IGREJA CATÓLICA E MAÇONARIA: novas abordagens sobre uma antiga questão

1.    Introdução

É necessária uma boa dose de perspicácia para perceber quando um evento noticiado tem o condão de propiciar uma reflexão sobre o presente vivido a partir de continuidades históricas. Assim foi com a notícia do Vatican News de 15 de novembro de 2023 com o singelo, apesar de bem direto, título “A maçonaria continua proibida para os católicos” (VATICANO NEWS, 2023).

Trata-se de matéria que analisa a resposta do Dicastério para a Doutrina da Fé de 13/11/2023, aprovada pelo Papa Francisco, referente a uma consulta do bispo de Dumaguete, nas Filipinas, sobre como lidar adequadamente, do ponto de vista doutrinário, com o fato de que tem havido o aumento de fiéis filiados à maçonaria.

O Dicastério confirmou que “a filiação ativa de um fiel à maçonaria é proibida, devido à irreconciliabilidade entre a doutrina católica e a maçonaria (cf. a Declaração da Congregação para a Doutrina da Fé de 1983, e as mesmas Diretrizes publicadas pela Conferência episcopal em 2003)” (VATICANO NEWS, 2023) . A nota esclarece que os maçons e aqueles que seguem os princípios maçons estão abrangidos pelas normas da Declaração acima referida.

Com efeito, a Declaração (CBCP, 2023) conjunta do CBCP sobre sanções para os católicos que aderem à maçonaria, datada de 6 de julho de 2002, emitida pelo Bispo Orlando B. Quevedo, dispõe que:

Qualquer católico que seja publicamente conhecido por ser membro de qualquer Associação Maçónica e participe activamente no seu programa e actividades, ou promova os seus pontos de vista, ou exerça qualquer cargo nela existente, e se recuse a renunciar a essa filiação apesar de pelo menos uma advertência (Cf. Cânon 1347) deve ser punido com um interdito (Cf. Cânon 1374), Isto é:

  1. não deve ser admitido à Santa Comunhão e a outros sacramentos (Cf. Cânon 1332);
  2. é proibido atuar como padrinho no Batismo e na Confirmação;
  3. não ser admitido como membro de estruturas paroquiais ou diocesanas;
  4. devem ser negados ritos fúnebres, a me- nos que tenham sido demonstrados alguns sinais de arrependimento antes da morte (cf. cânon 1184, §1, n. 3);
  5. quando os ritos fúnebres da Igreja forem permitidos pelo bispo, não serão permitidos cultos maçônicos na Igreja ou cemitério imediatamente antes ou depois dos ritos da Igreja, a fim de evitar escândalos públicos (Cf. Cânon 1184, §1, n. 3, e Cânon 1374).

Assim, qualquer católico que seja membro convicto da Maçonaria será considerado excomungado e sofrerá todas as punições pertinentes, dentre elas o seu afastamento da vida religiosa e sacramental, isto é, será proscrito no sentido amplo do termo: exilado, banido, degredado da vida da igreja.

A questão que merece nota e justifica essa pesquisa se refere a necessidade de se entender a posição da Igreja a respeito da participação de fiéis e religiosos católicos na Maçonaria. Foi consultada documentação do Vaticano em busca de se perceber como se fundamentou a decisão eclesiástica do Dicastério que confirmou que a filiação ativa de um fiel à maçonaria é proibida, devido à irreconciliabilidade entre a doutrina católica e a maçonaria, sujeitando o fiel à penalidades canônicas.

Como toda pesquisa sobre um tema tão complexo, não se pretendeu esgotar o assunto em debate, ficando desde já esclarecido que a investigação merece mais aprofundamento. Ao cabo, é salutar afirmar que, para a Maçonaria – em seus diversos níveis e abordagens doutrinárias – se faz mister enfrentar a questão posta pela Igreja Católica, pois unicamente dela se originou a chamada incompatibilidade doutrinária com a Maçonaria. A Maçonaria, instituição imbuída de princípios elementares, dentre os quais a crença na democracia que propugna pela existência de diferentes formas de pensar, projeta-se na reflexão do tema, consciente de que historicamente participou e vem participando da construção do destino no país.

2. As bulas papais do século XIX e a Maçonaria

Contudo, a fim de que se possa entender o percalço do presente se faz necessário relembrar do passado. Para tanto, não é despiciendo conhecer as bulas papais que trataram da relação entre a Igreja Católica e a Maçonaria ao longo dos anos, em passagens de séculos, demonstrando a importância da celeuma.

Será, pois, necessária uma avaliação que extrapole o limiar lógico das normas recentes e alcance a História (enquanto ciência que estuda as relações no passado) do conflito entre maçons e católicos. Para tanto, devemos recuar no tempo e buscar como a Igreja Católica se posicionou frente à Maçonaria já no século XVIII, em documentação acessível através de pesquisa em websites oficiais da Igreja, através do Vaticano.

Em 1738, o Papa Clemente XII, regulando a relação com os maçons, expediu a Carta Encíclica denominada In Eminenti Apostolatus Specula, que tratou das sociedades secretas. Tal edito demonstrou a preocupação da Igreja Católica quanto às organizações secretas e em especial a Maçonaria. A alegação da Carta baseou-se na ideia de que a organização maçônica ameaçava a integridade da religião católica e poderia gerar perturbação nos fiéis católicos. Segundo o Papa, as organizações maçônicas não estavam de acordo com as leis civis e canônicas e agiam como raposas assaltando as casas católicas, roubando os fiéis. Para a Igreja da época, era dever do Papa proteger a fé católica e a Igreja desses ataques.

Em 1751, quase duas décadas após a Carta de Clemente XII, o papa Bento XIV expediu a bula papal denominada de Provida Romanorum Pontificum que confirmou o entendimento anterior sobre a relação da Igreja com a Maçonaria. Os maçons eram considerados como um perigo e o crescimento e expansão da maçonaria no mundo eram vistos com um problema grave. O Papa ratificou as sanções e proibições anteriormente decretadas sobre a participação de católicos na Maçonaria.

Na bula de Bento XIV estão enumerados os motivos que justificaram sua decisão:

  • filiação de pessoas dos diversos credos, gerando um perigo à pureza da religião católica;
  • a obrigação estrita do segredo indevassável, pelo qual se oculta tudo que se passa nas assembleias secretas;
  • o juramento pelo qual se comprometem a guardar inviolável segredo;
  • que tais sociedades são reconhecidamente contrárias às sanções civis e canônicas;
  • que em muitos países as ditas sociedades e agregações foram proscritas e eliminadas por leis de príncipes seculares;
  • que tais sociedades e agregações são reprovadas por homens prudentes e honestos e, no pensar deles, quem quer que se inscreva nelas merece o ferrete da depravação e perversidade.

Da leitura dos motivos é possível inferir que a Igreja, já naquela época, percebia a Maçonaria com um perigo à sua existência, especificamente baseada na crença de que a pluralidade de credos seria um atentado à pureza da religião católica e de sua missão.

Na Encíclica Ecclesianm a Jesu, de 1821, o Papa Pio VII, evidenciou que as sociedades secretas, especialmente a Maçonaria e a Carbonária (esta ligada a Ordem Maçônica pelo entendimento da Igreja), eram organizações que propagavam a liberdade religiosa e desprezavam os ritos e sacramentos da Igreja Católica. Assim posto, tais sociedades representavam uma séria ameaça à fé cristã, até pelo fato (segundo o Vaticano) de que eram responsáveis por tramar e influenciar rebeliões e conspirações por toda a parte. A Encíclica indica que essas sociedades ameaçavam a paz e a harmonia nos principados e reinos que adotaram o cristianismo católico.

A bula papal Quo Graviora, de 1825, do Papa Leão XII, abordou novamente a questão das sociedade secretas e da Maçonaria, enfatizando que – apesar de todos os esforços dos Papas que lhe antecederam, com medidas punitivas – a instituição maçônica continuava a crescer e atuar em diversos reinos da Europa, procurando causar revoltas e rebeliões. Segundo a bula, tais movimentos buscavam derrubar príncipes e causar danos a Igreja e a todos os homens de bem. Desse modo, a Maçonaria estaria envolvida em desordens e representava uma séria ameaça ao mundo ocidental.

Em 1829, o Papa Pio VIII editou a Encíclica Traditi Humilitati, que conclamava toda a comunidade católica a envidar esforços contra as sociedades secretas de homens facciosos, inimigos de Deus e dos Príncipes, que estariam dedicados a provocar a ruína do Igreja, minar os Estados, subverter a ordem universal e, quebrando as restrições da verdadeira fé, abriam caminho para todos os tipos de maldade. Segundo a Igreja, esses homens facciosos tentavam esconder nas trevas dos ritos arcanos a iniquidade dos seus conselhos e das decisões que neles eram tomadas. A ação das sociedades secretas representava uma suprema ofensa contra a sociedade religiosa – leia-se: Igreja Católica – e civil.

Pio VIII destacou que não era o primeiro papa a agir contra essas organizações inimigas da Igreja e citava os Sumos Pontífices Clemente XII (com a constituição In eminenti Apostolatus Specula), Bento XIV (com a constituição Provida Romanorum Pontificum), Pio VII (com a constituição Ecclesiam a Jesu Christo) e Leão XII (com a constituição Quo Graviora). De fato, esses pontífices já haviam atuado e excomungado essas sociedades secretas através de cartas apostólicas públicas que não deixavam dúvida de que cabia ao papa o poder apostólico de zelar pelos preceitos católicos e cuidar da observância escrupulosa dos mesmos.

Em 1884, A Encíclica Humanum Genus sobre a Maçonaria foi emitida pelo Papa Leão XII. Tal documento evidenciava, novamente, que o Vaticano continuava preocupado com o crescimento e expansão do movimento maçônico no mundo ocidental. Esse documento papal reforçava a denominação da Maçonaria como um inimigo da Igreja e da fé católica. Há nesta Encíclica a expansão doutrinária da missão de combate à Maçonaria, que além de ser um dever do Papa passava a ser também obrigação de todos os cristão, notadamente pelo fato de que a Maçonaria passou a ser denominada de seita maçônica.

Essa breve síntese histórica das bulas papais emitidas no século XIX dão conta de que, para a Igreja Católica, a Maçonaria era vista como uma sociedade inimiga dos preceitos eclesiásticos católicos, sob diversas alegações, desde a afirmação de que os maçons eram promovedores da desordem religiosa e civil até ao ponto em que a Maçonaria deveria ser condenava por aceitar em suas fileiras diversos credos religiosos, fato este que atentava contra a pureza católica.

3. O Código Canônico Católico e a Maçonaria

Contudo, para o historiador, é natural questionar se onde se apresentam continuações ou permanências das instituições também não se apresentam rupturas ou descontinuidades, muitas vezes escamoteadas através de abordagens temáticas minimamente diferenciadas.

Assim, chamou a atenção do pesquisador o texto incluído na Declaração conjunta do CBCP sobre sanções para os católicos que aderem à maçonaria emitida pela Conferência Episcopal Católica das Filipinas em 6 de junho de 2023.

Figurando como uma lágrima de crocodilo, o documento arremata que:

Como os maçons católicos são membros da Igreja, eles merecem as orações e a caridade que os cristãos devem uns aos outros. Embora as diretrizes da Igreja não devam ser diluídas, a situação pessoal e individual de um maçom católico deve ser considerada, para que gradualmente ele possa seguir livremente essas diretrizes. Recomenda-se que um maçom consulte seu pároco ou bispo para receber orientação pessoal e espiritual sobre este assunto. (CBCP, 2023)

A declaração afirma que os maçons católicos merecem as orações e caridade que os cristão devem uns aos outros, mesmo que em dado momento sua situação esteja em desacordo com os regramentos da Igreja. Para tanto, deverá ser levada em conta a situação pessoal e individual do maçom católico para que o mesmo possa aos poucos seguir livremente os regramentos eclesiásticos.

A Declaração CBCP de 2023 indica a existência de uma dualidade de aspectos: de um lado, há a assunção oficial de que um problema existe (há fiéis maçons que são católicos e que merecem atenção) e deve ser enfrentado. De outro lado, não há indicação exata de qual é a intransponível “incompatibilidade entre o cristianismo e os princípios da maçonaria que toca em questões importantes da vida cristã” (CBCP, 2023).

Para entender melhor tal incompatibilidade doutrinária será, ainda, necessário buscar no passado (algumas vezes não tão remoto) as indagações pertinentes.

A Dichiarazione Sulla Massoneria (Declaração Sobre A Maçonaria) (VATICANO, 1983), promulgada pela Congregazione Per La Dottrina Della Fede (Congregação Para A Doutrina Da Fé) estabeleceu que:

DECLARAÇÃO SOBRE A MAÇONARIA

Pergunta-se se o julgamento da Maçonaria pela Igreja mudou porque não é expressamente mencionado no novo Código de Direito Canônico como no Código anterior.

Esta Congregação é capaz de responder que esta circunstância se deve a um critério editorial também seguido para outras associações que também não são mencionadas por estarem incluídas em categorias mais amplas.

Portanto, o julgamento negativo da Igreja em relação às associações maçônicas permanece inalterado, uma vez que seus princípios sempre foram considerados inconciliáveis com a doutrina da Igreja e, portanto, a pertença a eles permanece proibida. Os fiéis que pertencem a associações maçônicas estão em estado de pecado grave e não podem receber a Santa Comunhão.

Não cabe às autoridades eclesiásticas locais pronunciarem-se sobre a natureza das associações maçônicas com um juízo que implique derrogação ao acima estabelecido, e isso está de acordo com a Declaração desta Sagrada Congregação de 17 de Fevereiro de 1981 (Cf. AAS 73, 1981, pp. 240-241).

O Sumo Pontífice João Paulo II, no decurso da audiência concedida ao abaixo assinado Cardeal Prefeito, aprovou a presente Declaração, decidida na reunião ordinária desta Sagrada Congregação, e ordenou a sua publicação.

Roma, da Sé da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, 26 de novembro de 1983.

Joseph Card. RATZINGER – Prefeito Irmão Jérôme Hamer, O.P. – Arcebispo titulação de Lorium – Secretário

A Declaração estipula que os fiéis – caso estejam filiados à Maçonaria – estão em pecado grave perante a Igreja Católica Romana, pois “o julgamento negativo da Igreja em relação às associações maçônicas permanece inalterado, uma vez que seus princípios sempre foram considerados inconciliáveis com a doutrina da Igreja e, portanto, a pertença a eles permanece proibida”.

Constata-se que é decisão da Igreja Católica entender que os princípios maçônicos são inconciliáveis com a doutrina da Igreja. Contudo, não está claro na Declaração quais princípios são esses.

Necessário, pois, buscar um pouco mais no passado as normas e textos que possam iluminar a questão, a fim de esclarecer ao público e ao jovem maçom em que campo doutrinário se situa a querela. Pesquisou-se, assim, a fonte documental indicada pela própria missiva: Declaração desta Sagrada Congregação de 17 de Fevereiro de 1981 (Cf. AAS 73, 1981, pp. 240-241).

De acordo com o L’Osservatore Romano (Edição semanal em Português, Número 10, de 8 de Março de 1981. pág. 2) a declaração de 17 de fevereiro de 1981 assim estabelece:

SAGRADA CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRI- NA DA FÉ

DECLARAÇÃO SOBRE A PARTICIPAÇÃO DE

CATÓLICOS À ASSOCIAÇÕES MAÇÔNICAS

(Declaratio de canonica disciplina quae sub poena excommunications vetat ne catholici nomen dent sectae massonicae aliisque eiusdem generis associationibus)

Em data de 19 de Julho de 1974, esta Congregação escrevia a algumas Conferências Episcopais uma carta reservada sobre a interpretação do cân. 2335 do Código de Direito Canónico, que veta aos católicos, sob pena de excomunhão, inscreverem-se nas associações maçónicas e outras semelhantes.

Dado que a citada carta, tornada de domínio público, deu margem a interpretações errôneas e tendenciosas, esta Congregação, sem querer prejudicar as eventuais disposições do novo Código, confirma e precisa quanto segue:

1 – não foi modificada de algum modo a actual disciplina canônica que permanece em todo o seu vigor;

2 – não foi, portanto, ab-rogada a excomunhão nem as outras penas previstas;

3 – quanto na citada carta se refere à interpretação a ser dada ao cânone em questão, deve ser entendido, como intencionava a Congregação, só como um apelo aos princípios gerais da interpretação das leis penais para a solução dos casos de cada pessoa, que podem ser submetidos ao juízo dos Ordinários. Não era, pelo contrário, intenção da Congregação confiar às Conferências Episcopais o pronunciar-se publicamente com um juízo de carácter geral sobre a natureza das associações maçónicas que implique a derrogação das mencionadas normas.

    Roma, da sede da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, 17 de Fevereiro de 1981. (VATICANO, 1981)

    Neste documento, a Sagrada Congregação Para A Doutrina Da Fé afirmou que enviou uma carta reservada a algumas Conferências Episcopais sobre a interpretação do Cânone número 2335 do Código de Direito Canônico, que veta aos católicos, sob pena de excomunhão, inscreverem-se nas associações maçônicas e outras semelhantes. Contudo, o teor da carta tornou-se público, o que exigiu esclarecimentos quanto a interpretações errôneas. A Declaração supra reafirma que as Conferências Episcopais não poderão se pronunciar publicamente com um juízo de caráter geral sobre a natureza das associações maçônicas que implique a derrogação das mencionadas normas penais canônicas sobre o tema.

    Tal restrição imposta às Conferências Episcopais explica por que, depois de tão longo período, o bispo de Dumaguete (Filipinas) se viu na condição de solicitar orientação de como lidar adequadamente, do ponto de vista doutrinário, com o fato de que tem havido o aumento de fiéis filiados à maçonaria.

    Afinal, o que preceitua o Cânone número 2335 do Código de Direito Canônico?

    O Código de Direito Canônico foi promulgado pelo Papa João Paulo II em Roma, no Palácio Vaticano, no dia 25 de Janeiro de 1983, quinto ano do seu Pontificado. Sua Versão Portuguesa é a 4ª edição, revista pela Conferência Episcopal Portuguesa, em Lisboa, por António Leite, Serafim Ferreira e Silva, Samuel Rodrigues e Melícias Lopes. Esta edição pode ser encontrada no website do Vaticano.

    Logo na introdução do Código, o Papa João Paulo II informa que:

    As Leis Da Disciplina Sagrada teve a Igreja Católica, no decurso dos séculos, o costume de as reformar e renovar para que, conservando sempre a fidelidade ao seu divino Fundador, correspondessem adequadamente à missão salvífica que lhe foi confiada. Movidos por este mesmo propósito e satisfazendo finalmente a expectativa de todo o orbe católico, determinamos neste dia, 25 de Janeiro de 1983, a publicação do Código de Direito Canónico já revisto. Ao fazê-lo, o Nosso pensamento volta-se para o mesmo dia do ano 1959, quando o Nosso Predecessor João XXIII, de feliz memória, anunciou pela primeira vez ter decidido a reforma do Corpus vigente das leis canónicas, que tinha sido promulgado na solenidade de Pentecostes do ano 1917. (VATICANO, 1983)

    Ao tratar da extensão das decisões presentes na revisão de 1983, a nova norma se apresenta alterando a vigência de outros regramentos. Assim é que o Cân. 6 do Código Canônico determina que:

    Cân. 6 —

    § 1. Com a entrada em vigor deste Código, são ab-rogados:

    1. ° o Código de Direito Canónico promulga- do no ano de 1917;
    2. ° as outras leis, quer universais quer particulares, contrárias às prescrições deste Código, a não ser que acerca das particulares se determine outra coisa;
    3. ° quaisquer leis penais, quer universais quer particulares, dimanadas da Sé Apostólica, a não ser que sejam recebidas neste Código;
    4. ° as outras leis disciplinares universais respeitantes a matéria integralmente ordenada neste Código.

    § 2. Os cânones deste Código, na medida em que reproduzem o direito antigo, devem entender-se tendo em consideração também a tradição canónica. (VATICANO, 1983)

    Ao entender-se o termo ab-rogado (cuja etimologia pode ser encontrada no latim como abrogare) no sentido de anular ou abolir uma lei ou um decreto (o mesmo que revogar a validade de algo obrigatório ou instituído como um benefício ou privilégio) é consequente entender que as normas ab-rogadas tornaram-se obsoletas, obrigando a todos os obediente da normas a não mais usá-las, pois seus ditames foram suprimidos.

    Quanto à vigência e eficácia do novo Código não há dúvida, mormente frente à leitura do Cân. 7 que determinou que: “A lei é instituída quando se promulga”.

    Assim é que o Código de Direito Canónico promulgado no ano de 1917 foi juridicamente suprimido.

    Eis que, como consequência direta da revisão, o Cân. 2335 (que conforme a carta de 19 de Julho de 1974 da Congregação para a Doutrina da Fé vetava aos católicos, sob pena de excomunhão, inscreverem-se nas associações maçônicas e outras semelhantes) foi abolido.

    Convém destacar que, pesquisando-se o texto do novo Código Canônico de modo literal, não se encontram em todo o arcabouço normativo sequer uma vez os termos “maçom” ou “maçonaria” na versão em língua portuguesa. Acredita-se que efetivamente tais termos não constem do documento em vigor.

    Assim, a inconciliável compatibilidade entre ser fiel da Igreja Católica Apostólica Romana e ser membro da Maçonaria deve se originar de uma interpretação da nova norma, isto é, do Código promulgado em 1983. Mas qual dispositivo pode esclarecer a questão?

    Com efeito, pode-se encontrar no novo Código o Cân. 1374, que assim estabelece:

    Cân. 1374 — Quem der o nome a uma associação, que maquine contra a Igreja, seja punido com pena justa; quem promover ou dirigir tal associação seja punido com interdito. (VATICANO, 1983)

    É interessante conhecer o Cân. 750 do novo Código que estabelece certos requisitos mínimos para que a fé católica possa ser percebida como pertencente à doutrina católica, e por conseguinte detentora de direitos e deveres canônicos, nos seguintes termos:

    Cân. 750 —

    § 1. Deve-se crer com fé divina e católica em tudo o que se contém na palavra de Deus escrita ou transmitida por Tradição, ou seja, no único depósito da fé confiado à Igreja, quando ao mesmo tempo é proposto como divinamente revelado quer pelo magistério solene da Igreja, quer pelo seu magistério ordinário e universal; isto é, o que se manifesta na adesão comum dos fiéis sob a condução do sagrado magistério; por conseguinte, todos têm a obrigação de evitar quaisquer doutrinas contrárias;

    § 2. Deve-se ainda firmemente aceitar e acreditar também em tudo o que é proposto de maneira definitiva pelo magistério da Igreja em matéria de fé e costumes, isto é, tudo o que se requer para conservar santamente e expor fielmente o depósito da fé; opõe-se, portanto, à doutrina da Igreja Católica quem rejeitar tais proposições consideradas definitivas. (VATICANO, 1983)

    Conclui-se que a fé deve estar inserida no contexto de aceitação da fé nos exatos termos determinados pelo Cân. 750, pois em contrário se aplicará o preceituado no Cân. 1371 que estabelece punição da seguinte forma:

    Cân. 1371 — Seja punido com pena justa:

    1 – quem, fora do caso previsto no cân. 1364,

    § 1, ensinar uma doutrina condenada pelo Romano Pontífice ou pelo Concílio Ecuménico ou rejeitar com pertinácia a doutrina referida no cân. 750,

    § 2 ou no cân. 752, e, admoestado pela Sé Apostólica ou pelo Ordinário, não se retractar;

    2 – quem, por outra forma, não obedecer à Sé Apostólica, ao Ordinário ou ao Superior quando legitimamente mandam ou proíbem alguma coisa e, depois de avisado, persistir na desobediência. (VATICANO, 1983).

    Posto que as normas (mesmo as mais recentes) são reticentes ou lacunosas em especificar quais as partes das doutrinas católica e maçônica são incompatíveis, constata-se que o problema dentro da análise lógico-jurídica, persiste no sentido de se entender que a hermenêutica limitada aos regramentos e às suas justificações não é bastante para explicar o porquê dos maçons não poderem ser aceitos como fiéis na Igreja Católica, na medida em que no tempo presente não há indicativo de que os maçons estejam promovendo a desordem, destronando reinos ou enfraquecendo a pureza da religião católica.

    4.   A Igreja Católica e os Maçons

    Terá sido sempre assim na História do Brasil: católicos não podiam ser maçons? Maçons não podiam ser católicos? É possível entender a origem de tal dicotomia inconciliável?

    Como um fato verificável historicamente, é possível afirmar que a historiografia nacional (BARATA, 2002, 2006; CARVALHO,2019, COLUSSI, 1998) do século XIX comprova a forte presença de católicos na maçonaria brasileira, inclusive sacerdotes e religiosos, que exerceram cargos de liderança nos campos religioso e político do período. Destaca-se que alguns desses religiosos maçons foram protagonistas em momentos marcantes da história nacional, como a revolução de 1817 em Pernambuco, em que padres participaram ativamente desse movimento (DE SOUSA, 2023), ou na chamada Questão Religiosa, “durante os anos de 1872 a 1875, que foi uma série de acontecimentos envolvendo a Igreja Católica, a Maçonaria e o Governo Imperial em seu centro, mas que envolveu indiretamente outros elementos em voga” (CARVALHO, 2018, p. 105).

    É possível fazer uma síntese da Questão Religiosa no Brasil como sendo um efeito da confrontação que se verificava na Europa entre a Maçonaria e a Igreja Católica Romana. Várias autoridades eclesiásticas se envolveram na Questão que ditava, entre outros pontos, a autonomia da hierarquia e da estrutura da Igreja frente ao poder estatal da Monarquia. Houve intensos choques entre religiosos, com retaliações e penalidades eclesiásticas. Uma das consequências mais destacadas refere-se à expulsão de religiosos que pertenciam também à Maçonaria por ordem de Dom Vital e de Dom Antônio de Macedo Costa.

    Avançando-se na pesquisa, por conseguinte, para participar da Maçonaria é necessário primeiro saber o que ela representa. Vamos direcionar a pesquisa para melhor entender. Apesar de haver diversas definições sobre o que vem a ser a Maçonaria, uma definição mais geral e mais utilizada é a que lhe define como sendo um belo sistema de moralidade velado em alegoria e ilustrado por símbolos (ZELDIS, 2011). Alegorias e símbolos que precisam ser decifrados e ensinados a seus membros, a fim de que a sua tradição seja permanente, nesse sentido, William Preston, a definia como sendo um sistema regular de moralidade, concebido em uma tensão de interessantes alegorias, que desdobra suas belezas ao requerente sincero e trabalhador (PRESTON, 1867).

    Outrossim, percebe-se que a ordem maçônica é uma organização iniciática, de caráter fraternal, regida por normas e princípios próprios, que acolhe pessoas do sexo masculino em seu seio, com o objetivo de aprimorar seus conhecimentos por meio de um sistema baseado em símbolos, lendas e mitos, a fim de buscar o aprimoramento moral e intelectual.

    A Maçonaria é uma instituição universalista, filosófica, espiritualista, filantrópica e humanitária fundamentada nos postulados da liberdade, igualdade, fraternidade, paz, justiça e democracia (SOUSA, 2017, p. 20).

    Segundo a Confederação da Maçonaria Simbólica do Brasil, a Maçonaria tem como preceitos fundamentais: acreditar na existência de um princípio criador, o Grande Arquiteto do Universo; proclamar o trabalho como direito e dever do homem; respeitar as leis do País e defender a livre manifestação do pensamento e da dignidade da pessoa humana. A maçonaria combate o fanatismo e as paixões que tornam o homem cego e incapaz de tomar decisões justas, que o conduz ao caminho do mal.

    Em seus rituais, estão contidas lições e ensinamentos que – durante as suas cerimônias – são decifrados e possibilitam aos participantes vivenciarem experiências que os levam a refletir sobre as questões da vida cotidiana, de modo a contribuir com o seu aperfeiçoamento moral.

    A lei moral da maçonaria, presente nas Constituições de Anderson de 1723 (primeiro documento normativo maçônico aprovado pela Grande Loja Maçônica da In- glaterra, que foi a primeira potência maçônica) destaca que “um Maçom é obrigado, por sua Condição, a obedecer à Lei moral; e se compreende bem a Arte, não será jamais um Ateu estúpido, nem um Libertino irreligioso” (THE CONSTITUTIONS FREEMASONRY, 1755).

    No Rito Escocês Antigo e Aceito, a Bíblia está no centro do altar e, em todas as reuniões, há a leitura de passagens da Bíblia Sagrada que enaltecem a existência humana, a fé e a importância de uma conduta reta e moral. Em seus graus simbólicos, são retratadas passagens da história do Antigo Testamento, em que a construção do templo de Salomão é um dos principais enredos abordados.

    Entretanto, os atritos entre Igreja Católica e Maçonaria existentes durante o período da Revolução Francesa não podem ser olvidados, pois da sua compreensão se pode auferir lições importantes para a análise da situação presente.

    Na França, durante o período que se convencionou chamar de Revolução Francesa – de maio de 1789 a novembro de 1799 – segundo Simon Schama (1989, p. 421) que analisou continuidades e descontinuidades e o papel que coube à nobreza no processo de aceleração do fim do Antigo Regime,

    A fusão de velho e novo repetia-se por toda a França. No papel as transformações não poderiam ter sido mais abruptas ou radicais. Como organismos jurídicos os parlamentos simplesmente foram substituídos pelo fiat legislativo da Assembléia Constituinte e a velha jurisdição dos bailliages pelos dos juges de paix eleitos e dos tribunais dos distritos e departamentos. Da mesma forma, a natureza caótica do governo com fronteiras superpostas e entrecruzadas que diferiam da administração civil ao governo militar e à diocese eclesiástica desapareceu na unidade do departamento. […] A presença de “homens novos” — médicos, engenheiros, numerosos advogados, ocasionais comerciantes — na primeira leva de instituições criada pela Revolução certamente resultou, em parte, da maciça expansão de cargos eleitos. Pelo menos no atendimento às reivindicações por mais governo, formuladas nos cabiers, os notáveis revolucionários cumpriram amplamente seu dever. […] Um exame mais profundo dos novos regimes em muitas cidades, grandes e pequenas, da província francesa revela que muitos desses remanescentes do Ancien Régime estavam estrategicamente colocados.

    Schama atenta para o fato de que socialmente não havia muita diferença entre esses “homens novos” e aqueles tipificados como sendo da nobreza, especialmente quando viviam no ambiente de uma cidade ou centro comercial. De fato, “todos pertenciam ao mesmo ambiente cultural: o mundo das academias e das lojas maçônicas. Todos endossavam o projeto otimista do final do Iluminismo segundo o qual as ciências necessariamente levariam a uma prosperidade maior e a um governo mais perfeito”. SCHAMA (1989, p. 422).

    Se, de um lado o discurso radical dos “homens novos” punha na escrita dos decretos revolucionários toda uma narrativa de mudanças e rupturas, de outro lado os mesmos homens – aos quais tanto se criticava por fazerem as vezes do Antigo Regime – de fato continuavam no poder, porém agora com o apoio popular da turba mobilizada. “Assim, foram exatamente os homens dos quais tanto se queixavam os cabiers rurais – abastados coqs de village e outros proprietários, alguns deles nobres — que se apoderaram dos bens da Igreja quando estes foram colocados no mercado”. SCHAMA (1989, p. 423).

    É possível, pois, afirmar com base em forte documentação histórica que a relação da Igreja com a Maçonaria estava – a partir dos idos do fim do século XVIII – definitivamente posta em termos de conflito aberto de interesses, igualmente em intensidade nos campos político, cultural e ideológico.

    Ainda quanto ao século XIX, base histórica para essa reflexão, ainda há que se debater o fato da Maçonaria Brasileira ter sido uma instituição que apoiou o fim do regime do padroado patrocinado pela Monarquia portuguesa e a laicidade do Estado, assim como a acolhida aos protestantes em seu seio. Tal atuação pode ter causado a decisão pela incompatibilidade naquela época em terras nacionais.

    Outro aspecto que merece nota é que durante a Questão Religiosa, no século XIX, o conflito entre Igreja e Maçonaria pode ter se acirrado a partir do advento da chamada Maçonaria Especulativa de cunho iluminista (iniciado no século XVIII), com forte apelo filosófico- racionalista, cujo pendão de encadeamento de raciocínio lógico extremado pode não ter sido devidamente compreendido à época, exatamente em um contexto cultural europeu em que o raciocínio lógico se punha como um discurso científico contra a metafísica, o espiritual e o divino.

    5.   O Cristianismo e as Religiões

    De início, é de se considerar que a Ordem Maçônica não é uma religião, mas uma instituição de cunho iluminista. Sua organização filosófico-racionalista baseia-se nos antigos mistérios e está harmonizada com as religiões monoteístas de seus integrantes. Dessa maneira, não há qualquer tipo de afronta à Igreja Católica ou aos seus dogmas. Por isso, é substancial o entendimento de que proibir, conforme imposto pela alta hierarquia da Igreja Católica, que os católicos sejam também maçons é desnecessário e ineficaz tendo em vista que, mesmo que na aparência se difunda que se quer proteger o católico da influência maçônica, de fato não se está a respeitar um dos preceitos básicos do cristianismo que é o de aceitar a pluralidade de caminhos que visam a salvação.

    A respeito deste tema relativo à salvação do Cristão, em 1997, a Comissão Teológica Internacional do Vaticano, em análise do tema “O Cristianismo e as Religiões”, redigiu estudo sobre as relações da Igreja com outras religiões, cujo objeto de pesquisa se fundamentou nos seguintes termos:

    Numa época em que se aprecia o diálogo, a compreensão mútua e a tolerância, é natural surgir tentativas de elaborar uma teologia das religiões a partir de critérios aceitos por todos, isto é, que não sejam exclusivos de determinada tradição religiosa. Por isso, nem sempre se distinguem claramente as condições para o diálogo interreligioso e os pres supostos básicos de uma teologia cristã das religiões. Para fugir dos dogmatismos procuram-se padrões exteriores, que permitam avaliar a verdade de uma religião. Os esforços realizados nessa direção não chegam a convencer. Se a teologia é fides quaerens intellectum, não se vê como se pode abandonar o “princípio dogmático” ou refletir teologicamente prescindindo das próprias fontes. (VATICANO, 1997)

    Como se vê no trabalho de 1997, pouco mais de uma década após a promulgação do novo Código Canônico de 1983, a compreensão doutrinária da Igreja ampliou-se em busca do diálogo e compreensão mútua, da qual espera-se tolerância e a elaboração de uma teologia das religiões a partir de critérios de consenso.

    Tal ampliação da visão doutrinária católica está explicitamente definida nos itens 62 e 63 do Capítulo II.4. – Ecclesia Universale Salutis Sacramentum do texto referido anteriormente, como segue:

    62 – Não se pode desenvolver uma teologia das religiões sem levar em conta a missão salvífica universal da Igreja, testemunhada pela Sagrada Escritura e pela tradição de fé da Igreja. A valorização teológica das religiões foi impedida durante muito tempo por causa do princípio “extra Ecclesiam nulla salus”, entendido em sentido exclusivista. Com a doutrina sobre a Igreja como “sacramento universal da salvação” ou “sacramento do Reino de Deus”, a teologia trata de responder à nova apresentação do problema. Tal ensinamento, também acolhido pelo concílio Vaticano II, se concilia com a visão sacramental da Igreja no Novo Testamento.

    63 – Atualmente, a questão primária já não é se os homens podem alcançar a salvação ainda que não pertençam à Igreja Católica visível; tal possibilidade é considerada como teologicamente certa. A pluralidade das religiões, da qual os cristãos são cada vez mais conscientes, o melhor conhecimento dessas mesmas religiões e o necessário diálogo com elas, sem deixar em último lugar a mais clara consciência das fronteiras espaciais e temporais da Igreja, nos interrogam sobre se se pode ainda falar da necessidade da Igreja para a salvação e sobre a compatibilidade desse princípio com a vontade salvífica universal de Deus. (VATICANO, 1997).

    De fato, para a Igreja Católica – de acordo com a Comissão Teológica Internacional do Vaticano – não se trata mais de saber apenas se os homens podem se salvar, inclusive os que não pertencem à Igreja Católica. Tal possibilidade é certa do ponto de vista doutrinário. Discute-se, agora, se apenas a Igreja será considerada o único caminho da salvação eis que há uma “vontade salvífica universal de Deus”.(VATICANO, 1997).

    Atenta ao desenvolvimento globalizado das relações interculturais, a Comissão Teológica do Vaticano refletiu sobre a questão da verdade teológica, indicando que é necessário reconhecer a alteridade da verdade das diferentes religiões, de modo a levar o cristianismo a aprender a conviver respeitosamente com outras religiões. Aos poucos, mesmo que de modo relutante, vai expandindo a noção doutrinária de que é necessário ao católico aprender a conviver com outros tipos de religiosidades tendo em vista que se pode observar uma mudança da consciência do homem atual, nos seguintes termos:

    102. A crescente interrelação das culturas na atual sociedade mundial e sua constante interpenetração nos meios de comunicação fazem com que a questão da verdade das religiões tenha passado ao centro da consciência cotidiana do homem de hoje. As presentes reflexões consideram alguns pressupostos dessa nova situação; nelas, porém, não se entra na discussão de conteúdos com as diferentes religiões. Esta deveria realizar- se na teologia dos diferentes lugares, ou seja, nos diferentes centros de estudo que estão era contato cultural direto com as outras religiões. Ante a situação de mudança da consciência do homem atual e a situação dos fiéis, é claro que a discussão com a pretensão de verdade das religiões não pode ser um aspecto marginal ou parcial da teologia. A confrontação respeitosa com essa pretensão deve representar um papel no centro do trabalho cotidiano da teologia, deve ser parte integral dessa mesma teologia. Com ela o cristianismo de hoje deve aprender a viver, no respeito pela diversidade das religiões, uma forma da comunhão que tem seu fundamento no amor de Deus pelos homens e se funda em seu respeito para com a liberdade do homem. Esse respeito pela “alteridade” das diferentes religiões está por sua vez condicionado pela própria pretensão de verdade (VATICANO, 1997).

    É perceptível que a doutrina católica está buscando se adequar à atualidade, ampliando a visão de alteridade de seus fiéis, indicando que a salvação não está limitada a apenas um caminho doutrinário e clamando aos católicos para absorver espiritualmente o novo clima global de diversidade cultural.

    Ainda se pode falar da necessidade exclusiva da Igreja para a salvação frente à compatibilidade desse princípio com a doutrina que prega que a vontade de salvação do fiel é universal desde que direcionada à busca de Deus?

    6. A ação maçônica no Brasil do século XXI

    A Maçonaria, enquanto instituição iniciática, filosófica e social conseguiu evoluir e se expandir pelo mundo todo. Nos últimos trezentos anos, sobreviveu a diversas transformações culturais, políticas e sociais e, atualmente, é considerada como sendo uma instituição universal e de amplo alcance social.

    Não obstante todos os desafios e obstáculos enfrentados, a Maçonaria tem sua História. Para entendê-la, faz-se necessário refletir sobre quais foram os fatores que contribuíram para o seu êxito enquanto instituição, donde se destaca a continuidade de sua própria existência como uma organização ativa e influente no mundo moderno. Esta reflexão se impõe especialmente frente à permanência da celeuma com a Igreja Católica, cuja origem no século XVII foi possível rastrear sucintamente neste estudo, conforme se observou nos documentos papais referidos.

    Uma das hipóteses que aqui evidencia-se é que ela vem conseguindo sensibilizar homens que buscam ingressar em uma organização fraternal. Buscam benefícios pessoais, novos conhecimentos filosóficos, reconhecimento social, ajuda mútua tanto quanto a possibilidade do exercício de diferentes micro-poderes.

    E, ao se analisar de modo crítico o contexto atual da instituição, faz-se história também reconhecer que – apesar de permanecer ativa – não demonstra mais a força e o protagonismo social e político que teve no passado. Vivemos em um outro momento histórico, em que a Maçonaria se apresenta mais cumprindo um papel social do que propriamente de protagonismo político e social, e em muitos casos a formação maçônica, está em segundo plano.

    No caso da Maçonaria Brasileira, alguns pesquisadores maçônicos evidenciam o momento crítico, que a instituição vem vivenciando. Tal assertiva se evidencia por pesquisas recentes conduzidas pela CMSB e CMI que apontaram a evasão maçônica e o fechamento de lojas em diversos países, como um sinal de um momento crítico para a Ordem Maçônica no mundo ocidental. Essa é uma realidade que pode impactar a maçonaria brasileira, que já vivencia o problema da evasão maçônica, em virtude de conflitos internos, desmotivação, e falta de conteúdo nas reuniões, que foram evidenciados por De Morais (2017).

    Kennyo Ismail (2013), avaliando os motivos da crise da Maçonaria brasileira, destacou que ela precisava assumir uma vocação, assim como a maçonaria americana já o tinha feito, sobre o risco de vir a perder a sua importância.

    Seguindo princípios mais filosóficos do que práticos, a Maçonaria brasileira, assim como toda a Maçonaria latina, parece enfrentar uma crise de identidade, ou melhor, uma crise de obsolescência, ao sustentar vocações tão úteis em outros momentos históricos, mas menos necessárias no atual cenário mundial do Ocidente (ISMAIL, 2013, p. 20).

    A análise de Kennyo parece ser sensata e prudente. Contudo, é preciso destacar que a Maçonaria Brasileira, apesar de ser uma das mais populosas do mundo, enfrenta desafios e sofre com problemas crônicos, que necessitam ser enfrentados pelas lideranças maçônicas. Destaca-se o alto índice de turnover nas lojas maçônicas brasileiras, quando muitos iniciados, ao alcançar o grau de mestre, de alguma forma, se afastam dos trabalhos de sua loja. Esse é um fator preocupante. Necessário buscar soluções mais eficazes já que se demonstrou que tal problema não será resolvido apenas com incentivos ao aumento de iniciações, ou flexibilização ou facilitação nos processos de sindicância.

    A tese defendida pelo Maçom Albert Mackey (1869) advertia sobre o problema da formação maçônica e da valorização das vaidades na Ordem. Essa advertência se mantém vigente, em especial quando se constata que muitas lojas maçônicas têm dificuldades para cumprir o seu principal papel, que é a formação do homem.

    Compasso (2020) destaca que nessa formação é importante que os mestres maçons compreendam o seu papel, que é o de zelar pelo futuro da instituição, de modo a garantir que os aprendizes e companheiros sejam formados com qualidade e que tenham o mínimo de conhecimento maçônico necessário para manter a tradição.

    O autor destaca que:

    A base da filosofia maçônica tem por objetivo restabelecer seu antigo e verdadeiro caráter indelével e apostolado da mais alta moralidade, da prática das virtudes, da Liberdade debaixo da Lei, da Igualdade segundo o mérito, com subordinação e disciplina e, da Fraternidade com deveres mútuos (COMPASSO, 2020, p. 51).

    Há sem dúvida necessidade urgente de melhor formar os obreiros, a fim de construir o futuro da instituição. Caminhos são válidos como valorizar quem estuda e dar oportunidade a quem sabe e deseja formar os novos maçons. O despeito dessa constatação pode gerar, já no curto prazo, uma situação em que a instituição pereça por falta de qualidade doutrinária e por desconhecimento da sua força social, do seu simbolismo e de suas tradições. O risco real é que acabe por tornar-se simplesmente um clube social ou teatral, no qual pessoas se reúnem periodicamente apenas para praticar determinado ato teatral, sem significado e entendimento algum.

    Enfim, não se pode esquecer o que a Ordem é. O irmão, pesquisador e escritor Ailton Elisiário concebeu o entendimento de que:

    A Maçonaria é o centro de união e o meio de conciliar uma amizade sincera, entre as pessoas que nunca haveriam de poder, sem isto, chegar a ela. Seu fundamento é a fraternidade. Portanto, o futuro da Maçonaria no restante do Século XXI está para o Brasil e para o Mundo no trabalho maçônico, que se exprime na lapidação da pedra bruta e em tornar feliz a Humanidade. Os maçons não podem ser mais apenas coadjuvantes, mas efetivos participantes da vida pública. Daí, as discussões para o erguimento das colunas da Maçonaria Executiva (ELISIÁRIO, 2020, p. 49).

    Portanto, a Maçonaria brasileira deve direcionar seus esforços para melhor formar seus quadros e priorizar a qualidade dos processos seletivos, evitando a massificação no ingresso, o que isoladamente não garante a melhoria dos quadros de filiados.

    Não é tarefa simples. Mas medidas simples podem ser adotadas: É preciso formar melhor, qualificar as reuniões, ter projetos e principalmente criar um propósito para que as pessoas permaneçam na instituição.

    Desse modo, por meio de

    Maçons mais conscientes e dotados de mais conhecimentos sobre a ordem estarão mais comprometidos e engajados nas atividades da instituição, pois serão mais capazes de contribuir na construção de uma Maçonaria mais forte e atuante (SOUSA, 2020, p. 30).

    Além disso, é essencial que só sejam eleitos para os cargos de direção da organização homens comprovadamente qualificados para as funções e comprometidos com os ideais da Maçonaria. Que estejam dispostos a servir à instituição, oferecendo mais que dela possam se beneficiar, seguindo a esteira do pensamento de Albert Mackey (1869).

    Tal situação se apresenta tanto mais difícil quanto mais contundente for a questão apresentada pela Igreja Católica no sentido de declarar a irreconciliável incompatibilidade entre maçons e católicos.

    7.   Considerações finais

    Não basta esperar por novos entendimentos por parte da Igreja, em uma atitude reativa. Espera-se que os maçons se tornem agentes de seus próprios ideários, e construam seu tempo histórico. Para isso, será necessário estudar o assunto e enfrentar os desafios. Não há como negar que há pela frente grandes embates doutrinários e filosóficos.

    Argumenta-se que tal tema abordado neste estudo não seja tão importante para o maçom no seu cotidiano. Parece que, à primeira vista, a sociedade de modo geral não está muito preocupada com tal questão, tanto que não houve grande repercussão na imprensa nacional. Espera-se mesmo que a decisão publicada no Vatican News, em 15 de novembro de 2023, sob o título “A maçonaria  continua  proibida  para  os  católicos” (VATICANO NEWS, 2023) não repercurta muito na vida dos católicos.

    Entretanto, do ponto de vista da Maçonaria Brasileira, é de se considerar que tal decisão é um fato importante, que necessitará ser enfrentado com a devida atenção pelas lideranças maçônicas, principalmente visando orientar seus membros, com destaque para os que são responsáveis pelas milhares de lojas maçônicas existentes no Brasil.

    Se for levado em consideração o fato de que nosso país é o maior território nacional cristão e católico do mundo ocidental, a decisão ganha dimensão quase continental, eis que a imagem da Maçonaria Brasileira está sendo afetada, inculcada na mente da população como sendo uma instituição anti-cristã, o que obviamente compromete todos os esforços doutrinários e de ação social de interesse dos maçons.

    É certo que a Maçonaria, por suas próprias condições intelectuais e de formação cidadã, tem as ferramentas que podem ser utilizadas para melhor educar e formar cidadãos que compõem e comporão seus quadros. Contudo, algumas práticas necessitam ser reavaliadas no sentido de se evitar a mitificação de pessoas, concessão de medalhas com propósitos diminutos, construção de templos desnecessários e atividades sociais sem proveito efetivo para a instituição. De fato, há que se defender com vigor que é necessário investir na formação moral do homem maçom, não se admitindo com leveza que as disputas políticas entre Potências e Lojas diminuam o papel histórico da Maçonaria.

    Por fim, já com o devido alerta sobre a recente incursão da Igreja Católica na definição de um “inimigo institucional”, faz-se mais que necessário que os líderes maçônicos compreendam a importância de seu papel como representantes legítimos de seus irmãos.

    De se concluir, pois, que a Maçonaria pode estar escorregando para uma série crise ainda não percebida por suas lideranças, situação esta que não deriva necessariamente da declaração da Igreja Católica, mas que em função dela pode se agravar. A proibição da Igreja Católica que impede católicos de serem maçons está a esperar uma tomada de posição da Maçonaria Brasileira, e esta pode se dar com certeza através de mudanças de atitude da própria Ordem no sentido de enfrentar o debate doutrinário, melhorar a formação do quadro maçom e aprimorar a ação social da instituição.

    Autores: Kleber Cavalcante de Sousa e José Roberto Santhiago

    Fonte: Revista Ciência & Maçonaria, vol. 10, n. 1, p. 37-49, jul/dez, 2023.

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    Referências

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