portanto, se faz necessário levar em consideração toda a ideia filosófica dos pensadores do passado. Ao debruçar-se sobre uma questão filosófica, o pensador ou filósofo rende tributos aos seus antecessores sobre o assunto em questão, podendo ratificar as ideias já formuladas, contrapô-las, esclarecê-las ou até mesmo melhorá-las. Assim sendo, a busca pelo conhecimento torna-se infinita, mesmo que já exista algo sobre o assunto abordado. É na inquietação da busca pelo conhecimento, que o homem se torna um ser puramente pensante, na compreensão da realidade, na interpretação das coisas como um todo.
A Filosofia moderna (1453 a 1789) postula que todo homem deve ser livre das alienações dogmáticas religiosas. Livre dessas correntes, também é livre para exercitar o pensamento, passando a ter outro conceito sobre si mesmo ao interpretar o mundo e a vida. Entende-se que todo ser humano é um ser pensante na busca de novas interpretações do mundo que o cerca, não descartando, com isso, a sua religiosidade. O grande marco das Escolas Modernas era, portanto, a liberação da consciência humana, tornando o homem livre para pensar, investigar e interpretar.
O filósofo busca, interpreta e procura compreender as coisas através de sua observação, sem se embasar em doutrinas, quer sejam religiosas ou não, para explicar o inexplicável. Ele abandona os pensamentos escravizadores e passa a ser um indivíduo pensante que contribui com a coletividade para a construção do saber, do conhecimento. É romper as amarras institucionalizadas, é a libertação da individualidade na arte de pensar, contrapondo-se à uniformidade do pensamento medieval e às nacionalidades, animadas por uma vida nova, expressando sua peculiaridade, em suas respectivas filosofias.
Conclui-se que a Filosofia permeia pelo mundo abstrato e interpretativo, questionando os porquês do objeto investigatório até a conclusão dos significados. Para tanto, é necessário o filósofo ser possuidor de uma profunda amizade, amor e respeito pelo saber. Com base nessa premissa, o filósofo é, então, aquele que mergulha no desconhecido, na busca pelo conhecimento conclusivo, último e primordial, a sabedoria total.
Filosofia maçônica
A Maçonaria não possui uma Escola essencialmente filosófica. Não possui uma filosofia própria ou adota, exclusivamente, essa ou aquela Escola como base fundamental para os seus estudos. Ao contrário, a Maçonaria é uma Escola de filosofar e a filosofia das grandes Escolas filosóficas é que lhes servem como fonte inspiradora.
Caso ela se restringisse a uma Escola ou a um sistema, seus membros não teriam a liberdade de pensamento, que lhes é peculiar. Eles seriam obrigados a caminharem em uma só direção. Se assim se conduzisse, ela seria uma Instituição, provavelmente, dogmática e limitada; não mais existiria por estar presa nos limites da interpretação, da compreensão e da realidade das coisas. Antes de qualquer ensinamento maçônico, deve-se compreender que a sua filosofia está alicerçada na Liberdade, Igualdade e na Fraternidade.
Filosoficamente, a Maçonaria procura mostrar ao homem que ele é um ser em processo contínuo de lapidação interior, visando à compreensão do seu próprio “EU”, comprometido com o seu pensar, com a sua própria existência. Ela proporciona aos seus
membros os meios necessários para adquirirem o saber, descobrirem que o saber humano é, em especial, um saber filosófico, mas muitos não se apercebem disso.
A liberdade de pensamento é o ponto fundamental para todo Maçom que anseia a “luz”. É o livre pensar que faz o Aprendiz refletir sobre “si” mesmo, compreender os enigmas e significados da vida, na viagem pelo seu interior até descobrir o brilho de sua alma. É um lapidar constante da Pedra Bruta, para daí brotar um sentimento de solidariedade sincera entre os irmãos; e, dessa forma, não mais havendo diferenças, mas uma igualdade própria do Companheiro, solidificar os sentimentos de fraternidade.
Com os conhecimentos adquiridos quando Aprendiz, o Companheiro passa a exercitar todo o seu aprendizado, praticamente, em atividade construtiva social, alicerçada na tolerância e na justiça. Entende-se, então, que ele depende sempre da capacidade de interpretação dos elementos fundamentais do simbolismo; só assim, poderá caminhar até alcançar a Câmara do Meio. Na sua constante ação de aperfeiçoamento, trabalha na prática da moral e na observância da ciência, com a missão de aprofundar o seu intelecto na Pedra Cúbica.
Por sua vez, cabe ao Mestre todo o trabalho espiritual, já que a pedra, agora, está polida. É missão dele é unir o que está disperso, irradiando a luz, fortalecendo a fraternidade entre os homens. Ao Mestre é consagrada a firmeza de caráter, a moral; fazer a humanidade mais feliz e virtuosa, através dos seus exemplos como um Mestre Maçom. Cabe a ele investigar, tornar-se um pesquisador incansável na busca da Palavra Perdida, chave para todas as questões humanas.
Todo o ensinamento filosófico está voltado para o interior do homem, orientando-o primeiramente, a conhecer a si mesmo, aniquilando as paixões e os vícios que o deixam na ignorância.
Enquanto o homem for áspero, insensato, intolerante e não exercitar a humildade, ele não poderá ser um agente transformador da humanidade. É combatendo esses instintos que a Maçonaria trabalha o homem para a construção de um mundo melhor. É sepultando as paixões mundanas que o Maçom se torna um homem digno e de caráter ilibado para com a Família, à Pátria e a Humanidade.
A Maçonaria é uma Escola da Moral, que caminha pela Filosofia Social, fazendo com que todos os seus membros sejam fieis cumpridores dos seus deveres como cidadãos, para com a família e a pátria. Ela possui estágios de conhecimentos divididos em graus, que através de sucessivas iniciações, mostra ao homem o seu interior, o brilho da luz espiritual e divina, necessária para a sua dignidade, tornando-o livre, porém de bons costumes.
A Maçonaria, pelo exposto acima, não se resume aos rituais, aos ritos ou a três pontos. Ela é uma fonte de sabedoria dos significados humanos, é uma busca constante, é um desbastar a Pedra Bruta até a sua completa polidez. Para alcançar tal estágio, é necessário que os seus membros entendam que tudo passa pela compreensão e pelo exercício da virtude, numa luta incessante para vencer as paixões, cavar masmorras aos vícios, libertar-se das ilusões mundanas, para daí renascer um novo homem, no estado de inocência, no amor que fortalece a justiça e a verdade, que unem a todos como verdadeiros irmãos.
A Maçonaria e a Filosofia
Nos idos do século XVIII, dominava a Europa o pensamento filosófico denominado Ilustração, conhecido também por Iluminismo ou Enciclopedismo. É no auge desse movimento que acontece a fundação da Grande Loja de Londres, aos 24 de junho de 1717. O Iluminismo se estendeu pelos séculos XVII e XVIII, de cujo movimento provavelmente os Maçons da época tenham sofrido influência.
Durante séculos, o homem vinha padecendo forte pressão psicológica para não fazer qualquer questionamento a respeito da religião. Era obrigado a aceitar os dogmas impostos e ensinamentos religiosos como verdades absolutas; caso contrário seria provavelmente excomungado, sofrendo a ação da Inquisição.
Apesar de toda opressão, a história registra que as Escolas filosóficas modernas vinham lutando contra o absolutismo do pensamento religioso da época. Com a transformação da Maçonaria Operativa em Maçonaria Especulativa, a Arte Real toma outro sentido. As suas fileiras, agora, não são exclusivas de pedreiros na arte de traçar linhas arquitetônicas destinadas principalmente à construção de templos religiosos. A arte do saber, do pensar toma vulto entre os obreiros. Sua identificação fica mais clara ainda, quase que em sua totalidade, junto às Escolas Filosóficas Modernas: Renascimento, Racionalismo e Iluminismo, cujo objetivo era a libertação da consciência humana.
Com o Renascimento, os filósofos do Iluminismo se entusiasmam e projetam dois caminhos a serem percorridos: o laicismo e o da luta em busca de melhores condições de vida para o homem. A Maçonaria Especulativa, por sua vez, adota uma vertente de pensamento, que se constitui em observar os princípios morais do homem, aplicando-os no bom relacionamento humano, na confiança, na sinceridade e na lealdade. É através dessa observação que o Maçom tenta compreender a interação humana e construir uma harmoniosa e perfeita fraternidade entre seus membros.
Como a Maçonaria abraçara o pensamento dos movimentos filosóficos expurgados pela Igreja, (que vê no Renascimento o estímulo para uma cultura exclusivamente terrena, emponderando em demasia a dignidade do homem, com grandes prejuízos para a vida espiritual), passou a ser perseguida. Perseguida por pregar a liberdade de pensamento e, sobretudo, a liberdade de consciência. Perseguida porque proporciona ao homem o direito de conviver com os outros homens que professem qualquer religião ou fé. Perseguida porque o seu lema maior é “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”. Perseguida porque dá ao homem o direito de ser livre, inteira e intensamente livre.
No teor do pensamento renascentista, alguns frades, na Idade Moderna, passaram a pregar que o Humanismo restringia o homem ao puramente humano, reprimindo, sobretudo os fatores espirituais. Diziam eles:
“Nosso humanismo, por natureza, difere sensivelmente da atitude espiritual dos demais humanismo: difere da atitude humanista renascentista, da de Herder ou de Goethe, que apenas pretendem elevar-se acima do puramente material; difere dos atuais humanismo no domínio econômico, social-ético, marcial e político; difere ainda do humanitarismo dos pseudocristãos, da Maçonaria, do Deísmo e dos Livres Pensadores.” [1]
É nesse contexto que a Maçonaria abre suas portas para o pensamento filosófico, procurando se libertar dos dogmas, das superstições que escravizam o homem, e passa a questionar a sua existência, através da investigação científica, até reconhecer os valores e direitos individuais de cada ser humano.
Alicerçada no amor fraternal, passa a dar ênfase ao amor ao próximo, a Deus, à pátria e à família; os seus membros se reconhecem como verdadeiros irmãos. A livre investigação da verdade, simbolicamente, é a busca constante da Palavra Perdida que nunca será encontrada e, se encontrada, não será decifrada, por ser a chave dos mistérios da vida; se assim o fosse, perderia a razão da sua existência por conhecer toda a verdade, algo inalcançável para qualquer Maçom.
A Liberdade de pensamento, a Igualdade entre os homens de qualquer credo e a Fraternidade universal constituem o tripé que faz da Maçonaria uma Escola de pensamento filosófico, em busca da felicidade interior, do bem-estar social, anulando toda e qualquer aspereza que asfixia o homem, no exercício do amor ao próximo. Ela tem como grande objetivo a razão e a justiça para que o mundo alcance a felicidade geral e a paz universal.
Para tanto, é necessário que o Maçom seja um pesquisador na arte de filosofar, procurando encontrar a paz interior, a tolerância, a humildade, o lapidar da Pedra Bruta para daí, então, deixar fluir todo o conhecimento adquirido, durante anos de aprendizado e pesquisa, iluminando a todos com o seu exemplo, como cidadão diferenciado no mundo profano.
Sem adotar uma linha unilateral de pensamento filosófico, a Maçonaria torna-se fundamentalmente filosófica, trabalhando com justiça, no sentido de promover a solidariedade e a paz entre os homens.
O irmão Moisés Mussa Battal, da Grande Loja Maçônica do Chile, assim se expressa:
“A tarefa essencial da filosofia maçônica é irradiar a luz de nossos princípios e de nossos hábitos para melhorar a condição humana. Mais que monovalente, ou seja, de uma só linha, de uma só raiz, ela é polivalente. Tem vertentes, então, que a alimentam e ela se reparte como um delta no mundo profano. É tradicionalista e às vezes progressista; isto parece um paradoxo, mas não o é; tradição é conservar o melhor do passado para utilizá-lo em compreender mais o presente e preparar um porvir melhor que o presente. Ela não é o ensinamento de um conjunto de normas e princípios; nem um pensar exclusivo e excludente; é uma reflexão da vida e para a vida.” [2]
Ele ainda afirma:
“Diremos que nossa filosofia se identifica com esta Idade Moderna; sua identidade é quase total. Esta identidade é quase uma coerência, tratando-se do movimento filosófico chamado Ilustração.” [3]
Observe-se, agora, o que está escrito no Vade Mecum Maçônico da Grande Loja Maçônica do Estado da Paraíba, com relação à definição e princípios da ordem:
“A Maçonaria é uma Ordem Universal formada de homens de todas as raças, credos e nacionalidades, acolhidos por iniciação e congregados em Loja, nas quais, por métodos ou meios racionais, auxiliados por símbolos e alegorias, estudam e trabalham para a construção da Sociedade Humana, fundada no Amor Fraternal na esperança de que com Amor a Deus, à Pátria, à Família e ao Próximo, com tolerância, virtude e sabedoria, com a constante livre investigação da verdade, com o progresso do conhecimento humano, das ciências e das artes, sob a tríade – Liberdade, Igualdade e Fraternidade -, dentro dos princípios da Razão e da Justiça, o mundo alcance a felicidade e a paz universal.” [4]
Fazendo-se uma análise dessa definição, verifica-se que a Arte de Filosofar está implícita nos princípios da Ordem. Cabe ao Maçom entender qual a sua real missão, qual o seu compromisso para com a Instituição e com os irmãos na construção de uma sociedade, alicerçada no amor fraternal. Para tanto é preciso que ele seja um homem tolerante, virtuoso e um sábio pesquisador. O diagnóstico na Arte do Filosofar está na proposta da investigação da verdade. Todo processo investigatório passa pela arte do pensar, do deduzir, do saber, do compreender, para então chegar à conclusão através do conhecimento. Além disso, não se deve esquecer que todo homem na senda do saber não pode se excluir da fraternidade universal, nem se isolar no seu próprio mundo, o que o impedirá de entender toda a riqueza que o processo investigatório lhe propõe. Totalmente introspectivo, ele será incapaz de conhecer o progresso da razão humana, das ciências e das artes, porque não as compreenderá em sua essência. Ele será um cego, um limitado e egoísta pensador inconcluso. A energia que o alimenta, dando-lhe força para alcançar o seu objetivo visando à construção de um mundo melhor é o amor fraternal entre os irmãos, à família e a Deus.
Como Escola na arte de filosofar, a Maçonaria não se limita a uma vertente da Filosofia. Ela busca, através dos seus postulados, incentivar seus membros a compreenderem o seu “EU”, com vistas à construção de uma sociedade mais fraterna. Para isso, têm o livre arbítrio que lhes permite estudar e pesquisar o que lhe convém, com a sabedoria que lhes deve ser peculiar, daí serem livres pensadores. Para realizar esse sonho quase “utópico”, o Maçom deve, portanto, se libertar do egoísmo, das vaidades humanas para se tornar um homem de bons costumes, humilde, justo, fraternal, livre, feliz e perfeito, para então ser a Pedra Polida na construção de uma perfeita sociedade humana.
Observe-se o que consta na Constituição do Grande Oriente do Brasil:
“Art. 1º – A Maçonaria é uma instituição essencialmente iniciática, filosófica, filantrópica, progressista e evolucionária, cujos fins supremos são: Liberdade, Igualdade e Fraternidade.” [5]
Do mesmo modo, a Constituição da Grande Loja do Paraná, que estabelece:
“A Maçonaria é, antes de tudo, uma instituição filosófica; sua finalidade é a propagação de sua filosofia. Todas as suas atividades, sociais ou políticas, não são mais que aplicações dessa filosofia ao campo político-social.” [6]
A partir da análise feita no tocante à definição e os princípios da Grande Loja Maçônica do Estado da Paraíba, cabe agora, com base nas Constituições do Grande Oriente do Brasil, em seu art. 1º, bem como considerando o que estabelece a Grande Loja do Paraná, como Instituição Filosófica, que não é muito diferente da Grande Loja da Paraíba, questionar: os maçons praticam filosofia? Sob o aspecto constitucional, a Maçonaria se diz filosófica. Porém questionemos mais uma vez: Ela o é efetivamente?
Poder-se-ia responder a essas indagações ora formuladas com uma resposta simplória. Entretanto o simplório, ao tempo que satisfaz, também induz à acomodação e à ignorância, porque leva as pessoas a pensarem que já sabem tudo, quando na verdade estão longe do saber, do conhecer. Assim, cabe aos Maçons compreenderem que a prática da filosofia implica em esclarecer as questões que a realidade lhes impõe com a intenção de melhor elucidá-la. No ritual de Aprendiz, há uma orientação inicial para a compreensão do seu “interior”, quando se afirma que todo homem é uma Pedra Bruta e que pode se tornar uma Pedra Polida.
É na interpretação do V∴I∴T∴R∴I∴O∴L∴, onde estão subentendidos os primeiros passos na arte de filosofar. Para compreender melhor a realidade, primeiro deve-se, através da investigação, elucidar todos os questionamentos interiores, com o espírito de desbastar a Pedra Bruta. Esclarecendo essas questões, que impedem de ver o real sentido da vida, encontra-se o brilho necessário e transformador para construir uma sociedade harmoniosa e feliz.
É nesse processo alomórfico e construtivo que a Maçonaria utiliza os instrumentos de trabalho da arquitetura e das construções, como símbolos filosóficos para o aprendizado dos seus membros
O prumo é o exemplo de sua dignidade, da altivez e da imparcialidade como homem justo. Tomando-o como exemplo, o maçom passa a ser o apaziguador, aniquilando as diferenças entre os irmãos.
O nível indica ao maçom a igualdade social entre os irmãos embasada na justiça e na tolerância, sem levar em consideração a classe social a que ele pertença no mundo profano.
Com o compasso e o esquadro, as obras arquitetônicas possuem a justa medida, como símbolo. Esses instrumentos lembram ao Maçom que todas as suas ações devem estar pautadas na justiça e na retidão, atos que regem um verdadeiro obreiro da Arte Real.
Quando Aprendiz, o Maçom utiliza o esquadro como instrumento de trabalho juntamente com o maço e o cinzel, por serem úteis no desbastar da Pedra Bruta. Com o esquadro nas mãos, ele corta as pedras, deixando-as estritamente retangulares para se ajustarem com exatidão entre si. Entende-se, portanto, que o esquadro simboliza que a perfeição está para o indivíduo, assim como a justiça se coloca para a sociedade.
O malho, ou maço, e o cinzel são instrumentos preciosos que o Aprendiz usa para transformar a Pedra Bruta em Pedra Cúbica. Ele trabalha pacientemente deixando aflorar a sua arte. Simbolicamente esses instrumentos mostram-lhe como deve corrigir os seus defeitos, tomando decisões sábias (o cinzel), com determinação enérgica (o malho).
Enquanto a Pedra estiver Bruta, não se pode utilizar o compasso, pois é um instrumento usado pelo Mestre, quando a pedra estiver polida, esquadrejada e perfeitamente acabada.
A régua permite traçar linhas retas que podem ser prolongadas até o infinito. Para o Maçom, ela simboliza o direito inflexível e a lei moral, no entanto as realizações desse trabalho podem ser limitadas; antes, porém, deve-se traçar um programa que direcione passo a passo os caminhos a seguir, que vão além da ideia do “abstrato” (Régua), enquanto o compasso simboliza a “realidade concreta” com a qual se vivencia.
Filosoficamente, ser Maçom significa ser um pedreiro no processo construtivo da virtude, ser um obreiro incansável dessa obra interminável, ser perseverante no uso da trolha com prudência e perspicácia, pacientemente, quebrando as asperezas ainda existentes em seu interior. Para se construir uma sociedade mais justa e fraterna, o Maçom precisa primeiro se tornar uma pessoa melhor e exercitar com excelência a fraternidade.
A Filosofia nos graus simbólicos
A Maçonaria, como Instituição filosófica e iniciática, procura despertar no homem o senso de justiça e a perfeição. Para tanto, faz-se necessário, inicialmente, que ele mergulhe em seus pensamentos, buscando a fonte da razão de sua existência. Só assim será capaz de decifrar os enigmas interiores, quebrando as arestas que o separam da “verdadeira luz”, polindo a sua alma e tornando-se um homem capaz de trabalhar a Pedra Bruta que o simboliza em seus estágios evolutivos na investigação, interpretação e compreensão do seu próprio “EU”. Nesse sentido, interpreta-se ao iniciado o mundo maçônico, no qual a Loja é o símbolo do macrocosmo, o Universo; e do microcosmo, o homem.
É missão do Aprendiz trabalhar a sua interioridade no controle de “si”, buscando compreensão através dos ensinamentos a ele transferidos: os significados do desbastar a Pedra Bruta. Vencer as paixões mundanas deve ser a sua primeira reflexão; num estágio seguinte, ele trabalha desbastando as asperezas que o deixam cego, enquanto profano, impedindo-o de enxergar o “diamante” que é o homem. Agora, o Aprendiz, enquanto neófito, é instruído a trabalhar no sentido de quebrar as arestas que encobrem todo o brilho da essência humana, para, então, quando Companheiro, trabalhar na Pedra Cúbica. É no mestrado que esse conhecimento filosófico adquire corpo sólido. Assim sendo, é de fundamental importância que o Maçom deva instruir-se a respeito dessa parte filosófica, porque a vida em si é o exercício da filosofia.
Para adquirir esses conhecimentos, o Aprendiz tem que evoluir simbolicamente e subir com dificuldade os degraus da escada de Jacó. A cada conhecimento adquirido, ele faz uma reflexão de sua existência; a percepção é individual e intransferível, levando-o com seus estudos e observações a uma interpretação pessoal da vida na compreensão do amor ao próximo, alicerce de toda felicidade humana.
A investigação da verdade é a base da Filosofia Maçônica. A compreensão da Arte Real deve ser interpretada, na Maçonaria Especulativa, como sendo o aperfeiçoamento na arte de pensar, da investigação em busca do significado da existência e da verdade.
Jules Michelet, historiador e escritor francês, afirma:
“É preciso planar sobre o que nós fazemos. É necessário saber muito mais por cima e por baixo, ao lado e de todos os lados, rodear o seu objeto e tornar-se o seu dono.”
Grau de Aprendiz Maçom
O grande filósofo Sócrates ensina ao Aprendiz em filosofia, que a primeira coisa a fazer é aprender a pensar. Ele afirma: “Conhece-te a ti mesmo”. Aprendendo a pensar, aprende-se a conhecer, a discernir, a falar. Foi o que o próprio Sócrates fez. Dessa forma a linguagem que ele usa é sempre a linguagem do conhecimento. Eis aí o primeiro passo do Aprendiz Maçom: aprender a pensar. Como a Filosofia está embasada na busca e na investigação para chegar ao conhecimento, por analogia, o Aprendiz Maçom, mergulhado em seu interior, no seu pensar, procura entender o sentido do seu próprio “EU”, passando a conhecer-se melhor. Dessa forma, morre para o mundo profano, renascendo com outra visão de mundo, buscando outro estilo de vida completamente transformador.
Sócrates afirma também que o homem deve morrer instintivamente, para que as virtudes do seu interior possam aflorar, elevando-o acima das pequenas coisas desse mundo. Sócrates ainda nos fala: “O existir nada mais é que o cotidiano na busca do saber”. Para ele, a virtude só será alcançada quando se adquire a ciência, mas para isso depende do trabalho e da luta constante que o homem pode empregar na busca do conhecimento.
Filosoficamente, sabe-se que a existência humana passa pela questão do “SER”. O Aprendiz Maçom deve ter como objetivo conhecer primeiro a “si” mesmo, desbastando a Pedra Bruta, para daí, então, compreender todo o sentido da lapidação do espírito; não limitar-se ao pensamento primário de que o ser está singularizado no “SER É, O NÃO-SER NÃO É”.
Cabe aqui descrever o que Tomás de Aquino, preceitua:
“O ser não se pode acrescentar nada que lhe seja estranho, porque nada lhe é estranho, com exceção do NÃO-SER, que não pode ser nem forma nem matéria.”
Conhecer, portanto, é descobrir o “SER”; assim, para o Aprendiz Maçom, o conhecimento pode significar o nascimento do seu “SER” interior. Compreendendo a “si” mesmo, ele se diferencia do profano, pois uma nova luz ilumina o seu caminho, uma vez que visualiza as coisas com o olho do pensamento, usando a lente da inteligência, ao passo que o profano olha e não vê. É aí onde reside a diferença entre o olhar e o ver, entre o profano e o Aprendiz Maçom.
Com base no pitagorismo, o Aprendiz mergulha no silêncio, como primeiro fim, para que se possa melhor enxergar, ouvir e meditar.
“Conhece-te a ti mesmo!” Essa assertiva no sentido maçônico leva à conclusão de que, se o Aprendiz Maçom não praticar o conhecimento interior, se não lapidar o seu espírito com a finalidade de evoluir, com a intenção de aperfeiçoar o seu intelecto, não buscar uma conduta condizente com os princípios da moral e da razão, não conseguirá desbastar a Pedra Bruta.
Portanto, o Primeiro Grau ensina que é necessário o conhecimento próprio, para daí se partir para outros conhecimentos. Finalmente, o Aprendiz deve aprender a trabalhar em equipe, com amor, vigilância e dedicação.
Grau de Companheiro Maçom
Uma vez o Aprendiz Maçom conhecendo o seu interior, ele agora está preparado para o passo seguinte, alicerçado no pensamento do filósofo francês René Descartes: “Se duvido, penso, se penso, existo”. É a senda do Companheiro Maçom.
Por estar filosoficamente bem mais elevado, o Grau de Companheiro Maçom, direciona-o
para a verdade científica, anulando definitivamente as superstições. Nesse grau, pode-se fazer uma síntese das filosofias de Pitágoras, de Parmênides, de Sócrates, além de outros.
“O que somos? O que é que existe? De onde vieram as coisas? Para onde iremos?” Esses questionamentos são, na verdade, a primeira grande influência filosófica do Segundo Grau, advindos dos primeiros pensadores pré-socráticos. Eles procuravam compreender e buscar soluções para os princípios das coisas existentes. O ato de pensar era o caminho para chegar a conclusões concretas, visando encontrar uma resposta que se baseasse num ponto de vista lógico para seus questionamentos.
A constante mudança que sucedia na natureza deixava o homem deslumbrado, diante do fenômeno que consistia em as coisas mudarem, desaparecerem e a natureza continuar a mesma. Simbolicamente é o que acontece com o Companheiro: a sua primeira tarefa é fazer uma análise objetiva da realidade física, a fim de que possa chegar a um conhecimento tanto maior da existência. A vida é um enigma e, no Segundo Grau, o tema é abordado filosoficamente: O que sou eu? O que é a vida? Que estou fazendo neste mundo?
Neste ponto, faz-se presente a filosofia de Parmênides de Eleia, talvez o maior entre os pré-socráticos. Em um dos fragmentos, dentre os que chegaram até hoje, ele filosofa:
“Mas há no mundo o que importa mais que o mundo: O ser do mundo.”
Protágoras dizia que o homem é a medida de todas as coisas. Portanto, quando se pensa, esse ato está sempre ligado ao “ser” e acredita-se que se não existisse elo, não existiria o pensar, haveria apenas um simples refletir. Entende-se, assim, que o pensar tem sempre o homem como alvo principal.
Sendo um grande conhecedor do seu “EU”, o Companheiro Maçom, agora, passa a estudar o conhecimento sociológico para melhor entender e ter uma visão mais apurada dos valores sociais e individuais. Ele passa a ser o defensor da vida social e inimigo das tiranias que procuram escravizar e alienar a inteligência e o espírito do homem, pois a Arte Real não admite entraves ao pensamento humano.
Com o exposto, entende-se que o Segundo Grau é essencialmente social. O Companheiro Maçom tem que trabalhar com afinco na prática da filantropia, a serviço da comunidade; ele tem que se despojar em beneficio de seus semelhantes.
Eticamente o Companheiro Maçom deve possuir quatro atributos: ser um sábio, por compreender os significados da ciência, interpretar a Arte Real e, acima de tudo, por conhecer a “si” mesmo; ser forte por vencer as paixões alienadoras que escravizam o homem; ser um moderador nas diferenças e nas indiferenças da vida social; ter senso de justiça por ser um homem virtuoso, reto e íntegro. Atingindo esses objetivos, ele agora está preparado para subir mais um degrau da escada de Jacó.
Grau de Mestre Maçom
O filósofo Arcângelo Buzzi afirma que:
“O estudo da filosofia desenvolve o espírito de fineza. Exercita o pensamento a conhecer a realidade por si próprio, tornando-se ele mesmo esclarecido, portador de luz força de discernimento.”
Por excelência, o Mestre Maçom é um filósofo. Chegando ao Terceiro Grau, ele é muito mais Aprendiz do que quando tinha assento no setentrião, e muito mais Companheiro do que quando ocupava um lugar na coluna do sul. Diante dessa afirmativa, vem a pergunta que deve incomodar: Por que o Mestre é muito mais Aprendiz e muito mais Companheiro? A resposta que deve ser levada em consideração é que a missão do Mestre Maçom é ensinar. A melhor forma de aprender é ensinando, e se aprende muito mais do que estudando. Heidegger nos diz:
“É bem sabido que ensinar é ainda mais difícil que aprender.”
Para ensinar, o Mestre deve ser possuidor de conhecimentos, mas para isso precisa estar aberto ao aprendizado como um eterno Aprendiz. Se for soberbo, ele acaba se fechando e não evolui na arte de filosofar, daí os seus ensinamentos tornam-se falhos. Porém se ele exercitar a humildade e se deixar aprender, os seus conhecimentos se renovam e todos se beneficiam; com essa conduta, há um mútuo enriquecimento entre ele, o Aprendiz e o Companheiro.
Nesse contexto, ele deve aprender a deixar-se aprender. A sua compreensão ultrapassa os discípulos que se limitam a absorver o conhecimento transmitido, porque ele é uma fonte inesgotável de estudo e de pesquisa. Se assim não o faz, só lhe resta inventar e propagar a filosofia do achismo, na qual ele supõe, mas não tem certeza de nada, tudo é fruto de sua imaginação. A Maçonaria não admite invencionices, mas nela existem mestres que, agem dessa forma e, ocasionalmente, falam por pura intuição, sem fundamento no que diz; pura fábula criada pelo seu pensamento.
A constante pesquisa, aliada à perseverança, incentiva o Mestre a alcançar os objetivos desejados. É através da interpretação e compreensão do objeto em estudo que o questionamento é elucidado. É na tolerância que ele exercita a arte de aprender com paciência, como um Aprendiz ao desbastar a Pedra Bruta. Sem a socialização do conhecimento, o Mestre só enxerga a “si” e assume uma conduta isolada, daí o que é filosófico entre os Maçons fica restrito a poucos pensadores. Adotando essa postura, toda a sua filosofia adquire outro significado com deduções ilógicas sobre tudo com que se depara e passa a transmitir suas conclusões aos Aprendizes Maçons como verdade absoluta. Dessa forma, ele não está contribuindo com a Instituição na arte de filosofar.
O Mestre Maçom deve sempre pesquisar, sem se deixar influenciar pelo seu ímpeto, sem nenhuma base de sustentação nas ideias do achismo, sistemas ou doutrinas alienadoras. É bom não confundir postulados maçônicos com dogmas, como se a maçonaria fosse uma seita. Ela não é religião, mas religiosa.
Sócrates, o maior de todos os filósofos gregos, disse:
“Empenho muito mais belo é quando alguém, servindo-se da dialética, tomando uma alma apropriada, pela planta e nela semeia, com ciência, discursos que são capazes de ajudar aos próprios e a quem os plantou, e que não são infrutíferos, mas têm em si germes donde brotarão outros discursos plantados, em outras pessoas, discursos capazes de produzir esses efeitos, sem nunca falhar e de tornar feliz quem possui tal dom, tanto quando o homem isso é possível.”
O Mestre Maçom não deve se prender a ensinar a ritualística referente à Loja a qual pertence. Ele transcende a essa prática, a esse pensamento, a esses ensinamentos. Ele não pode ficar limitado à discussão dos trabalhos em Loja, muito menos falando em vão, externando maledicência, criando um clima de animosidade entre os irmãos, dando mau exemplo aos Aprendizes e Companheiros. Deve-se entender que ele é uma fonte de tolerância, de riqueza para o aprendizado; é exemplo a ser seguido dentro e fora de Loja, pois é um Mestre Maçom.
Conclusão
O Mestre Maçom se caracteriza pela serenidade ao pensar, pela sua humildade ao ouvir, pelo controle de “si” ao agir. Ele é o termômetro entre as colunas, é a harmonia na Câmara do Meio pela meditação na compreensão do significado da morte.
A ordem dos trabalhos requer tolerância e mansidão no uso da palavra, que circula tanto no ocidente como no oriente. Passa pela interpretação do significado da “luz” que emana do oriente, iluminando a todos num clima de união. O Mestre Maçom deve ser possuidor da sabedoria que foi outorgada pelo G∴A∴D∴U∴ ao Rei Salomão, quando ele se torna um Venerável Mestre ou um Sereníssimo Grão-Mestre. É nesse exercício prático que o filosófico se torna concreto no mundo profano, onde o Maçom é o exemplo de homem digno da serenidade que lhe é peculiar.
Compreende-se que o Mestre Maçom é uma fonte inesgotável do pensar, do agir interagindo, do lapidar-se lapidando. É a busca do saber até a luz do conhecer, é a compreensão dos significados que a vida lhe impõe, questionando os porquês, procurando soluções para as coisas imperceptíveis aos olhos do mundo profano, a fim de tornar-se um profundo conhecedor na arte de FILOSOFAR.
A Maçonaria, como Instituição Filosófica, precisa de homens pensadores, filósofos da vida, das experiências adquiridas dentro e fora das Lojas Maçônicas. Nela não há discórdia de pensamentos, pois todos buscam esclarecer o que está obscuro, o inexplicável. A razão de sua existência está na vontade de interpretar e compreender os obstáculos que afastam o homem da paz interior, que o impossibilitam construir a felicidade humana.
Para ser Maçom não é preciso cursar universidade, nem ter título universitário, muito menos ser doutor, principalmente em Filosofia. Nela, compreende-se que todo Maçom deve ser “livre e de bons costumes”; um pensador, um investigador que caminha nas veredas das observações das atitudes humanas, desprezando o que é desprezível, lapidando-se até o brilho do conhecimento. Ser um incansável explorador em busca da Palavra Perdida e Indecifrável, trilhando o caminho da investigação, na compreensão da
verdade até alcançar a luz que o libertará das trevas que o acorrentam até a morte, ressurgindo para uma nova vida.
Nessa compreensão, todo homem com esses pré-requisitos têm condições de adentrar pelo Portal que separa a ignorância da verdade e participar da meditação; filosofar sobre a vida, com a finalidade de encontrar o diamante que brilha em seu interior. É um traspassar pela grade da razão, subindo pela escada de Jacó até alcançar, simbolicamente, toda sabedoria do Rei Salomão.
Autor: Alveriano de Santana Dias
Fonte: Revista O Buscador. Ano I – N° 2, pág. 21– 31 abr/jun – 2016. Uma publicação da Loja Maçônica de Estudos e Pesquisas Renascença nº 1, oriente de Campina Grande- PB.
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Notas
[1] – http://www.samauma.biz/site/portal/conteudo/opiniã o/g00304incidencia.htm
[2] – http://www.lojasaopaulo43.com.br.htm
[3] – http://www.samauma.biz/site/opinião/g00304inciden cia.htm
[4] – Vade Mecum Maçônico, 1991, p.21.
[5] – Boletim Especial da Constituição – 25/05/2007, p.3.
[6] – Constituição, 1985, p. 5.
Referências bibliográficas
ALBUQUERQUE, Raimundo Rodrigues de. A Incidência Filosófica nos Graus Simbólicos. Disponível em: htttp://www.samauma.biz/site/portal/conteúdo/opinião/g00304incidencia.htm
AUTOR DESCONHECIDO. Maçonaria e seus princípios. Disponível em:
http://www.vivernatural.com.br/filosofias/mac_prin.htm
BATTAL, Moises Mussa. Filosofia da Maçonaria – “Lições de Filosofia Geral e Maçônica“. Editora Gazeta Maçônica. São Paulo. 1991. Disponível em www.lojasaopaulo43.com.brr.
GUERRA, Pe. Aloísio. Religiosidade e Maçonaria. Editora Maçônica a Trolha, Londrina, novembro 2006.
GRANDE LOJA MAÇÔNICA DO ESTADO DA PARAÍBA. Rituais dos Graus de Aprendiz, Companheiro e Mestre Maçom. G:.L:.O:.M:.E:.PB., João Pessoa, 1985, Nova Edição – 2005.
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MORENTE, M. Garcia. Filosofia. Disponível em http://www.brasilescola.com/filosofia/
NOVO DICIONÁRIO ELETRÔNICO AURÉLIO
PRETERS, Ambrósio. Filosofia Maçônica. Disponível em : http://www.samauma.biz/…/ap00306filosofiamaconica.htm
PUCCI, Francisco C. L.. Graus Filosóficos. Disponível em : http://www.maconaria.net/portal/index.php?option
A Evolução da Lenda Hirâmica na Inglaterra e na França (Parte II)
Nessa segunda parte do trabalho, Dr. Snoek irá abordar como Pritchard, e outras exposures subsequentes do século XVIII, narram o desaparecimento do Mestre Construtor e todos os esforços empenhados para encontrá-lo.
Para ter acesso ao texto clique no link abaixo e digite a P∴P∴ de M∴ (a primeira letra é maiúscula; a última letra é “m”):
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O Maçom e a Dúvida
Na Maçonaria buscam-se novos horizontes no plano do pensamento. Existem conhecimentos que escapam ao campo da experiência em virtude da limitação sensorial e analítica inerente ao homem-ego: aquele que bloqueia qualquer atitude verdadeira e autêntica em si, tornando-se seu próprio inimigo. São noções que exigem círculos de juízos muito acima dos limites individuais e da linguagem humana. Ideias que ultrapassam o mundo sensível, onde a experiência não serve de guia.
São quatro as escolas que permeiam as discussões dos maçons: a Autêntica ou Histórica; Antropológica ou Primitiva; Mística ou Teológica; e Oculta ou Esotérica. As investigações, destas diferentes escolas, partem com os pensamentos de base inicialmente teológicas e mágicas, depois metafísicas e místicas, podendo alcançar o nível da compreensão científica. Devido a estes diferentes níveis de estudo progressivos, a Maçonaria ressalta a importância do respeito ao pensamento do outro, enquanto a ideia passa pelas diversas fases em direção a consolidação: é quando o pensamento deixa de ser filosófico e passa a ser ciência. E é apenas nestas situações que o maçom exercita a tolerância: somente para com o pensamento do outro. Mau comportamento e atitudes grosseiras nunca devem ser aceitas porque conspurcam o ambiente puro desejado para os estudos da nobre arte do pensamento, cujo alicerce é a dúvida.
O ponto forte da fraternidade maçônica é o respeito ao pensamento do outro.
Na área da especulação, fatalmente os intelectuais enveredam no Eruditismo, o que complica a absorção de conhecimentos mais sutis. Outros mais tímidos têm medo de expor seus pensamentos. Existem aqueles que conhecem, mas não compartilham seus conhecimentos. Porém, seguindo a metodologia maçônica, o entendimento de conhecimentos acima dos limites normais de entendimento é aprendido com facilidade quando o grupo e suas dinâmicas agem sobre a pessoa, razão da necessidade de reuniões regulares em loja: os participantes se soltam e lentamente o conhecimento de todos aumenta.
Mesmo na complexidade dos temas, não existe na Maçonaria a figura do professor, seja na pessoa do Venerável, do orador, dos vigilantes ou qualquer outro maçom: todos são mestres e aprendizes. O conhecimento suprasensorial, das vivências do homem e seu despertar pela vontade em atividades e experiências da liberdade, é transmitido de pessoa a pessoa na forma de blocos de informação que emanam da interação do grupo e não da imposição de algum líder.
O maçom duvida até o momento em que passa a sentir e entender fenômenos sublimes com o auxílio de sua própria capacidade intelectual e sensorial, ou na eminência de comprovação científica de suas ideias.
O processo evolutivo do pensamento atravessa distintas fases de tratamento mental: parte-se da observação concreta e abstrata, envereda-se pela meditação e análise indutiva e dedutiva para, finalmente, florescer na linguagem e nos processos mentais racionais. Este é o caminho por onde passam todas as análises dos fenômenos invisíveis que, pelo fato de não serem acessíveis aos padrões normais, são sempre retomados e criticados: florescem da dúvida.
Informações e conceitos como Grande Arquiteto do Universo, liberdade, imortalidade, e outros, apenas são acessíveis e estudados pela Metafísica e Mística depois de passarem pelos processos naturais de desenvolvimento. No plano espiritual os pensamentos são impossíveis de se definirem ou de se estabelecerem em resultados desejáveis a priori. Daí todos os processos de busca das verdades sutis serem apenas especulações filosóficas incertas. E estas, considerando a ilusão sensorial a que o homem é submetido pela própria Natureza, devem sempre serem reavaliadas, desacreditadas, reconsideradas. O Ceticismo é a atitude usual do maçom porque, apesar de perscrutar em direção à verdade, sabe que está sendo enganado permanentemente pelos seus sensores primários, daí expandir também esta disposição aos sensores sutis, aqueles que tem a faculdade de penetrarem na alma, na essência do ser.
Em Maçonaria, o conhecimento transcendental passa inicialmente pelo estabelecimento de lendas e ficções que servem apenas de esboço aos pensamentos iniciais. Estes depois são filtrados em outros níveis. Podem chegar a verdades demonstráveis por leis naturais: as ideias apenas são lançadas dentro da mente dos ouvintes que, de sua livre iniciativa, usa como guarda de trânsito o livre-arbítrio, as adaptam e modificam ao nível de sua própria evolução. Daí se afirmar que não existe a figura do educador, existe apenas autoeducação, o que elimina a figura do professor, do mestre. A maioria das revelações, em níveis sensoriais sutis ocorre em grupo e é resultado de pura intuição individual. Pode ser percebida, mas não verbalizada, racionalizada. O acesso ao divino se dá apenas no silêncio.
Alguns maçons penetram logo naquilo que a Maçonaria provoca nestes aspectos, outros só alcançam a Luz, ou Aufklärung de Kant, depois de longa e penosa caminhada. Outros, mais arraigados ao seu conservadorismo, ego e vícios, jamais a veem. A divindade não pode ser pensada, falada, refletida, apenas percebida na meditação contemplativa, receptiva afastada de exercícios do intelecto.
Independente do fato de perceberem verdades mais sutis ou não, o que interessa aos maçons em suas oficinas é reunirem-se para debaterem assuntos que possibilitem a evolução individual, cujo caminho passa pela dúvida. Maçom desperto é homem inquieto e desejoso em decifrar os mistérios que estão velados nos rituais e na Natureza. Uma vez percebida uma particularidade ao seu redor, o maçom duvida. Não em sentido negativo, mas atento, de modo a reavaliar os mistérios debaixo da luz contemporânea da ciência e evolução tecnológica. É da dúvida que nascem novos e inusitados pensamentos que tem a pretensão de mudar o homem, e com isso a sociedade e o mundo. É a busca do homem cósmico, integrado ao Universo, com o qual se unifica. É por isso que podem denominar o maçom iluminado como aquele que se considera “filho da heresia”: aquele que busca na dúvida reavaliar conceitos já estabelecidos para fugir da estagnação e do conservadorismo.
O maçom e a dúvida são companheiros inseparáveis na caminhada pelo Universo que se originou num ponto dentro de um círculo. Aquele ponto, o ovo cósmico que deu à luz a realidade que o homem é levado a acreditar, por meios fantásticos. Consciência de que o homem e toda a materialidade é nada! Tudo é espaço vazio! Inclusive o próprio homem. Tomado em termos atômicos toda a realidade é apenas uma ilusão dos sentidos que o Grande Arquiteto do Universo criou num ato de amor.
Autor: Charles Evaldo Boller

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Plenitude Maçônica
O Maçom prega a tolerância, pratica a caridade sem distinção de raças, crenças ou opiniões e luta contra a hipocrisia e fanatismos (sabedoria maçônica)
A Cerimônia Magna de Exaltação se realiza quando o obreiro, após o privilégio de ser acolhido na Ordem, cumprir com denodo os trabalhos como Aprendiz e Companheiro, e mostrar-se um líder, faz jus ao reconhecimento do Grau de Mestre Maçom, considerado a conquista do ápice do simbolismo da Maçonaria, como o coroamento de um período de estágio.
Com a exaltação, o Mestre adquire a tão esperada Plenitude Maçônica, que enseja um forte significado e não se traduz em pavonear-se ao exibir a boniteza do seu novo avental. Implica ser, a partir de então, protagonista, proativo e estar sintonizado com todos os movimentos da Maçonaria Universal, fazendo-se respeitado e reconhecido como Mestre, na Ordem e na Sociedade. Deve assumir a responsabilidade pelos trabalhos da sua Oficina, com o direito de ser votado, ocupar cargos e estar inclusive comprometido a ajudar nos trabalhos em qualquer outra Loja regular nos Graus Simbólicos, quando solicitado, sempre com foco no aprimoramento.
Ao refletir sobre o simbolismo da sua caminhada, o Mestre precisa reconhecer que no Grau de Aprendiz Maçom (germinação – o grão que brota: estuda, pratica e observa) desenvolveu-se no aspecto material, trabalhou na Pedra Bruta e venceu a luta contra inimigos como as paixões, hipocrisias, fanatismos, ambições, abraçou o ideal da liberdade, praticou o socrático “conhece-te a ti mesmo”, e está apto a discernir entre o vício e a virtude e entre o erro e a verdade.
Já como Companheiro Maçom (crescimento – a planta que floresce: analisa e compara) laborou a Pedra Cúbica, tendo como aspiração a igualdade e os sentimentos de fraternidade. Na esfera intelectual, reavaliou e ponderou os conhecimentos adquiridos, duvidando e questionando paradigmas e fazendo novas descobertas ao aprofundar os conceitos sobre as capacidades do pensamento, da consciência, da inteligência, da vontade e do livre-arbítrio. Com uma visão mais ampla, preparou seu dinamismo cerebral e desenvolveu competências para interpretar os elementos fundamentais do simbolismo. Reconheceu a relevância do Grau de Companheiro, que não consiste em trampolim para o Mestrado, mas um indispensável e aprofundado estágio entre o autoconhecimento do Aprendiz Maçom e o espiritual que será objeto de aprimoramento no Grau seguinte.
Agora os horizontes se ampliam. Sobrepondo-se a si mesmo, o campo de atuação do Mestre é o espiritual (produção – a planta que frutifica: aplica o que observou na primeira etapa e analisou na segunda), com a missão de reunir o que está disperso, através da síntese para a conclusão da obra de construção social, de modo a tornar a fraternidade humana mais forte, e difundir a Luz do conhecimento, progresso e ciência, sobre as trevas da ignorância, por meio da educação, decifrando as realidades, consagrando-se à firmeza de caráter e à Moral que não transige com o dever.
Ao transpor a metamorfose dos três degraus iniciáticos, representando o homem que se esculpiu e mostrou-se apto para ser o Mestre de si mesmo, vem o imperativo de aprofundar estudos e pesquisas, com o compromisso de retribuir o que conquistou e de ser um facilitador para os novos Aprendizes e Companheiros, para que os mesmos se superem e, quando esses discípulos estiverem prontos, se tornem também Mestres, em “buscadores da verdade”, realimentando o círculo virtuoso, com o ensino e os conceitos sempre se renovando.
Dentro do simbolismo e alegorias maçônicas, claros para os verdadeiramente iniciados, a Acácia – a Obra, como o Mestre, jamais apodrece, pois é o símbolo de uma vida indestrutível, representando a sobrevivência de energias que a morte não pode destruir face o reconhecimento pelos esforços feitos em prol do desenvolvimento da Ordem. A alegoria da lenda do Construtor do Templo é um constante alerta, quando a Virtude e a Sabedoria são postas em perigo pela ignorância, pelo fanatismo e pela ambição. Cabem aos verdadeiros Maçons compreender a finalidade da Maçonaria e não usá-la como meio para escalada social ou busca de algum proveito material.
Assim, conquistar o Mestrado Maçônico, conhecer as ferramentas, receber as primeiras noções do Grau, as responsabilidades que o mesmo comporta, não se caracteriza o fim de um processo, pois ainda falta o principal, a vivência, o trilhar do caminho, o que ocorre à medida em que se fizer novos progressos. Para isso deve compreender o simbolismo do traçar e delinear os trabalhos de construção na Prancheta da Loja. O que se espera de um Mestre, portanto, é que absorva e vivencie conscientemente os desafios do grau e continue a ser assíduo, estudioso, participativo, fraterno, se fazendo necessário e compartilhando seus saberes, empenhando-se para o fortalecimento da Loja e da Maçonaria Universal.
No Grau de Mestre, o Espírito prevalece sobre a Matéria, ou seja, esta opera como um instrumento físico compatível com o mundo e serve àquele para sua jornada evolutiva. Com a compreensão desse sutil mistério é que o verdadeiro trabalho começa, pois o legítimo Maçom, um filósofo na sua essência, está sempre em busca do seu crescimento espiritual, da sua regeneração, da sua vitória sobre a vaidade e os vícios, visando incansavelmente ao bem de seus semelhantes, em prol de uma sociedade mais justa. Apesar da conquista do mestrado, esse obreiro qualificado precisa ter consciência de que continua a ser Pedra Bruta e a lapidação interna não termina neste estágio material do espírito, o que se verifica, apenas e tão somente, com o derradeiro e solitário ato de passagem ao Oriente eterno.
O Mestre é o artífice da Pedra Filosofal, o alquimista do eu interior, cujo segredo é desenvolver o poder que eleva no homem a capacidade de se transformar e realizar. Portanto, compreender a dimensão do Mestre é praticar a tolerância, o perdão, a partilha, o entendimento e o equilíbrio entre os ensinamentos da razão e os sentimentos do coração. O Mestre é a referência, o alicerce, semelhante à Pedra Angular base das construções antigas, sobre a qual se apoia a sociedade justa e perfeita, devendo, portanto, saber ouvir, mediar, aconselhar, inspirar, agir de forma colaborativa e servir de exemplo a ser seguido, empenhando-se em ajudar os outros irmãos na caminhada, tornando-se cada vez mais útil e indispensável.
Ao decifrar o enigma da existência e da morte, a condição de exaltado representa um recomeço, um renascimento em plano mais elevado, um novo ciclo. Muito mais há pela frente, desta feita impondo-se o comprometido com a busca permanente da Verdade, agora que detém as chaves para abrir novos portais de conhecimento. Entretanto, é importante ter em mente que o verdadeiro trabalho maçônico é fora da Loja e se dá na interação com o mundo que o cerca. As reuniões em Loja se constituem em um meditar constante, que permitem revigorar o ânimo, além da salutar troca experiências e informações necessários à consolidação de um arcabouço moral e intelectual. O perigo é deixar que a plenitude maçônica alcançada com o Grau de Mestre leve à acomodação, à falsa sensação de infalibilidade e segurança, à indiferença e apatia em relação aos trabalhos da Loja.
Infelizmente, para alguns, a caminhada cessa ou é praticamente interrompida quando se chega ao Grau de Mestre. Quando isso acontece, pode-se dizer que o suposto Mestre foi mal exaltado e está investido de falsa plenitude. Isso pode ser constatado ainda com atitudes de desdém ou de arrogância. Estas invariavelmente reconhecidas naqueles que passam a se comportar como gurus, pretensos detentores de um saber transcendental, com ares de mistério e cheios de invencionices, achismos e mimimis.
A determinação, a perseverança, o “pegar pra fazer”, é o exemplo fundamental do Mestre, sendo motivo de repreensão a postura de se restringir a dar “ordens” ou “ideias” para os outros, como se dono da Loja o fora. Muitos, quando questionados por um Aprendiz ou Companheiro sobre alguma questão específica, respondem com ar triunfalista que ainda não chegou a hora do consulente saber, pois na realidade não sabem exatamente como responder. Não raramente dão interpretações distorcidas aos rituais e simbolismos, relutam em aceitar os próprios erros, à míngua de estudos, passando atestado de insofismável e total desconhecimento dos fundamentos da Ordem. Na realidade, são esses “Mestres” os verdadeiros responsáveis pelas críticas em geral e pela evasão de obreiros em muitas situações (outras considerações podem ser coletadas na Prancha “O Irmão Rabugento”: https://opontodentrodocirculo.wordpress.com/2018/11/01/o-irmao-rabugento/).
Por outro lado, a senda do autêntico Mestre não é um mar de rosas e os desafios são variados. Atropelos existem e, por vezes, os trabalhos não recebem o apoio e reconhecimento de alguns irmãos, em especial nas suas próprias Lojas ou Potências, mostrando-se sempre atual a reflexão do nosso Mestre Maior quando disse que “um profeta só é desprezado em sua terra e em sua própria casa “(Mt 13,57), o popular “santo de casa não faz milagre”. Já ouvimos falar também sobre a valorização do “estrangeiro” em detrimento da prata da casa. Mas, é preciso acreditar, ter força de vontade, entusiasmo, vencer as próprias deficiências e limitações, e prosseguir lançando as sementes do bem, construindo o caminho no hoje e não deixando para um incerto amanhã. Nesse sentido, não podemos deixar de registrar os exemplos edificantes e inspiradores de Mestres com mais de meio século em franca atividade na Ordem e que se superam a cada dia.
O campo de crescimento na Maçonaria é vasto. Vislumbram-se ainda novos níveis além do Grau de Mestre, que no Rito Escocês Antigo e Aceito são 33, além de outros Ritos. Porém, as graduações superiores não são exigidas, apenas recomendadas, pois o 3º Grau confere a plenitude da qualidade de Maçom. Jules Boucher (2015) comenta: “Os altos graus não lhe trarão nada de novo, pois nada mais são do que desenvolvimento, ampliações do terceiro grau”. E aduz: “Poderíamos mesmo dizer que, em certos casos, eles podem representar uma diminuição, caso desenvolvam em quem os recebe – mas que não os possui – um sentimento de vaidade”.
Enfim, o mestrado maçônico não pode se reduzir à sua titularidade e à obtenção de diplomas e porte de insígnias, estando a grandeza da Plenitude Maçônica na ressignificação da existência, na construção de um legado, no despertar de uma vocação direcionada no sentido de tornar feliz a humanidade, cabendo ao Mestre manter-se firme no propósito de transformar-se em uma pessoa melhor e mais instruída a cada dia e ter a certeza de contar nessa caminhada sempre com os seus irmãos, que não se furtarão ao compromisso sagrado a que estão submetidos.
“O Mestre está entre o Esquadro e o Compasso, isto é, entre a Terra e o Céu – no Meio, no Centro, ou seja, é o ‘homem verdadeiro’, é a conclusão dos pequenos Mistérios.” (René Guénon).
Autor: Márcio dos Santos Gomes
Márcio é Mestre Instalado da ARLS Águia das Alterosas – 197 – GLMMG, Oriente de Belo Horizonte, membro da Academia Mineira Maçônica de Letras e, para nossa alegria, um colaborador do blog.

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Referências bibliográficas
BOUCHER, Jules. A Simbólica Maçônica. São Paulo: Pensamento, 2015;
DA CAMINO, Rizardo. Simbolismo do Terceiro Grau – Mestre. Rio de Janeiro: Aurora, nd;
OLIVEIRA FILHO, Denizart Silveira de. Da Elevação rumo à Exaltação. Londrina: Ed. “A Trolha”, 2013;
OLIVEIRA FILHO, Denizart Silveira de. Da Exaltação rumo à Perfeição. Londrina: Ed. “A Trolha”, 2014;
Rituais dos Graus Simbólicos;
RODRIGUES, Raimundo. Cartilha do Mestre. Londrina: Ed. “A Trolha”, 2008.
Protegido: Reflexões de um Jovem Mestre Maçom (para ter acesso ao texto, digite a p∴ de p∴ de M∴)
Seis Séculos de Ritual Maçônico – 3ª Parte
Indícios de Três Graus
Os primeiros indícios de terceiro grau aparecem em documentos como os que eu tenho falado – principalmente documentos que foram escritos como memorandos para os homens a quem pertenciam. Mas nós temos que utilizar exposições também, exposições impressas para o lucro, ou ofensa, e nós temos algumas indicações úteis do terceiro grau muito antes dele realmente aparecer na prática. E assim, começamos com um dos melhores, um adorável pequeno texto, uma única folha de papel conhecida como o Manuscrito Trinity College, Dublin, datado de 1711, encontrado entre os papéis de um médico irlandês famoso e cientista, Sir Thomas Molyneux. Este documento tem como cabeçalho uma espécie de “Triplo Tau”, e debaixo dele as palavras “Sob nada menos que uma penalidade”. Isto é seguido por um conjunto de onze perguntas e respostas e sabemos imediatamente que algo está errado! Já temos três conjuntos perfeitos de quinze perguntas, então onze perguntas deve ser ou má memória ou cópia ruim – algo está errado! As perguntas são perfeitamente normais, apenas não há o suficiente delas. Em seguida, após as onze perguntas seria de se esperar que o escritor desse uma descrição de toda ou parte da cerimônia, mas, em vez disso, ele dá uma espécie de catálogo de palavras e sinais da Maçonaria.
Ele dá este sinal (AM demonstrado) para o AM com a palavra B.
Ele dá “toques e sinais” como o sinal para o “companheiro”, com a palavra ‘J ………’. O “sinal de Mestre é a espinha” e para ele (ou seja, o MM) o escritor dá a pior descrição do mundo dos cinco pontos de perfeição. (Parece claro que nem o autor desta peça nem o escritor do Manuscrito Sloane, jamais ouviram falar dos Pontos de Companheirismo, ou sabia como descrevê-los.) Aqui, como eu demonstro, estão as palavras exatas, nem mais nem menos:
“Aperte o Mestre pela espinha, coloque o seu joelho entre os dele, e diga Matchpin.”
Isso, Irmãos, é a nossa segunda versão da palavra do terceiro grau. Começamos com ‘Mahabyn’, e agora ‘Matchpin’, horrivelmente degradada. Deixe-me dizer agora, alto e claro, ninguém sabe qual era a palavra correta. Era provavelmente hebraico originalmente, mas todas as primeiras versões estão degradadas. Deveríamos trabalhar para trás, traduzindo do Inglês, mas não podemos ter certeza de que nossas palavras inglesas estão corretas. Então, aqui no Manuscrito Trinity College, Dublin, temos, pela primeira vez, um documento que tem segredos separados para três graus distintos; o aprendiz, o companheiro e o mestre. Não é prova de três graus na prática, mas mostra que alguém estava brincando com essa ideia em 1711.
A próxima peça de prova sobre esse tema vem da primeira exposição impressa e publicada para entretenimento ou por despeito em um jornal de Londres, The Flying Post. O texto é conhecido como um “Telhamento de Maçom”. Por esta época, 1723, o catecismo era muito mais longo e o texto continha várias peças de rima, todas interessantes, mas apenas uma de particular importância para o meu propósito presente e aqui está ela:
“Um Maçom iniciado eu fui, B∴ e J∴ eu vi; Um companheiro que eu fui jurado mais raro, e conheço a Pedra Bruta, Polida e o Esquadro: Eu sei a parte do Mestre muito bem, tão honesta Mohabin você dirá”.
Observem, Irmãos, ainda existem dois pilares para a AM, e mais uma vez alguém está dividindo os segredos maçônicos em três partes para três categorias diferentes de Maçons. A ideia de três graus está no ar. Nós ainda estamos procurando atas, mas elas não chegaram ainda. Em seguida, temos outro documento de valor inestimável, datado de 1726, o Manuscrito Graham, um texto fascinante que começa com um catecismo de cerca de trinta perguntas e respostas, seguido por uma coleção de lendas, principalmente sobre personagens bíblicos, cada história com uma espécie de distorção Maçônica no seu relato. Uma lenda conta como três filhos foram ao túmulo do pai deles tentar, se pudessem, encontrar alguma coisa sobre ele para levá-los até o segredo de virtude que este famoso pregador tinha. Eles abriram a sepultura nada encontrando, exceto o corpo morto quase totalmente consumido. Agarrando um dele, ele se soltou de junta a junta até o pulso até o cotovelo, assim eles ergueram o corpo morto e o sustentaram colocando pé com pé, joelho com joelho, peito com peito, rosto com rosto e a mão nas costas e pediram socorro, ó pai… então alguém disse aqui há ainda medula nesse osso, e o segundo disse, apenas osso seco e o terceiro disse que cheirava mal, assim eles concordaram em dar-lhe um nome que é conhecido da Maçonaria até hoje…
Esta é a primeira história de uma elevação em um contexto maçônico, aparentemente, um fragmento da lenda de Hiram, mas o velho cavalheiro na sepultura era o Pai Noé, e não Hiram Abif.
Outra lenda se refere a “Bazalliel”, o artesão maravilhoso que construiu o Templo móvel e a Arca da Aliança para os israelitas durante a sua peregrinação pelo deserto. A história diz que perto da morte, Bazalliel pediu que uma lápide fosse erguida sobre seu túmulo, com uma inscrição “de acordo com seu desserviço” e que foi feito da seguinte forma:
“Aqui jaz a flor de maçonaria superior de muitos outros companheiros a um rei e dois príncipes um irmão. Aqui jaz o coração que todos os segredos conseguia esconder. Aqui jaz a língua que jamais revelou.”
As duas últimas linhas não poderiam ter sido mais aptas se elas tivessem sido escritas especialmente para Hiram Abif; elas são praticamente um resumo da lenda de Hiram.
No catecismo, uma resposta fala daqueles que. . . obtiveram uma Voz tripla através de iniciação, elevação e exaltação e conformado por 3 lojas diferentes…
“Iniciado, elevado e exaltado” é bastante claro. “Três lojas diferentes” significa os três graus separados, três cerimônias separadas. Não há dúvida de que tudo isso é uma referência a três graus em prática. Mas ainda queremos atas e nós não as temos. E eu sinto muito dizer-lhes, que as primeiras atas em que temos registro de um terceiro grau, por mais fascinantes e interessantes que elas sejam, referem-se a uma cerimônia que nunca aconteceu em uma loja; ela ocorreu no interior de uma Sociedade Musical de Londres. É uma linda história e é isso que você vai receber agora.
Em dezembro de 1724, houve uma pequena reunião agradável de loja na Taverna Queen’s Head, em Hollis Street, no Strand, cerca de trezentos metros do nosso atual Freemason’s Hall, a sede da Maçonaria na Inglaterra. Pessoas agradáveis; o melhor da sociedade musical, arquitetônica e cultural de Londres eram membros desta loja. Na noite especial em que eu estou interessado, Sua Graça, o duque de Richmond era o Mestre da Loja. Devo acrescentar que a Sua Graça, o Duque de Richmond também era o Grão-Mestre da época, e você pode chamá-lo de ‘pessoa agradável’. É verdade que ele era descendente de um bastardo real, mas hoje em dia até mesmo os bastardos reais são contados como pessoas agradáveis. Um par de meses depois, sete dos membros dessa loja e um irmão que eles tinham tomado emprestado de outra loja decidiram que queriam fundar uma sociedade musical e arquitetural.
Eles deram a ela um título Latino de um quilômetro de comprimento – Philo Musicae et Architecturae Societas Apollini – que traduzindo, “A Sociedade Apolínea Para os Amantes da Música e Arquitetura” e elaboraram um livro de regras incrivelmente bonito. Cada palavra dele escrita à mão. Parece que o impressor mais magnífico o tinha impresso e decorado.
Agora, essas pessoas estavam muito interessadas em sua Maçonaria e para sua sociedade musical, eles elaboraram um código incomum de regras. Por exemplo, uma regra era que cada um dos fundadores deveria ter seu próprio brasão de armas estampados em cores nas páginas de abertura do livro de atas. Quantas lojas vocês conhecem, em que cada fundador tem o seu próprio brasão de armas? Isso lhes dá uma ideia do tipo de garotos que eles eram. Eles amavam a sua Maçonaria e eles fizeram outra regra, de que qualquer um poderia vir às suas palestras arquiteturais ou às suas noites musicais – os melhores condutores eram membros da sociedade – qualquer pessoa poderia vir, mas se ele não era um Maçom, ele tinha que ser iniciado Maçom antes que eles o deixassem entrar; e porque eles estavam tão interessados sobre o status Maçônico de seus membros, eles mantiveram notas biográficas maçônicas de cada membro quando ele ingressou. É a partir dessas notas que podemos ver o que realmente aconteceu. Eu poderia falar sobre eles a noite toda, mas para os nossos propósitos atuais, precisamos somente seguir a carreira de um dos seus membros, Charles Cotton.
Nos registros da Sociedade Musical lemos que em 22 de dezembro de 1724 “Charles Cotton Esq.” foi iniciado um Maçom pelo dito Grão-Mestre [isto é, a Sua Graça, o Duque de Richmond] na Loja na Queen’s Head. Não poderia ser mais regular do que isso. Em seguida, em 18 de fevereiro de 1725 “… antes que fundássemos esta Sociedade uma Loja foi realizada… a fim de iniciar Charles Cotton Esq.”. . . e porque foi no dia em que a sociedade foi fundada, não podemos ter certeza se Cotton foi elevado na Loja ou na Sociedade Musical. Três meses depois, em 12 de maio de 1725 o “Irmão Charles Cotton Esq. e o Ir .’. Papillion Ball foram regularmente exaltados a Mestres”.
Agora temos a data da iniciação de Cotton, sua elevação e sua exaltação; não há dúvida de que ele recebeu três graus. Mas, Mestres regularmente exaltados – Não! Não poderia ter sido mais irregular! Esta era uma Sociedade Musical – não uma loja! Mas eu lhes disse que eles eram pessoas agradáveis, e eles tinham alguns visitantes ilustres. Em primeiro lugar, o Grande Primeiro Vigilante veio vê-los. Em seguida, o Grande Segundo Vigilante. E então, eles receberam uma carta desagradável do Grande Secretário e, em 1727, a sociedade desapareceu. Nada resta agora, exceto o seu livro de atas na Biblioteca Britânica. Se você alguma vez for a Londres e visitar o Freemason’s Hall, você verá um fac-símile maravilhoso daquele livro. Vale a pena uma viagem a Londres apenas para vê-lo. E este é o registro dos primeiros terceiros graus. Eu gostaria que pudéssemos produzir uma novidade mais respeitável, mas esta foi a primeira.
Devo dizer-lhes, Irmãos, que Gould, o grande historiador maçônico acreditou, toda a sua vida, que este era o mais antigo terceiro grau de que havia qualquer registro. Mas, pouco antes de morrer, ele escreveu um artigo brilhante nas Transações da Quatuor Coronati Lodge, e ele mudou de ideia. Ele disse: “Não, as atas estão abertas à interpretação ampla, e não devemos aceitar isso como um registro de terceiro grau.” Francamente, eu não acredito que ele provou seu caso, e sobre este ponto me atrevo a discutir com Gould. Observem-me cuidadosamente, Irmãos, porque eu posso ser atingido por um raio neste momento. Ninguém discute com Gould! Mas eu discuto isso porque no prazo de dez meses a partir desta data, temos provas irrefutáveis de terceiro grau na prática. Como vocês poderiam esperar, benditos sejam, elas vêm da Escócia.
A Loja Dumbarton Kilwinning, agora no. 18 no registo da Grande Loja da Escócia foi fundada em janeiro de 1726. Na reunião de fundação havia o Mestre, com sete mestres maçons, seis companheiros e três aprendizes; alguns deles eram maçons operativos, alguns não operativos. Dois meses depois, em março de 1726, nós temos esta ata:
“Gabriel Porterfield, que apareceu na reunião de janeiro como um Companheiro, foi admitido por unanimidade e exaltado como Mestre da Fraternidade e renovou seu juramento e pagou suas taxas de admissão.”
Agora, observem Irmãos, aqui estava um escocês, que começou em janeiro como Companheiro, um companheiro fundador de uma nova Loja. Então, ele veio em março, e renovou seu juramento, o que significa que ele passou por outra cerimônia; e ele deu sua taxa de admissão, o que significa que ele pagou por ela. Irmãos, se um escocês pagou por isso você apostar sua vida que ele conseguiu! Não há dúvida sobre isso. E há o mais antigo registro 100 por cento dourado de um terceiro grau. Dois anos depois, em dezembro de 1728, outra nova Loja, Greenock Kilwinning, em sua primeira reunião, prescrevia taxas separadas para a iniciação, elevação e exaltação.
Continua…
Autor: Harry Carr
Tradução: José Filardo
Fonte: REVISTA BIBLIOT3CA
Notas
Harry Carr foi Past Master e Secretário por muito tempo da Quatuor Coronati Lodge No. 2076, CE, que é conhecida como a “Primeira Loja de Pesquisas Maçônicas”.
A Missão Permanente da Maçonaria
A Missão Permanente da Maçonaria: Um Sacerdócio Maçônico
Introdução
No mundo maçônico, uma notícia comemorada nos últimos anos diz respeito ao advento de estudos acadêmicos sobre a Maçonaria desenvolvidos por estudantes regulares do ensino superior, em diferentes universidades da Europa e das Américas (CASTELLANI; CARVALHO, 2009). A novidade foi festejada no meio maçônico em razão de ampliar o cuidado metodológico dos estudos da história maçônica, tradicionalmente conduzidos por maçons independentes que, em alguma medida, pecavam justamente quanto ao rigor metodológico das pesquisas.
Esse aporte do formalismo acadêmico, embora promissor, também desperta cuidados, tendo em vista as dificuldades que se antepõem a um não iniciado para compreender os arcanos que suportam a doutrina da Ordem e lhe definem o espírito. Não se trata meramente de compreender as razões e as motivações formais da Maçonaria, mas também de saber ler a linguagem simbólica e metafórica dos rituais, tão distante da linguagem conceitual cultivada na Academia e cujo domínio requer tempo e muita reflexão recursiva. E, mesmo assim, depois de o pesquisador ter adquirido familiaridade com os símbolos, volta e meia, surpreende-se com insuspeitos significados que sempre estiveram ali, diante dos olhos, sem serem notados.
De outro lado, a própria comunidade dos maçons, em constante renovação (Ibid., p. 517), encontra dificuldades equivalentes para interpretar e entender tanto a instituição e seus propósitos quanto a doutrina e seus desafios. A proliferação de potências e de ritos constitui evidência eloquente de dificuldades interpretativas e perdas de foco cuja acomodação se fez ao custo da unidade da Ordem. Além disso, o saudosismo recorrente sobre feitos políticos do passado (Ibid., p. 511), e as constantes reclamações e críticas dirigidas às lideranças sobre a passividade da Ordem, diante das mazelas políticas e sociais do momento, também revelam visões tencionadas, predominantemente, por olhares de curto prazo, por circunstâncias que mudam constantemente e que, certamente, não possuem escopo para justificar uma instituição secular como a Maçonaria e, muito menos, para contemplar a tradição milenar que lhe fornece os alicerces.
Compreende-se naturalmente que essa diversidade de visões constitui preço da ampla liberdade de pensar, intencionalmente cultivada (GOB, 2001), como ambiente propício tanto à geração de novos conceitos como ao resgate de significados simbolicamente preservados. Entretanto, em se tratando de um projeto que perpassa os séculos e o próprio milênio, é evidente que nenhum estudioso, seja maçom ou acadêmico, poderá contemplar adequadamente a Maçonaria, desprovido de consistente compreensão sobre as suas razões e motivações secularmente preservadas. Da mesma forma que o labor científico especializado, voltado para um aspecto particular da realidade, não pode ser realizado sem que o cientista tenha em mente as leis gerais da natureza, também a competente contemplação e compreensão da Ordem maçônica requerem a consideração de suas razões essenciais e de suas motivações permanentes.
A par dessas razões eminentemente maçônicas, cumpre destacar o novo alento que os estudos metafísicos têm recebido no meio acadêmico, em decorrência de tese oriunda das escolas de Tübingen e de Milão (SZLEZÁK, 2009), evidenciada em trabalhos filológicos (Ibidem) e historiográficos (REALE, 2004) de grande consistência, segundo os quais se impõe considerar as lições que Platão reservou e tratou exclusivamente na oralidade – identificadas sob o título de “doutrinas não escritas” – para se entender devidamente a sua obra. A força com que essa nova perspectiva vem-se impondo, inclusive no Brasil (PERINE, 2011), prenuncia uma retomada ou um novo ímpeto nos estudos acadêmicos de metafísica, fato que abre preciosa oportunidade de diálogo entre a Academia e a Maçonaria, dado que esta, apesar de valer-se de linguagem simbólica, nunca se afastou da perspectiva metafísica.
Em face dessas circunstâncias, objetiva-se, com o presente trabalho, primeiramente, lançar alguma luz sobre os arcanos que são determinantes do seu espírito e indicativos da sua missão de longo prazo, na expectativa de melhor instrumentalizar o ensino maçônico e de contribuir para que estudiosos, maçons e leigos, possam, nas suas análises, levar em conta o que a Ordem possui de mais valioso e essencial. Secundariamente, objetiva-se postular uma estrutural afinidade entre doutrina maçônica e estudos metafísicos, com base em legados de Platão, cuja doutrina não escrita adquire significados esclarecedores quando contemplada por olhos iniciados, configurando contribuição conceitual importante para todos e, em particular, para os estudos da obra de Patão orientados pelas mencionadas “doutrinas não escritas”.
Para atingir esses objetivos, contextualiza-se, em largos traços, uma tradição de Escolas de Mistério cultivadora de um conhecimento esotérico, cuja orientação ontológica encontrou terreno fértil no espírito grego clássico, empenhado em superar a cultura mitológica – mediante a busca de fundamentos da natureza que pudessem ser suportados pela razão. Esse movimento alcança seu ápice na Academia Antiga que, sintomaticamente, mantém a tradição de um conhecimento esotérico distinto do saber liberado para todos, configurando um fato apenas marginalmente contemplado nos estudos modernos da obra de Platão e que, agora, ganha relevância em razão dos novos rumos que se oferecem para tais estudos.
Uma vez detectada a presença dessa tradição esotérica no berço da filosofia ocidental, ausculta-se a doutrina maçônica a fim de identificar os seus motivos, constata-se que Platão comungava de preocupações semelhantes, tendo se dedicado intensamente à questão – particularmente no mito da caverna e no desafio que coloca ao verdadeiro filósofo. Na sequência, a fim de avaliar a extensão dessa confluência, examina-se a teoria das ideias de Platão, identificam-se limites do modo platônico de ver o mundo e constata-se que a superação de tais limites depende da sua “doutrina não escrita” ou do que Aristóteles vai designar de “teoria dos princípios” de Platão. Finalmente, aportam-se conceitos conquistados na modernidade e, com isso, logra-se alcançar, em alguma medida, os objetivos formais deste trabalho, que apenas abre uma picada no meio da floresta, indicando um percurso promissor que, virtualmente, poderá vir a recepcionar uma civilizadora autoestrada pavimentada de intenso tráfego, mas cuja consecução certamente requer árduos esforços complementares de pesquisa.
Desenvolvimento
A Maçonaria inscreve-se em uma tradição de Escolas de Mistério de orientação filosófica, cujas raízes são encontradas na mitologia egípcia. Mas, em se tratando da civilização ocidental, isso não constitui prerrogativa da Maçonaria, uma vez que a religião e a filosofia do ocidente também possuem o mesmo nascedouro.
Está demonstrada a origem egípcia das concepções básicas de Pitágoras e de Platão (JÁMBLICO, 1997) que inauguram o pensamento filosófico ocidental bem como a influência egípcia na formação do povo hebreu e na própria composição de certos relatos bíblicos, inclusive na concepção de um Deus único (GADALLA, 2003), de sorte que convém levar em conta que, embora a mitologia operasse uma linguagem simbólica e metafórica, ensejou tanto derivações religiosas de cunho místico quanto derivações filosóficas de caráter racional.
Esse fato, por si só, já evidencia que os relatos mitológicos precisam ser levados a sério e que, apesar de a sua origem ser desconhecida, a riqueza e a densidade de seus conteúdos denunciam a genialidade e a sabedoria dos seus criadores, o que também revela que a história oficial da humanidade está omitindo parte da verdade ou, no mínimo, apresenta instigante lacuna. De qualquer modo, parece perfeitamente interpretável que a mitologia egípcia representou construção pedagógica de cultura superior, visando a impregnar certos valores em uma cultura incipiente, incapaz de preservá-los como tradição racional (CAMPBELL, 1989). De certa maneira, solução similar foi adotada pelos criadores da Maçonaria especulativa, no século XVIII, quando os rituais foram concebidos. Estes registram simbolicamente certos conhecimentos que tendiam a desaparecer ou serem esquecidos, em meio a uma cultura que, inexoravelmente, voltava-se para a materialidade e para a valorização de uma ciência excludente de tais saberes, porquanto confinada ao âmbito do espaço tridimensional.
Aliás, a preservação e o cultivo de conhecimentos julgados essenciais, em contextos culturais hostis, parecem representar motivação base de boa parte das confrarias e Escolas de Mistério de que se têm notícias. Essas iniciativas, que se reproduzem no tempo a partir dos templos do Egito Imperial, passando pela Grécia Clássica antes de assumir as formas Rosa Cruz e Maçônica modernas, precisam ser consideradas seriamente, tal como se requer da mitologia. Tais iniciativas, em boa parte das ocasiões, sobreviveram à revelia do poder político estabelecido, significando que impunham aos seus membros algum grau de risco (PORFÍRIO, 1987). A adoção de um discurso exotérico distinto do conhecimento esotérico praticado na intimidade evidencia cuidados que eram tomados. Na contrapartida, isso torna também evidente que havia convicção, perspectiva de longo prazo e dedicação à causa da cultura humana, de sorte que, quando a Academia, agora, passa a estudar cientificamente a Maçonaria, demonstra que não se pode apreciar simplistamente um fenômeno social dotado de tal persistência e que convém apreciá-lo com formalismo científico.
Em face do acima exposto, entende-se pertinente procurar, no âmbito dos rituais maçônicos, as razões e as motivações permanentes da Ordem. Nesses rituais, a condição de maçom pleno é obtida com a conquista do grau de Mestre, que é conferido em uma cerimônia ritualística própria: a Cerimônia de Exaltação (GOB, 2009). Ora, se essa cerimônia confere ao obreiro a plenitude maçônica, parece justo supor que os projetistas dos rituais tenham definido, nessa ocasião, tanto o papel do Mestre como os propósitos da Ordem, uma vez que aquele somente pode ser estabelecido à luz destes.
Além de fixar, na Cerimônia de Exaltação, o ponto de partida desta investigação, cumpre considerar que se está contemplando conteúdos simbolicamente registrados, dado ser essa a linguagem do ritual que, conforme já vimos, no caso da mitologia, admite derivação tanto no sentido místico-religioso quanto no sentido filosófico-racional.
Obviamente, o presente estudo requer que se siga esta última linha, no sentido da racionalidade, por ser ela que possibilita não apenas a identificação do papel do Mestre, mas também a identificação da missão da Ordem. Curiosamente, como se verá, essa passagem do simbólico para o conceitual demonstrará o caráter essencialmente filosófico da Maçonaria e, para ser mais preciso, o caráter metafísico da Maçonaria (RODRIGUES, 2012).
Ora, sabe-se que, na modernidade, a Filosofia abandonou a linha metafísica, assumiu um caráter subjetivista, converteu-se em Teoria do Conhecimento, realizou estudos de lógica, configurou uma Filosofia da Linguagem e chegou, com Heidegger, a afirmar que Metafísica só seria possível à margem da racionalidade (MORA, 1978; MOLINARO, 2004). Somente nas últimas décadas, a percepção das “doutrinas não escritas” de Platão traz novo alento aos estudos metafísicos e promete recolocar a Filosofia no seu leito original.
Observe-se que a doutrina maçônica manteve-se fiel à perspectiva metafísica e que o desvio da Filosofia por caminhos outros comprova o acerto dos criadores da Ordem tanto no diagnóstico da situação como na solução de preservação adotada, o que indica, de modo bastante efusivo, que a Maçonaria constitui um projeto comprometido com a cultura humana e que os estudos acadêmicos que estão surgindo merecem efetivamente ser festejados.
O que nos diz a Cerimônia de Exaltação
A construção do Templo da Razão ou da mente, em todo o seu esplendor, tanto quanto a libertação do espírito da caverna das ilusões, potencializando os estágios superiores de lucidez e discernimento que a natureza faculta à espécie humana, não pode ser realizada por outro, de fora para dentro, mas apenas pelo ser que possui acesso à razão. Apenas cada um, individualmente, pelo seu próprio esforço e empenho, pode libertar a sua própria mente. Não há a mínima possibilidade de fazê-lo de modo distinto. Portanto, o que a Cerimônia de Exaltação informa-nos é que a Maçonaria constitui um projeto de libertação (SUPREMO…, 2005ª), de libertação do espírito ou da mente humana, para as suas melhores potencialidades e que o desafio do Mestre Maçom consiste, primeiramente, em realizar essa libertação em si mesmo: realizar a sua própria libertação.
A Necessidade de Passar do Simbólico para o Racional
A compreensão da missão da Ordem e do desafio do Mestre inscreve a Maçonaria na condição de promotora do processo civilizatório e de instituição a serviço da humanidade, nos mesmos moldes de outras instituições existentes, tais como escolas, universidades, igrejas, institutos de pesquisa e tantas outras. O objetivo específico, porém, de libertar o espírito das ilusões que o enganam e potencializar a competência cognitiva superior preconizada no projeto humano implica projeto de domínio pleno do ato de pensar, de modo a torná-lo um ato metódico, plenamente formalizado (RODRIGUES, 1999). Ora, saber pensar metodicamente exige um método formal de pensar, e pretender ensinar isso para seus adeptos pressupõe uma instituição que detenha e domine esse conhecimento. Isso diferencia a missão da Maçonaria e a torna uma instituição única no mundo, de vez que, pelo que se sabe, em nenhuma universidade, encontra-se uma disciplina com a pretensão de ensinar a pensar metodicamente. No máximo, encontram-se, em diferentes cursos, estratégias de desenvolvimento de capacidade interpretativa ou, então, estratégias de desenvolvimento de habilidades lógicas e metodológicas gerais.
Impõe-se perceber que libertar o espírito da matéria constitui um projeto ambicioso, caso, efetivamente, vise ao amadurecimento intelectual da espécie e a habilitação do homem para uma compreensão totalizante do universo, da natureza e de si mesmo. Algo claramente diferente e que não se confunde com as formações científicas especializadas de toda ordem que, hoje, são propiciadas nas faculdades e universidades do mundo profano; algo que deveria instrumentalizar todo homem que tenha a pretensão de desenvolver ciência sobre o universo, pois, caso a sua visão de mundo esteja equivocada, o resultado de sua ciência fica comprometido.
A questão é que a especificação conceitual e científica desse método libertador do pensar não consta dos rituais da Maçonaria, embora ele esteja simbolicamente indicado com grande destaque (RODRIGUES, 2009). A especificação formal desse método não consta dos rituais, não por deficiências na sua elaboração, mas porque, até a presente data, não apenas a Maçonaria, mas todas as Escolas de Mistério do mundo não conseguiram produzir uma descrição formal e científica dele.
Certos estudos revelaram que quem mais se esforçou para conseguir essa descrição foi Platão, tomando por base uma solução precária legada por Pitágoras (SZLEZÁK, 2008). Apesar do seu esforço, ele não logrou resolver o problema, embora tenha aportado decisiva contribuição para solucioná-lo, como ainda veremos. Na ocasião, Platão enfrentou dificuldades intransponíveis, representadas pela inexistência de certos recursos conceituais que a humanidade somente desenvolveu na modernidade. Platão e Pitágoras foram os primeiros grandes iniciados que se esforçaram para converter uma convicção, simbólica e metaforicamente descrita, em uma descrição formal, racional e, logicamente, suportada. Esse conhecimento tinha sido recolhido por Pitágoras no seio da mitologia egípcia (PORFÍRIO, 1987; JÁMBLICO, 1997; SCHURÉ, 2011) e, embora fosse absolutamente convincente, tinha apenas descrições simbólicas, possivelmente não muito diferentes daquelas usadas pela Maçonaria de hoje. Isso podia ser suficiente no âmbito de uma confraria unida pela lealdade e pelo desejo de compreender, mas era nitidamente insuficiente para conquistar mentes extramuros e ganhar universalidade.
Atualmente, a situação da Maçonaria não é diferente. Os obreiros estão todos convencidos da necessidade, da utilidade e da conveniência de libertar o espírito da matéria. Apenas não sabem como fazer isso racionalmente. Já se viu que não basta derivar para a religião e o misticismo e apelar para a fé. Esse caminho tem sido tentado pelas religiões. A solução almejada implica derivação para a racionalidade e a razão. A demanda é de elementos conceituais, solidamente amparados pela lógica, que se revelem convincentes e possam ser testados em procedimentos confiáveis, tais como aqueles preconizados pelo método científico. Portanto, impõe-se transitar do simbólico para o conceitual sob o amparo da racionalidade. Capitaliza-se, para tanto, os esforços, no mesmo sentido, desenvolvidos por Platão e, depois, acrescenta-se o que a modernidade ensina.
A Teoria das Ideias e a Razão Áurea de Platão
Platão percebeu que os sentidos orgânicos de percepção que instrumentalizam os homens são especializados. O ouvido ouve sons; o olho vê formas e cores; o tato sente texturas, temperaturas e formas; o gosto percebe sabores; o olfato percebe odores; e a mente compreende. Percebeu, também, ser impossível para o ouvido ver, para o olfato sentir sabor, para o olho compreender etc., sendo apenas possível a cada sentido realizar a percepção de sua própria especialidade, a percepção para a qual o sentido está habilitado. Nesse contexto, percebeu, ainda, que os homens confundiam e não distinguiam, adequadamente, os objetos de percepção do olho e da mente. Os homens acreditavam pensar o que viam, o que contrariava a especialização dos sentidos. Se o olho via o objeto, as cores e a forma da matéria, a mente pensava o que do objeto?
Platão soluciona essa questão com a sua teoria das ideias, segundo a qual a mente entende e tem acesso à inteligência organizativa que constitui a essência modeladora dos objetos. Essa essência ou inteligência organizativa ele designou de ideias ou formas. Essas ideias ou formas determinam a compleição dos objetos e constituem a essência constitutiva deles, conferindo-lhes propriedades que são identificadas como atributos. Em lugar de ideias e formas, prefere-se usar a expressão inteligência organizativa para designar essa essencialidade constituinte, uma vez que, modernamente, sabe-se que os objetos não resultam da junção aleatória de componentes, mas da articulação inteligente de certos e determinados componentes, capazes de se integrar em uma totalidade estável que resultará dotada de propriedades específicas. Nessa perspectiva, Platão encontra uma maneira simples de diferenciar os objetos de percepção da mente dos objetos de percepção do olho: “Os objetos são visíveis, mas não inteligíveis, ao passo que as ideias são inteligíveis, mas não visíveis” (PLATÃO, 2012).
Essa frase sintetiza de forma simples e clara a percepção que suporta a teoria das ideias de Platão: há um mundo inteligível distinto do mundo visível que, ordinariamente, prende a atenção dos homens. Esse mundo inteligível configura uma realidade essencial situada mais além do mundo visível imediato e se compõe de ideias ou inteligência organizativa que cumpre papel determinante da compleição e da forma desse mundo visível. Essa separação entre a instância visível e a instância inteligível proporciona a Platão um poderoso e revolucionário modo de ver o mundo que, juntamente com a sua dialética, explica o poder de sedução e a magnitude da sua obra. Pode-se esquematizar esse modo de ver o mundo da seguinte forma:
Figura 1: Modo platônico de ver o mundo. Fonte: Platão (2012)
Essa figura foi extraída de texto que antecede a apresentação do mito da caverna por Platão, no diálogo A República (Ibidem), em que o personagem Sócrates é desafiado a falar do bem em si que, na teoria das ideias, ocupa a posição de fonte a partir da qual as ideias emanam. Em outros textos, essa fonte primordial é também designada de o belo em si e também de o uno. Esse uno, em Platão, expressa a simplicidade absoluta e indivisível que antecede ao próprio número e à própria unidade quantitativa, sendo assim considerada a origem primeira do cosmos (REALE, 2004). Sócrates recusa-se a falar do bem em si – que está justamente no cerne do que, hoje, está sendo designado de “doutrinas não escritas” de Platão –, mas se dispõe a falar do filho do bem em si, o qual afirma ser muito semelhante ao pai que o gerou e que resulta ser o Sol. Essa semelhança é afirmada por ele em uma frase em que estabelece verdadeira relação áurea, ligando o mundo inteligível ao mundo visível, que exerce função estrutural semelhante à da famosa proporção áurea (1,168) que os gregos também identificaram e que, além de estar sempre presente na natureza, foi usada no Parthenon e também está ou deveria estar presente no retângulo básico que formata os templos maçônicos. Essa razão áurea pode ser expressa nos seguintes termos: “O Sol está para o mundo visível assim como o bem em si está para o mundo inteligível” (PLATÃO, 2012, 508c).
Sócrates explica aos seus ouvintes, mais ou menos, nos seguintes termos: no mundo visível, o olho vê porque possui a propriedade de ver, e o objeto e as cores são vistos porque possuem a propriedade de se mostrarem (Ibid., 507c a 509c). Nada disso pode ocorrer na ausência de luz e, no nosso planeta, a fonte da luz é o Sol. Quando começa a escurecer, a visão também vai se perdendo, até que, em plena escuridão, o olho não consegue ver mais nada.
Quando amanhece, o processo se inverte, as visões vão ficando cada vez mais claras, até que, à plena luz do Sol, tudo torna-se nítido outra vez. Ocorre, porém, afirma Sócrates, que o Sol não apenas fornece a luz que possibilita a visão, mas também é a fonte geradora tanto do olho como do objeto visto.
Atualmente, na modernidade, não se tem mais dúvida disso. O Sol é a fonte criadora não apenas da luz, mas igualmente de todos os planetas do Sistema Solar e também os mantém em órbitas estáveis, o que possibilitou o surgimento da água e de toda a vida presente na Terra e, ainda, moldou todos os sentidos de percepção dos animais e, evidentemente, também tornou os olhos capacitados para ver. Além disso, continua fornecendo a energia que sustenta toda a vida.
O mesmo processo ocorre no mundo inteligível, afirma, ainda, Sócrates. O bem em si não apenas gera a mente e a inteligência organizativa ou ideias que moldam os objetos, mas também fornece a “iluminação” que permite à mente entender essa inteligência organizativa. A diferença é que, em lugar de luz, o bem em si fornece o ser e a verdade que são os elementos com os quais esse entendimento torna-se possível. Pode-se, então, também dizer que a luz está para o ato de ver, assim como o ser e a verdade estão para o ato de entender.
Sobre o mundo visível descrito por Platão, não restam dúvidas. A ciência moderna sanciona, em termos próprios, todas as explicações dadas. Sobre o mundo inteligível, cabem algumas explicações:
A presença do ser, na mente, constitui um fato que apenas cada um pode constatar ao examinar os seus próprios pensamentos. Ao pensar, percebe-se nitidamente que, na raiz de nossos pensamentos, encontra-se o ser que somos e que constitui o operador inteligente que pensa. A presença da inteligência organizativa nos fenômenos, também, não oferece dificuldades. É evidente que um computador resulta da confecção e reunião de peças projetadas pelo homem e registradas, inicialmente, de forma escrita, em documentos/projetos. As peças que integram o computador foram construídas a partir de especificações contidas nesses projetos, e a montagem do computador deu-se em obediência à inteligência organizativa que os engenheiros registraram no projeto. À medida que a montagem realizava-se, essa inteligência organizativa foi sendo incorporada à máquina em construção e, no final, o computador tornou-se uma unidade funcional determinada por essa inteligência organizativa (RODRIGUES; RODRIGUES, 2012), a qual Platão chamaria de a ideia ou a forma do computador.
De outro lado, o bem em si é o uno, o princípio criador, o Deus das religiões e o princípio necessário da metafísica. Na Maçonaria, corresponde ao Grande Arquiteto do Universo que é aceito, aprioristicamente, como princípio (GOB, 2001), de sorte que a demonstração de sua existência, embora possível (SANTOS, 2001), fica aqui dispensada. Resta, então, falar sobre a verdade que tanto imprime inteligência às ideias quanto permite à mente entender essa inteligência organizativa.
O conceito de verdade de Platão está ligado ao conceito de beleza grego e, consequentemente, ao conceito de bem em si e belo em si. O grego entende que nem mesmo Deus poderia criar o mundo de qualquer maneira, pois tinha de obedecer às matemáticas (ARISTÓTELES, 2006), posto ser essa a única maneira da criação configurar um cosmos e não um caos. Ou seja, para os gregos, as leis da forma, do movimento e da quantidade, que correspondem em linhas gerais às ciências hoje designadas de Geometria, Lógica e Matemática, constituíam estruturas inescapáveis da existência, de modo que a criação somente pode ocorrer em âmbito de possibilidades demarcado por essas leis. Nesses termos, tanto a construção da mente e de sua faculdade de pensar como a construção da inteligência organizativa e sua faculdade de ser pensada resultam frutos do ser e da verdade (PLATÃO, 2012, 508e e 509ª). Consequentemente, o ato de entender implica reconhecimento da verdade por parte do ser, isto é, a verdade presente no ser encontra correspondência na verdade presente na inteligência organizativa do objeto e, assim, torna-se compreensão e conhecimento.
Platão ainda esclarece que o ser surge do bem em si ou do uno por transbordamento (Ibid., 508b/c), querendo, com isso, dizer que o ser não se origina do bem em si em virtude de um movimento deste, posto que o bem em si, desde Pitágoras, é concebido como ilimitado (REALE, 2004) e, portanto, necessariamente estático, já que qualquer movimento implica determinação e limitação. Hoje, seria mais adequado dizer que o ser emana do bem em si por transcendência, uma vez que o movimento transcendental encontra-se formalizado (SAMPAIO, 2001) e explica como um fenômeno pode surgir e desaparecer de um dado plano existencial, fato que constitui ocorrência comum na natureza.
Caso o leitor possa reunir um átomo de oxigênio com dois átomos de hidrogênio em condições adequadas, terá criado uma molécula de água que, antes, não existia no plano existencial das moléculas e, fazendo o inverso, fará essa molécula desaparecer da existência. Designar esse movimento de transcendência revela-se perfeitamente adequado, porque a molécula de água apresenta propriedades que não estão presentes nos seus átomos constitutivos, de sorte que a molécula de água constitui uma totalidade que se situa para além da mera soma das partes. Portanto, a ideia básica de surgimento de algo, no âmbito da existência, por transcendência, afigura-se pertinente, razoável e adequada.
Assim, constatam-se perfeitamente justificados todos os elementos usados por Platão para caracterizar e distinguir, na realidade, um mundo visível de um mundo inteligível. Apesar disso, o modelo de mundo inteligível de Platão não está fechado e completo, faltando um elemento-chave para dar-lhe consistência interna.
Platão tinha plena consciência dessa carência, embora não tenha conseguido supri-la. Esse elemento faltante constitui justamente o núcleo central das chamadas “doutrinas não escritas” de Platão, assunto do qual apenas tratou na oralidade. Observe-se que o projeto de computador acima mencionado contempla a inteligência organizativa que faz daquela máquina um computador dotado de certas propriedades e de certas funcionalidades, mas não contempla a inteligência criativa que os engenheiros utilizaram para criar o projeto, isto é, não contempla o conhecimento usado pelos engenheiros para projetar a inteligência organizativa do computador.
Da mesma forma, em se tratando da natureza, uma árvore constitui um fenômeno bem determinado por certa inteligência organizativa. Essa inteligência organizativa da árvore é muito mais sofisticada do que aquela do computador, tanto assim que possui a propriedade de reproduzir-se. Entretanto, por mais sofisticada que essa inteligência organizativa seja, não contempla o conhecimento demandado para a criação da primeira árvore.
Portanto, está faltando, no esquema de mundo inteligível retratado na figura, a indicação de uma inteligência criativa capaz de explicar como é que o ser emanado do uno, contando apenas com o apoio da verdade, consegue criar as inteligências organizativas que moldam os fenômenos existentes. Pode-se também formular essa pergunta nos seguintes termos: como é que o ser que transcende do uno consegue criar fenômenos na existência, contando apenas com as leis naturais da Lógica, da Geometria e da Matemática?
A Razão de Todas as Escolas de Mistério
Conseguir uma descrição formal, racional e lógica dessa inteligência criativa foi o sonho acalentado pelos mestres maiores de quase todas as Escolas de Mistério, e perceber o seu potencial enquanto ferramenta referencial ampliadora do discernimento humano, a fonte motivadora da sua construção.
Ao que tudo indica, no Egito Imperial, a percepção disponível dessa inteligência criativa, ao menos em algumas épocas, foi suficiente para gerar uma tecnologia avançada que possibilitou as obras faraônicas conhecidas. Pitágoras recolheu esse conhecimento em expressão simbólica e tentou traduzi-lo e formalizá-lo em termos matemáticos próprios da cultura grega. O resultado foi a famosa dédaca sagrada, expressa na equação 1 + 2 + 3 + 4 = 10, que constituía o cerne da doutrina pitagórica e, sobre a qual, os iniciados da escola místico-filosófica, criada por Pitágoras, juravam fidelidade à Ordem e lealdade aos demais irmãos (SANTOS, 2002; MARTÍN, 2009).
Embora essa equação constituísse um avanço sobre uma descrição meramente simbólica e expressasse o sentido geral do modelo criativo usado pela natureza na geração dos fenômenos, representava uma formalização precária e problemática, tanto assim que esses números foram definidos como números ideais (KLEIN, 1992; ARISTÓTELES, 2006) distintos dos números quantitativos. Esses números ideais não podiam ser operados uns contra os outros, tal como na matemática ordinária, mas cada um inaugurava uma série quantitativa distinta que não se misturava com as demais.
Essa descrição pitagórica da inteligência criativa foi a que Platão recebeu e não conseguiu formalizar de modo mais preciso e racional. Por esse motivo, não escreveu a respeito e tratou do assunto exclusivamente na oralidade. Supõe-se que isso se dava no âmbito privativo de uma Escola de Mistério de orientação pitagórica, que Platão operava na residência que tinha construído no jardim de Academos, onde funcionava a Academia. Nesta, tratava-se de todos os assuntos contidos nos diálogos, no entanto, quando a conversa exigia tratar da inteligência criativa, que, em termos platônicos, seria designada de forma das formas, ele desconversava e transferia para outra ocasião, a qual, supõe-se, ocorria na sua residência, para convidados criteriosamente selecionados, dentre os quais, curiosamente, ao que tudo indica, não constava Aristóteles.
Possivelmente, as descrições que Platão podia apresentar a respeito dessa inteligência criativa consistiam de menções simbólicas, de algum modo, relacionadas à dédaca sagrada em contextos que exigiam a presença de um princípio criador. Provavelmente, a liturgia praticada nessa escola, em virtude da sua orientação pitagórica, derivava fortemente da mitologia egípcia que, em pontos relevantes, confrontava a mitologia grega.
Dado que um ambiente de confraria afastava o risco de denúncia por “heresia”, tal como experimentado por Sócrates, justifica-se, em parte, tratar dessas questões apenas na intimidade. As razões fundamentais eram, porém, segundo entendemos, de ordem técnica. Faltavam conhecimentos e conceitos necessários para viabilizar a formalização desse modelo criativo, tanto assim que Platão chegou a denominá-lo de díada do grande e do pequeno, expressão que menos indicava o que ele era, indicava mais o seu alcance universal: respondia pela existência de todos os fenômenos, independentemente do tamanho e da complexidade.
Apesar dessa carência, o modo platônico de ver o mundo sintetizado na figura apresentada imprimia, nos espíritos, a certeza de que deveria existir solução. Depois de Platão, os esforços de compreensão persistem e caracterizam o movimento filosófico do Neoplatonismo; acomodam-se durante a Idade Média, virtualmente porque a Igreja Católica mantém a perspectiva como Verbo, “que era no princípio”; e, apenas na Modernidade, o despertar de uma perspectiva materialista vai gerar o movimento Rosa Cruz e a Maçonaria. Esta vai designar esse princípio criador de palavra perdida, uma palavra que deve ser buscada e denominar os seus templos de Lojas de São João, razões pelas quais se percebe mantido, na Ordem maçônica, o propósito milenar de todas as Escolas Filosóficas de Mistério: achar a palavra perdida, visando a libertar o espírito do homem preso no mundo visível da matéria.
As Descobertas da Modernidade
O conhecimento hoje disponível permite-nos, finalmente, compreender o que a década sagrada queria dizer.
A equação 1 + 2 + 3 + 4 = 10 indica o modelo matemático segundo o qual toda e qualquer existência estabelece-se como fenômeno presente neste universo. Os números 1, 2, 3 e 4 (a tétrada) indicam, respectivamente, a 1ª dimensão, a 2ª dimensão, a 3ª dimensão e a 4ª dimensão da existência. O número 10 indica a instância da totalidade dos fenômenos, a qual corresponde uma determinada inteligência organizativa.
Desde 1999, esse modelo criativo encontra-se especificado e formalizado com a denominação de logos normativo (RODRIGUES, 2011) e, na condição de estrutura ontológica, de cuja constituição apenas participam as leis naturais do movimento, da forma e da quantidade que, no geral, correspondem às ciências modernas – Lógica, Geometria e Matemática –, conforme já indicado. O título de logos normativo decorre do fato de a estrutura normatizar a existência, e a condição ontológica quer dizer que os fenômenos apenas ganham assento na existência como totalidades, o que implica afirmar que, no universo, não existe um fenômeno de segunda classe chamado parte, mas apenas totalidades (RODRIGUES; RODRIGUES, 2012).
Com isso, a complexidade, nesse modelo, resulta não da reunião de partes, mas da inteligente articulação de totalidades bem constituídas. Tratando-se de um modelo único gerador de toda existência, este possui a propriedade de se replicar ao infinito e, assim, responder pela edificação ordenada do universo em camadas de crescente complexidade, a partir de energias quânticas, passando por partículas atômicas, átomos, moléculas, organismos, sistemas planetários, galáxias até o próprio universo, sempre dentro de espaços de possibilidades determinados pelas matemáticas.
Não cabe, neste trabalho, entrar em detalhes dessa versão moderna da década, pois existem livros tratando disso (RODRIGUES, 1999). Cabe, porém, ressaltar que essa solução torna-se, hoje, viável por ser possível admitir uma geometria dimensional (uma métrica da amplitude?), situada para além das geometrias não euclidianas.
Pode-se igualmente pensar uma ciência de múltiplas lógicas, situada para além da lógica clássica única de Aristóteles e, ainda, ser defensável a possibilidade de uma matemática de múltiplos graus de infinidade demandada pelo modelo. Além disso, a Mecânica Quântica, ao constatar a presença de fenômenos que desobedecem às leis do tempo e do espaço – 4ª e 3ª dimensão, respectivamente –, abre espaço para uma retomada da Metafísica e para a reutilização do conceito de transcendência. A própria Astrofísica, com o convencimento de que o universo teve um começo, enseja modos de pensar impossíveis de serem alcançados na antiguidade grega.
Há, ainda, outras conquistas conceituais que facilitam o entendimento e a formalização dessa inteligência criativa, mas as citadas parecem suficientes para justificar por que Pitágoras e Platão não conseguiram realizá-lo.
Conclusão
Com o advento do logos normativo formalizando a inteligência criativa, superam-se as críticas de Aristóteles sobre a Teoria das Ideias de Platão (ARISTÓTELES, 2006), e o modo platônico de ver o mundo estabelece-se como modelo completo dotado de rigorosa consistência interna. Basta substituir, no esquema platônico de mundo inteligível, a palavra verdade pela expressão logos normativo, e o modo platônico de ver o mundo torna-se referência adequada para orientar o trabalho maçônico de libertar os espíritos da materialidade. Com essa conquista conceitual, a Maçonaria do século XXI completa a transição do simbólico para o racional que todas as escolas da tradição almejaram, disponibiliza para os homens um método capaz de superar as ilusões do mundo visível e um modo formalizado de pensar a totalidade que, no caso da totalidade da espécie, potencializa um novo padrão civilizatório.
A missão permanente da Maçonaria consiste, sim, como afirmam os rituais, em projeto de libertação da humanidade do mundo ilusório da materialidade. Um espírito preso na matéria significa uma mente estreita cuja visão não ultrapassa o mundo sensível e acredita que o universo está contido no âmbito do espaço tridimensional. Uma mente presa no mundo visível debate-se em uma missão impossível de pensar um visível que não é pensável. Na verdade, esse homem comunga da visão de mundo que todos os demais animais possuem e vive no devir espaço-temporal em constante sobressalto, em face dos conflitos dialéticos com suas circunstâncias. Para esse homem, a civilização é selvagem, os problemas sociais são insolúveis, e a paz e a fraternidade, impossibilidades, em razão do egoísmo estrutural.
Dado que uma sociedade de homens presos ao mundo visível não tem futuro, além daquela pós-modernidade possibilitada pela animalidade, a Maçonaria dedica-se a formar Mestres Maçons, desafiando-os a libertar o seu espírito da matéria, desafiando-os a superar o mundo visível, a abrir os olhos para o mundo inteligível e a descortinar as superiores potencialidades da espécie, o que fez, até o presente momento, invocando imagens simbólicas e argumentos alegóricos. Com os legados da tradição e as descobertas em curso na modernidade, passa a oferecer recursos metódicos e racionais como apoio para essa travessia. A partir de agora, libertar o espírito da matéria constitui procedimento racional plenamente normalizado. Seu pré-requisito: entender e saber operar a inteligência criativa geradora dos fenômenos manifestos na existência. Em outros termos: compreender os axiomas e os modos da existência.
A missão permanente da Maçonaria e de todas as Escolas de Mistério da tradição perante a humanidade implica verdadeiro sacerdócio, na medida em que procura resgatar os homens do mundo das ilusões – da caverna metafórica de Platão – e os colocar no mundo inteligível, em presença do princípio criador e do ser atemporal que edifica o mundo. Constitui um sacerdócio legítimo porque, apesar dos contextos adversos, empenha-se em instrumentalizar os homens e suas mentes para um entendimento superior do mundo e da sua própria existência e, assim, perceber o poder construtivo que despertaria uma humanidade que trabalhasse harmônica e cooperativamente. Para cumprir essa missão – que poderia e deveria ser compartilhada por todos os sacerdotes do mundo –, a Maçonaria exige do Mestre Maçom que se dedique ao estudo e se habilite para esse sacerdócio, o qual se revela superior na medida em que, ao invés de submeter os homens a qualquer doutrina que lhe seja exterior, quer mesmo é que cada um seja capaz de, por si mesmo, encontrar, no seu interior, as leis permanentes do universo e que decida o que é conveniente para si e para a espécie.
A missão da Academia e, em particular, das Faculdades de Filosofia empenhadas na formação de verdadeiros filósofos – segundo a concepção platônica – não é diferente: também objetivam facultar aos homens a saída das cavernas e colocá-los frente do mundo inteligível. Certamente, um Platão iniciado, metafísico e pitagórico enseja estranheza e conflitos em mentes educadas sob princípios científicos que sub-repticiamente criam também preconceitos de linguagem. Superados estes, conclui-se que a tese apresentada retira parte do véu que encobria a teoria dos princípios de Platão, a qual acompanhava Pitágoras na percepção de que os princípios primeiros eram constituídos do ilimitado e do limitante: indicações normativas das naturezas absoluta e relativa que, segundo a razão e a lógica, recepcionam a existência. Nessas condições, resulta que a dédaca pitagórica indica a estrutura dimensional segundo a qual o limitante, condicionando o movimento existencial do ser, constitui e molda toda a existência relativa. A fundamentação última dessa interpretação demanda certamente um exame ontológico que não cabe no plano de um artigo, mas, apesar disso, contabiliza-se uma hipótese de solução teorética para as “doutrinas não escritas” de Platão, em contribuição que se soma às justificativas histórico-hermenêuticas ofertadas pelas escolas de Tübingen e de Milão.
Atendida a racionalidade, conceda-se espaço ao delírio que enriquece a humanidade. Este planeta é um paraíso. É uma ilha-paraíso em meio a uma vastidão galáctica hostil à forma humana de vida. Pensar este planeta como uma maçã cósmica sendo devorada por vermes constitui apenas uma alternativa superável. O homem pode superar o casulo animal e se transformar em jardineiro cioso e orgulhoso de seu jardim. Empenhar-se metodicamente para que isso aconteça constitui oportunidade que se oferece a professores e maçons do século XXI. A estes, a história reservou, como missão ou oportunidade, completar os esforços das escolas de sabedoria de todos os tempos e concluir um projeto virtualmente surgido na mente dos sábios que formularam a mitologia egípcia há mais de cinco mil anos, qual seja, o de preservar, na cultura humana, perspectiva metafísica e ontológica que faculta e conduz naturalmente ao desvelamento dos axiomas da existência.
Por quê? Porque o seu conhecimento permite superar a animalidade estrutural da espécie, amadurece as mentes ao revelar as leis constitutivas do universo e, com isso, potencializa uma civilização centrada no ser que, verdadeiramente, constitui-nos. Pode-se, é claro, enquanto espécie, continuar sendo apenas um acidente cósmico, mas pode-se, também, converter a humanidade em caso de sucesso do ser que edifica o universo.
Autor: Rubi Rodrigues
Fonte: Revista Ciência & Maçonaria
Referências Bibliográficas