Os Maçons Operativos

Maçonaria Operativa no Século 21 – Bibliot3ca FERNANDO PESSOA

Hoje é geralmente aceito pelas autoridades maçônicas que a moderna fraternidade dos maçons teve sua origem entre as corporações de construtores da Inglaterra na Idade Média. Uma pesquisa rápida do sistema de corporações em geral, já foi publicada no blog; agora é o momento de se examinar com mais cuidado as próprias corporações maçônicas, com vistas à obtenção de um retrato (necessariamente um pouco bruto, e em linhas gerais) dos usos e costumes de nossos antepassados Maçônicos, um assunto que escapa de ser acadêmico e seco pelo fato de que a maioria das regras, regulamentos e costumes em funcionamento entre nós hoje são traçados até os antigos Maçons Operativos (como é hábito descrevê-los), de modo que é impossível para nós compreender a Maçonaria de hoje separada da Maçonaria de muitos séculos atrás.

O assunto é reconhecidamente difícil.

Não temos uma série de documentos, nem mesmo uma abordagem a uma série, suficientemente extensa para nos permitir criar qualquer história da conexão entre as instituições centenárias de Pedreiros e Maçons. Não temos, de fato, qualquer material através do qual possamos formar alguma ideia definida da natureza exata daquelas primeiras sociedades.

Estas palavras de Halliwell-Phillips, descobridor do Poema Regius, o mais antigo e mais precioso de todos os manuscritos maçônicos, foram proferidas em 1839; muito foi adicionado ao nosso conhecimento da história maçônica desde então; na verdade, a história maçônica estritamente assim chamada só viria a surgir quase meio século mais tarde, mas mesmo assim a declaração permanece substancialmente correta. Nossas fontes são dispersas, bem como escassas e muitas vezes exigem grande habilidade para encontrar absolutamente qualquer fonte. Além disso, deve-se ter em mente que a Maçonaria da Inglaterra antes de 1717 era uma instituição em desenvolvimento e mudança, de modo que variava muito de um lugar para outro e de tempos em tempos; é um erro generalizar muito amplamente, com base em algum fato isolado.

Também é necessário que desafiemos cada escritor sobre o assunto a nos fornecer suas autoridades e fontes, e que ele prove ser ele próprio livre de partidarismo; um vasto negócio da chamada “literatura maçônica”, que flutua sobre o mundo é derivado de segunda ou terceira mão de autores acríticos que tomam suas próprias teorias a partir de boatos, ou de má interpretação ignorante de fatos conhecidos. A existência de uma declaração em algum livro antigo, mesmo que seja um volume das “Constituições” mais ou menos oficialmente sancionado pela Grande Loja não é de forma alguma uma prova de sua autenticidade. As teorias dos escritores mais velhos – conhecidos há tanto tempo e tão frequentemente amados entre nós – a de Anderson, de Preston, de Oliver, de Hutchinson, e o resto, são, afinal, apenas teorias, e não mais a serem protegidas do escrutínio da crítica histórica que as teorias lançadas em nossos dias.

As fontes em geral a partir das quais os historiadores autênticos reúnem informações relativas à Maçonaria operativa podem ser divididas em sete ou oito grupos, tabulados por conveniência da seguinte forma:

  • A história geral da arquitetura medieval. Um estudo da arte da construção em toda a Idade Média, tal como se desenvolveu na Itália, Alemanha, Holanda, França e Inglaterra revela muito sobre os construtores, de modo que se pode muitas vezes, aprender mais sobre Maçonaria de um historiador não maçom que em outros lugares. A História Medieval de Porter em dois volumes é um desses casos.
  • A história geral do povo da Inglaterra. A vida corporativa da Idade Média desempenhou um papel tão visível na vida das pessoas quanto às igrejas e escolas o fazem na história dos povos e nos ajuda a compreender melhor as instituições em seu meio.
  • Os estatutos passados por diferentes reis e parlamentos para governar os trabalhadores. A Portaria dos Operários de 1349 e o Estatuto dos Operários de 1350 são casos típicos. Sob o mesmo cabeçalho geral podem ser incluídos os relatórios da corporação, que eram relatórios feitos pelas corporações ao governo mediante demanda oficial. Alguns escritores acreditam que o Manuscrito ou Poema Regius foi escrito em resposta a algum desses pedidos, a fim de fornecer informações oficiais sobre a história e a prática dos Maçons no final do século XIV.
  • Os Antigos Manuscritos do Ofício, o primeiro dos quais foi o “Poema” que acabamos de mencionar, geralmente datado de 1390. Estes documentos foram escritos por homens crédulos e amantes de milagres em uma época em que era mais fácil acreditar em maravilhas que não fazê-lo, de modo que como fontes da história eles devem ser lidos com muita atenção; mas a aplicação aos mesmos do método histórico conhecido popularmente como críptico “mais alto” e “mais baixo” gera resultados e raro valor.
  • Diários, cartas, atas de loja, rolos de tecido, etc. Os registros da Companhia da cidade de Londres, apresentado à Ordem por Edward Conder, e as antigas atas de lojas da Escócia são os casos em questão.
  • A literatura geral do século XVII e início do XVIII. Sir Richard Steele menciona a Maçonaria, assim como Plot, Dugdale, etc.
  • As relíquias do passado incorporadas à instituição atual, como restos fossilizados de uma camada de rocha, lembrando uma das linhas familiares do irmão Rudyard Kipling, que, ao escrevê-los, pode muito bem ter tido isso em mente:

“Eu limpei o terreno para um Palácio como um Rei deve construir. Eu decretei e corte até meus níveis, atualmente, sob o lodo, cheguei às ruínas de um Palácio como um Rei tinha construído.”

  • Uma análise cuidadosa do ritual, por exemplo, no contexto da história geral da Maçônica produz, nas mãos certas, achados seguros e valiosos.

I. Muitos problemas permanecem obscuros

Foi uma tarefa enorme desenvolver estas fontes de possíveis informações a respeito de nossa história antiga; o fim está longe ainda, de modo que um aluno sábio, como o caro Horace Bushnell costumava dizer, “pendura muitos assuntos em ganchos, como ainda não resolvidos”. Muitos dos mais importantes de nossos problemas históricos, como, por exemplo, a questão de saber o número de graus antes de 1717, ainda estão dependurados, e manuscritos longos, provavelmente ainda não descobertos e inúmeros outros ainda não examinados por estudiosos maçônicos.

O ofício do maçom operativo não era fácil de aprender, especialmente porque não havia livros, manuais e escolas, como as que estão agora em uso; um trabalhador tinha de ser ele próprio um aprendiz quando era apenas um menino, a fim de aprender a arte em primeira mão na escola da experiência. Uma organização compacta era necessária (como o era na maior parte dos outros ofícios), não só para proteger os segredos comerciais, mas também como um meio de ensino.

Muitas vezes, um pedreiro trabalhava sozinho, passando de um lugar para outro à medida que o trabalho exigia, e em conformidade com as normas e regulamentos existentes em diferentes comunidades, cada qual com suas próprias leis e “costumes” – este último normalmente reconhecido pelos tribunais como tendo o peso de lei. Neste caso a Maçonaria podia ser praticada em uma aldeia em que não existisse loja ou corporação.

Em muitas cidades, os maçons tinham suas próprias corporações, como os outros ofícios; neste caso, eles realizavam seu trabalho da maneira descrita nos artigos anteriores. É um fato digno de nota que a corporação dos pedreiros não deixou muitas marcas na vida da cidade, sendo geralmente relativamente pouco importante em comparação com corporações de outros ofícios; e, em alguns casos, eles eram simplesmente proibidos de ter corporação, o que nem sempre é fácil determinar, embora seja provável que grande parte dos edifícios das cidades médias era monopolizada pelos carpinteiros, porque estruturas de tijolo e pedra não entraram geralmente em uso até um período relativamente tardio.

Por exemplo, em Norwich, a cidade das igrejas, os pedreiros parecem não ter tido uma corporação própria em 1375, mas eram anexadas aos carpinteiros. Nas obras de Exeter os pedreiros dividem uma obra com os ourives, e em York estão unidos com os Chapeleiros. Em 1604, encontramos que uma corporação em Oxford recebeu estatutos que incluíam maçons. Carpinteiros, Marceneiros e Telhadistas.” (Vibert)

Parece que a “loja“ era peculiar dos Pedreiros, embora seja provável que outros ofícios tivessem por vezes edifícios ou salas próprias próximas ao local de trabalho; os carpinteiros, por exemplo; mas a loja como uma organização, um corpo controlador, assim como o edifício, a cabana, ou local onde ela se reunia, era característica apenas dos construtores. Ela estava geralmente anexada ao edifício em construção, mas às vezes era uma estrutura permanente, como em Aberdeen. Em alguns casos, como em York e Westminster, grupos permanentes de trabalhadores estavam em constante presença e, provavelmente, usavam salas ou edifícios permanentes. A existência de uma loja onde admitir aprendizes  é mencionada no Poema Regius, entre as normas que regulamentam os aprendizes está a de que eram proibidos de divulgar o que acontecia na “loja”. O Manuscrito Cooke ordena que um Pedreiro deva “ocultar o conselho de seus companheiros em loja e em câmara”, uma regra sábia que poderia, nestes dias atuais ser pendurada nas paredes da loja.

II. Existiu uma “grande fraternidade”?

Eram todas essas diferentes lojas e operários individuais regidos por “uma grande fraternidade” que tinha jurisdição sobre todo o Ofício? Costumava ser uma opinião comum que este era o caso; mas todos os fatos posteriormente descobertos apontam na direção oposta, uma conclusão bem indicada pelo Sr. Wyatt Papworth, em Transações do Real Instituto de Arquitetos:

Todos os documentos que me levaram a acreditar que não houve qualquer corporação suprema na Inglaterra, embora possa parecer provável a existência de tal órgão. Assim, as “ordens” dadas aos Pedreiros na Catedral de York em 1352, dão apenas uma ideia pobre de que houvesse, na época, naquela cidade alguma coisa como uma corporação ou fraternidade reivindicando autoridade em virtude de um estatuto, que se supunha tivesse sido concedida por Atheistan em 926, não só sobre a cidade, mas sobre toda a Inglaterra.

R.F. Gould, que cita o referido, concorda, e diz, com relação à teoria de uma corporação suprema, que “todos os elementos que possuímos apontam em uma direção completamente oposta”. A unidade da atividade dos Pedreiros era mantida como a de qualquer outro oficio, por leis gerais, regras, regulamentos e costumes respeitados por todo o país, e também, conforme explicado no primeiro capítulo desta série, pela natureza do trabalho em si que, como as ocupações técnicas dos dias atuais não admite ampla variação na prática. O controle uniforme de todas as lojas a partir de uma autoridade central só surgiu muito mais tarde; ele não foi tentado até depois da formação da Grande Loja em Londres em 1717, e não foi aperfeiçoado até a organização da Grande Loja Unida da Inglaterra, no primeiro quarto do século XIX.

Uma questão mais difícil de tornar simples, mas que é absolutamente vital para a compreensão do assunto, é a diferença entre corporação de Pedreiros e Pedreiros-livres. Esses dados que possuímos são tanto fragmentados quanto confusos, de modo que os melhores especialistas não foram capazes de esclarecer todos os problemas envolvidos. No entanto, parece bastante certo que sempre houve uma divisão bastante ampla entre os membros das corporações locais estacionárias, que tinham o monopólio da construção em cada cidade, e os Pedreiros-livres empregados para construir catedrais e outras estruturas eclesiásticas. A corporação de Pedreiros estava vinculada por leis locais e não estava autorizada a trabalhar fora de sua própria comunidade, fato que assumirá mais força, quando é lembrado que na Idade Média as cidades eram muito mais independentes e autocentradas do que são agora, e mais zelosas das leis e costumes locais. Mas não havia, naturalmente, nenhum trabalho constante em qualquer cidade para homens treinados para trabalhar em catedrais, uma forma especializada de arquitetura tão difícil e exigindo tanto conhecimento especial que é muito difícil entender como os construtores de catedrais conseguiram resolver alguns dos seus problemas. É quase certo que esses Pedreiros-livres eram uma classe à parte da corporação de Pedreiros, e que, ao contrário da corporação de Pedreiros, eles tinham regras e regulamentos próprios, e estavam autorizados a aderir aos mesmos onde quer que estivessem trabalhando, e qualquer que fossem as ordenanças obrigatórias vinculantes para os Pedreiros locais. Também é quase certo que a Maçonaria, como ela mais tarde evoluiu para o que hoje chamamos Maçonaria Especulativa, originou-se entre as lojas de construtores de catedrais, e não entre as corporações de Pedreiros, embora, naturalmente, devesse ter havido certa interação e sobreposição entre as duas, nossas Antigas Obrigações, nossas tradições, lendas e nosso simbolismo chegaram até nós a partir das lojas migratórias associadas a estruturas eclesiásticas. Pode não ser possível provar esta teoria para satisfação de um tribunal, mas todas as evidências disponíveis, direta e indireta indicam isso. O ponto é de extrema importância, não só no que diz respeito à história, mas sempre que pretendemos reger nossa Ordem atual por atividades do passado.

Era uma coisa difícil de governar adequadamente uma loja de Pedreiros construtores de catedrais, não somente por seu caráter essencialmente temporário, mas também pelo fato de ter em mãos a obra mais admirável possível na Idade Média, envolvendo o dispêndio de grandes somas, a importação de trabalhadores do exterior e da movimentação de massas de material caro. Em uma empresa desse tipo todos os tipos e maneiras de homens foram empregados, desde o superintendente geral, que seria um artista ilustre, até os trabalhadores rudes e moços de recados, um grupo cosmopolita no qual todas as classes seriam representadas, sacerdotes, bispos, senhores, homens livres, escravos, servos, necessitando um sistema complexo e altamente desenvolvido de administração. O controle geral de tal empresa, às vezes, ficava inteiramente nas mãos de religiosos, às vezes, totalmente em mãos leigas, e muitas vezes em um grupo misto.

III. Os oficiais das lojas eram os líderes 

O encarregado do trabalho seria um chefe geral, de diversos estilos de superintendente, supervisor, arquiteto, chefe de obras, guarda das obras, mantenedor da fabrica, diretor, inventor, etc. O presidente era chamado mestre, guardião, diácono, presidente, conforme determinassem os costumes locais; o detentor dos fundos era um mestre de caixa ou tesoureiro; além disso havia outros funcionários, como contadores, que, naturalmente, caíram totalmente fora da forma de organização quando o Oficio se tornou especulativo, porque os oficiais das lojas operativas eram escolhidos tendo em conta o trabalho a ser feito, e não como representantes de graus ou categorias de uma ciência especulativa. Não parece que um cobridor era empregado, embora seja certo que alguns meios eram utilizados para guardar a porta da loja.

Os membros da Ordem eram regidos de acordo com um conjunto de regras e regulamentos que cada Pedreiro jurava respeitar, versões dos quais estão incorporadas em diferentes versões das Antigas Obrigações, a mais velha delas, assim se acredita, sendo a do Manuscrito Cooke, datado de meados do século XV, e preservado com algumas alterações nas constituições ainda usadas por Grandes Lojas; essas regras eram adaptadas às necessidades de tempo e lugar, e pode-se supor, mas, em linhas gerais, foram fielmente preservadas por muitos séculos. As “Ordens aos Pedreiros e Trabalhadores” encontradas nos Registros de Fabrica da Catedral de York, fornecem uma ideia razoável do horário de trabalho, condições de trabalho, e as regras gerais:

Os primeiro e segundo Pedreiros, que são chamados de mestres da mesma, e os carpinteiros, farão o juramento que eles farão com que os costumes antigos assumidos sejam fielmente observados. No verão, eles devem começar a trabalhar imediatamente após o nascer do sol até o toque do sino da Virgem Maria; depois até café da manhã na loja da fábrica (logium fabricae), então um dos mestres deverá bater à porta da loja, e imediatamente todos devem voltar a trabalhar até o meio dia. Entre Abril e Agosto, depois do jantar, eles dormirão na loja; em seguida, trabalharão até o primeiro sino de Vésperas, depois sentar-se-ão para beber até ao final do terceiro toque do sino, e retornarão ao trabalho enquanto puderem ver a luz do dia. No inverno, eles devem começar a trabalhar ao nascer do dia, continuar como antes, até o meio-dia, tomar sua refeição, e voltar ao trabalho até o fim da luz do dia. Em Vigílias e aos Sábados eles devem trabalhar até o meio-dia.

Parece que de tempos em tempos, assembleias eram realizadas, também chamadas congregações, e em um Manuscrito (O Papworth) era colocado as regras das associações, para que todas as lojas em um determinado distrito se mantivessem em devida ordem e sob o controle dos agentes do rei. As Antigas Obrigações fazem muitas menções a elas, apesar de apenas três assembleias serem claramente mencionadas; o Regius refere-se a uma convocada pelo rei Athelstan à qual compareceram grandes senhores e burgueses; outra versão fala de uma assembleia realizada em Windsor, quando Edwin foi iniciado; e quase todos eles referem-se às assembleias de York. “Cada mestre que seja um Pedreiro-livre”, diz o Regius, “deve estar na congregação geral.” É provável que algumas dessas reuniões fossem convocadas por oficiais da ordem, e outras pelo xerife do rei ou de outras autoridades, neste último caso, para zelar para que a Ordem estivesse obedecendo rigorosamente as leis do reino. O Manuscrito Cooke deixa claro que o comparecimento era obrigatório para os mestres: “Que cada Mestre seja notificado para vir a sua congregação, que ele venha no devido tempo, a não ser que seja desculpado por algum motivo. Mas, aqueles que desobedeciam a tais congregações, ou fossem falsos com seus empregadores, ou tivessem agido de modo a merecer a reprovação pela Ordem, deveriam ser dispensados somente por doença grave, notícia sobre a qual devia ser data ao Mestre que presidia a assembleia”. Não há registro de qualquer assembleia em nível nacional, nem é possível ter certeza sobre quando e onde tais reuniões eram realizadas; ou por quanto tempo o costume continuou; os registros são tão escassos, e muitas vezes tão confusos, que não podemos ter certeza de qualquer ponto, exceto que algum tipo de assembleia era realizado ocasionalmente. Alguma ideia da extensão do território abrangido pela autoridade de tal assembleia geral é sugerida pelas Antigas Obrigações, como em Cooke, Grande Loja, York, Sloane e outros que mencionam oitenta quilômetros; o Harleian, dezesseis quilômetros, e ainda outros, todos de uma data posterior, oito quilômetros. Com o passar do tempo e o aumento das cidades e da população da Inglaterra, as assembleias simplesmente saíram de moda; pode muito bem ser que a ideia de formar uma “Grande Loja” em Londres, em 1717, fosse sugerida a “algum velho irmão” pela leitura das Antigas Obrigações; podemos pelo menos estar certos de que os irmãos naquele tempo sentiam-se justificados em tomar a medida radical pelo fato de que as assembleias gerais “tinham sido realizadas em tempos antigos.”

IV. Quantos graus existiam?

As Lojas Maçônicas Operativas não empregavam graus, em nosso sentido moderno do termo, mas graus reconhecidos de trabalhadores e tinham regulamentos e, provavelmente, cerimônias correspondentes. Um jovem era feito aprendiz com apenas doze ou catorze anos de idade, portanto não é provável que o seu ingresso no ofício fosse realizado com qualquer cerimônia muito pesada, mas é certo que ele era obrigado a ouvir a Lenda do Oficio, suas regras e regulamentos, e era obrigado a fazer um juramento. Após sete anos, ele passava para o outro grau, e se tornava Mestre Pedreiro ou Companheiro, os dois sendo dois termos para o mesmo grau. As autoridades estão quase igualmente divididas quanto a ser esse avanço realizado por meio de qualquer tipo de cerimônia secreta; o fato de que se sabe que os aprendizes estavam presentes ao “se fazer um mestre” poderia indicar que tal coisa não ocorreu; mas o outro fato de haver uma divisão entre os dois graus sugeriria que um mestre recebia alguns segredos que nunca eram dados a um aprendiz. No continente, um operário viajava por cerca de dois anos ou mais, depois de ter sido feito Companheiro, mas este não era o costume na Inglaterra, onde, no século XIV, era expressamente proibido por lei. Todos os mestres estavam no mesmo nível com relação a direitos e privilégios, mas alguns mestres gozavam da maior honra de serem escolhidos para fiscalizar o trabalho, e que, portanto, estavam em um grau ainda mais elevado no que diz respeito à posição; mas mesmo assim eles não possuíam segredos do ofício que os companheiros não possuíssem. Os salários variavam de tempos em tempos, muitas vezes fixados por lei; geralmente os trabalhadores recebiam luvas, túnicas, aventais, e às vezes cama e comida; os aprendizes nada recebiam ou então pequenos montantes, além de cama e comida. Em cada construção, muitos trabalhadores não membros da loja eram necessariamente empregados, dos quais temos registros abundantes; eles eram conhecidos como pedreiros ordinários, profanos, assentadores, “pedreiros sem a palavra”, paredeiros, estucadores, etc. Era terminantemente proibido para qualquer mestre pedreiro expor os planos ou empregar seus segredos de ofício na presença destes homens, que eram vistos como “profanos”, ou estranhos. Além disso – este é um fato importante – era necessário dar a “liberdade da loja” a certos homens relacionados com as obras que não eram Pedreiros treinados, podia ser um bispo, estando encarregado de todo o trabalho, ou um homem especialmente qualificado em geometria ou outros itens importantes da maçonaria “especulativa”. Na Escócia, estes irmãos, assim, recebido na loja, mas não como trabalhadores efetivos, eram conhecidos como Maçons “geomáticos“ ou “cavalheiros”. Alguns deles eram, sem dúvida, muito sábios, e não é um palpite supor que certa quantidade de simbolismo e “trabalho” esotérico que, finalmente, evoluiu até o magnífico Ritual agora empregado pode, no início, ter sido devido à presença destes cavalheiros educados.

Quando o Oficio se transformou em uma instituição especulativa no século XVIII, as cerimônias antigas e provavelmente muito simples empregadas pelos Maçons Operativos foram enormemente modificadas e ampliadas, em alguns casos, pela adição, pode-se acreditar, de materiais provenientes de fontes diferentes da Maçonaria Operativa; os um ou dois graus foram reorganizados e um terceiro foi adicionado, algum tempo depois de 1720. Após esse sistema de três graus se tornar permanentemente estabelecido – algo que levou muito tempo para ser feito, e depois de encontrar oposição – foi adotado na Escócia, na Irlanda e no Continente, dando origem à Fraternidade presente em todo o mundo. Deve-se notar aqui, e como um fato que nunca deve ser esquecido pelo estudante, que, embora muitos países além da Inglaterra tivessem um sistema de Maçonaria Operativa, foi só na Inglaterra que a Maçonaria Especulativa se desenvolveu; toda a Maçonaria Especulativa existente hoje veio inicialmente daquela única fonte. As tentativas de explicar em nossas práticas atuais por meio de referências à Maçonaria Operativa na Alemanha, Itália, Espanha e França são geralmente enganadoras. O segredo era vital para a Maçonaria naqueles primeiros tempos como é agora, e por razões semelhantes, exceto na questão das fórmulas comerciais, a posse dos quais tinha o mesmo tipo de valor monetário para um Maçom Operativo que a posse de uma patente tem hoje em dia. Sem uma cuidadosa guarda de tudo o que se passava na loja, todo o sistema teria ficado em pedaços, a arquitetura teria se tornado uma arte perdida, e o mundo teria ficado muito mais pobre, uma coisa que se poderia dizer com igual ênfase sobre a Maçonaria Especulativa, que mantém as portas fechadas aos estranhos, não porque tenha alguma coisa de que se envergonhar, como é a moda em alguns círculos se presumir, mas porque sem os seus arcanos, ela em breve deixaria de ser algo mais que um mero clube social, de que, só Deus sabe, já temos em abundância. Mas, enquanto nossos segredos são morais e especulativos, aqueles mantidos tão cuidadosamente pelos nossos antepassados eram da variedade comercial, e tinham a ver com os métodos de projeto e construção. Eu já citei um trecho do Poema Regius comandando o aprendiz a “ocultar” o “conselho de seus companheiros”; a regulamentação de importância semelhante ocorre em todas as Antigas Obrigações, conforme testemunha esta passagem do Harleian:

Você não revelará seu Mestre ou Dama [esposa do Mestre] seus Conselhos ou segredos, que eles lhe deram, ou o que deve ser ocultado, falado ou feito, dentro do perímetro de sua casa.

Esta passagem mostra que o segredo Maçônico Operativo tinha seu lado moral, bem como profissional. Assim é entre nós; a Maçonaria Especulativa ensina que o segredo é uma virtude a ser praticada em todos os lugares e sempre, e não apenas um dispositivo para manter os estranhos no escuro quanto aos assuntos da loja, uma sábia advertência em um mundo tão cheio de pessoas, onde a confiança que alguém coloca em um companheiro seu precisa ser mantida em confiança sagrada.

V. Os maçons se diferem de outros profissionais

O ofício dos Maçons Livres é diferente em um aspecto muito importante daquele de quase todas as outras corporações, ou seja, que o trabalho de seus predecessores permaneceu visível em seu meio. Um alfaiate, um carpinteiro, um funileiro poderia se importar pouco sobre a história de seu ofício, suas tradições ou seus ideais; por que ele haveria de fazê-lo, porque seu trabalho rapidamente pereceu e não poderia deixar para trás restos duradouros. Com os construtores de catedrais, foi o contrário. Eles estavam familiarizados com o trabalho que seus pais haviam feito, amado e reverenciado, e encontraram nele um livro aberto de lições, um poço de inspiração, uma casa de doutrina. Da mesma forma, era uma questão de grande importância para eles preservar as tradições do passado, sua luz e sua fama, porque eles estavam, eles mesmos, engajados em fábricas que durariam de geração em geração, e transmissores de uma arte tão duradoura quanto pedras forjadas em contraforte e paredes.

Por este fato em si, parece-me, ignorando todos os outros, seria quase inevitável o desenvolvimento de um sistema de simbolismo. Os homens que construíram igrejas tinham de pensar e praticar a religião, tinham que se familiarizar com a filosofia e saber algo de arte, e todos estes interesses nos dias em que não havia imprensa e o analfabetismo era geral poderia ser expresso de alguma outra forma que não fosse simbólica. O simbolismo era a língua popular, de modo que as esculturas na fachada de uma catedral eram um livro para o povo, a história do mundo, uma Bíblia para os olhos. Num tempo como este, teria sido realmente estranho, se os artistas que falavam ao povo através de símbolos não tivessem utilizado o mesmo meio para ensinar a seus próprios aprendizes e preservar os seus próprios segredos.

Basta olhar para a fotografia da fachada de uma catedral para ver que os homens que a construíram tinham mentes simbólicas, não para esconder as suas ideias, mas expressá-las; e que os pensadores mais poderosos do período deixaram para trás em símbolos algumas das ideias mais ricas e raras jamais conhecidas, e que muitas vezes não seriam descobertas de outra forma. Interpretar seus símbolos não é um jogo de antiquário, como o de juntar um velho quebra-cabeças, mas é um legítimo trabalho da mente, esforçando-se para traduzir em nossa própria linguagem e formas de pensamento as verdades aprendidas pelos maçons-livres e ensinadas por eles da maneira que sabiam; é como a tradução de um livro sábio e antigo de uma língua morta para uma língua viva.

Foi a Reforma que deu à Maçonaria Operativa seu golpe de misericórdia. Henrique VIII, após dissolver os mosteiros e conventos, foi secundado por Eduardo VI, que varreu os últimos vestígios das irmandades, confrarias e associações religiosas que não fossem a igreja, ambos os reis embolsando o dinheiro em nome da bolsa privada. Os mosteiros tinham sido os principais empregadores dos Maçons Operativos, e com a chegada de uma época de puritanismo no pensamento, na moral e na arte o período de construção das catedrais chegou a um triste, mas não inglório fim. As os pedreiros Operativos abandonaram e perderam completamente o interesse no Oficio; só os mais inteligentes entre os graus mais leves de trabalhadores continuaram a valorizar as antigas tradições, ler os velhos manuscritos, e debruçar-se sobre os símbolos consagrados pelo tempo.

No século XVII as lojas começaram a se tornar definitivamente especulativas, ou pelo menos não operativas; e até o primeiro quartel do século seguinte, todo o sistema foi reestruturado de cima para baixo, a Maçonaria Operativa desapareceu, exceto em casos isolados, e a Maçonaria Especulativa surgiu. Mas, afinal, e na sequência, o mundo foi quem ganhou. Muitos de nós são Maçons que nunca seguraram uma colher de pedreiro, continuando os vetustos costumes e mantendo vivo o fogo antigo, não porque somos supersticiosamente reverentes do passado, mas porque em nossa herança dos Maçons Operativos temos um tesouro de riquezas insondáveis pelas quais se é habilitado a se tornar em sua alma secreta um templo não profanado onde habita uma luz trazida do passado, através da qual somos ajudados a guiar nossos passos ao longo dos caminhos tortuosos da vida em direção à vocação de um homem, que é a honra, a retidão e a fraternidade.

Autor: H.L. Haywood
Tradução: José Filardo

Fonte: REVISTA BIBLIOT3CA

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LIVROS CONSULTADOS NA PREPARAÇÃO DESTE ARTIGO

A.Q.C., Antigrapha; ;Brewster, History of Freemasonry; ; Robert I. Clegg, Mackey’s Revised History of Freemasonry; ; Edw. Conder, Records of the Hole Crafte and Fellowship of Masons; ; Dallaway, Master, and Freemason; ; Findel, History of Freemasonry; ; Fort, Early History and Antiquities of Freemasonry; ; Fr. Funck-Brentano, The Middle Ages; ; R.F. Gould, Collected Essays on Freemasonry; R. F. Gould, Concise History of Freemasonry; ; R. F. Gould, The Four Old Lodges; ; R.F. Gould, History of Freemasonry; ; William Herbert, History of the Twelve Great Livery Companies; ; W.J. Hughan, Old Charges of the British Freemasons; ; W.J. Hughan, Origin of the English Rite of Freemasonry; ; Lethaby, Medieval Art; ; Lethaby, Westminster Abbey and the King’s Craftsmen; ; Murray D. Lyon, History of the Lodge of Edinburgh; ; Meredith, Economic History of England; ; J.F. Newton, The Builders; Frederick A. Paley, Manual of Gothic Architecture; ; Pierson, Traditions, Origin, and Early History of Freemasonry; ; Robert Plot, The Natural History of Staffordshire; ; A. K. Porter, Medieval Architecture; ; Wm. Preston, Illustrations of Masonry; ; Toulmin Smith, English Guilds; ; F.J. Snell, The Customs of Old England; ; Lionel Vibert, Freemasonry Before the Existence of Grand Lodges; ; Lionel Vibert, Story of the Craft; ; Paul Vinogradoff, English Society in the Eleventh Century; ; A. E. Waite, New Encyclopedia of Freemasonry; ; J.S.M. Ward, Freemasonry and the Ancient Gods; ; E.M. Wilmot-Buxton, A Social History of England: ; Robert Wylie, History of the Mother Lodge Kilwinning.

REFERÊNCIAS SUPLEMENTARES

Mackey’s Encyclopedia of Freemasonry (Revised Edition). Anderson. 57-58; Apprentice, 70-71; Architect, 75; Architecture, 75; Athelstan, 85; Builder, 123; Church, 151; Comacine Masters, 161-167; Company of Masons, 472; Congregations, 174; Corporations of Builders, 123; Cowan, 183-184; Craft, 184; Craftsman, 184; Deacon, 197-198; Fellow, 261; Fellow Craft, 261-262; Gentleman Mason, 294; Geomatic, 295; Gloves, 299-300; Grand Lodges, 306-307; Hale, 313; Halliwell Manuscript, 616; Harleian, 317; Hutchinson, 342-343; Lodge, 449-451; Master, 473-476; Master of the Work, 476; Master Mason, 474-475; Middle Ages, 483; Oliver, 527-529; Old Masonic Manuscripts, 464-467; Operative Art, 532; Operative Masonry, 532; Overseer, 540; Preston, 579-582; Regius Manuscript, 616; Revival, 622-623; Ritual, 627; Sloane, 694-695; Stone-Masons of the Middle Ages, 718-722; Symbol, 751- 755; Tiler. 786: Tyler, 811; Wages, 834; Warden, 835-836; York, 867-871.

Como a Maçonaria Operativa se Transformou na Maçonaria Especulativa

I. O PERÍODO DE TRANSIÇÃO

Se em meu breve estudo sobre a Maçonaria Operativa eu advertia rapidamente e de passagem ao fato de que nos dias em que as lojas maçônicas eram em sua maioria completamente “operativas”, ou dedicadas a atividades de construção efetiva, havia certo elemento de não operativa na participação, algo tornado necessário pelas condições sob as quais foram erigidos os edifícios eclesiásticos. Muitas vezes, o trabalho estava sob a superintendência geral de um bispo ou outra autoridade da igreja que, na natureza das coisas, teria que ter a liberdade da loja; ao mesmo tempo, ali eram empregados funcionários educados para cuidar dos livros e possivelmente também homens educados para ajudar na elaboração de alguns dos problemas mais técnicos.

Sempre que uma catedral era erguida por uma corporação local, era necessário que seus representantes tivessem acesso aos registos e, de outra forma fossem autorizados a compartilhar a direção das atividades; além disso, pode ser que homens da alta posição totalmente fora do Ofício eram ocasionalmente, e por diferentes razões políticas ou sociais, admitidos sob alguma qualidade na irmandade. Um exemplo é fornecido no Manuscrito Cooke, datado de cerca de 1450, onde é dito do “Príncipe Edwin” que “de especulativo ele era um mestre”; o significado disso pode ser ou que este dignitário era amigável do Ofício, ou então que ele sabia que algo de “geometria”, que estava na base de todos os projetos de construção.

Em todo caso, os homens eram admitidos a algum tipo de participação em loja, que não tinha a pretensão de praticar a arte, um fato que não precisa causar qualquer surpresa porque ele era bastante coerente com os princípios e práticas das corporações. A aceitação destes não-operativos pode eventualmente ter tido algum efeito sobre cerimônias em loja. Na natureza do caso, tal irmão não podia fazer juramento de manter os segredos do ofício sobre o qual ele não precisava aprender coisa alguma;, nem podia ser obrigado a produzir uma obra prima, como o eram os aprendizes regulares, porque ele não possuiria a habilidade.

Tão pouco se sabe sobre este assunto que só se pode permitir especular, não obstante seja de alguma consequência o esforço para recuperar uma imagem dos usos da loja nos tempos antigos. O principal ponto aqui é que desde os primeiros tempos não se era considerado ilegal ou irregular para lojas operativas aceitar sob algum tipo de razão a participação de homens não operativos; tendo isso em mente, será mais fácil entender como em anos posteriores não operativos passaram a ser aceitos em tais números que superaram simplesmente os Operativos.

II. DECLÍNIO DA MAÇONARIA OPERATIVA

No século XV, a Maçonaria operativa começou a declinar, e no século seguinte, quase deixou de existir e, isso principalmente devido à Reforma Protestante na Inglaterra. Todas as corporações de ofício foram suprimidas por Henrique VIII (ver Estatutos de 37 de Henrique VIII, c. 4, e I Edward VI, c. 14) e corporações de mosteiros foram dissolvidas e seus fundos confiscados pela Coroa. As catedrais já não eram mais erguidas; aos olhos dos puritanos, que rapidamente chegaram à frente, elas eram monumentos da religião papista e, portanto, consideradas perigosas, de modo que muitas delas foram desfiguradas ou parcialmente demolidas; a mesma amargura foi dirigida contra todas as outras estruturas de tipo semelhante, de modo que as velhas lojas de Maçons Operativos, que tinham surgido para erguer as catedrais, viram-se sem trabalho. Algumas delas, assim se acredita, voltaram sua atenção para as casas da nobreza palaciana para os fidalgos do interior, mas a maioria delas pereceu ou então manteve uma existência lânguida.

Outras influências operaram com a mesma finalidade. As guerras civis deixaram o país esgotado. Novas cidades surgiram com novas tradições, e alguns dos antigos centros de vida das corporações passaram para segundo plano. Ao mesmo tempo, e devido à escassez de trabalhadores, operários estrangeiros foram importados da França, da Holanda, Alemanha e Itália, e estes tinham outros costumes e tradições. No mundo do pensamento, outras revoluções, silenciosas mas poderosas, ocorreram, uma delas dando origem à fundação da famosa Royal Society, da qual os membros eminentes da primeira Grande Loja eram membros, alguns deles bastante ativos. Em outras palavras, toda a vida da Inglaterra sofreu uma mudança profunda, de tal modo que organizações como o Ofício de Maçonaria tiveram que mudar com ela, e se encontraram em um conjunto de circunstâncias bem diferentes daquelas que tinham obtido durante os séculos XIII e XIV.

É um fato de alguma importância que o número de não operativos aceitos na sociedade parece ter aumentado à medida que o Ofício como um todo diminuía; a maioria dos nossos escritores tem visto nisso as conexões de causa e efeito, e não há razão supor que eles estejam errados. As atas de loja mais antigas ainda existentes na Inglaterra datam do início do século XVIII; mas, na Escócia, os registros são muito mais antigos, as atas da Loja-Mãe Kilwinning datam de 1642, as de Aberdeen a partir de 1670. A partir dessas atas, e de outros registros antigos, aprendemos que não só os não-Operativos eram aceitos no início por lojas escocesas, mas que eles (os não operativos) tinham uma participação ativa nos assuntos da loja. O Irmão Murray Lyon, cuja história da Loja de Edimburgo tem sido, há muito tempo, uma obra padrão, diz que o primeiro registro autêntico de um não operativo sendo aceito como membro de uma loja data de 08 de junho de 1600, quando o nome de John Boswell, Lord de Auchinleck, aparece entre os irmãos.

Dois anos antes disso, no entanto, ainda outro não operativo deve ter estado nas listas, porque sabemos que em 1598, William Schaw, quem Lyoll acredita ter sido um membro honorário, assinou e promulgou dois conjuntos de estatutos, ou códigos de leis, um para uso do Ofício em geral, o outro para uso da loja de Kilwinning. Schaw assinou como “Mestre dos Trabalhos, Vigilante dos Maçons”. Em julho de 1634, Lord Alexander, Visconde do Canadá, Sir Anthony Alexander e Sir Alexander Strachan foram admitidos à Loja de Edimburgo. Como o historiador da Maçonaria Escocesa por excelência, vale a pena citar as palavras de Lyon de comentário a este respeito:

“É digno de nota que, com poucas exceções, os não operativos que eram admitidos com membros das irmandades maçônicas nas lojas de Edimburgo e Kilwininng durante o século XVII eram pessoas de qualidade, a mais eminente das quais, como resultado natural da sua posição metropolitana, sendo feita na primeira loja. Sua admissão à irmandade uma instituição composta de Maçons Operativos associados juntos para as finalidade de seu Ofício, com toda probabilidade, seria originária de um desejo de elevar sua posição e aumentar sua influência, e uma vez adotado o sistema, recomendaria ainda à Fraternidade pelas oportunidades que se apresentam para o cultivo da amizade e desfrute da sociedade de senhores, a quem, em circunstâncias normais, havia pouca chance de que eles sequer teriam conhecido pessoalmente.”

“Por outro lado, a vinculação de não profissionais à loja pelos laços de filiação, acreditamos, seria ativado em parte por uma disposição de retribuir os sentimentos que tinham provocado a concessão da participação, em parte pela curiosidade de penetrar os arcanos do Oficio, e em parte pela novidade da situação, como membros de uma sociedade secreta e participantes em suas cerimônias e festividades.”

III. REGISTROS DA ANTIGA LOJA ESCOCESA

Hughan deu expressão à surpresa sentida pela maioria de nossos acadêmicos com o fato de que os registros de loja fossem muito mais longe na Escócia do que na Inglaterra; ele escreve:

“O motivo pelo qual tantos livros de ata ainda estão preservados na Escócia, muito antes da instituição da Grande Loja, até mesmo alguns do século XVII, e ainda assim quase nenhum é encontrado na Inglaterra, parece inexplicável.”

Os registros da Loja Alnwick remontam a 1703. Parece que uma loja não-Operativa existia em York, a julgar pelos registros, já em 1705. A extinta Loja Haughfoot tinha uma maioria não operativa com um ritual e cerimônia já em 1702. Essas entradas mostram que as práticas não operativas estavam na moda nos anos antes da fundação da primeira Grande Loja da Maçonaria especulativa, em Londres, 1717.

O registro mais antigo sobrevivente de um homem ter sido iniciado maçom não operativo em solo Inglês é a de Robert Moray, que foi “iniciado” em Newcastle, por membros da Loja de Edimburgo membros do exército escocês, em 20 de maio de 1641. Mas, o mais famoso de todos os primeiros maçons não operativos é, de longe, Elias Ashmole, iniciado em Warrington em 16 de outubro de 1646. Ashmole nasce em Lichfield em 1617, foi educado para a advocacia, tornou-se capitão durante a Grande Revolta; foi eleito Fellow da Royal Society, recebeu o grau de M.D. foi feito Windsor Herald e, além de todos esses interesses e atividades dedicou muito tempo ao estudo do ocultismo, astrologia, botânica, história e diversos outros assuntos. Sua terceira esposa foi a filha de seu amigo, Sir William Dugdale. Um colecionador ativo de curiosidades industriosas e objetos de valor antiquário, ele presenteou sua coleção à Universidade de Oxford, onde ainda é conhecido como o Museu Ashmolean. Ele foi autor de uma História da Ordem da Jarreteira. Seu diário foi publicado pela primeira vez em 1717, e depois uma segunda vez, como uma espécie de apêndice à História de Seu Tempo e Sua Vida de Lilly em 1774. O diário contém dois artigos sobre a Maçonaria, como se segue, ortografia e pontuação como no original:

(Manuscrito Ashmole 1136) 1646. [folio 19, verso]

16 de outubro. – 04:30 P.M. – Fui iniciado Franco Maçom em Warrington, Lancashire, com os Coll: Henry Mainwaring de Kanincham em Cheshire. Os nomes daqueles que estavam lá da loja, o Sr. Rich Penket Warden, Jr. James Collier, o Sr. Rich Sankey, Henry Tattler, John Ellam, Rich: Ellam e Hugh Brewer.

Depois de 36 anos aparece outro trecho que contém menção a Companhia de Maçons de Londres. Ela é dada aqui na íntegra:

Março de 1682. [folio 69. verso]

10º. – Cerca de cinco horas da tarde, recebi uma convocação para c omparecer à loja a ser realizada no dia seguinte, no Masons Hall de Londres.

11º. – Assim eu fui, e cerca de Meio dia foram iniciados na Irmandade de Franco Maçons.

Sr. William Wilson Knight, Capt. Rich: Borthwick, Will: Woodman, Mr. Wm. Grey, Taylour Samuell Sr. e Sr. William Wise.

Eu era o Membro sênior entre eles (sendo 35 anos desde que fui iniciado). Estiveram presentes, além da mim mesmo os companheiros a seguir nomeados. Sr. Tho: Sr. Wise da Companhia dos Maçons aqui presentes estão. Mr Thomas Shorthose, Mr. Thomas Shadbolt, Waindsford Esqr., Mr. Nich: Young, Mr. John Shorthose, Mr. William Hamon, Mr. John Thompson, and Mr. Will: Stanton.

Todos jantamos na Taverna Halfe Moone em Cheapside, em um Jantar Noble, preparado por conta dos Maçons recém-iniciados.

IV. A COMPANHIA DOS MAÇONS

A Companhia de Maçons, sem dúvida, mencionada na citação acima é o assunto de um livro de valor inestimável por Edward Conder com o título Hole Crafte and Fellowship of Masons. Este corpo de Maçons foi constituído em 1410 – 1411 e recebeu uma quota de armas no décimo segundo ano de Edward IV (1472-1473) de William Hawkeslowe, Clarenceaux King of Arms. Os registros da cidade de Londres demonstram que este corpo deve ter estado funcionando já em 1356, porque as sua direção se formou naquele ano. Em 1530, o nome foi alterado para a “Companhia dos Franco Maçons.” Conder acha que há boas razões para acreditar que esta companhia começou em algum lugar no início do século XIII.

O ponto interessante aqui, à luz do nosso presente propósito, é o fato de que associado a esta Companhia de Maçons estava outra organização, talvez subsidiária, denominada “The Accepcon” ( A Aceitação). Reuniam-se na mesma sala e estavam de alguma forma ligadas, como se pode aprender com Conder:

“Infelizmente, nenhum livro relacionado com esta Aceitação – ou seja, a Loja – foi preservado. Podemos, portanto, somente formar nossas ideias de seu funcionamento a partir de alguns itens espalhados pelas contas. A partir destas, pode-se verificar que os membros da Companhia pagaram 20 shillings para entrar na Acception, e estrangeiros 40 shillings. Se eles pagaram direitos aos fundos da Companhia, é impossível afirmar, na ausência do velho Livro de Quarteridge. Uma questão, porém, é bastante certa a partir do velho livro de contas que tem início em 1619, que os pagamentos feitos por maçons recém-admitidos foram realizados para os fundos da Companhia; que alguns ou tudo isso foi gasto em um banquete e as despesas de atendimento, e que qualquer quantia adicional exigida foi pago com os fundos comuns da companhia, comprovando que a companhia tinha o controle completo da Loja e seus metais.”

Parece que os membros da Acception não eram maçons operativos; se fosse esse o caso, é óbvio que maçons não operativos fossem admitidos com base em alguma coisa, já em 1619, e provavelmente muito antes disso. Se essa suposição for sólida, segue-se que algum tipo de não operativo ou Maçom especulativo já existia na metrópole mais de um século antes da fundação da primeira Grande Loja. Também parece que Ashmole frequentava a “Acception” na época mencionada em sua segunda entrada de diário citada acima. Com a força desse fato, alguns escritores, o Irmão A.E. Waite, por exemplo, sugeriram que a semente da qual a nossa moderna Maçonaria simbólica teve sua origem pode ter sido plantada ali por homens como Ashmole, que estavam interessados em simbolismo, rituais, ocultismo e todas essas questões.

Que algo era conhecido de uma sociedade de maçons durante a segunda metade do século é provado por referência a isso em alguns livros da época. Randle Holme (o terceiro de mesmo nome), em seu Acadamie de Amorie publicado em 1688, refere-se aos Maçons desta maneira:

“Não posso deixar de Homenagear a Irmandade dos Maçons por sua antiguidade, e mais, sendo um membro da sociedade chamada dos Franco Maçons.”

Dois anos antes do aparecimento do volume de Holme o Dr. Robert Plot publicou a História Natural de Staffordshire, no qual ele se refere aos Maçons de uma forma um pouco satírica:

“A isso se acrescentem os costumes relativos ao Condado, do qual eles têm um, de admitir Homens na Sociedade dos Maçons, que, nas plagas deste Condado parece ser mais solicitado que em qualquer outro lugar, apesar de eu achar que o Costume se espalha mais ou menos por todo o país; pois aqui eu encontrei pessoas da mais eminente qualidade que não desdenham estar neste Clube. Nem, na verdade, eles precisam, se fosse ela de tal antiguidade e honra, que se pretenda, em um volume grande de pergaminho que têm entre eles, conter a História e as regras do ofício de maçonaria.”

“Em que a sociedade, quando são admitidos, eles convocam uma reunião (ou Loja como eles a chamam em alguns lugares), que deve consistir de pelo menos 5 ou 6 dos Antigos da Ordem, quando o candidatos apresentados com luvas, e assim da mesma forma suas esposas, e entretêm com um agrupamento de acordo com o costume do lugar: Isso acabado, eles prosseguem com a admissão deles, que consiste principalmente na comunicação de certos sinais secretos, pelo qual são conhecidos um do outro em todo o país, pelo qual significa que eles têm atendimento para onde quer que viagem: porque se alguém aparece embora totalmente conhecido que possa mostrar qualquer um desses sinais a um Companheiro da Sociedade, a quem eles chamam de outra forma pedreiro aceito, ele é obrigado atualmente a vir até ele, de qual companhia ou lugar ele esteja, ou melhor, embora no alto de uma torre (o perigo ou inconveniente que ele possa correr) para saber o seu prazer e ajuda-lo; ou seja, se ele quiser trabalhar, ele é obrigado a encontrar-lhe algum; ou se ele não puder fazê-lo, dar-lhe dinheiro ou de outra forma apoiá-lo até que possa ter trabalho, que é um de seus Artigos”. 

John Aubrey, um amigo do Dr. Plot e também um antiquário, escreveu a História Natural de Wiltshire, na mesma época, em uma cópia da qual ele inscreveu um memorando onde se lê:

“Memorando: Neste dia, 18 de Maio, sendo segunda-feira, 1691, após a Rogação de Domingo uma grande convenção na Igreja de St. Paul da Fraternidade de Maçons Adotados, onde Sir Christopher Wren, deve ser iniciado como um irmão, e Sir Henry Goodric da Torre, e diversos outros. Houve reis que pertenceram a este Sodalício.”

V. WREN ERA MAÇOM?

Esta referência à Wren levanta uma questão sobre a qual tem havido um longo debate contínuo. Foi o famoso arquiteto, o construtor de St. Paul e de Londres depois do grande incêndio, um maçom? Claro, ele era um arquiteto e, portanto, um membro do Oficio em sentido geral, mas era ele membro de uma loja? Gould dedica cinquenta e quatro das suas páginas mais fortemente carregadas para provar que ele não era, e que qualquer afirmação neste sentido é pura e simples fábula. O Irmão F. De P. Castells escreveu uma crítica mordaz destas páginas num esplêndido ensaio publicado em Transactions na Loja dos Autores, vol. II, página 302:

Nós todos admiramos a erudição de Gould”, observa ele, “sua História é uma obra monumental. Mas, nesse assunto, ele se mostrou mais instruído que sábio, porque ele se colocou sob uma falsa luz, na qual o vemos como um crítico acerbo, sofismando, digladiando com os fatos, e lançando dúvida sobre tudo o que sugere o pensamento de Wren ter sido maçom.”

Alguns acreditarão, talvez, que o irmão Castells tenha exagerado um pouco o assunto, mas que nem lá nem cá; ele encerra em seu próprio caso com quatro peças de evidência: primeiro, as Constituições de 1738; segundo, um trecho do Postboy, um jornal londrino que, no seu anúncio da morte de Wren, refere-se a ele como “aquele digno maçom”; Terceiro, a anotação de Aubrey citada acima e quarto a afirmação de Preston no sentido de que “Wren presidiu a antiga Loja de St. Paul’s durante a construção da catedral”. Mas, o que parece ser o argumento decisivo na argumentação do Irmão Castell é dado em seu postcriptum, em que há tanta matéria muito interessante que pode muito bem ser citado na íntegra:

 “O que precede foi apresentado como uma palestra. Desde então, porém, tendo visto os registros da Loja de Antiguidade que o irmão Rylands trouxe à luz, penso que a questão está absolutamente resolvida. A Loja já teve registros que remontavam a 1663. Mas, quando um inventário foi feito em 1778, tudo o que existia anterior a 1721 tinha desaparecido. Isto é referido em um Memorando como “o ultraje”, pois foi um caso de apropriação indébita. Ainda assim, os poucos registros agora existentes são suficientes para satisfazer qualquer um. Assim, as Atas de uma Reunião realizada em 03 de junho de 1723, dão substância ao que os irmãos haviam decidido: “O conjunto de Castiçais de Mogno presenteado a esta Loja por seu digno e velho mestre, Sir Christopher Wren, deverá ser cuidadosamente depositado em uma caixa de madeira revestida de pano a ser imediatamente adquirido para esta finalidade”. A razão para isso era que como o “digno e velho mestre” da Loja tinha morrido, eles estavam ansiosos para preservar os castiçais como lembranças preciosas de sua ligação com a Loja.

Existe também um Memorando sobre uma ‘Assembleia Geral de um grande Número de Maçons Realizada em 24 de junho de 1721’, que é notável por incluir entre os presentes ‘Christopher Wren, Esq.’, o único filho do arquiteto, cujo nome reaparece de maneira semelhante oito anos mais tarde. Obviamente, o filho era um daqueles que ajudaram a formar a primeira Grande Loja; assim, podemos entender que o pai deveria tê-lo nomeado como seu substituto, quando a Fraternidade comemorou o Capestone em 1710. E ainda assim, Gould, quando escreveu sua História, não sabia que alguém já tivesse anunciado o filho como um membro da nossa Ordem!

A questão tem sido levantada se a Loja Antiquity original era de maçons especulativos. Os três Castiçais permitem boa base para a presunção, mas deixemos os membros da Loja falar por si mesmos. Na ata de uma reunião em 03 de novembro de 1722, lemos:

“O Mestre relatou os trabalhos da Grande Loja e a nomeação do Irmão Anderson para rever as antigas Constituições. Foi o parecer da Loja que o Mestre e os seus Vigilantes compareçam a todo Comitê durante a revisão das Constituições, e que nenhuma alteração possa ser feita no Antigo Estabelecimento.

Este zelo em manter a velha ordem nos permite afirmar positivamente que a Grande Loja de 1717 não criou a Maçonaria, mas simplesmente reorganizou a Fraternidade.

A partir dessas citações e das considerações de práticas operativas iniciais advertidas nos parágrafos de abertura deste artigo, é evidente que o elemento da associação e princípios não operativos estavam na Ordem desde os primeiros tempos; e que uma interpretação conservadora da história maçônica sugeriria que este elemento veio com o tempo, e que, devido a alterações fora e dentro da Ordem, para contrabalançar a influência Operativa, resultando finalmente em uma completa reorganização da Fraternidade. Mas, de acordo com uma visão mais radical, que também precisa ser considerada, este elemento não operativo não poderia, por si só e sem assistência externa, ter jamais se provado suficientemente poderoso para realizar as muitas mudanças que ocorreram no “renascimento” de 1717. Outras influências devem ter operado, como sustenta este ponto de vista, e que de fora da Ordem causaram tais mudanças revolucionárias, como, sem dúvida, ocorreu. Alguns dos argumentos apresentados por aqueles que sustentam essa posição merecem consideração.

Muito pouco se sabe realmente sobre a formação da primeira Grande Loja, mas parece certo que muito atrito foi gerado entre os “antigos membros” e as antigas lojas independentes pelas mudanças radicais que foram feitas pela primeira Grande Loja. Este fato pode significar que inovações no ritual e regulamentos foram feitos e que isso despertou a inimizade dos “irmãos antigos” que temiam inovações; em caso afirmativo, isso mostraria que o novo material foi introduzido de fora, senão não teria havido qualquer insatisfação com a nova ordem das coisas.

VI. O SIMBOLISMO DO TEMPLO

Pode ser possível oferecer o elaborado sistema de simbolismo construído sobre o Templo do Rei Salomão como um caso em questão aqui. O mais antigo manuscrito maçônico não mapeia a Maçonaria até o rei Salomão, mas muito além dele até Nimrod e até Euclides. No Manuscrito Dowland, datado em cerca de 1550, Hiram Abif é mencionado, mas apenas como um nome entre muitos outros. Em 1611, a versão da Bíblia do Rei James apareceu na Inglaterra e despertou um interesse quase universal, em especial pelas narrativas do Antigo Testamento de Salomão e seu Templo.

No final do mesmo século e no início do século seguinte, esse interesse foi tão geral que muitos modelos do Templo foram construídos e expostos em centros populosos, e manuais descrevendo-os receberam circulação geral, algo que deve ter sido particularmente interessante para os maçons antigos, que tinham tradições há muito acalentadas relacionadas com aquele edifício histórico. Quando Anderson preparou a primeira edição de suas Constituições, ele incorporou em uma nota de rodapé uma explicação erudita do nome “Hiram Abif”, uma coisa que ele não teria feito se seus leitores já não estivessem interessados.

A inferência a partir desses fatos, assim sucintamente expostos, é que há muito tempo existia na Ordem um germe de interesse pelo Templo de Salomão; que esse germe se encontrava em um ambiente favorável para o desenvolvimento quando o interesse na matéria tornou-se popular, e que este desenvolvimento encontrou um lugar no Ritual no início do século XVIII sob a forma agora três vezes familiar. Se esta leitura da matéria é procedente, segue-se que o simbolismo do Templo é um caso de desenvolvimento dentro da Ordem, devido a condições externas.

Aqueles que sustentam a visão de que o “renascimento” em 1717 deveu-se principalmente à influência de fontes externas apontam para o cabalismo, Templarismo, Rosacrucianismo, Hermetismo, etc., (a consideração de todos exigiria muito espaço), mas, mesmo assim, outra influência “de fora” pode ser chamada agora, porque ela não recebeu tanta atenção quanto parece merecer. Refiro-me ao clube Inglês, que era tão poderoso como influência social na vida Inglesa do século XVIII. Quase todo homem, rico ou pobre, pertencia a um; havia clubes de beber, clubes musicais, clubes literários, clubes de homens gordos, clubes de Antigos colegas, clubes chineses, clubes para os homens com narizes grandes, e para os pequenos, e todas as outras formas imagináveis de organização para fins de sociabilidade.

Em uma época em que os jornais diários não existiam e os livros eram escassos, estes clubes eram centros de fofocas e informações gerais, bem como sociedades para a propagação de diferentes “causas”, todas elas embalsamadas para sempre nos ensaios de Addison, Steele, Goldsmith e os outros imortais da época. Será que as primeiras lojas de maçons especulativos surgiram em resposta a esta necessidade de clubes? A questão exige ventilação mais profunda do que tem recebido, porque há algo a ser dito sobre ela. Gould, recorde-se, atribuída a adesão de Desaguliers à Ordem ao seu desejo pela vida de clube, e o irmão Arthur Heiron mostrou quão poderosa era a influência do clube na Maçonaria do século XVIII, em seu excelente livro Maçonaria Antiga e a Antiga Loja Dundee.

De minha parte, não acredito na “teoria do clube” como origem da Maçonaria especulativa, mas a questão é oferecida aqui como um exemplo dessas teorias que olham para as influências externas como explicação para a transformação da Maçonaria Operativa em Especulativa, e como uma sugestão aos estudantes que eles investiguem um campo fascinante.

Como conclusão, pode-se dizer que até que se saiba mais sobre o período de transição, será necessário para cada leitor maçônico sentir o seu caminho através da escuridão, tão bem como puder, mantendo seu julgamento sobre muitas questões em suspenso, pois, como pouco ainda se sabe realmente, e que muitas vezes é bastante conflitante. No entanto e não obstante pareça alguns de nós que o que sabemos mostra uma continuidade ininterrupta entre as antigas lojas maçônicas operativas e a Instituição que as substituiu em 1717, e que em uma maneira geral, as práticas e princípios dos maçons medievais continuaram na Maçonaria Especulativa. Ainda temos Aprendizes, Companheiros e Mestres; ainda nos reunimos em lojas como antigamente, sob o governo de Mestres e Vigilantes; observamos o sigilo, e usamos cerimônias de iniciação dividida em classes ou graus; mantendo tudo junto, como uma estrutura sólida, está o uso emblemático e simbólico dos instrumentos e práticas da construção, e no centro de tudo está o edifício mais famoso da história e o mais famoso construtor sob tais circunstâncias de drama e mistério que ajudam cada maçom a melhor compreender a si mesmo e o mundo, os segredos da vida e Deus, que é a verdadeira vida.

Autor: H.L. Haywood
Tradução: José Filardo

LIVROS CONSULTADOS NA PREPARAÇÃO DESTE ARTIGO

Ars Quatuor Coronatorum, Author’s Lodge Transactions, I, II, III. ; Constitutions of the Freemasons, Anderson. ; A Short Masonic History, Armitage. ; Natural History of Wiltshire, Aubrey. ; Grand Lodge of England, Calvert. ; Mackey’s Revised History of Freemasonry, Clegg. ; Hole Craft and Fellowship of Masons, Conder. ; Evolution of Freemasonry, Darrah. ; Ahiman Rezon, Dermott. ; Club Makers and Club Members, Escott. ; History of Masonry, Findel. ; Concise History of Freemasonry, Gould. ; History of Freemasonry, Gould. ; Ancient Freemasonry and the Old Dundee Lodge, Heiron. ; Acadamie Armory, Holme. ; Masonic Sketches and Reprints, Hughan. ; Spirit of Masonry, Hutchinson.; Medieval Architecture, Kingsley. ; History of the Lodge of Edinburgh, Lyon. ; Guild Masonry in the Making, Merz.; History of Lodge Aberdeen, Miller. ; The Builders, Newton. ; Essay on the Usages and Customs of Symbolical Masonry in the 18th Century, Oliver. ; Preston’s Masonry, Oliver. ; Tradition, Origin and Early History of Freemasonry, Pierson. Natural History of Staffordshire, Plot. ; Illustrations of Masonry, Preston. ; Freemasonry Before Existence of Grand Lodges, Vibert. ; Story of the Craft, Vibert. ; New Encyclopedia of Freemasonry, Waite. ; Freemasonry and the Ancient Gods, Ward.

REFERÊNCIAS SUPLEMENTARES

ENCICLOPÉDIA DE MACKEY (Edição Revista): Accepted, 10; Anderson, 57; Antiquity of Freemasonry, 66; Apprentice, Entered, 70; Ashmole, 81; Constitutions, 175; Cromwell, 186; Degrees, 203; Desaguliers, 207; Dunckerley, 223; Edwin, 230; Fellow Craft, 261; Free and Accepted, 281; Freemason, 282; Freemasonry, Early British, 283; Geometry, 295; Gilds, 296; Hermetic Art, 323; Innovations, 353; Kabbala, 375; Kilwinning, 381; Legend, 433; Lodge, 449; Mason, 471; Master Mason 474; Operative Art, 532; Points of Fellowship, 572; Progressive Masonry, 591; Scotland, 671; Speculative Masonry, 704; Stone-Masons, 718; Symbolic Degrees, 752; Wren, 859; York 866.

 

A Maçonaria e a Casa dos Homens

I. Antropólogos descobrem a Casa dos Homens

Desde que Heinrich Schurtz publicou seu “Altersklassen und Maennerbunde” em 1902, os antropólogos têm se interessado cada vez mais no papel desempenhado pelas sociedades secretas entre os povos primitivos. Herr Schurtz descobriu que as sociedades secretas não eram de forma alguma uma coisa privada, de pouco interesse e menor consequência, conforme antropólogos antigos acreditavam que elas fossem, mas que eram de igual importância na vida primitiva à de outras instituições sociais. Ele descobriu que

em íntima conexão com as faixas etárias, e mais particularmente com o papel dominante desempenhado pelos solteiros organizados, ali se desenvolvia a casa dos homens. Ela é caracterizada como uma estrutura na qual homens adultos, porém solteiros preparam suas refeições, trabalham, jogam e dormem, enquanto os homens casados moram separados com suas famílias. As mulheres e crianças são geralmente proibidas de entrar nos locais, enquanto as meninas amadurecidas se relacionam livremente com os ocupantes.”

O Prof. Hutton Webster da Universidade de Nebraska, trabalhando independentemente e sem conhecimento das conclusões de Schurtz, chegou à mesma conclusão, e escreveu um tratado sobre o assunto que se revelou de extrema importância para os estudantes de sociedades secretas. Este artigo foi publicado em 1908 sob o título de Primitive Secret Societies: A Study in Early Politics and Religion (Sociedades Secretas Primitivas: Um estudo de Política e Religião Primitivos). O conceito central deste livro é o da casa de homens. O Prof. Webster descreve isso até certo ponto na primeira página deste livro, como segue:

A separação dos sexos que existe nas sociedades civilizadas é o resultado, em parte, das diferenças naturais de sexo e função econômica; em parte, ela encontra uma explicação nos sentimentos de solidariedade sexual aos quais devemos a existência dos nossos clubes e sindicatos. A solidariedade sexual em si é apenas outra expressão para o funcionamento dessa lei universal da empatia humana, ou em frase mais moderna, de consciência da espécie, que está na base de todas as relações sociais. Mas, em sociedades primitivas, a essas forças produzindo separação sexual, acrescenta-se uma força ainda mais poderosa, que tem origem na crença generalizada quanto à transmissibilidade das características sexuais de um indivíduo a outro. Dessas crenças surgiram muitos tabus curiosos e interessantes destinados a evitar o perigo real ou imaginado incidente no contato entre os sexos. A separação sexual é ainda mais garantida e perpetuada pela instituição conhecida como “casa dos homens”, exemplos da qual podem ser encontrados entre os povos primitivos em todo o mundo.

A casa dos homens geralmente é o maior edifício em um assentamento tribal. Ela pertence em comum aos moradores; serve como sala do conselho e prefeitura, como casa de hóspedes para estranhos, e como local de repouso dos homens. Frequentemente, assentos na casa são designados a idosos e outros líderes de acordo com sua dignidade e importância. Aqui, os bens preciosos da comunidade, tais como troféus tomados na guerra ou na perseguição, e símbolos religiosos de vários tipos são preservados. Dentro do seu recinto, mulheres, crianças, e homens membros da tribo não completamente iniciados, raramente ou nunca entram. Quando o casamento e a posse exclusiva de uma mulher não ocorrem imediatamente após a iniciação na tribo, a instituição da casa dos homens torna-se uma contenção eficiente sobre as predileções sexuais dos jovens solteiros. Ela serve, então, como um clube para os solteiros, cuja permanência nela pode ser considerada como uma perpetuação daquela separação formal entre rapazes e as mulheres, que deve ser conseguida com as cerimônias de iniciação em primeiro lugar. Essa vida comunitária dos jovens é um sinal visível da sua separação do círculo restrito da família e da sua introdução aos deveres e responsabilidades da vida tribal. A existência de tal instituição enfatiza o fato de que uma vida familiar estabelecida com uma residência privada é privilégio dos homens mais velhos, que sozinhos têm direitos conjugais sobre as mulheres da tribo. Porque a promiscuidade, seja antes ou depois do casamento, é exceção entre os povos primitivos, que não apenas tentavam regular através de sistemas de casamento complicados e rigorosos os desejos sexuais daqueles que são competentes para se casar, mas na verdade para evitar qualquer relação sexual com aqueles que não são membros plenamente iniciados da comunidade.

“Pode-se esperar que uma instituição tão firmemente estabelecida sobrevivesse por devoção a outros usos, à medida que as ideias anteriores que levaram à sua fundação desaparecem. Como postos de guarda onde os jovens são confinados em serviço militar e onde são exercitadas artes da guerra, estas casas muitas vezes se tornam um meio útil de defesa. O culto religioso da comunidade frequentemente está centrado neles. Muitas vezes, eles constituem o teatro para representações dramáticas. Em raros casos, estas instituições parecem ter perdido sua finalidade original, e ter facilitado o comunismo sexual, ao invés da separação sexual. Entre algumas tribos, a casa dos homens é usada como centro de cerimônias de iniciação da puberdade. Com o desenvolvimento das sociedades secretas, substituindo as instituições tribais de puberdade anteriores, a casa dos homens frequentemente se torna a sede dessas organizações e constituem uma “loja“ secreta. A presença, então, da casa dos homens em qualquer de suas numerosas formas em uma comunidade primitiva indica fortemente a existência, agora ou no passado, de cerimônias secretas de iniciação.“ (Primitive Secret Societies, páginas 1, 2, 3)

Pode-se duvidar da precisão do Prof. Webster quando ele diz que “exemplos podem ser encontrados entre os povos primitivos em todo o mundo.” Não há muitos exemplos a serem encontrados na Ásia, e que pode muito bem ser que em determinadas partes do continente, a sociedade secreta primitiva nunca tenha sido conhecida: algumas autoridades têm a mesma opinião, Schurtz, por exemplo, que não foi capaz de descobrir vestígios das sociedades secretas de homens em grandes partes do continente. Em seu capítulo sobre “Difusão de Antigas Cerimônias”, o próprio Webster não forneceu exemplos asiáticos, mas limitou-se à Austrália, Tasmânia, Melanésia, Polinésia, América do Sul, América Central e América do Norte.

É impossível nas presentes limitações de espaço, estabelecer muitos exemplos do culto primitivo secreto: algumas amostras serão suficientes. Entre os ilhéus de Andaman existem três tipos de barracas, para os solteiros, solteiras e Casais, respectivamente. Aos onze anos, meninos e meninas são submetidos a diferentes provas e em cada caso devem participar de cerimônias elaboradas ao passar de um grau de idade a outro. As mulheres participam nestes mistérios, assim como os Homens. A maioria das tribos australianas têm cerimônias de iniciação em ou perto da época da puberdade. Na maioria dos casos, essas cerimônias são muito rigorosas, somente os Homens são admitidos; e o rito aparece geralmente como uma forma de preparação para o matrimônio. Os Masai dividem seus membros do sexo masculino em três classes de meninos, guerreiros e anciãos; suas cerimônias são acompanhadas de circuncisão. Entre os Ilhéus de Banks, os Homens constituem uma espécie de sociedade secreta tripla, mas a entrada neste grupo não ocorre através de iniciação, mas através do pagamento de uma taxa. Os homens vivem na Casa do clube da vila, que é um lugar de repouso e refeição durante o dia e dormitório à noite: eles são divididos em classes com poder e prestígio respectivos, e só os homens ricos podem chegar a posições mais elevadas.

Este mesmo povo tem “Sociedades Fantasmas”, que são muito secretas por natureza e têm sede nos lugares mais recônditos. Entre os índios Pueblo, os Zunis tinha uma sociedade “Dançarino Mascarado”, na qual havia graus, iniciações e muita palhaçada primitiva: cada sociedade tem sua sede própria loja onde havia compartimentos que representam os quatro cantos da bússola, o zênite, e o nadir. Os índios Hopi tinham fraternidades secretas semelhantes, assim como os Crows, que tinham uma “Sociedade do Tabaco”, com cerimônias de iniciação, diplomas, etc. O Hidatsas tinha muitos clubes sociais, onde a entrada era adquirida através de compra: suas mulheres tinham organizações semelhantes. Por outro lado, o Shoshoneans de Great Basin, aparentemente, nunca tiveram qualquer coisa que possa ser corretamente classificada como uma sociedade secreta. Estes casos são apenas típicas do inúmeros casos em que povos primitivos – ou selvagens como os chamamos – fizeram uso de organizações secretas.

II. A iniciação tribal é uma provação rigorosa

Na maioria dos casos, as cerimônias de iniciação têm a natureza de provas, e muitas vezes são tão rigorosas que morte ou permanente incapacitação não são inéditos.

A diversidade de provas é muito interessante. Assim, depilação, mordidas na cabeça, remoção de dentes, aspersão com sangue humano, imersão em poeira ou sujeira, flagelação pesada, escarificação, fumo e queimaduras, circuncisão e sub-incisão são algumas das formas em que as provas aparecem, só entre os australianos… De todas essas provações, a circuncisão tem o maior destaque… Quase universalmente, os ritos de iniciação incluem uma representação mímica da morte e ressurreição do noviço. A nova vida para a qual ele acorda da iniciação é uma totalmente esquecida da antiga, um novo nome, uma nova linguagem e novos princípios são o seu acompanhamento natural. Uma nova linguagem está intimamente associada ao novo nome. A posse de um discurso esotérico conhecido apenas aos membros iniciados é muito útil pois empresta um mistério adicional ao processo… As diferentes cerimônias que se realizam sobre a chegada das meninas à puberdade são nitidamente menos impressionantes que as dos meninos. Como regra, não há admissão em uma iniciação formal possuindo aspectos tribais e ritos secretos… Não há dúvida que diversas crenças originárias de muitas fontes diferentes se uniram para estabelecer a necessidade de separar meninos e meninas na puberdade.

O isolamento das coisas da carne e do sentido tem sido uma atitude não raramente empregado por pessoas de cultura avançada para a promoção da vida espiritual, e não precisamos ficar surpresos ao encontrar o homem não civilizado recorrendo a atitudes semelhantes para fins mais práticos. Os jejuns prolongados, privação de sono, a constante excitação do novo e inesperado, a reação nervosas sob tormentos longos e continuados resultam em uma condição de extrema sensibilidade – hiperestesia, que é certamente favorável à recepção de impressões que serão indeléveis. As lições aprendidas em uma escola tribal dessa natureza, como o é a instituição da puberdade, perduram por toda a vida.

Outro motivo óbvio ditando um período de reclusão é encontrado na sabedoria da separação completa dos jovens púberes das mulheres, até que aulas de contenção sexual tenham sido aprendidas. Nativos de Nova Guiné, por exemplo, dizem que “quando os meninos atingem a idade da puberdade, eles não devem ser exposto aos raios do sol, para que eles não sofram com isso; assim, eles não devem realizar trabalho manual pesado, ou o seu desenvolvimento físico será parado, todas as possibilidades de misturá-los com mulheres devem ser evitadas, sob pena de se tornarem imorais, ou a ilegitimidade se torna comum na tribo. Quando a casa dos homens é encontrada em uma comunidade tribal, essa instituição muitas vezes serve para prolongar o isolamento dos homens mais jovens iniciados por muitos anos após a puberdade ter sido atingida.” (Primitive Secret Societies, páginas 36, 37, 38, 41, 45, 47.)

As instituições da puberdade para a iniciação dos jovens na idade adulta estão entre as características mais difundidas e presentes na vida primitiva. Elas são encontradas entre povos considerados os menos desenvolvidos da humanidade: entre Andamaneses, hotentotes, fueguinos e australianos, e eles existem em vários estágios de desenvolvimento entre os povos emergentes da selvageria até a barbárie. Seus fundamentos remontam a uma antiguidade desconhecida; seus mistérios, zelosamente guardado dos olhos de todos, exceto os iniciados, preservam a religião e a moralidade da tribo. Embora variando infinitamente em detalhes, suas características principais se reproduzem com uniformidade substancial entre os diferentes povos e em áreas muito distantes entre si no mundo. A iniciação dos jovens da tribo pelos anciãos tribais, seu isolamento rígido, às vezes por um longo período das mulheres e crianças; sua sujeição a certas provas e ritos destinados a mudar completamente sua natureza; a utilização desse período de confinamento para transmitir aos noviços um conhecimento das tradições e os costumes tribais e, finalmente, a inculcação através dos métodos mais práticos de hábitos de respeito e obediência aos homens mais velhos – todas estas características são bem descritas no elegante e vigoroso relato por um antigo escritor de cerimônias praticadas uma vez pelos índios Tuscarora da Carolina do Norte.” (Ibidem, p. 32.)

Estas iniciações diferem notavelmente entre si, no entanto, todas e cada uma delas têm certas características fundamentais em comum. Em um parágrafo brilhante de um tratado sobre a Iniciação, na Enciclopédia de Religião e Ética de Hasting (Vol. VII, p. 317), o Conde Goblet d’Alvielia, que está tão alto entre os estudiosos maçônico europeus fornece uma lista dessas características:

As formalidades de iniciação, seja sua função dominante mágica ou religiosa, apresentam semelhanças marcantes. Andrew Lang observa as seguintes características gerais: (a) danças místicas, (b) a utilização do rombo, (c) rebocar com barro e lavar, (d) desempenho com serpentes e outros “feitos loucos”. A estes poderíamos acrescentar: (e) simulação de morte e ressurreição, (f) a concessão de um novo nome aos iniciados, (g) o uso de máscaras ou outros disfarces. Em todo caso, podemos dizer que as cerimônias de iniciação incluem: (1) uma série de formalidades que afrouxar os laços de ligação do neófito com seu ambiente antigo, (2) outra série de formalidades admitindo-o ao mundo sobrenatural, (3) uma exposição de objetos sagrados e instruções sobre assuntos que lhes dizem respeito; (4) ritos de reentrada ou reintegração, facilitando o retorno do neófito ao mundo comum. Estes ritos, especialmente os das três primeiras divisões, são encontrados com uma função mais ou menos importante em todas as cerimônias de iniciação, tanto entre selvagens quanto entre civilizados.” 

De onde vieram esses clubes secretos? Será que todos são originários de um centro? NW Thomas, escrevendo no Volume XI da Enciclopédia de Hasting, página 297, oferece uma resposta com a qual a maioria das autoridades concordaria:

Talvez possamos resumir a posição, dizendo que rastrear todas as sociedades secretas até uma origem única é provavelmente tão errado quanto rastrear todas as formas de religião a uma única fonte, ou tentar desvendar todas as mitologias com uma única chave. Parece claro que graus de idade, clubes de sepultamento, escolas de iniciação, irmandades religiosas, grupos ocupacionais, e sociedades mágicas têm contribuído para a massa de diversos elementos agrupados em sociedades secretas. O que não pode ser definitivamente estabelecido é que qualquer um desses teve um tipo inicial como modelo; como encontramos todos os seus estágios rudimentares em várias partes da África, precisamos, a menos que suponhamos que esses rudimentos sejam derivadas de sociedades totalmente desenvolvidas de outras tribos, supor que eles são a semente da qual, em outras áreas, as sociedades secretas vêm se desenvolvendo e que todos são igualmente primitivos, embora não necessariamente da mesma idade.

III. A Maçonaria evoluiu da Casa dos Homens?

Quando as sociedades secretas aparecem entre bárbaros e povos meio civilizados, eles mantêm muitas das características fundamentais descritas nas páginas acima, mas ao mesmo tempo, tornam-se extremamente diferentes e, muitas vezes são utilizados para fins completamente diferentes. Todos os leitores de literatura maçônica estão familiarizados com a história dos Druidas, dos Drusos, dos caldeus, dos Assassinos, etc., etc.: também as inúmeras sociedades secretas da China, que, parecem, na maioria dos casos, ser de caráter político, ao invés de moral ou religioso. Estas organizações bárbaras, ou semicivilizadas têm seus graus, sinais, segredos, palavras de passe e cerimônias de iniciação, assim como todas as outras, e não há necessidade, neste contexto, de particularizar entre elas ou prestar-lhes qualquer atenção adicional.

O leitor já terá notado certa semelhança entre algumas dessas associações e a nossa própria. Em alguns casos, essas semelhanças são tão marcantes que quase equivalem à identidade, como quando um dos nossos sinais maçônico é encontrado na posse de alguma seita selvagem. Contos de como os maçons salvaram suas vidas ou obtiveram outras vantagens entre povos selvagens através do uso de um dos sinais maçônicos estiveram entre as anedotas de nossa literatura por muitos anos.

O uso sensacional destes fatos tem sido feito recentemente pelo irmão J.S.M. Ward em seu “Maçonaria e os Deuses Antigos” publicado em 1921. O Irmão Ward corajosamente assume a posição de que as sociedades secretas primitivas, como aquelas descritas acima devem ser considerados parte integrante da Maçonaria, ou vice-versa. Ele assume essa posição muito claramente nos seguintes termos: “Corajosamente esta é a minha tese, de que o nosso sistema atual é derivado originalmente de ritos de iniciação primitivos de nossos ancestrais pré-históricos. Baseio esta afirmação no fato de que muitos dos nossos mais venerados sinais e símbolos, apertos e senhas são hoje utilizadas por raças selvagens precisamente com o mesmo significado que nós. Não posso concordar com aqueles que afirmam que isso é apenas uma questão de coincidência, ou ainda que eles sejam puramente sinais naturais que expressam sentimentos simples e elementares. “Esta declaração aparece na página 119 do seu livro. Na 123, ele repete isso em outras palavras:

Meu argumento, então, é que a Maçonaria deriva originalmente daqueles ritos primitivos que primeiro ensinaram um menino de onde ele veio, em seguida o preparou para ser um membro útil da sociedade e, finalmente, lhe ensinou a morrer e que a morte não era o fim de tudo. Em relação a estes ritos primitivos, eu considero, o homem construiu os mistérios e as diferentes confissões religiosas do mundo antigo, alguns dos quais sobreviveram até os nosso dias, enquanto outros se desenvolveram em outras religiões, incluindo o cristianismo.”

A tese é desenvolvida ainda em outras palavras, na página VIII do seu prefácio, onde ele diz:

“Resumidamente, a teoria que me atrevo a propor é que a Maçonaria se originou nos ritos de iniciação primitivos do homem pré-histórico, e a partir daqueles ritos foram construídos todos os mistérios antigos, e daí, todos os sistemas religiosos modernos. É por esta razão que os homens de todas as crenças religiosas podem entrar Maçonaria, e, ainda, a razão para não se admitir as mulheres é que estes ritos eram originalmente ritos de iniciação de homens, as mulheres tinham os seus próprios. Estes, por razões sociológicas pereceram, enquanto que os dos homens sobreviveram, e se desenvolveram nos mistérios.”

Se o irmão Ward fizesse valer a sua tese, ele provocaria uma revolução completa na antropologia. Uma sociedade secreta que existiu em todas as partes do mundo através de todos os muitos séculos da história seria o fato mais estupendo conhecidos da sociologia, e exigiria uma revisão completa de nossas teorias sociais. A coisa é estupenda demais para ter acontecido. Para se entender que a Maçonaria, como a conhecemos hoje, está em solidariedade com todas essas outras fraternidades secretas, é necessário ampliar os fatos em quase todos os pontos, para preencher as lacunas com suposições e hipóteses, e para ler nas cerimônias das tribos primitivas muitos significados e propósitos que nunca foram capazes de ter.

Ficou abundantemente claro nas citações acima de várias autoridades que todas as sociedades secretas têm uma cultura em comum e na natureza do caso, inevitavelmente, fazem uso de sinais, símbolos, cerimônias, graus, lojas, iniciações, etc., de modo que se uma nova sociedade secreta surge, criada ab initio por seus próprios membros, ela terá, necessariamente, muitas características em comum com outras organizações similares, de modo que um pouco de imaginação sempre facilitará para os homens acreditar que o que foi recentemente criado já existia em outros lugares durante muitos séculos. Nada é mais fácil que criar tradições e história antiga para um culto secreto; e isso porque ele é munido de muitos usos que outros cultos secretos empregaram em tempos passados. A Maçonaria não é exceção a esta regra. Quase tudo nela pode encontrar paralelo em sociedades semelhantes que existiam há centenas de anos, e sempre há a tentação de emprestar delas a autoridade e o prestígio da antiguidade.

Muitas vezes, encontram-se atribuídos a uma época muito antiga símbolos que foram criados, de acordo com nosso conhecimento positivo em tempos recentes. “A Virgem chorando sobre uma coluna quebrada” é o caso abordado aqui. Ela foi idealizada por um Maçom Americano cerca de cem anos atrás, mas só recentemente eu li um artigo que procurava mostrar que este símbolo tinha sido emprestado de Mistérios Antigos pela Maçonaria.

Irmão Ward tenta provar que Os Altos Graus são tão antigos quanto os Graus do Simbolismo. Para um leitor americano familiarizados com a história do Rito Escocês, ele não terá muito sorte. Sabemos que o próprio Albert Pike, sozinho e sem ajuda criou uma grande parte da estrutura elevada e bela do ritual do Rito Escocês, de modo que tem sido dito sobre ele que ele encontrou o Rito Escocês uma cabana de madeira e o deixou em um palácio de mármore. Mas, há muitas coisas nas cerimônias do Rito Escocês mais antigas que a história, alguém poderia argumentar. É verdade, mas nós sabemos como elas chegaram ali: Albert Pike as tirou de sua própria aprendizagem dos livros antigos. Muito do material é muito antigo, mas a estrutura em ele as construiu e o uso em que ele os colocou data do trabalho de Albert Pike, ou, no máximo, de seus antecessores imediatos.

O verdadeiro cerne de toda esta discussão pode ser colocando em forma da pergunta, Qual a idade da Maçonaria? Essa questão nunca perde a sua vitalidade, e parece ter um fascínio inesgotável para os maçons. A resposta depende do significado que se atribui à palavra Maçonaria. Se por Maçonaria queremos dizer qualquer tipo de organização secreta, então ela é tão velha quanto o mundo. Se for usada sobre qualquer sociedade secreta que emprega alguns de nossos sinais ou símbolos, então ela pode ser traçada aqui e ali, em muitas terras e através de muitos séculos. Se ela é usada no sentido mais estrito para indicar um homem que foi iniciado em uma loja regular da Maçonaria simbólica trabalhando sob a autoridade de uma Grande Loja regular, então a Maçonaria tem apenas 300 anos de idade. Se for para ser usado sobre organizações com as quais esta moderna maçonaria especulativa pode traçar uma continuidade histórica inegável, então ele pode ser datado até os séculos XII ou XIII. De uma coisa podemos ter certeza, a casa dos homens, uma loja em que irmãos encontram por trás de portas fechadas, não é uma coisa moderna e artificial, mas brota da própria natureza humana, para satisfazer as necessidades que foram sentidas desde que o homem começou a ser.

Autor: H.L. Haywood
Tradução: José Filardo

Fonte: BIBLIOT3CA

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LIVROS CONSULTADOS NA PREPARAÇÃO DESTE ARTIGO

Lowie, Primitive Society. J.S.M. Ward, ; Freemasonry and the Ancient Gods. Webster, ; Primitive Secret Societies. Frazer, Golden Bough. ; Hasting’s Encyclopedia of Religion and Ethics, Vol. VII, p. 314; XI, p. 287. Smith, ; Religion of the Semites. Heckethorn, ; Secret Societies. Lang, ; Myth, Ritual, and Religion. Thomas, ; Source Book For Social Origins. Rivers, ; The Todas. Tyler, ; Primitive Culture. Wallace, ; The Malay Archipelago. Coote, ; The Western Pacific. Upward, ; The Divine Mystery. Capart, ; Primitive Art. Evans, ; Tree and Pillar Cult. Harrison, ; Ancient Art and Ritual. Maspero, ; Dawn of Civilization. Wright, ; Indian Masonry. Giles, ; Freemasonry in China.

REFERÊNCIAS SUPLEMENTARES

Vol. I (1915) – Ancient Evidences, p. 18; The Golden Bough, p.22; The Men’s House, p. 308. Vol. 11 (1916) – Masonic Tradition, p. 189; Indian Masonry, p. 190; The Meaning of Initiation, p. 205; Masonic Signs, p. 253; Indian Freemasonry, p. 371. Vol. III (1917) – A Central African Mystery, p. 15; The Origin of Druidism, p. 22; The Initiatory Rites of Druidism, p. 35; Masonry Among Primitive Peoples, p. 38; Secret Societies of Islam, p. 84; Aboriginal Races and Freemasonry, p. 96; Chinese Signs, p. 156; The Men’s House, p. 209. Vol. IV (1918) – Definitions of Masonry, p. 125; The Voice of the Sign, October, C.C.B., p. 4; The Divine Mystery, p. 334; The Mysteries of the Art of the Caverns and Early Builders, p. 366. Vol. V (1919) – Legendary Origin of Freemasonry, p. 297, Vol. VI (1920) – A Bird’s-Eye View of Masonic History, p. 236; The Purposes of Legends and Myths, p. 258; Freemasonry Among the American Indians, p. 295. Vol. VII (1921) – Whence Came Freemasonry, p. 90; Little Wolf Joins the Metawin, p. 281. Vol. VIII (1922) – American Indians and Freemasonry, P. 71; Freemasonry and the Ancient Gods, pp. 88, 151, 152, 153; Masonry Among the Chippewa Indians, p. 126; A Mediating Theory, p. 318; Traces of Masonry Among Indians and Worth Americans, p. 354. Mackey’s Encyclopedia – (Revised Edition): Albert Pike, p. 563; Assassins, p. 82; China, p. 147; Chinese Secret Societies, p. 148; Civilization and Freemasonry, p.153; Culdees, p. 191; Degrees, p. 203; Druidical Mysteries, p. 220; Druses, p. 221; Initiation, p. 353; Man, p. 461; Primitive Freemasonry, p. 584; Scottish Rite, p. 671; Secret Societies, p. 677; Woman, p. 855.

A Maçonaria e os Construtores de Catedrais

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I. O que foi o Gótico

A palavra Gótico tornou-se associada em nossas mentes a muito do que é mais bonito no mundo – catedrais, igrejas, torres e uma forma antiga de decoração – mas para os artistas italianos da Renascença que lhe deram notoriedade ela tinha um significado bastante diferente, e era usada por eles como um termo de reprovação para significar a cultura dos bárbaros do norte, especialmente de sangue alemão, que tinham rompido com as tradições clássicas. Vasari parece ter sido o responsável, acima de qualquer outra pessoa, por este uso.

O Gótico foi primeiro aplicado a toda a cultura bárbara (eu uso a palavra aqui em seu sentido renascentista); mas mais tarde, e depois que os homens começaram a entendê-la e apreciá-la, era mais restritivamente aplicada ao que era mais característica da cultura bárbara, a arquitetura; e em ainda no período mais tardio, e através do uso popular, tornou-se associada quase exclusivamente à arquitetura religiosa, e mais especialmente às catedrais, de modo que encontramos o grande Novo Dicionário Inglês dando-lhe a seguinte definição:

“O termo para o estilo de arquitetura predominante na Europa Ocidental do século XII ao século XVI, cuja característica principal é o arco ogival; também aplicado aos edifícios, detalhes de arquitetura e ornamentação. Os nomes mais comuns para os períodos sucessivos neste estilo na Inglaterra são Inglês Antigo, Decorativa, e Perpendicular.”

Resultado de imagem para arco ogivalArco ogival

Esta definição não é tão precisa quanto poderia ser. Muitas autoridades sobre história da arquitetura não concordariam com a afirmação de que “a principal característica é o arco ogival”, pois eles têm outras teorias sobre o assunto. Também não é seguro aplicar a palavra apenas à arquitetura, porque existiam estilos góticos em roupas, pontes, paredes, móveis, na ornamentação, nos costumes, e até em utensílios domésticos. Acontece que pouco resta do gótico, exceto edifícios de igrejas, mas isso se deve às guerras que destruíram tudo o mais.

Alguns dos melhores escritores sobre o assunto, Lethaby, por exemplo, cujo trabalho é recomendado por sua energia, interesse e erudição, torna o gótico equivalente a tudo especificamente medieval em arte, o que incluiria vitrais, manuscritos, poesias, etc. Esses autores destacam que só quando surgiram os arqueólogos do século XIX, sob a liderança de De Caumont e seus companheiros, os homens começaram a dar um uso restrito à palavra. “A palavra”, escreve Arthur Kingsley Porter, “aplicada pela primeira vez como um epíteto de opróbrio a todos os edifícios medievais pelos arquitetos do Renascimento, recebeu um significado técnico por De Caumont e os arqueólogos do século XIX, que a empregavam para distinguir prédios com arcos pontiagudos daqueles com arcos redondos, que eram chamados Românicos”. Alguns autores continuam simplesmente a se recusar a usar a palavra; Rickman prefere “Arquitetura Inglesa”, e Brion “Arquitetura Cristã”. O Dr. Albert G. Mackey diz: “que a arquitetura gótica foi, por conseguinte, muito justamente chamada de A Arquitetura da Maçonaria, mas daquela de outros tempos”.

O antigo estilo romano de construção, no qual todos os estilos subsequentes na Europa Ocidental estavam baseados até a chegada do Gótico, e que vieram a serem chamados Românicos, era organizado com base em um princípio muito simples, e teve o seu início, pelo menos até onde se relacione com templos, igrejas e catedrais, na antiga basílica. Um telhado plano era colocado sobre quatro paredes, como a tampa de uma caixa. Se o telhado era ondulado ou arqueado, as paredes tinham que ser engrossadas, para suportar a pressão lateral, de modo que em edifícios maiores, onde era necessário muito espaço interior, as paredes recebiam necessariamente uma espessura maciça, e esta espessura, por sua vez,tornava necessário usar pequenas janelas, para que a ancoragem fornecida pelas paredes não fosse enfraquecida e o colapso do edifício evitado. Em consequência disto, os edifícios românicos eram como fortificações militares em seu achatamento, sua aparência pesada e seu interior sombrio. Os arquitetos góticos escaparam desses resultados infelizes através da utilização do arco ogival que lhes permitiram considerável aumento em sua altura interior, e eles aprenderam como anular a pressão lateral daqueles arcos por meio de contrafortes, ao invés de muros pesados como cais. Isso eliminou o grande peso das paredes laterais e permitiu que os construtores substituíssem pedra por vidro, destruindo imediatamente a obscuridade desagradável. No decorrer do tempo, o sistema de colunas, arcos e contrafortes arcobotantes tornou-se um tipo coisa em si, coma estrutura de uma máquina, de modo que o esqueleto de um prédio se tornou autossuficiente, e pode-se dizer que dispensava simplesmente as paredes. É nesta estrutura organizada para ser autossustentável, que mais distingue o gótico como um todo do seu antecessor, o Românico; sendo as características que tornaram possível esta façanha – o arco, a abóbada, e o arcobotante – secundárias.

Este é o ponto da famosa descrição do gótico de Violet-le-Duc, habilmente resumida por C.H. Moore com estas palavras: “Um sistema que foi uma gradual evolução a partir do estilo Romanesco, e aquele cuja característica distintiva é que todo o caráter do edifício é determinado por, e toda a sua força reside em uma estrutura finamente organizada e francamente confessada, ao invés de paredes.”

Moore forneceu, ele mesmo, uma definição ainda mais famosa, e facilmente compreendida:

“Em suma, então, a arquitetura gótica pode ser resumidamente definida como um sistema de construção em que a abóbada sobre um sistema independente de costelas, é sustentada por pilares e contrafortes, cujo equilíbrio é mantido pela ação contrária da impulsão e do contragolpe. Este sistema é adornado por esculturas cujos motivos são retirados da natureza orgânica, convencionada em obediência às condições arquitetônicas, e regidas pelas formas adequadas estabelecidas pela arte antiga, complementada por desenhos coloridos sobre chão opaco e, mais amplamente em vidro. É uma arquitetura da igreja popular – o produto dos artesãos seculares trabalhando sob o estímulo das aspirações nacionais e municipais, e inspirados por fé religiosa”.

Moore acha a chave para o Gótico no arcobotante.

Outras autoridades têm outras teorias. Porter acha que está na abóbada; Phillips no arco ogival, o que ele transformou no alfa e o ômega de todo o sistema; Gould acredita que o as abóbadas de pedra são fundamentais, enquanto Lethaby parece achar a quintessência do gótico nesta ou naquela característica, mas no caráter medieval geral dela como um todo.

II. Quem inventou o Gótico?

Tem havido uma grande diferença de opinião entre os historiadores da arquitetura quanto a onde e quando começou o Gótico. Escritores ingleses, que têm um desejo muito natural de reivindicar para sua própria terra a glória da descoberta da arte, a datam de 1100 DC ou mais cedo, e encontram suas primeiras manifestações em Durham; enquanto que os escritores franceses sustentam quase unanimemente que o gótico começou primeiro de todas as regiões em redor de Paris, no que já foi chamado de Ile de France, e dizem que a Igreja da Abadia de St. Denis, iniciada em 1140, deve ser considerado como o primeiro monumento gótico conhecido. Parece que a maioria dos escritores mais modernos inclina-se a concordar com a teoria francesa. Porter data o novo estilo como se iniciando em Paris por volta de 1163, e diz que ele alcançou seu ponto culminante no ano de 1220, com a nave de Amiens.

Resultado de imagem para gothic architectureNave de Amiens

Goodyear, em seu Arte Romana e Medieval, faz um relato bastante preciso e muito condensado da origem e do crescimento do gótico em um parágrafo muito apropriado para citação a este respeito. Ele diz que

“o gótico tardio é conhecido na França como extravagante, ou seja, florido (ou flamejante). Caso contrário, as designações do Gótico como ‘inicial’, médio’ e ‘tardio’ são aceitas. Deve ser entendido que não há limites definidos entre esses períodos. Falando de maneira geral, o final do século XII foi o tempo em que o Gótico surgiu da França, e ele é raramente encontrado em outros países antes do século XIII; os séculos XIII e XIV são, ambos, períodos de grande perfeição, e o século XV é o momento de relativa decadência. Tanto na Alemanha quanto na Inglaterra o século XIII foi o momento da introdução do estilo gótico. Na Itália ele nunca foi plena ou geralmente aceito. Dentro do campo do gótico propriamente dito (isto é, excluindo a Itália), a Inglaterra é o país onde as modificações locais e nacionais são mais evidentes, muitas delas mostrando que o estilo era mais ou menos praticado de segunda mão. Na pitoresca beleza e atratividade geral, as catedrais inglesas podem ser comparadas a qualquer outra, mas a preferência deve ser dada aos franceses no estudo da evolução do estilo.” (Pág. 283.)

De onde os arquitetos góticos tiraram o segredo de sua nova arte? As teorias são tão numerosas quanto diferentes, e elas vão desde as sublimes até as ridículas. Lascelles acreditava que os construtores haviam aprendido seus arcos ogivais de seções transversais da arca de Noé! Stukeley e Warburton sustentavam que eles tinham tropeçado em seu novo princípio ao tentar imitar os bosques secretos dos druidas. Ranking argumentava que o gótico é gnóstico por natureza para suportar uma grande massa de dados. Christopher Wren alegava que ele tinha sido tomado emprestado dos Sarracenos. Findel e Fort atribuíam, ambos, a descoberta da arte aos alemães, e com isso Leader Scott concorda em seu agora famoso Construtores de Catedrais, exceto que ela parece defender que os Mestres Comacine eram missionários que a levaram para a França e para a Inglaterra. O Dr. Milner acreditava que o gótico era uma alteração dos arcos do estilo românico, uma teoria com a qual muitos concordam. Em uma contribuição para a Ars Quatuor Coronatorum que provocou uma grande celeuma na época, Hayter Lewis insistia em que tal princípio definido e claramente articulado devia ter sido obra de um único homem, e sugeriu Suger, o ministro do rei Louis, o Grande, da França, país que era, nessa época, pouco mais que uma pequena tira não muito maior que a Irlanda. O Governador Pownall acreditava que o gótico se originava de práticas de trabalho em madeira; enquanto alguns teóricos escoceses acreditavam que ele era provenientes de trabalhos em vime. Gilbert Scott, um escritor de grande autoridade na sua época, rejeitava todas estas derivações especiais e argumentava que o gótico evoluiu gradualmente, oral e inevitavelmente, a partir de condições já existentes na arquitetura e na sociedade; com o que Gould está de acordo, assim como a maioria dos escritores do presente. Gould coloca toda a questão em uma frase: “As pesquisas de escritores posteriores e mais bem informados, no entanto, deixaram claro que o gótico não era imitação ou importação, mas um estilo nativo, que surgiu aos poucos, mas quase que simultaneamente em várias partes da Europa.” (História da Maçonaria, vol. I, p. 255.)

III. Foram arquitetos góticos os primeiros maçons?

Na época em que o gótico fez a sua aparição, quase toda a arte, incluindo a arquitetura, ainda estava sob o controle das ordens monásticas; mas com o desenvolvimento das catedrais a arte passou ao controle leigo. Alguns acreditam que a escassez de registros sobre os próprios construtores deve-se ao orgulho de cronistas, quase sempre eclesiásticos, que desprezavam mencionar os trabalhadores, exceto de forma mais geral. Esses trabalhadores, como quase todos os outros artesãos da época, eram organizados em corporações (guildas). As guildas diferenciaram muito entre si com o tempo e lugar, mas em todas as suas diferentes modificações retiveram características bem definidas. Cada guilda era uma organização estacionária que geralmente possuía o monopólio do comércio em sua própria comunidade, cujas leis eram obrigatórias para os artesãos. As guildas de um comércio não exerciam qualquer controle sobre os de outra, mas todos concordaram com determinadas regras e práticas, tais como aquelas relacionadas com aprendizagem, compra de matérias-primas, marketing, e tudo isso. Em algumas comunidades, as guildas tornaram-se tão poderosos que alguns historiadores têm confundido o seu governo com o governo de sua cidade, mas é provável que isto nunca tenha acontecido com frequência, se é que aconteceu.

Acredita-se que, devido a peculiaridades de sua arte, as guildas que tinham a incumbência da construção das catedrais tornaram-se diferenciadas de outras em alguns elementos muito importantes. Se isso realmente aconteceu, era um resultado muito natural das circunstâncias em que os construtores das catedrais trabalhavam. A deles era uma vocação única. Todas as outras construções eram totalmente diferentes de catedrais, e não era frequente que as cidades pudessem dar-se o luxo de ter uma, de modo que nunca havia grande abundância de trabalho para elas. Além disso, sua arte era particularmente difícil, e envolvia a posse e aprendizagem de muitos segredos incomuns, de modo que a própria natureza do trabalho diferenciava o artesão construtor de catedrais de outros membros da guilda. Historiadores cautelosos acreditam que depois de um tempo, as autoridades, reconhecendo a especificidade da arte dos construtores de catedrais, concedeu-lhes certos privilégios e imunidades, e permitiram que eles se movessem à vontade de lugar para outro, o que por si só os definia nitidamente como diferentes das guildas estacionárias, cada uma delas não sendo autorizada a trabalhar fora de seus próprios limites incorporados; e muitos escritores acreditam que devido a essa liberdade para se movimentar sem restrições pelas limitações comuns de privilégios do costume medieval, que estas guildas, ou Maçons (a palavra significa “construtores”), vieram finalmente a serem chamadas de “maçons livres ou francos”. O Governador Pownall escreveu uma página certa vez, para provar que mesmo os papas concederam privilégios especiais a estes construtores, mas pesquisas posteriores na biblioteca do Vaticano não permitiram que ele, ou outros pesquisadores depois dele, descobrissem as bulas papais.

IV. Os construtores góticos formavam uma grande fraternidade?

Escritores da velha guarda costumavam acreditar, quase unanimemente, que esses maçons medievais eram ligados em uma grande fraternidade unificada operando sob o controle individual de alguns centros, tais como Londres, Paris, Nova York, e argumentavam que esta “grande fraternidade única”, com certas mudanças importantes, mas não revolucionárias, existiu até ao nosso tempo, e que a Maçonaria de hoje é praticamente a mesma organização que era então. R. F. Gould, que falava por um grupo inteiro de estudiosos maçons ingleses de primeira classe, bem como por si mesmo, negava categoricamente toda essa teoria da forma mais ampla e inequívoca. “Eu demonstrei”, disse ele na página 295 do primeiro volume de sua História da Maçonaria, “que a ideia de um corpo universal de homens trabalhando com um só impulso, e segundo uma forma definida, a pedido de um organismo cosmopolita sob certa direção… é um mito.” Na página 262 do mesmo volume, ele comenta que a teoria de uma fraternidade universal “é desmentida pelo silêncio absoluto de toda a história”. Com este veredicto, Arthur Kingsley Porter, que escreveu apenas como historiador da arquitetura medieval, e não tendo qualquer um dos problemas da Maçonaria em mente, concorda, e em grande medida pelo mesmo motivo.

Gould baseia sua negação quase totalmente nos testemunhos dos próprios edifícios, e argumenta que, embora um escritor aqui e ali possa errar, as construções não o fazem, e ele sustenta que elas, todas e cada uma delas, oferecem um testemunho unificado de que não eram o trabalho de “uma grande fraternidade”, mas representavam peculiaridades locais que não devem ser negligenciadas. Sua análise da arquitetura gótica dos diferentes países, com o propósito em vista de revelar o seu testemunho sobre este ponto importante é uma das conquistas mais belas de sua monumental História. É provável que a grande maioria dos historiadores atuais de arquitetura medieval concordaria com ele.

A história das diferentes artes e artefatos que tornaram possível o gótico parece corroborar esta posição. Todos os fatos conhecidos sobre a evolução do gótico provam que ele passou a existir de forma gradual, e que nenhuma organização jamais possuiu os seus segredos em momento algum, e que o arco, o arcobotante, abóbada, e outros recursos tão característicos foram aprendidas através de dolorosa experiência, e independentemente uns dos outros. Porter fala sobre o arcobotante como “um novo princípio” e um “que mais do que qualquer outro assegurou o triunfo da abóbada e um princípio cuja descoberta marca o momento em que a arquitetura gótica apareceu pela primeira vez.” Na página 92 do volume II de sua grande obra, Arquitetura Medieval, uma produção magistral cuja leitura todo estudante da Maçonaria deveria empreender, ele escreve o seguinte: “Dai ser provável que as vantagens e possibilidades do arcobotante não fossem imediatamente totalmente apreciadas, e, embora nova construção fosse livremente aplicada nos casos em que diante de ameaça de queda da abóbada sua aplicação fosse exigida, mesmo edifícios de dimensões consideráveis continuaram a ser erguidos sem o seu auxílio. Esta característica importante, sem a qual o gótico nunca poderia ter surgido foi o trabalho de experimentação gradual, e os construtores aprenderam sobre ele lentamente, um pouco aqui, um pouco ali, e em alguns lugares eles nunca o dominaram completamente: se o segredo do arcobotante tivesse sido conhecido antecipadamente por qualquer grande fraternidade de artesãos, toda esta evolução dolorosa e cara teria sido desnecessária.”

O mesmo pode ser dito do arco ogival que foi tão essencial ao gótico que frequentemente seu próprio nome tem sido dado ao estilo. Porter mostra que o arco como unidade de construção era muito antigo e usado muito antes de os Cruzados terem tomado Jerusalém; e que ele foi adotado pelos construtores góticos lentamente e só sob coação; seu uso para fins ornamentais só veio tarde e no início do gótico os construtores se apegavam ao uso de antigo arco redondo, enquanto foi possível.

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O Arco Românico

Não há necessidade de multiplicar os exemplos. A geometria, que era às vezes utilizada como sinônimo da própria arte de construir e, mais particularmente, com o gótico, e que foi obviamente de tanta importância nunca foi conhecida como uma ciência meramente abstrata, e se impôs gradualmente depois de inúmeras experiências e testes de tentativa e erro. Não há evidência de que qualquer grupo de homens a tenha jamais possuído e em sua totalidade, que é o que teria sido necessário para que “uma grande fraternidade” tivesse a empresa de construção medieval na mão. A história de ornamentação românica em estruturas gótico conta uma história semelhante, e assim o faz o uso de vitrais, que Porter mapeia até a Ile de France, e que passou a existir de forma gradual e lenta.

Em suma, a história da arte verifica o testemunho dos próprios edifícios; tudo foi uma evolução gradual, e de acordo com a moda do momento, com base em condições contemporâneas e a partir de métodos e costumes pré-existentes. Quando se olha casualmente para trás na história medieval no conforto de uma poltrona, e se olha para ela como um espetáculo pairando no ar, o gótico pode parecer ter começado a existir quase imediatamente, como uma deusa saindo da cabeça de Zeus; mas um exame mais cuidadoso dos fatos mostra que a velha teoria de uma grande fraternidade conferindo ao mundo uma arte completamente nova e toda uma nova cultura é uma ilusão agradável.

Poderíamos ainda acrescentar ao argumento o testemunho da história, que é o testemunho de silêncio. Se a arte gótica estava na posse de uma única grande fraternidade, então aquela surpreendente sociedade também devia ter em mãos a construção de estradas, pontes, muros, residências particulares, fortalezas, moinhos, e também teria ensinado às pessoas como fazer as suas roupas e ornamentar suas residências, pois, como já foi dito, a arte gótica era uma continuação da arte medieval. Uma sociedade dotada de tal sabedoria, e trabalhando em todos os centros na Europa teria sido tão universal quanto a Igreja Católica da época, e teria deixado um registro volumoso; mas o fato é que existe essa falta de registros, até mesmo dos construtores de catedrais, que mesmo agora, e após um século de constantes pesquisas no terreno por peritos, muito pouco se sabe dos construtores de catedrais, de modo que é necessário descobrir o caminho no escuro, sempre que alguém se dispõe a aprender algo sobre eles.

A arquitetura gótica não foi o resultado do trabalho de qualquer grupo isolado, mas de todos os grupos e classes que compunham o décimo segundo, o décimo terceiro e o décimo quarto séculos na Europa e na Inglaterra. Neste último país, basta recordar os reinados de Henrique II e do Rei João, de quem a Carta Magna foi arrancada para lembrar em que efervescência estava tudo, e quão vigorosa era a vida comunitária. Na Europa ocidental, ocorria a mesma coisa. Os sucessores dos Capeto criaram nos territórios francos, e com Paris como seu centro, um império comparável ao da própria Roma. Foi a época em que as cidades alcançaram a independência, quando reis se tornaram poderosos monarcas contra a regra divisiva de senhores feudais e barões; quando o papado estendeu seu poder aos limites da cristandade, com a consequência de que algo como unidade estivesse afetado à vida moral e religiosa das partes constitutivas; e esta vida moral e religiosa tornou-se poderosa o suficiente para enviar os cruzados à Palestina para a captura de Jerusalém. A maior de todas as maravilhas da catedral gótica é a idade que a produziu. No meio das brigas de barões ladrões; em meio ao clamor das comunas e facções em conflito; em meio à ignorância e superstição da Igreja, essa arte encantadora, ao mesmo tempo tão intelectual e tão ideal, floresceu como uma explosão. Parece quase como um anacronismo que esta arquitetura devesse ter surgido durante a turbulenta Idade Média. Mesmo assim, a arquitetura gótica, embora em um sentido tão claramente oposto ao espírito dos tempos, estava no entanto, profundamente imbuída desse espírito dos tempos, e só pode ser entendida quando considerada em relação às condições políticas, eclesiásticas, econômicas e sociais contemporâneas. Porque o século XII, apesar de sua escuridão era ainda um período muito avançado em relação ao que tinha acontecido antes – tanto que M. Luchaire não hesita em chamá-lo ‘A Renascença francesa’.

“A revolução intelectual foi acompanhada por uma revolução econômica não menos radical. Herr Schmoller até mesmo o comparou ao que ocorreu no século XIX. Nas cidades, os trabalhadores foram liberados da servidão, e começaram a se unir em corporações livres, e o mesmo processo operou em menor grau entre os vilões ou servos do país. As vantagens econômicas desta emancipação foram incalculáveis. As romarias, as jornadas dos cavaleiros franceses a todas as partes da Europa, e acima de tudo as cruzadas, abriram aos comerciantes um campo de atividade até então inimaginável. As guildas de mercadores, que nunca tinham sido tão numerosas e tão fortes; as relações comerciais que foram estabelecidas entre a Normandia e a Inglaterra; a prosperidade redobrada de Montpellier e Marselha; a multiplicação de mercados; a crescente importância das grandes feiras de Champagne – todas essas condições traem uma transformação radical nas condições materiais da população. Em toda parte, a condição do trabalhador foi facilitada; em toda parte as cidades aumentaram sua produção econômica, e ampliaram seus negócios; em todos os lugares as pontes foram reconstruídas e reparadas; e por todos os lugares novas estradas foram abertas. E com o comércio, veio a riqueza.” (Páginas 145, 147, Arquitetura Medieval, Porter Vol. II)

Esta nova vida também se manifestou na especulação teológica, algumas das quais eram tão audaciosas que homens foram martirizados na fogueira por suas opiniões; na filosofia e do estudo do direito; em organizações políticas e em arte. Uma nova vida rompeu em todos os lugares, e de sua riqueza veio, como sua flor consumada, a catedral gótica.

Mas como, pode-se perguntar razoavelmente, podemos entender a unidade da arte gótica em um momento em que o mundo estava muito dividido, e a intercomunicação entre os países muito difícil? A questão é bem levantada, mas ela pode ser facilmente respondida. A unidade do ofício era devida à união do trabalho realizado pelo ofício; a técnica gótica impôs sua própria unidade sobre os trabalhadores e suas atividades, como essas coisas sempre fazem. Phillips mostrou que se alguém traçar um gráfico mostrando a construção de cada uma das catedrais francesas em sucessão, os locais começarão, grosso modo, próximos a Paris e, em seguida, se ampliarão em curvas concêntricas, provando assim que os novos conhecimentos de arquitetura aprendidos no centro irradiavam-se para fora, como o conhecimento é capaz de fazê-lo.

Temos em nosso meio abundantes exemplos de tal evolução. O mundo está cheio de motores a vapor de vários tipos, mas nem por isso acreditamos que o segredo de vapor foi propriedade privada de uma organização secreta; sabemos que o motor a vapor começou com Watt, em 1789, e que cada inventor copiou o trabalho de seu antecessor e adicionou suas próprias melhorias e modificações. Existem centenas de escolas médicas neste e em outros países que usam a mesma terminologia técnica (comparável à “linguagem secreta” dos cultos antigos); elas empregam os mesmos tipos de instrumentos, têm regras semelhantes, e todas proporcionam a seus alunos uma educação que é formalmente reconhecida em outras escolas em todo o mundo. Sabemos que esta unidade de organização médica nunca foi criada no início por “uma grande fraternidade”; ela cresceu a partir da natureza da técnica empregada; a unidade formal agora nas mãos de associações médicas nacionais não é a causa, mas o resultado da unidade imposta pela própria profissão.

Eu acredito que alguma coisa semelhante aconteceu no que diz respeito às guildas de construtores da Idade Média. Estes corpos tinham uma unidade, mas era devido à natureza do trabalho, e surgiu inevitavelmente. Eles trocavam associações, como fazem hoje as sociedades médicas, ou de direito, ou de arte, porque o trabalho realizado era basicamente o mesmo. Eles desenvolveram uma ética de sua própria profissão e mantiveram todas as guildas rigorosamente sob a mesma, assim como fizeram as guildas estacionárias, e como fazem hoje as sociedades médicas locais e similares, sempre autogovernadas. A unidade assim desenvolvida a partir da natureza do trabalho em si gradualmente se cristalizou em constituições e tradições; e essa unidade, finalmente, na Inglaterra do século XVIII, e devido a mudanças profundas nas condições sob as quais as guildas, ou lojas operavam, transformaram-se em unidade formal que é representada pela autoridade e poder de Grandes Lojas. Desde o momento no início do século XII, quando as guildas construtoras de catedrais começaram a existir, até que a Maçonaria especulativa nascesse em 1717 como uma sociedade formalmente organizada, nunca houve uma ruptura na continuidade histórica, mas ocorreram importantes mudanças evolutivas. Legal e tecnicamente, nossa atual Maçonaria começou em Londres em 1717; historicamente, e em uma visão mais ampla, ela começou na Europa nos séculos XI ou XII.

Mas, mesmo naqueles primeiros dias, os construtores não começaram desde o começo. Eles tiveram antecessores e antepassados em cujos ombros eles se apoiaram, e de cuja arte eles desenvolveram as suas próprias. Será necessário considerar isso, para completar o quadro; isso será feito em alguns próximos capítulos, e como introdução para um desenvolvimento ainda maior do tema apresentado nesta Nota: A História da Maçonaria de Gould foi, na realidade, o trabalho de um grupo de homens, e era a intenção inicial ter os nomes de todos na página de título. Tenho esta informação diretamente de um dos membros do grupo.

Autor: H.L. Haywood
Tradução: José Filardo

Fonte: REVISTA BIBLIOT3CA

A seguir algumas questões para você, caro leitor:

O que significa originalmente a palavra gótico? Qual é a definição dada pelo Novo Dicionário Inglês? Como Lethaby define gótico? Dê a substância da descrição de Porter do gótico. Qual era o princípio sobre o qual a arquitetura românica estava baseada? Descrever o princípio geral da arquitetura gótica, conforme explicado pelo irmão Haywood. Dê a explicação de Moore com suas próprias palavras. Você pode citar qualquer espécime de arquitetura gótica em sua própria comunidade? Você pode citar alguma catedral gótica nos Estados Unidos? Por que a arquitetura gótica é considerada particularmente adequada para edifícios de igrejas? Alguma vez em sua própria mente você ligou a arquitetura gótica à Maçonaria? Se sim, qual foi a sua teoria daquela conexão?

Onde e quando começou o gótico? Dê em suas próprias palavras um esboço da história gótica. Quais são algumas das várias teorias sobre a origem do gótico? O que tudo isso tem a ver com a história da Maçonaria? O que era uma Guilda? Por que os edifícios góticos são diferentes dos outros? Qual é o significado da palavra Maçom? Como surgiu a palavra ”Maçonaria”? 

Qual era a teoria da ”única grande fraternidade”? Qual é o veredicto de Gould sobre essa teoria? De que maneira a história da arte gótica tende a desmentir a ”teoria de uma só grande fraternidade”? Dê exemplos para mostrar que a arquitetura gótica desenvolveu-se gradualmente. Diga algo sobre a época em que gótico surgiu. Como você explica a unidade da Arte da Maçonaria na Idade Média? Dê alguns exemplos modernos. A maioria dos historiadores da ”Maçonaria” concorda que nossa fraternidade teve sua origem entre as guildas da Idade Média: como você afirma aquela teoria em suas próprias palavras? Que importância tem esta teoria em nossas interpretações e obrigações da maçonaria nos dias de hoje?

LIVROS CONSULTADOS NA PREPARAÇÃO DESTE ARTIGO

Medieval Art – W.R. Lethaby. ; Westminster Abbey and the King’s Craftsmen – W.R. Lethaby. ; Architecture – W.R. Lethaby; Freemasonry before the Existence of Grand Lodges – Lionel Vibert. ; Story of the Craft – Lionel Vibert. ; Ars Quatuor Coronatorum, Vol. III, p. 13; 70. Ibid., Vol. XXXIII, p. 114. ; New English Dictionary on Historical Principles. History of Freemasonry – R.F. Gould, Vol. I, chapter 6, p.253. ; Medieval Architecture – Arthur Kingsley Porter, Vol. II. ; Mackey’s Revised History of Freemasonry – Robert I. Clegg, p. 814. ; Early History and Antiquities of Freemasonry – G.F. Fort. ; History of Freemasonry – J.G. Findel, p. 76, (1869 edition). ; Freemason’s Monthly Magazine, (Boston), Vol. XIX, p. 281. ; Hole Craft and Fellowship of Masonry – Edward Conder ; The Cathedral Builders – Leader Scott The Comacines – W. Ravenscroft. ; A Concise History of Freemasonry – R.F. Gould, 1920. ; Roman and Medieval Art – Wm. H. Goodyear. ; Development and Character of Gothic Architecture – Charles Herbert Moore. ; History of Architecture – James Fergusson. ; History of Architecture – Russell Sturgis. ; Art and Environment – L.M. Phillips

REFERÊNCIAS SUPLEMENTARES

Mackey’s Encyclopedia – (Revised Edition) Antiquity of the Arch, p. 74; Architecture, p. 75; Basilica, p. 99; Bridge Builders of the Middle Ages, p. 117; Builder, p. 123; Cathedral of Cologne, p. 159; Cathedral of Strasburg, p. 729; Freemasons of the Church, p. 150; Gilds, p. 296; Giblim or Stone-squarers, p. 296; Geometry, p. 295; Gothic Architecture, p. 304; Implements, p. 348; Operative Masonry, p. 532; Secret Vault p 822; Sir Christopher Wren, p. 859; Stone-Masons of the Middle Ages, p. 718; Stone of Foundation, p. 722; Stone Worship, p. 727; Symbolism of the Temple, p. 774; Traveling Masons, p. 792.

REFERÊNCIAS DO THE BUILDER

Vol 1 – Regensburg Stonemason’s Regulations, pp. 171, 195; Whence Came Freemasonry? p. 181. Vol. II (1916) – Masonry Universal, p. 29; Steinbrenner, p. 158; Masonic Traditions, p. 189; Joseph Findel, p. 221; A Significant Chapter in the Early History of Freemasonry, Nov. C.C.B. 4; Operative Masonry, Dec. C.C B. 1. Vol. III (1917) – Antiquities, p. 181; Masonic History, p. 204; The Guild and York Rites, p. 242; Freemasonry and the Medieval Craft Guilds, pp. 342, 361; Worthy Operatives Cathedral Builders, p. 349. Vol. IV (1918) – George Franklin Fort, p. 171; The Masonic Writings of George Franklin Fort, p. 210. Vol. V (1919) – Mackey’s History of Freemasonry, p. 53; Legendary Origin of Freemasonry, p. 297; Quatuor Coronate, p. 300. Vol. VI (1920) – Speculative Masonry, p. 130; A Bird’s-Eye View of Masonic History, p. 236. Vol. VII (1921) – Whence Came Freemasonry? p. 90; Three Good Books on the Guild Question, p. 195; “The Evolution of Freemasonry,” p. 360. Vol. VIII (1922) – Gould’s Concise History of Freemasonry, p. 23; Masonic Legends and Traditions, p. 57; Craft Guilds and Trade Unions, p. 63; Travelling Craftsmen, p. 102; A New Brief History of Freemasonry, p. 120; “Freemasonry and the Ancient Rites,” p. 151; Freemasonry of the Middle Ages and International Society, p. 331.

 

Grande Loja dos Antigos – Do Cisma à União

De todos os capítulos na longa e variada história da nossa Arte nenhum é mais interessante ou mais importante que aquele que relata como uma concorrente cresceu junto com a primeira Grande Loja da Inglaterra, como as duas se tornaram rivais, e como finalmente uma união aconteceu. Daí o leitor pode aprender como certas mudanças aconteceram na Ordem que ainda o confundem, e também, em certa medida, por que as cerimônias maçônicas na América diferem daquelas praticadas na Inglaterra, e também entre os diferentes estados americanos. Necessariamente, apenas um resumo rápido de muitos eventos pode ser tentado aqui; aqueles que buscam mais detalhes são encaminhados aos livros listados no final deste artigo e, especialmente a Masonic Facts and Fictions de Henry Sadler, o clássico neste campo.

I. CAUSAS QUE LEVARAM À DISPUTA

É absolutamente impossível elaborar uma história conectada e detalhada de todas as causas que levaram finalmente à formação de uma nova Grande Loja, e pelas mesmas razões é impossível colocar o dedo sobre certo ano ou lugar e dizer: aqui é onde tudo começou. A coisa se deu gradativamente e a partir de muitas forças em operação. Um dos principais resultados da formação da primeira Grande Loja estabelecida em Londres em 1717 foi que a Maçonaria Especulativa afastara completamente a Maçonaria Operativa. Essa mudança radical na natureza íntima da Arte não podia deixar de suscitar oposição. Supõe-­se, por exemplo, que as dificuldades em que caiu Anthony Sayer depois que ele serviu como o primeiro Grão Mestre, podem ter sido devido à sua aversão ao novo regime, já que ele era um velho Maçom Operativo. Quantos problemas a grande mudança provocou, ou quanto tempo durou, é agora impossível determinar, mas parece evidente que um ressentimento contra a nova ordem de coisas durou muito tempo em alguns setores, e que lojas inteiras recusaram-­se por muitos anos a consentir um abandono tão completo dos antigos usos.

Outra causa de problemas nos primeiros anos da primeira Grande Loja foi a adoção do “Parágrafo Relativo a Deus e à Religião “nas Constituições de Anderson. Antes de 1717, as bases dos Maçons tinha sido de religião cristã e a própria Arte, a julgar por suas próprias Constituições, tinha sido francamente Cristã Trinitária. As novas Constituições, agora associadas ao nome de Anderson, mudaram tudo isso; de acordo com sua formulação um pouco ambígua, um Maçom era obrigado a ser apenas daquela religião “na qual todos os homens de bem estão de acordo”. Isso não agradou aqueles que desejavam ver a Maçonaria permanecer especificamente cristã e, consequentemente, eles tinham problemas com isso.

A partir dos registros da primeira Grande Loja em si, é evidente que nem tudo foi fácil.

Havia reclamação constante de “iniciações irregulares”, mas pouco foi feito para afastar aquele mal; também parece que os assuntos da Grande Loja eram tratados com desleixo, se não totalmente com simples descaso. Um bom exemplo disso é fornecido no caso de Lord Byron, que foi eleito Grão­-Mestre em 30 de abril de 1747. Este cavalheiro, conhecido como “o maléfico Lord Byron”, apareceu diante de seus irmãos, apenas cinco vezes em cinco anos, e parece ter dado pouca atenção às suas responsabilidades. O descuido despertou tantos sentimentos que “era a opinião de muitos maçons velhos ser preciso uma consulta sobre a eleição de um novo e mais ativo Grão Mestre”; eles “se reuniram para aquela finalidade” e o teriam feito se não fosse pela intervenção do irmão Thomas Manningham, M.D.

A partir desse e de outros casos semelhantes que poderiam ser citados, pode-­se julgar que a Grande Loja não mantinha um controle muito grande das rédeas, um fato que ajudará a explicar o que veio depois.

II. INOVAÇÕES TINHAM SIDO FEITAS

A pior coisa, “pior”, isto é, do ponto de vista dos irmãos conservadores da época era que a primeira Grande Loja deliberadamente fez algumas drásticas “inovações” nas formas antigas, algo que aconteceu da seguinte forma, assim se acredita: após a Maçonaria tornar­-se mais ou menos popular em Londres, inúmeros homens desejosos de se achar seu caminho até as lojas sem o custo problemático de uma iniciação. Para atender às suas necessidades certas, assim chamadas, “exposições” foram publicadas, a mais notável das quais foi Masonry Dissected, por certo Samuel Prichard, descrito como um “falecido membro de uma Loja constituída”. Diante disso, o “clandestinismo” tornou tão comum que finalmente a Grand Loja, em defesa própria, determinou que mudanças fossem realizadas no trabalho esotérico, que permitiria às lojas regulares detectar as fraudes. Agora, é quase impossível saber com certeza exatamente quais alterações foram estas, mas de acordo com os inimigos da Grande Loja de 1717 e referências dispersas em registros da Grande Loja foram mais ou menos o que se segue: A cerimônia de instalação do Venerável Mestre foi suprimida ou passou a ser automática; o Terceiro Grau foi remodelado; o simbolismo da preparação de um candidato foi alterado; um dos segredos mais importantes do Primeiro Grau foi transferido para o segundo, e vice-­versa, alguns dos antigos “segredos geométricos” há muito praticados entre os “antigos maçons operativos” ou foram totalmente omitidos ou então mudaram para uma forma irreconhecível, etc. Como prova de que tais acusações de inovações não eram sem fundamento na verdade é um dos itens na edição de 1784 das Constituições da Grande Loja de 1717, que diz: “Algumas variações foram feitas na forma estabelecida”, e continua para explicar que essas mudanças foram feitas,“mais eficazmente para afastá-los [isto é, os clandestinos] e aos seus cúmplices das Lojas”.

Ainda outra causa que contribuiu para os novos desenvolvimentos tem a ver com o Arco Real, um assunto particularmente difícil de tratar, especialmente no papel e, além disso, em curto espaço. Laurence Dermott, o gênio criativo da nova Grande Loja (sobre a qual falarei mais em instantes), uma vez escreveu estas palavras:

“Um Maçom Moderno e membro de uma loja sob a Grande Loja de 1717 pode comunicar com segurança todos os seus segredos a um Maçom Antigo, membro de uma Loja sob as Constituições da Grande Loja iniciada em 1751, mas um Maçom Antigo não pode com segurança comunicar todos os seus segredos para um Maçom Moderno sem qualquer cerimônia.”

Depois de citar estas palavras, e algumas outras que não preciso incluir aqui, o Irmão. Fred J.W. Crowe, em sua revisão da História Concisa de Gould, à página 256, observa que, “Há pouca dúvida de que essas diferenças consistem em mudanças no Terceiro Grau e a introdução do Arco Real”.

III. O ARCO REAL SE TORNOU UM PROBLEMA

A teoria aqui é que, na sua reorganização do Ritual, Desaguliers e seus companheiros nos primeiros dias da Grande Loja de 1717 deixaram o Terceiro Grau sem a sua conclusão lógica, de modo que certo segredo vital foi perdido, mas não foi encontrado; e que muitos dos irmãos, a fim de completar o simbolismo, ou adaptaram ou criaram uma cerimônia de complementar a reparar o prejuízo. Ao fazê-­lo, eles correram contra as práticas da Grande Loja de 1717 e, assim, tornaram-se estigmatizados como “irregulares”. Firmes em sua convicção de que tinham razão e que a Grande Loja estava errada, eles persistiram em seu curso até que finalmente fundaram uma Grande Loja própria. Isto, conforme dito acima, é uma “teoria”, mas há fatos para suportá-la, e é razoável diante das coisas.

Sejam os fatos o que forem, é certo que após a nova Grande Loja ter­-se formado, ela fez uso da cerimônia conhecida como Arco Real e a praticava como uma parte legítima da Maçonaria antiga. Os resultados disso foram sucintamente descritos por W.J. Hughan em uma comunicação citada na página 1185, da História Revista da Maçonaria de Mackey, pelo irmão Robert I. Clegg:

“O Grau do Real Arco não foi iniciado por esses “Antigos” [quando a nova Grande Loja veio a ser criada], mas apenas adaptado por eles como uma cerimônia autorizada. Em autodefesa, os “Modernos” [como a Grande Loja de 1717 foi apelidada], que o tinham trabalhado antes da origem dos “Maçons Atholl” [outro nome para a nova Grande Loja], mas não oficialmente, aos poucos lhe deram mais proeminência. Em 1767, eles formaram um Grande Capítulo do Arco Real, e emitiram Cartas Constitutivas de Capítulos, empurrando o grau mais ainda que o ‘Antigos’, embora não reconhecido por sua Grande Loja; assim, quando da União das duas Grandes Lojas, em dezembro de 1813, o caminho estava preparado para a inauguração do ‘Grande Capítulo Unido” em 1817, a cerimônia sendo adotada como a conclusão da cerimônia do Mestre Maçom, não como um grau separado e independente.”

A mais importante de todas as teorias sobre a origem da nova Grande Loja é aquela desenvolvida por Henry Sadler, embora a palavra “teoria”, em vista dos muitos fatos reunidos em seu Masonic Facts and Fictions, é muito fraca para sugerir a força e poder de seu raciocínio. Devo me contentar com dar um breve resumo dos resultados a que chegou neste livro notável.

O resultado mais importante do trabalho de Sadler foi abolir a antiga noção de que a Grande Loja “Antiga” resultou de um “cisma”, ou “secessão” da Grande Loja mais antiga. A teoria “cismática” foi divulgada pela Grande Loja mais antiga, e veio a ser geralmente aceita entre seus apoiantes e defensores; mesmo Gould, que normalmente era tão independente em sua teorização, teimosamente agarrou­-se a ela muito tempo após os outros terem se convencido do ponto de vista de Sadler, razão pela qual foi considerado prudente fazer uma revisão de sua História Concisa. Sadler deixou claro que a Grande Loja “Antiga” cresceu não de uma cisão da Grande Loja de 1717, mas devido a causas independentes, e que, em uma época antes da doutrina da competência exclusiva ter sido adotada não havia ilegalidade em tal medida.

O próximo resultado mais importante de suas pesquisas foi que a principal inspiração para a fundação da Grande Loja “Antiga” veio dos maçons irlandeses que haviam se estabelecido em Londres, e que não haviam sido reconhecidos pela Grande Loja de 1717. Sadler mostra que a maioria dos membros da primeira loja autorizada pelos “Antigos” eram irlandeses, e que eles copiaram os usos e costumes da Grande Loja da Irlanda, e que, nas conversas da época eles eram devidamente apelidados de “maçons irlandeses”. A maioria destes homens era de classes “baixas”, pintores, alfaiates, mecânicos, operários, e assim por diante, estando, assim, em nítido contraste com os membros das lojas que trabalhavam sob a Grande Loja de 1717.

IV. OS “ANTIGOS” ESTAVAM MAIS PRÓXIMOS DA G.L. DA IRLANDA

Os “Antigos” diferiam muito em suas práticas da Grande loja mais antiga e, ao mesmo tempo, e diferenciando-se, ficaram próximos aos costumes da Grande Loja da Irlanda: O próprio resumo isso por Sadler pode ser dado:

“É suficiente, sem dúvida, que eu apenas mencione os pontos principais remanescentes de conexão e da mesma forma, sem maiores comentários: O Livro das Constituições e os Estatutos para lojas privadas; Cartas Constitutivas reconhecendo o grau do Arco Real; Selos da Grande Loja, bem como o método de afixa-­los com as mesmas coloridas [as mesmas, isto é, como as da Grande Loja da Irlanda], que tanto quanto sei não eram utilizadas por qualquer outra Grande Loja; Certificados em Latim e Inglês; Constituição de uma loja somente para os Grandes Oficiais, e os nomes dos membros inseridos na frente do cadastro; Sistema de registro nos livros da Grande Loja; o fato de que os “Antigos” eram designados “maçons irlandeses”, suas lojas “Lojas irlandesas”, e suas cartas constitutivas ‘cartas constitutivas irlandesas “por escritores independentes e não oficiais em diferentes períodos, de cerca de quinze anos após a sua organização em 1751 até o final do século passado” [isto é, do século XVIII].

Depois que a nova Grande Loja estava sendo organizada e depois que ela tinha começado a entrar em conflito com o corpo mais antigo, é claro, os defensores dos “Antigos” começaram a criar argumentos para defender suas próprias posições; em grande parte, tais argumentos eram apenas um apelo especial, e não para serem agora levados muito a sério. Isso, a título de exemplo, era o argumento de Dermott de que a primeira Grande Loja tinha sido constituída de forma ilegal. Em seu Ahiman Rezon, edição de 1778, ele diz que “para formar uma Grande Loja são necessários Mestres e Vigilantes de cinco Lojas regulares”, e afirma que “isto é tão bem conhecido de todos os homens familiarizados com as antigas leis, usos, costumes e cerimônias de Mestres Maçons, que é desnecessário dizer mais.” Dermott devia saber na época que tal declaração era infundada; nunca houve tal lei. Conforme o tempo passou, este argumento foi substituído por outro no sentido de que os “Antigos” tinham montado uma loja para si, porque a Grande Loja mais antiga era culpada de inovações, que, embora fosse, sem dúvida, verdade, não poderia muito bem se sustentar porque os próprios “Antigos” eram culpados de muitas inovações próprias; porque eles tinham trazido para o sistema um grau maçônico inteiramente novo, uma inovação de primeira linha, seria de se supor.

V. FORMAÇÃO DA GRANDE LOJA “ANTIGA”

Chegou a hora de dar um relato de como surgiu a Grande Loja “Antiga”. Antes, porém, direi uma palavra sobre Laurence Dermott, que apareceu muito em tudo o que aconteceu, recomendando ao leitor desde já que folheie as Notes de W.M. Bywater sobre Laurence Dermott e Sua Obra, publicado em Londres em 1884.

Dermott nasceu na Irlanda em 1720, vinte e dois anos antes do nascimento de William Preston, que primeiro viu a luz do dia em Edimburgo, em 28 de julho de 1742, e que é o único de todos os luminares da Maçonaria daquela geração a compartilhar com Dermott uma fama igual. Dermott foi iniciado na Irlanda em 1740, e passou pelas cadeiras da Loja n º 26, na Irlanda, onde ele foi instalado Venerável Mestre em 24 de junho de 1746. Parece que ele foi muito bem educado para aqueles dias, e Gould é de opinião que ele provavelmente conhecia um pouco de hebraico, que seria responsável pelo carinho que ele tinha por cobrir seus trabalhos com caracteres hebraicos, aquele idioma antigo e difícil! Ele mudou-­se para Londres, provavelmente quando jovem, com pouco dinheiro no bolso, mas muitos esquemas fervendo em sua cabeça; ele era incansável, alerta, inteligente, sarcástico e muitas vezes um pouco sem escrúpulos na guerra contra seus inimigos, que ele tinha aos montes. Parece que ele se engajou como pintor jornaleiro (Preston tornou-­se um impressor jornaleiro, será lembrado), e que ele prosperou de forma que nos anos seguintes, ele gastou muito dinheiro em caridade e em suas atividades maçônicas. Em registros tardios ele era descrito como um comerciante de vinhos, e parece que sofria de gota. Uma vez iniciado ele nunca descansou, mas dedicou­-se a ela como se fosse uma amante, com sinceridade apaixonada, não se permitindo desanimar, e sempre na linha de frente da batalha. Além de sua genialidade em colocar uma Grande Loja em curso, sua maior conquista foi a composição de sua Ahiman Rezon (que significa “Digno Irmão Secretário”), as Constituições da nova Grande Loja, e depois adotada por muitas outras Grandes Lojas, a nossa própria em Pensilvânia, Maryland e Carolina do Sul entre elas.

VI. A “GRANDE COMISSÃO” É FORMADA

Já chega de Dermott. A extensão das “iniciações irregulares” tantas vezes denunciadas nos registros da Grande Loja de 1717 pode ser demonstrada pelo fato de que devido a isso, a Grande Loja apagou de sua lista pelo menos quarenta e cinco lojas entre 1742 e 1752. Irmãos lidavam com isso, junto com muitos freelances e também alguns independentes, ou “Lojas de São João” (sobre as quais muitas coisas interessantes podem ser escritas) se reuniram e formaram uma “Grande Comissão” da “Antiga e Honorável Fraternidade de Maçons Livres e Aceitos”; esta Comissão transformou-­se na “Grande Loja da Inglaterra, de acordo as Antigas Constituições”, Grande Loja esta posteriormente chamada de Grande Loja “Antiga”, em oposição à “Moderna”, como a Grande Loja mais antiga ficou apelidada. O registro mais antigo da Grande Comissão é datado de 17 de julho de 1751; naquele dia, as Lojas Nº. “2, 3, 4, 5, 6 e 7 foram autorizadas a conceder Dispensas e Cartas Constitutivas e agir como Grão-Mestre.”

O cargo de Grão-­Mestre foi deixado vago até que um “irmão nobre” pudesse ser encontrado para aceitar o cargo; e local da Loja Nº 1 foi deixado para ser ocupado pela Loja do Grão-­Mestre, uma coisa sem dúvida sugerida pelo Grande Loja da Irlanda que tinha feito a mesma coisa. John Morgan foi eleito Grande Secretário em 1751, mas parece que ele foi negligente em seus deveres, portanto, Laurence Dermott foi eleito para ocupar o seu lugar em 5 de fevereiro de 1752, após o que os mais amargos inimigos do Grande Secretário não puderam reclamar de qualquer negligência, porque Dermott assumiu o espírito de liderança em tudo os que se seguiu, e foi ao seu gênio que um grupo de descontentes, originários daquilo que naquele tempo eram as classes mais baixas ou a classe média, foram capazes de avançar e crescer mais rapidamente, considerando o tempo que levou, que sua Grande Loja rival.

Um dos expedientes empregados por Dermott foi conceder cartas constitutivas a lojas militares, algo que não havia sido feito antes, e que foi responsável pelo rápido crescimento da Maçonaria Antiga nas colônias americanas, graças à concessão de cartas constitutivas a lojas do exército nas forças britânicas que se tornaram missionários maçônicos neste continente. A Grande Loja Moderna depois seguiu este exemplo. Outro expediente foi franco e aberto incentivo ao Grau do Arco Real; é fácil entender que um sistema oferecendo quatro graus teria mais apelo em geral que outro oferecendo somente três. Também os Antigos foram capazes de assegurar os apoios formais das Grandes Lojas da Irlanda e da Escócia, e além disso certa quantidade de um apoio ativo daqueles corpos influentes.

Em uma lista dos Grandes Secretários da Grande Loja Antiga nota­-se que Dermott serviu por dezoito anos:

1751, John Morgan. 1752-­70, Laurence Dermott. 1771­-76, William Dickey. 1777-­78, James Jones. 1779­-82, Charles Bearblock. 1783-­84, Robert Leslie. 1785­-89, John McCormick. 1790-­1813, Robert Leslie.

Ainda mais instrutiva é a lista dos Grãos-Mestres eleitos:

1753, Robert Turner. 1754-56, Edward Vaughan. 1756­-59, Earl of Blesington. 1760­-66, Earl of Kelly. 1766-70, Hon. Thomas Mathew. 1771-­74, John, terceiro Duque de Atholl (também grafado Athol, Athole). 1775-­81, John, quarto Duque de Atholl. 1783­-91, Earl of Antrim. 1791­-1813, John, quarto Duque de Atholl. 1813, Duke of Kent.

Pode-­se observar que dos sessenta anos durante os quais os Antigos tiveram um Grão­-Mestre, um duque de Atholl ocupou o trono durante 31 anos; por esta razão que os Antigos eram frequentemente chamados de “Maçons de Atholl”, e por uma razão correspondente que os Modernos eram, por vezes chamados de “Maçons do Príncipe de Gales”.

VII. ELES CRESCERAM RAPIDAMENTE

O zelo e a energia dos líderes Antigos, além da atratividade superior do seu sistema de graus, são demonstrados pela rapidez com que a nova Grande Loja progrediu. Em 1753, uma dúzia ou mais de lojas estavam na lista; durante os próximos quatro anos, e em grande parte devido à atividade de Dermott, vinte e quatro foram adicionadas; entre 1760 e 1766, enquanto o Conde de Kelly era nominalmente o Grão­-Mestre, sessenta e quatro mais foram assumidas.

Até 1813, quando a União foi efetuada, os Antigos reivindicavam um total de 359 lojas, mas é certo que em muitos casos, os nomes de lojas extintas ainda apareciam.

Os Antigos adotaram como seu Livro das Constituições o Ahiman Rezon, em grande parte o trabalho de Dermott, embora ele seguisse de perto as principais linhas das Constituições da Grande Loja da Irlanda e, ao mesmo tempo, emprestasse com liberdade as Constituições de Anderson usadas pelos Modernos, publicada pela primeira vez em 1723; a primeira edição do Ahiman Rezon apareceu em 1756. Ao acompanhar de perto as Constituições já em uso, Dermott foi capaz de evitar um afastamento demasiado grande da Maçonaria como já era praticada, e ao mesmo tempo, embora involuntariamente, preparou o caminho para a União que veio depois, um fato de feliz presságio para a Maçonaria em geral.

A existência de duas Grandes Lojas, ambas com sede em Londres, naturalmente, causou uma grande confusão e desentendimento entre os maçons comuns. Em muitos casos, tais irmãos não defendiam qualquer uma das partes, de modo que, em alguns casos, é de se registrar que havia lojas que seguiam ambas as constituições; mas na maioria das vezes havia uma boa dose de amargura entre os partidários, embora se deva dizer que os Antigos eram mais ávidos de controvérsia que os Modernos, e que, em quase todos os casos, quando todos os ramos de oliveira eram estendidos, era sempre do campo desses últimos. Um exemplo da atitude conciliatória dos Modernos é oferecido por Preston, que diz que em 1801 quando acusações eram proferidas contra irmãos sob os Modernos por suas atividades em lojas Antigas, o assunto era abandonado.

Em 1797, um movimento foi feito com vistas à união, mas o projeto fracassou. Dois anos depois, porém, os dois Grão-­Mestres, o Conde de Moira pelos Modernos e o Duque de Atholl pelos Antigos, agiram em conjunto para que a Maçonaria fosse isentada da Lei de Prevenção de Sociedades Secretas na Inglaterra. Além disso, como outra etapa que abriu caminho para uma fusão, a Grande Loja Moderna conseguiu garantir os endossos das Grandes Lojas da Irlanda e da Escócia de forma a colocar os Antigos em uma posição um pouco duvidosa, algo que reverteu completamente a situação original, até onde esses dois Grandes Corpos estavam envolvidos.

VIII. A UNIÃO ACONTECE

Já em 1809, comissões se reuniram para considerar a “propriedade e praticidade da união”. Em 26 de outubro daquele ano, o Conde de Moira (pelos Modernos) concedeu carta a uma loja especial para servir como um meio para se chegar a uma fusão; esta loja realizou sua primeira sessão em 21 de novembro e, em seguida, resolveu chamar­-se “Loja Especial de Promulgação”. Em 10 “de abril do ano seguinte o Conde de Moira informou sua Grande Loja que, tanto ele quanto o Grão Mestre dos Antigos”, eram ambos totalmente de opinião que seria um evento verdadeiramente desejável consolidar, sob um só chefe, as duas Sociedades de Maçons que existiam neste país”. Estes resultados foram transmitidos à Grande Loja dos Antigos, onde esta confissão franca de um desejo de união foi recebida com cordialidade sincera, de modo que, após concessões terem sido feitas por ambos os lados, embora mais calorosamente pelos Modernos, acordou-­se por todo lado que as diferenças devessem ser resolvidas, e uma união ser feita. “A Grande Assembleia de Maçons para a União das Duas Grandes Lojas da Inglaterra”, foi realizada em 27 de dezembro de 1813. Com as devidas cerimônias solenes, a tão desejada fusão foi consumada, todos os Grandes Oficiais demonstrando, quase sem exceção, um espírito fino e estadista. Durante o mês anterior, o Duque de Atholl tinha renunciado Grão Mestrado dos Antigos em favor do Duque de Kent, este último sendo instalado em 01 de dezembro; na época da União, este último nomeou o Duque de Sussex como “Grão-­Mestre da Grande Loja Unida de dos Maçons Antigos da Inglaterra” e ele foi eleito por unanimidade.

Cada uma das duas Grandes Lojas participantes nomeou uma comissão de nove Mestres Maçons ou Ex-Veneráveis especialistas e estes formaram uma Loja de Promulgação, cujo objetivo era elaborar uma espécie de ritual aceitável por todos. Este alojamento continuou o seu trabalho de 1813 até 1816, muitas vezes contra a oposição; mas embora seu trabalho fosse consequente e oficial, a fusão real entre os dois sistemas continuou de acordo com as circunstâncias nas lojas privadas, de modo que a influência da Loja de Reconciliação era mais acadêmica que real.

O trabalho de preparação de um novo Código de Regulamentos para a Grande Loja Unida foi encaminhado a uma Câmara de Finalidade Geral; o seu trabalho foi aprovado pela Grande Loja Especial em 23 de agosto de 1815. Neste meio tempo, e para estabelecer relações mais próximas possíveis entre a nova Grande Loja Unida e as Grandes Lojas da Escócia e da Irlanda, uma Comissão Internacional foi criada que começou suas deliberações em 27 de junho de 1814, continuando até 2 de Julho do ano seguinte. Como resultado, foi declarado que “as três Grandes Lojas estavam perfeitamente em uníssono em todos os grandes pontos essenciais do Mistério e da Arte, de acordo com as tradições imemoriais e uso ininterrupto dos Maçons Antigos”; oito resoluções, o chamado Pacto Internacional, foi adotado.

IX. À GUISA DE CONCLUSÃO

O efeito de toda essa reorganização sobre o ritual foi muito bem resumida pelo irmão W.B. Hextall que citarei seu parágrafo integralmente de Ars Quatuor Coronatorum, vol. XXIII, página 304: (o leitor deve consultar aquele volume inteiro).

“A conclusão a que eu, pessoalmente, chego é que por muitos anos após a União – falando aproximadamente, até por volta de 1825, uma grande quantidade de dar e receber relacionada com o ritual ocorreu não oficialmente em Londres, assim como nas províncias, e que nossas Cerimônias do Ofício, conforme praticadas a partir de 1830, e anteriormente, se desviaram consideravelmente daquelas que foram acordadas na Loja de Promulgação entre 1809­ e 1811; trabalhadas na Loja da Reconciliação, 1813­1816, e aprovadas pela Grande Loja em 05 de junho de 1816. O material de onde temos de fazer inferências é ligeiro, mas ao mesmo tempo convincente; e quando (para citar apenas alguns pontos) encontramos deveres originalmente atribuídos ao Primeiro Diácono transferido para o segundo; confiar os meios de prova satisfatória levando à pratica do segundo grau de outra forma; e a admissão de um membro ou visitante ‘por meio de prova de ele ter se identificado nos termos do grau em que a loja está aberto em uma inspeção pelas três grandes luzes na entrada’ (atas da Loja de Promulgação, 05 de janeiro de 1810) caídos em completo desuso; é difícil evitar perceber que, em grande medida, o assunto do trabalho da Maçonaria deve ter sido colocado no cadinho, e que independentemente do meio de instrução disponibilizados oficialmente em 1813.”

A fim de ajudar os irmãos a encontrar seu caminho para sair desta confusão, as Lojas de Instrução surgiram, algumas das quais chegaram a ser instituições permanentes; e foi como resultado da influência destas que os diferentes “trabalhos” entram em uso na Inglaterra “Emulação”, “Estabilidade”, “Oxford”, etc.

Se se assume uma visão suficientemente ampla da história da maçonaria Inglesa de 1717 até que a União tivesse sido aceita em todos os lugares, ver­-se-­á que todo o período assume o caráter de uma grande transição, e que nesta perspectiva, os meros detalhes e mecanismos do Grande Corte, juntamente com o ato oficial subsequente da União caem para segundo plano como eventos, grandes em importância, mas da natureza de incidentes. A mudança de Maçonaria Operativa para Maçonaria Especulativa oficialmente feita em 1717 foi profunda, além da nossa compreensão habitual da mesma; e tal mudança só pode ser realizada completamente após muitos anos, muita experimentação e uma longa evolução. Nessa visão, o grande resultado da União é que ela trouxe, finalmente, a completa cristalização e solidificação da Maçonaria Especulativa, fixou seu caráter para as gerações vindouras, estabeleceu no Reino Unido, o princípio da Jurisdição Territorial Exclusiva, e tornou possível o estabelecimento dentro da Maçonaria daqueles Poderes e Autoridades que hoje impedem a dispersão de suas energias e a divisão de suas forças. Mesmo até agora aquela influência está atuando; e vai continuar a atuar, por conta de sua lógica inevitável, uma maneira será encontrada para unir e unificar a Maçonaria em todo o mundo, cuja consumação todos nós podemos dizer sinceramente:

Assim Seja!

Autor: H.L. Haywood
Tradução: José Filardo

LIVROS CONSULTADOS NA PREPARAÇÃO DESTE ARTIGO

Ahiman Rezon, all eds., Laurence Dermott. Ars Quatuor Coronatorum, V, 166; VI, 44, 65; VIII, 233; XI, 190, 202; XXIII, 37, 162, 215; XXIV, 268. Atholl Lodges, R.F. Gould. Book of Constitutions, edtd. by Entick. Book of Constitutions, edtd. by Noorthouck. Builders, The, Joseph Fort Newton. Century of Masonic Working, F.W. Golby. Concise History, R.F. Gould. Grand Lodge of England, A.F. Calvert. History of Freemasonry, Findel. History of Freemasonry, R.F. Gould. History of the Lodge of Edinburgh, Murray Lyon. Illustrated History of the Lodge of Improvement, Henry Sadler. Illustrations of Masonry, Wm. Preston. Mackey’s Revised History of Freemasonry, R.I. Clegg. Masonic Facts and Fictions, Henry Sadler. Memorials of the Masonic Union, W.J. Hughan. Military Lodges, R.F. Gould. Minutes of the Grand Lodge of England, W.J. Songhurst, Ed. Notes on Lau. Dermott, W.M. Bywater. Origin of the English Rite, W.J. Hughan. Short Masonic History, Fred Armitage. Story of the Craft, Lionel Vibert. Capitulos De Histórias Maçônicas – PARTE XI

REFERÊNCIAS SUPLEMENTARES

Mackey’s Encyclopedia – (Revised Edition): Ahiman Rezon, 37; Ancient, or Antient, or Atholl Masons, 55; Antiquity, Lodge of, 65; Book of Constitutions, 112; Christianization of Freemasonry, 148; Dermott, Laurence, 206; Grand Lodge, 306; Grand Master, 307; Innovations, 353; Ireland, 357; Lectures, History of the, 430; Preston, William, 579; Prichard, Samuel, 583; Ramsay, A. M., 607; Reconciliation. Lodge of, 611; Royal Arch Degree, 643; Schisms, 668; SymbolicDegrees, 752; United Grand Lodge of England, 815; York Grand Lodge, 867.

A Maçonaria e os Collegia Romana

A origem da Maçonaria moderna foi rastreada por meio de documentos e outros registros históricos até as guildas de construtores na Idade Média. Essas corporações, por sua vez, originaram-se de formas ainda mais antigas de empreendimento organizado (como já foi observado no capítulo sobre os Construtores de Catedrais), portanto, os historiadores maçônicos acharam necessário tentar empurrar o caminho para trás em uma tentativa de saber como elas começaram a existir. Quase todos estes historiadores têm prendido sua atenção nos collegia romanos (plural de colegiado), como fornecedores dos ancestrais mais prováveis das corporações de onde surgiu a Maçonaria e, portanto, é necessário que um estudante Maçônico saiba algo sobre as sociedades da antiga Roma. Um colégio era uma associação de pessoas, nunca inferior a três, para algum objetivo escolhido, geralmente de uma atividade comercial, social ou de caráter religioso, organizado de acordo com a lei. Ele tinha seus próprios regulamentos e, geralmente, o seu próprio local de reunião.

Na maioria dos casos, estes collegia eram tratados pela lei como tendo aquilo que é conhecido no jargão dos advogados como “personalidade jurídica”, ou seja, eles poderiam possuir bens e poderiam ser responsabilizados através dos seus funcionários por seus atos. As organizações colegiadas atingiram sua perfeição e se tornaram mais populares de Roma, portanto elas são geralmente conhecidas como collegia romanos, mas também eram populares em muitos outros países.

I. COLLEGIA ERAM ORGANIZADOS ENTRE OS GREGOS, EGÍPCIOS, ETC.

A grande maioria dos Colégios gregos foi organizada para adoração de algum deus ou herói. A religião era uma atividade pública controlada pelo Estado e, consequentemente, era forma em seu caráter; muitos homens e mulheres, sentindo a necessidade de algo mais emocional, organizavam-se em cultos de adoração privada de seus deuses favoritos, e estas organizações eram muitas vezes colegiadas em sua forma. Acredita-se que os famosos mistérios órficos, tantas vezes descritos por escritores maçônicos, iniciaram-se desta forma. Os colégios de adoradores de Baco existiam no século II; há um registro de tal colegiado datado de 186 a.C.. Estes e outros collegia gregos eram chamados por vários nomes, thiassoi, hetairai, etc. A atividade política entre os gregos, por vezes, assumia a forma colegiada, especialmente entre as classes mais baixas e entre colônias de estrangeiros residentes, estas últimas normalmente localizadas em ou perto de algum porto marítimo.

Havia collegia políticos em Atenas no tempo de Péricles, e eles causaram muitos problemas. Em 413 a.C., um grupo deles conspirou para derrubar o governo democrático. Tais associações gregas, no entanto, não eram muito numerosas e poderosas, e nunca chegaram a algo parecido com o estado de desenvolvimento que atingiram em Roma.

Os colégios tornaram-se mais ou menos comuns no Egito no século I a.C., especialmente entre os adoradores de Ísis. Apuleio cita uma dessas organizações com a data de 79 a.C., e há motivos para crer que elas existiam muito antes. Em muitos casos, elas assumiram a forma de clubes de sepultamento, sobre a qual falarei mais em seguida. Registros da existência de tais associações na famosa região de Fayum foram encontrados, tendo a data de 67 a.C. Na Ásia Menor, também, traços de collegia foram desenterrados, e acredita-se que Tiatira tinha um número maior do que qualquer outra cidade na Ásia; seus colégios de ferreiros tornaram-se conhecidos em todo o mundo.

II. OS COLÉGIOS TORNARAM-SE MUITO COMUNS NO IMPÉRIO ROMANO

Entre os romanos, as associações colegiadas eram tão antigas que a lenda atribui sua fundação a Numa, o segundo dos tradicionais reis romanos, e não há uma menção de colegiados nas Doze Tábuas. Estas organizações floresceram desimpedidas até depois do início do século I a.C., durante o qual alguma oposição começou a se desenvolver entre os legisladores romanos. Em 64 a.C., elas foram proibidas por um tempo, com exceção de algumas de caráter religioso, mas em 58 uma lei Clodiana as permitiu novamente. Esta lei foi anulada apenas dois anos depois. Júlio César, por sua vez, proibiu todas elas, exceto as associações de culto judaico, com a alegação de que elas se imiscuíam demais em política.

Quando Augusto tornou-se imperador, ele abraçou a causa dos colegiados e fez com que fosse adotado um estatuto imperial que se constituiu no fundamento de toda a jurisprudência relacionada com eles e com outras organizações semelhantes. O imperador Marco Aurélio foi o maior amigo que os colegiados jamais tiveram.

Exceto quanto a estes estatutos gerais, os colegiados foram deixados em paz até que Nero se tornou imperador, quando ele fez se adotasse uma série de disposições que regulavam as associações nas cidades italianas.

Estes regulamentos foram ampliados para incluir as cidades provinciais por Trajano, e do seu regime até o final, um imperador após o outro assumiu tal crescente controle dos colegiados que chegou um momento em que eles eram apenas engrenagens da grande máquina do Estado. A associação foi tornada hereditária; a transferência de um homem de um colegiado para o outro era proibida, e a liberdade de trabalhar ou não trabalhar era negada por toda a parte.

A indústria tornou-se de fato um monopólio estatal e os operários eram tão controlados quanto os soldados em um exército. O sistema imperial em seus últimos séculos era apoiado pelo poder que ele extorquia dos colegiados, para que as organizações de negócios, as organizações de política, e as organizações das forças militares tornaram-se os três grandes pilares que sustentavam o império.

Apesar da grande massa dos regulamentos e das leis restritivas, e as penas severas de cobertura a que todos eles estavam sujeitos, um grande número de collegia apareceu sob condições e para fins que violavam os estatutos. Estes eram conhecidos como collegia illicits, e deram aos oficiais tantos problemas quanto às contrafações provocam hoje em dia. Algumas destas associações ilícitas eram de caráter religioso; outras eram locais de incubação para intrigas políticas. Quando apreendidas elas eram severamente reprimidas na pessoa do seu presidente, que era obrigado a pagar uma multa pesada, ou então ir para a cadeia.

É surpreendente descobrir quantos collegia existiam. Mais de duas mil e quinhentas inscrições existem, e estas emanaram de cerca de 475 cidades e aldeias do império. Na própria cidade de Roma mais de oitenta diferentes atividades eram organizadas, e acredita-se que se os memoriais fossem mais completos, o número deveria aumentar consideravelmente. É uma grande infelicidade que sejamos dependentes de inscrições e registros semelhantes, porque o tempo não foi benigno com essas coisas, mas este é o caso, e porque os escritores clássicos, quase sempre evitavam falar delas devido ao seu caráter plebeu. Como os nossos próprios historiadores literários, os antigos escritores latinos gostavam de contar sobre os senhores e as senhoras e outros notáveis, suas fortunas, suas intrigas, e suas guerras: as massas incontáveis de gente comum leiga estavam fora do seu campo de visão. Uma tentativa de descobrir o que os historiadores do Império Romano tinham a dizer sobre os colégios esclareceria isso; em todas as histórias que eu pude consultar não encontrei qualquer referência digna de leitura, com exceção de um ou dois os grossos volumes de Duruy, o francês. Gibbon torceu o nariz; Ferrers não tem nada a dizer; Mommsen esquece tudo sobre isso, embora em 1870 ele publicasse um volume em latim sobre o assunto, que, até onde se pode descobrir, nunca foi traduzido em Inglês, e assim vai. É-se obrigado a recorrer aos arqueólogos.

Um grande número de collegia foi organizado exclusivamente para a finalidade de garantir ao membro uma sepultura decente, e eram conhecidos como collegia teuinorum, ou clubes de enterro. Cada clube deste tipo construía ou alugava um salão, e realizava reuniões periódicas, ocasiões em que poemas eram lidos sobre o falecido, ou uma festa era realizada para comemorar o aniversário de nascimento de um irmão. Cada uma destas sociedades patéticas possuía, ou tinha acesso a um columbário. A columbário, Deus salve a marca, era uma espécie de apelido, e significava literalmente pombal, que era um nome sugerido pelo fato de que se assemelhava muito aos predinhos em que aristocratas alojavam suas pombas. Em um quarto escuro, meio subterrâneo havia galerias de nichos, cada uma delas grande o suficiente para conter uma urna; cada membro do colegiado tinha o direito ao seu nicho e sua urna, e havia lugar para um vaso de flores, talvez, ou até mesmo uma inscrição.

A morte era uma coisa de horror para os romanos, especialmente se ele tinha a infelicidade de ser pobre, porque suas crenças lhe ensinavam que um homem mal enterrado se tornaria um fantasma infeliz, ou mesmo vagaria sem casa com os ventos, um espírito desesperado e trêmulo em agonia de solidão. Assim, cada homem esgotava seus recursos para providenciar que sua alma estivesse protegida contra tal destino. Os ricos podiam construir seus próprios monumentos – em estrada romana de alguma importância era ladeada por essas coisas -, mas os escravos e os pobres tinham dificuldade e em evitar a negligência após a morte. Eles recorriam ao expediente de unir seus recursos, e o clube do enterro era o resultado.

É impossível para nós, modernos, perceber o quanto tal coisa significava para um romano, com pouco ou nenhum recurso. O costume do público de dispor daqueles mortos sem assistência era indescritivelmente repelente. Grandes buracos eram mantidos semiabertos nas proximidades dos centros de população e neles, sem qualquer cerimônia, os cadáveres dos pobres eram despejados. Para escapar de tal horror, um homem estava disposto a fazer quase qualquer sacrifício. Devido a este sentimento sobre o enterro, os romanos eram sempre pacientes com qualquer tentativa de garantir um funeral decente, e assim os colegiados encarregados de tais questões eram tratados com paciência e, muitas vezes com indulgência. Supõe-se, segundo autoridades tais como Sir William Ramsey, que muitas das primeiras igrejas cristãs foram organizadas como clubes de enterro, a fim de escapar da ira dos funcionários, especialmente quando todas as associações privadas religiosas estavam debaixo da proibição, como aconteceu várias vezes. Alguns acreditam que a igreja primitiva era frequentemente perseguida, não por causa das doutrinas teológicas que ensinavam, mas porque o funcionalismo considerava a associações de particulares uma ameaça ao Estado.

A grande maioria dos collegia apareceu para propósitos mais mundanos. Quase todas as profissões, a arte e o comércio tinha sua própria organização na devida forma e de acordo com o estatuto imperial. Às vezes, a divisão de funções entre esses ofícios era levada a um extremo como quando os coletores de lixo tinham seu próprio colégio, os fabricantes de chinelo o deles, os vendedores de peixe o deles, os fabricantes de perucas o deles, etc. A mais antiga inscrição conhecida refere-se a um colégio de cozinheiros, de 200 a.C. Muitos escritores maçônicos alegam que collegia de pedreiros ou construtores e arquitetos ocuparam um lugar de destaque e gozavam de honras e privilégios especiais.

É verdade que existem observações de Cícero sobre a honorabilidade da arquitetura, e que alguns outros dos latinos mencionam esta chamada como tendo uma utilidade peculiar, mas a não ser por isso eu nunca fui capaz de descobrir qualquer fundamento para as afirmações tão livremente feitas por nossos próprios historiadores, embora eu tenha procurado com carinho, já que eu desejava encontrar tal evidência.

Não havia collegia na África romana, e não havia muitos no Império do Oriente, mas em outros lugares eles eram densamente espalhados pela civilização romana. Cada regimento de soldados carregava consigo seu próprio colégio de engenheiros, carpinteiros e artesãos, e conforme observa Coote, “é tão fácil imaginar um romano sem uma cidade quanto conceber sua existência sem collegia”.

III. COMO OS COLLEGIA ERAM ORGANIZADOS

Cada colégio aspirava controlar ou possuir uma sala ou local de reunião, que chamavam schola, ou em alguns casos, cúria. Como funcionários ele tinha uma espécie de presidente chamado por diferentes nomes: magistri, curitarious, quinquennales, perfecti praesides, e assim por diante. Os Decuriones eram uma espécie de guarda, e havia fatores ou questores para administrar os assuntos de negócios. Cada sociedade tinha suas próprias leis, chamadas lex college, e suas regras ou regulamentos, e estas normas estavam baseadas, conforme já explicado, nos estatutos imperiais. As taxas e encargos entravam em uma caixa comum, chamada Arca.

Tem sido alegado por alguns escritores que os recursos assim acumulados eram utilizados para fins de caridade, mas os arqueólogos mais bem informados discordam dessa opinião, e dizem que a renda era utilizada para custear as despesas necessárias para a manutenção da sede, e para banquetes memoriais. Muitas vezes, algum membro ou amigo abastado deixava um legado, geralmente com instruções para que fosse utilizado para banquetes memoriais, mas às vezes para beneficiar a sociedade como um todo. A maioria dos collegia procurava a graça de um patrono, geralmente uma mulher, que, em troca de honrarias, ajudava a custear as despesas do pequeno grupo.

Alguns cronistas supõem que estes patronos, que muitas vezes pertenciam às classes superiores, eram mais ou menos úteis em controlar as atividades do colégio, no interesse da ordem estabelecida.

O sistema social de Roma, com a sua forma de castas, era refletido dentro do colégio, onde as diferenças de classificação eram observadas com ansiedade, e o membro de alguma casa nobre sempre recebia homenagens especiais. Os escravos eram geralmente admitidos, se eles viessem com o consentimento de seus senhores, e havia muitos libertos, que eram, em muitos casos, homens ricos. Para a maior parte, a organização técnica do corpo, com os seus funcionários, suas fileiras, e os sua orientação paroquial, era decalcado no layout da cidade romana típica que era para um romano o ne plus ultra da organização política.

IV. OS COLLEGIA E A MAÇONARIA

Para o estudante da evolução da Maçonaria desde seus primeiros traços crus até seu estado atual de riqueza e poder, a história dos colegiados é de grande importância. A noção entusiástica de que essas associações antigas eram lojas maçônicas no sentido literal, e que através deles nossa Fraternidade como ele existe hoje pode traçar a sua história até 1000 a.C. ou mais deve ser abandonada, exceto em um sentido tão amplo, quase roubando a ideia de qualquer significado. No entanto, a organização colegiada pode ser justamente considerada como um item em uma longa cadeia de desenvolvimento associativo geral, o último elo da qual é a nossa moderna Fraternidade.

Há três ou quatro teorias que sustentam que se pode traçar certa continuidade tênue entre os collegia romanos e a Maçonaria moderna.

Um deles é a teoria dos Artífices Dionisíacos. Esta hipótese recebeu a forma com que estamos familiarizados hoje por Hyppolito José da Costa em seu Esboço para a História dos Artífices de Dionísio (publicado completo em capítulos em The Montana Mason começando em novembro de 1921), e foi seguido, e seus argumentos repetidos, por A História da Maçonaria, elaborado a partir de fonte autêntica de informação, com um relato da Grande Loja da Escócia, desde a sua instituição em 1736 até o presente momento, compiladas a partir dos Registros, e um Apêndice de Artigos Originais, um volume antigo famoso atribuído a Alexander Lawrie, mas que agora geralmente se acredita ter sido escrito por Sir David Brewster.

A essência desta teoria é que esses Artífices eram empregados – isto é, a lojas deles – na construção do Templo de Salomão, e que eles conservaram os segredos da arquitetura até que finalmente o último deles os transmitiu aos collegia romanos, tal como a arte era praticada.

Neste momento, entra a igualmente bem conhecida teoria dos Mestres Comacines. De acordo com esta leitura da matéria, conforme podemos aprender de Construtores da Catedral de Leader Scott, e a partir de codicilos do mesmo pelo Irmão Ravenscroft em seu ComacinesSeus Antecessores e Seus Sucessores, alguns dos collegia de construtores romanos (collegia fabrorum) se refugiaram fugindo das invasões bárbaras em, ou perto do Lago de Como, no norte da Itália e lá mantiveram um conhecimento vivo de edificação, até ao momento em que condições se estabilizaram e a Europa tornou-se pronta para outra civilização. Quando os povos bárbaros começaram a construir suas próprias cidades e desenhar suas estradas, estes Comacini, de acordo com a teoria, foram aqui e ali para ensinar ao povo a arte de construir. Eles fundaram escolas, e atuaram como missionários em geral por todos os diferentes países da Europa, incluindo a Inglaterra, que serão descritos de forma mais adequada em um próximo capítulo.

A terceira das teorias que iria ligar o colegiado às primeiras guildas Maçônicas é a que Gould elabora no primeiro volume de sua História, mas sem se comprometer de uma forma ou de outra. Segundo esta teoria, os collegia entraram na Grã-Bretanha com o exército romano de conquista e foram responsáveis por cidades, estradas, diques e igrejas, restos das quais ainda existem. Quando os anglos, saxões e os dinamarqueses colocaram um fim à civilização romana nas ilhas, os collegia continuam a existir entre eles em uma forma ligeiramente modificada, conhecida como guildas. Entre essas guildas estavam aquelas que se dedicavam à construção e suas artes relacionadas, e dessas guildas surgiram com o tempo as organizações de maçons que nos deram a Maçonaria. Alguns dos maiores historiadores do mundo negam tudo isso completamente – Freeman, entre eles – enquanto outros aceitam. Um leigo deve se decidir como bem entender.

Ainda outra teoria é a que liga as corporações medievais da Europa aos collegia que existiam em e em torno de Constantinopla, ou, como era chamada, Bizâncio. Supõe-se que, à medida que estas organizações de construtores bizantinos eram cada vez mais procuradas, elas se deslocaram gradualmente pela Itália até a Europa central, onde atuaram como a semente da qual surgiram as guildas Teutônicas. Segundo a teoria, foi a partir dessas guildas Teutônicas que as guildas maçônicas da Inglaterra surgiram, e ele foi das guildas inglesas que surgiu a Maçonaria.

Até a época em que mais evidências surjam, estas e outras teorias que poderia ser descritas se o espaço assim permitisse ficarão mais ou menos no ar. De minha parte eu não aceito qualquer uma delas como provada. Nenhuma delas tem um fundo suficiente de fatos conhecidos. Parece-me que devemos manter o julgamento em suspenso.No entanto, e apesar dessa incerteza, os collegia continuarão sempre a ser de importância para nós maçons, pois eles nos dão um dos melhores exemplos no mundo de como e porque é que uma coisa como a Maçonaria cresce a partir da natureza humana. Nos dias do Império Romano a vida tornou-se dura e cresceu em complexidade, de modo que o indivíduo encontrava-se impotente para lutar sozinho contra o mundo. Ele descobriu que, se combinasse suas próprias insignificantes forças individuais com os recursos de seus vizinhos e amigos, que o que ele sozinho não conseguia fazer, ele poderia fazer através de cooperação. Através da reunião de seu dinheiro, seu conhecimento, sua influência e sua boa vontade, as multidões de pessoas comuns aprenderam a se manter em um grande mundo muito duro.

E é assim hoje. A loja é um meio pelo qual o indivíduo solitário pode escapar de sua impotência, ligando sua própria vida à vida de seus companheiros. Em sua essência fundamental, isso é o que faz a Maçonaria. Ela desce às profundezas da natureza humana, até que encontra o que é mais permanente e universal nela e a vincula à natureza mais íntima de muitos outros. Realizada em conjunto por uma União Mística, os irmãos trabalham e vivem juntos, e aqueles que talvez nos nossos grandes centros levem uma vida solitária como estranhos ou até mesmo como inimigos são capazes de resgatar do turbilhão da vida moderna as doces comodidades da amizade, amor fraterno, ajuda, tolerância mútua, e bondade. O que os collegia foram para os homens da antiga Roma, a loja maçônica é para os homens de hoje.

Autor: H.L. Haywood
Tradução: José Filardo

LIVROS CONSULTADOS NA PREPARAÇÃO DESTE ARTIGO

Livy, Metamorphosis, XI, 30. Kennedy, St. Paul and the Mystery Religions, 72, etc. Poland, History of the Greeks. Waltzing, Historical Studies of the Professional Corporations of the Romans. Pauly, Realencyclopadie, article by Kornemann on Collegium. Hastings, Dictionary of the Bible, vol. V, 132. A Companion to Latin Studies, see. 202. Find complete Latin bibliography in sec. 563. Hasting, Encyclopedia of Religion and Ethics, vol. VI, 218. Hatch, The Organization of Early Christian Churches. Encyclopedia Britannica, eleventh edition, vol VI, 564. Mommsen, De Collegiis et Sodalitiis Romanorum Kiliae, 1870. Grote, History of Greece, vol. V, Greenidge, Handbook of Greek Constitutional History, 208 ff. Davis, The Influence of Wealth in Imperial Rome, section on Gilds. Pliny, Epistle X, 97, 98. Abbott, The Common People of Ancient Rome, 205. Corpus Inscriptionum Latinarum, XI, 5047; V, 7906; Ill, 953; VIII,14683; III, 3583; XIV, 2112; XIV, 326. Friedlander, Roman Life and Manners, I, 146. Fowler, The Religious Experience of the Roman People, ch. beginning p. 270. Barnes, Early Church in the Light of the Monuments, 53. De Rossi, Roma Soterranea, 58. Bulletino di Arch. Crist. Ramsey, The Church in the Roman Empire, 213. Hatch, Bampton Lectures, 152. Le Blant, Actes, 282. Dill, Roman Life From Nero to Marcus Aurelius. Plutarch, Numa. Duruy, History of Rome, several chapters; consult index. Cobern, The New Archaeological Discoveries and the New Testament. Pelham, Essays on Roman History, 701 ff. Ars Quatuor Coronatorum, XI, 170. Scott, The Cathedral Builders, book II, eh. 3. Clegg, Mackey’s History of Freemasonry, ch. 46 ff. Gould, The History of Freemasonry, vol. I-10 See bibliographical notes in entire chapter. Coote, The Romans of Britain. Fort, Early History and Antiquities of Masonry. Hope, Historical Essay on Architecture. Newton, The Builders, part I, ch 5. Armitage, A Short Masonic History, vol I ch 7. Gould, The Concise History of Freemasonry, (Crowe’s Revision), 10. Ward, Freemasonry and the Ancient Gods, part 1, ch. 17. Spence, Encyclopedia of Occultism, article on Freemasonry. Corpus Juris Civilis, Dig. XLVII, 22. Brown, From Schola to Cathedral.Mackey’s Encyclopedia – (Revised Edition): Ancient Mysteries, 497; Builder, 123; Collegium, 158. Comacine Masters, 161; Egyptian Mysteries, 232; Freemasons of the Church, 150; Gilds, 296; Initiations of the Egyptian Priests, 234; Isis, 358; Mysteries of Osiris, 540; Oath of the Gild, 524; Orphic Mysteries, 539; Osiris, 540; Roman Colleges of Artificers, 630; Stone-Masons of the Middle Ages, 718.THE BUILDER: Vol. III, 1917. – Masonic History – Suggestions for Research, p.204; The Cathedral Builders, p. 380. Vol. IV, 1918. – The Comacines, p. 63. Vol. VI, 1920. – A Bird’s-Eye View of Masonic History, 236 Vol. VII, 1921. – Whence Came Freemasonry, p. 90. Vol. VIII, 1922. – A Mediating Theory, p. 318.

A Maçonaria e o Sistema de Corporações

I. A CORPORAÇÃO OU O SISTEMA DE CORPORAÇÕES EM GERAL

Quando os anglos e os saxões se radicaram na antiga Inglaterra (Bretanha como era então chamada) primeiro eles mantiveram sua forma de organização militar, de modo que cada assentamento era uma espécie de acampamento; mas com o passar do tempo, as aldeias tornaram-se permanentes, uma forma civil de ordem social começou lentamente a evoluir.

O primeiro passo para isso foi a instituição do vínculo de parentesco, onde parentes de sangue ficavam juntos para apoio e proteção, o indivíduo e sua família sendo mutuamente responsáveis. Isso deu lugar, no decorrer do tempo, a associações voluntárias fundadas não na relação de sangue, mas em laços comunitários, existentes para proteger o indivíduo contra o grupo, para preservar a ordem no assentamento, e para uma variedade de propósitos semelhantes. Essas associações descritas como “artificiais” em contraste com o vínculo “natural” de sangue, foram as primeiras corporações da Inglaterra, em por isso não se pode dizer que alguém jamais descobriu” ou “inventou” as corporações; elas cresceram a partir de condições naturais, em resposta à necessidade social, assim como haviam surgido entre gregos e romanos séculos antes, os primeiros chamando-a “thiassoi”, etc., e os últimos, “collegia”.

As autoridades mais confiáveis acreditam geralmente que é muito possível que possa ter havido certa continuidade histórica entre as primeiras corporações da Inglaterra e os collegia romanos, mas os vestígios históricos do período são muito escassos para que possamos ter certeza sobre esse ponto.

Se tal continuidade jamais existiu, foi mais provavelmente na Itália, onde os collegia duraram mais tempo, e que, como a maioria dos outros países europeus, havia um sistema de corporações próprio.

A palavra “corporação” continua a ser um enigma na no que se refere à sua etimologia. Os alemães do Norte tinham “Geld”, que significa dinheiro; os dinamarqueses, “Gilde”, uma festa religiosa em honra do deus Odin; os anglo-saxões, “gild” da mesma raiz de ”rendimento” e significando um pagamento fixo em dinheiro; os bretões têm “gouil”, uma festa ou feriado; e os galeses “gmylad”, um festival.

Em épocas posteriores, quando as corporações se tornaram comuns em todos os lugares, os alemães do Norte usavam a palavra “gild”; os alemães do Sul “Zunft”; os franceses “métier” e os italianos “arte”. Na Inglaterra do século XVI, a palavra foi geralmente substituída por “empresa”, “sociedade” ou “mister”, este último derivado do latim “ministerium” ou comércio, sem referência a qualquer coisa misteriosa, sendo preservado em nosso uso até hoje, como quando se fala das artes, partes e mistérios da Maçonaria.

As primeiras corporações, acredita-se, foram organizadas na Itália. Na França, elas eram muito comuns antes de Carlos Magno, e são mencionadas pela primeira vez nas Carolingian Capitularies de 779 e 789. Corporações comerciais e artesanais começaram a se tornar comuns na França, Holanda, Noruega, Dinamarca e Suécia no século XI. As mais antigas ordenanças conhecidas, como eram chamadas as leis escritas para o governo de uma corporação, ocorrem na Inglaterra no século XI. O princípio da corporação provou ser tão bem sucedido e foi aplicada a tantos usos que por volta dos séculos XII e XIII, tornou-se a característica marcante da vida social e econômica da Europa.

Um dos usos mais comuns do início desse princípio estava no “frith”, ou paz, corporações que se tornaram muito populares no Norte da Europa no século VI – os Vikings as organizavam então para reprimir a pirataria – e na Inglaterra no século seguinte, onde elas eram mencionadas nas leis de Ine. Estas eram associações voluntárias de homens organizados para defesa mútua, para complementar leis defeituosas, e para policiar a comunidade em um período em que os governos nacionais não eram conhecidos e, quando a autoridade da cidade era muito fraca.

Vimos este sistema em funcionamento em nossa própria terra, em condições pioneiras, como no caso dos vigilantes, e ainda hoje, apesar de nossos mecanismos elaborados de aplicação da lei e proteção dos cidadãos, homens impacientes em algumas comunidades se esforçam para fazer cumprir a lei por métodos semelhantes.

No decorrer do tempo, as corporações se multiplicaram até chegar a ser utilizadas para todos os propósitos concebíveis, para companheirismo, para beber, para assegurar um enterro decente, para o culto, para a caça, viagens, arte e atividade bancária; padres e frades organizados, marinheiros, viajantes, pastores e lenhadores; havia corporações para homens, mulheres, crianças, para ricos e para pobres, no país e na cidade. Funções atualmente desempenhadas pelo governo, exércitos, escolas, lojas, fábricas, hospitais, sindicatos, e a maioria de outras formas inumeráveis em que a organização social se diferencia, eram desempenhadas por corporações.

A corporação típica tinha orações pelos mortos; uma caixa comum para a eventual manutenção e ajuda às viúvas e órfãos de membros falecidos; reuniões periódicas com banquetes; membros admitidos sob um juramento, às vezes dois; multas administradas; portarias adotadas para a regulamentação das suas próprias atividades; membros punidos por conduta inadequada, e colaboração de muitas maneiras com a cidade ou governos nacionais.

A maior parte dessas sociedades era pequena, a maior já registrada era a Corporação Corpus Christi em York, que se gabava, certa vez, de ter 15.000 membros. Às vezes, muitas corporações em uma comunidade se consolidavam, mas nunca houve uma fusão em nível de país.

Da cidade de Londres há registro de uma corporação em 1130; de dezoito em 1180, e de 110 em 1422. Na época de Eduardo III, existiam listadas mais de 40.000 corporações religiosas e comerciais na Inglaterra; o censo de 1389 mostrava 909 só em Norfolk. Esta proliferação sofreu seu primeiro sério revés durante a Reforma, quando Henrique VIII destruiu todas as corporações religiosas; ela morreu rapidamente com o advento do sistema capitalista, e chegou a um ponto morto, exceto em alguns casos sem importância, no século passado. A França as proibiu em 1789-1791, a Espanha e Portugal em 1833-1840, a Áustria e a Alemanha em 1859-1860; a Itália em 1864; a Escócia, onde o desenvolvimento seguiu as linhas Continentais, em 1846, e a Inglaterra em 1835.

Em seu auge, o sistema de corporações esteve intimamente ligado à igreja, tão intimamente que alguns escritores creditam à igreja a sua origem; quase todas as corporações tinham seu santo padroeiro, diante de cuja imagem era mantida uma vela acesa, e muitos separavam quantias em dinheiro para sustentar um sacerdote, para a manutenção de uma capela e para missas, capelas, escolas e caridades da igreja.

Muitas vezes, uma corporação tinha seu próprio capelão, e um número muito grande, como já referimos, eram dedicadas exclusivamente a fins religiosos; essas irmandades religiosas foram suprimidas na Inglaterra em 1547, e outras corporações foram, ao mesmo tempo, proibidas de dar dinheiro às igrejas. Um grande número das fraternidades católicas existentes hoje são descendentes diretos das antigas corporações religiosas.

Em parte como resultado de sua aliança com a igreja, muitas corporações, de outra forma dedicadas a atividades puramente seculares participavam de desfiles e em peças de moralidade, mistério e milagre, os precursores do nosso drama moderno. Essas peças eram encenadas em carroças puxadas em uma “procissão” de um ponto de exibição a outro através da cidade, e sempre era um dia de emoção quando eles eram mostrados, e grandes multidões se reuniam. As despesas eram divididas entre as corporações e as peças distribuídas, como em Norwich, onde os vendedores de seda, tecidos e artigos masculinos apresentaram a criação do mundo; os vendeiros o Paraíso, os ferreiros, a luta entre Davi e Golias, ou como em Hereford, o luveiros encenaram Adão e Eva, os carpinteiros, O Barco de Noé, e os alfaiates, os três reis, etc.

É de se registar que, em alguns casos as peças eram assumidas por corporações de pedreiros. Eu sou de opinião que o drama de nosso Terceiro Grau pode muito provavelmente ter sido originalmente uma peça de mistério antiga, que pode ter encontrado seu caminho até nós através de alguma corporação de maçons que nela participaram.

Costumava ser moda dizer que a corporação da corporação e a corporação da cidade eram idênticas, ou que a primeira gradualmente se metamorfoseou na segunda, uma que teve ampla circulação por Brentano; essa ideia foi abandonada. Houve sempre uma ligação estreita entre o governo municipal e governo da corporação, mas os dois sempre foram distintos, exceto possivelmente em dois ou três casos desprezíveis.

Em muitos casos, um homem tinha que ser membro de uma corporação antes que ele pudesse se tornar um cidadão, mas as ordenanças da corporação eram sempre subordinadas à autoridade da cidade. A maneira em que as corporações se governam será descrita mais tarde.

É um fato notável e digno de nota para nós maçons, que muitas corporações aceitavam homens que não estavam de modo algum envolvidos na arte como patronos ou como um meio de proporcionar uma homenagem ou algum privilégio especial. “De fato”, escreve um dos melhores autoridades, E. Lipson, “os membros de muitas companhias de Londres frequentemente chegavam a ter apenas uma ligação muito tênue com o negócio da companhia à qual estavam ligados”, um fato que torna mais fácil compreender como não operativos passaram a ser admitidos nas corporações ou lojas Maçônicas. “Eles incluíam na sua composição”, escreve outra autoridade, “a maioria dos homens ricos da nação, e os grandes [corporações] salões existentes agora na cidade de Londres atestam os orgulhosos nomes com os quais eles são tão generosamente decorados dos homens que fizeram da Inglaterra o que ela era, os homens que construíram o seu comércio, ganharam sua fortuna e arriscaram suas vidas e fortunas para estender a supremacia comercial da Inglaterra, eram poderosos nas corporações.

Henrique IV, Henrique VI, Henrique VIII eram membros de corporações, assim como Edward III, que pertencia a uma corporação de armeiros. Não há, portanto, nada de extraordinário no fato de que Elias Ashmole e outros dignitários do seu tempo tenham procurado a adesão entre os maçons operativos.

Com o comércio, o elemento essencial da vida urbana é o ofício. A forma como foi compreendido na Idade Média, como se regulou o seu exercício e as suas condições, mereceu reter particularmente a atenção da nossa época, que vê no sistema corporativo uma solução possível para o problema do trabalho. Mas o único tipo de corporação realmente interessante é a corporação medieval, tomada no sentido lato de confraria ou associação de ofício, logo alterada sob pressão da burguesia.

A forma como foi compreendido na Idade Média, como se regulou o seu exercício e as suas condições, mereceu reter particularmente a atenção da nossa época, que vê no sistema corporativo uma solução possível para o problema do trabalho.

Mas o único tipo de corporação realmente interessante é a corporação medieval, tomada no sentido lato de confraria ou associação de ofício, logo alterada sob pressão da burguesia.

II. AS CORPORAÇÕES MERCANTIS

O sistema de corporações, em geral, teve dois períodos de grande desenvolvimento; o primeiro deles culminou com as corporações mercantis, como eram chamadas as associações formadas em todas as cidades (exceto umas poucas, entre os quais Londres) com a finalidade de gerenciar e controlar o comércio e os negócios. Tal corporação incluía todos aqueles envolvidos em um determinado tipo de comércio, incluindo assalariados, assim como proprietários, e o objetivo era permitir que os comerciantes mantivessem o monopólio de, e uma organização eficiente de toda a comercialização em uma determinada comunidade. Estas organizações cresceram aceleradamente e se tornaram poderosas e na época eram os pais adotivos de comércio inglês; mais de 100 cidades na Inglaterra e setenta na Irlanda e País de Gales as tinham. Eles atingiram seu apogeu no século XII, começaram a desaparecer no século XIV, e foram quase totalmente substituídas por corporações profissionais no século XV.

As corporações mercantis se envolviam em tantas atividades, algumas privadas, outras públicas alguns, que é impossível descrevê-las na íntegra; entre as mais importantes das suas funções estava o controle de importação e exportação de mercadorias; a limitação do número permitido em qualquer comércio; a regulamentação dos preços e salários, e a inspeção e normalização de mercadorias. Cada membro tinha de pagar “scot” e “lot”, como eram chamados os impostos gerais, e prestar juramento de obedecer aos governantes e às ordenanças, bem como contribuir com suas anuidades. Como recompensa por sua participação, ele tinha o privilégio de compartilhar em transações comerciais e em negócios, e recebia um “status” muito cobiçado na comunidade. Se ele caísse doente, era cuidado; sua família era cuidada no caso de sua morte; no desemprego, ele era ajudado a encontrar uma posição, e ele estava protegido contra brigas e relações injustas.

A corporação era governada por um alderman (ancião) e seus associados, dois ou quatro; ela tinha sua própria tesouraria; passava suas próprias resoluções; podia multar ou punir de outra forma os seus membros; e em alguns casos, tinha seu próprio tribunal. Em reuniões periódicas – chamadas “discursos da manhã” – os irmãos passavam ou revisavam resoluções, admitiam novos membros, festejavam e elegiam oficiais.

À medida que a indústria se desenvolveu no âmbito e complexidade, tornou-se cada vez mais difícil para essas corporações mercantis manter seus monopólios; gradualmente um novo sistema cresceu para substituir o antigo, conhecido como corporações profissionais, onde não o comércio, mas um ofício era a unidade, havia uma luta entre o sistema novo e o antigo, mas o antigo finalmente cedeu o lugar e no século XV, cessou de existir. As corporações profissionais não eram, como tem sido alegado com frequência, uma evolução das corporações mercantis, pois não havia ligação orgânica entre elas; elas eram em geral dois desenvolvimentos bastante distintos e separados do princípio da corporação devido às mudanças econômicas.

III. CORPORAÇÕES DE OFICIO

O objetivo principal da corporação de ofício foi estabelecer um sistema completo de controle industrial sobre todos os que estavam associados no exercício de uma vocação comum. A corporação mercantil, trabalhando normalmente nas cidades menores, organizou toda uma indústria; as corporações de ofício, surgindo por toda parte, de Londres até quase toda aldeia, organizava cada parte separada de cada indústria, ou vocação, como uma entidade independente. Por exemplo, onde a corporação mercantil tinha organizado o negócio de couro como um todo, as corporações de ofício a dividiram em especialidades, de modo que os curtidores, fabricantes de selas, fabricantes de arreios, fabricantes de freio, fabricantes de calçados, fabricantes de chinelo, fabricantes de botas, etc., tinham cada um deles a sua própria fraternidade.

Este elevado grau de especialização foi estendido às artes, aos interesses sociais, recreativos e educação; ele foi estendido até mesmo à religião, de modo que em uma igreja podia haver uma corporação de padres, de músicos, de cantores, de atores em autos de mistério, e uma corporação para cuidar do altar, além de cuidar para que ele estivesse devidamente ornado com panos ricos e suas velas sempre acesas.

As corporações dedicadas inteiramente a algum ofício realizavam um número surpreendente de funções e se tornaram um pouco uma pequena família para cada membro, onde ele encontrava o seu convívio social, sua escola, sua empresa, seu hospital, sua saúde e seguro de vida, proteção contra inimigos, escritório de empregos, um tribunal perante o qual era responsável por sua conduta, e leis e decretos para controlar seu comportamento. O velho debate entre escritores maçônicos quanto a se as corporações maçônicas medievais operativas tinha qualquer elemento “especulativo” parece estar singularmente fora de propósito; cada corporação estava cheia de elementos “especulativos”, até mesmo os motoristas de suínos e pastores de ovelhas, que, como o resto tinha os seus santos padroeiros, suas festas religiosas e queimavam uma vela no altar.

“Muitas escolas livres de gramática eram fundadas e mantidas pelas corporações”, escreve Lipson, em seu excelente História Econômica “que constituíam uma das principais fontes de educação na Idade Média; e uma corporação, a de Corpus Christi em Cambridge, perpetuou sua memória fundando o famoso colégio que ainda leva seu nome. Desta forma, as corporações contribuíram para a disseminação da aprendizagem, e os esforços voluntários de artesãos ajudaram a manter acesa a chama do conhecimento”. Ele poderia ter acrescentado muitos outros exemplos. O Reitor Colet entregou a uma corporação a gestão se sua escola de St. Paul. William Shakespeare garantiu seu “pouco latim e menos grego” em uma escola de corporação em Stratford-on-Avon.

Muitos autores descreveram corporações de ofício como “os sindicatos da Idade Média”, mas isto é muito impreciso. Conforme Sidney e Beatrice Webb disseram tão claramente em sua magnífica História dos Sindicatos, não havia qualquer ligação entre as duas, e apenas uma semelhança superficial. A corporação de ofício era um corpo semipúblico, muitas vezes tão entrelaçado com o governo municipal que escritores eruditos confundiam as duas; ela controlava o comércio não apenas no interesse dos trabalhadores, mas no de todos, incluindo o público; a filiação nelas era obrigatória, e assim reconhecida pelas leis locais e nacionais; suas fileiras incluíam empregadores, bem como empregados, e estes dois grupos não entravam em conflito até bem mais tarde, com a ascensão das corporações de jornaleiros; ela aceitava como membro só homens treinados, todos os outros, servos, etc., eram deixados de fora e considerados “profanos”; ela era uma instituição puramente local, com um território limitado pelas fronteiras da comunidade; e além da regulamentação dos salários, horários de trabalho e condições gerais de comércio, ela era também contratada, conforme descrito acima, em muitas atividades de caráter puramente social, e não relacionadas com o comércio em si.

À frente da corporação típica estavam os vigilantes, dois ou quatro, geralmente eleitos pela assembleia, mas algumas vezes nomeado pelo prefeito, com mandato de um ano, cuja missão era supervisionar o trabalho realizado pelo ofício e zelar para que certos padrões fossem mantidos. A assembleia geral se reunia uma vez por ano, mas às vezes quatro vezes, e a intervalos estabelecidos. A corporação muitas vezes tinham seu próprio tribunal e os membros eram admitidos sob juramento. A participação geral era dividida em três graus de mestres, jornaleiros (companheiro) e aprendizes, mas qualquer jornaleiro podia se tornar um mestre, de modo que, até onde a habilidade era considerada, havia somente duas classes. Mulheres eram admitidas em muitas corporações e autorizadas a tomar aprendizes e contratar diaristas.

A característica mais admirável em todo o sistema era que a instituição chamada aprendizagem, que era um método para treinar jovens na sua vocação que desde então nunca foi superado e muitas vezes nem igualado. Um menino era “adotado” ou contratado, por algum mestre por período de anos, que em épocas anteriores podia durar de um a dez anos, mas em 1563 era em toda parte (na Inglaterra) fixado em sete anos. O mestre fornecia cama e comida, treinamento técnico, às vezes um salário pequeno, às vezes escolaridade, supervisionava sua conduta e, geralmente, ficava com o menino in loco parentis; o garoto, por sua vez, era obrigado a não ser cativo, de boa compleição física, um fiel operário e atento ao bem-estar de seu mestre.

O início deste sistema foi mapeado até 1260; ele se tornou uma parte vital de todo o sistema econômico no século XIII. Os aprendizes eram normalmente registrados junto às autoridades da cidade ou recebiam um status reconhecido na comunidade. Os termos e as experiências de sua posição passaram para o discurso popular, permanecendo em uso até os dias atuais, coloriram todo o pensamento social, e muitas vezes foram celebrados na literatura, como no Wilhelm Meister de Goethe.

O costume da aprendizagem, como o leitor já terá percebido, permanece arraigado em nosso próprio sistema maçônico para nos lembrar de que um candidato aos nossos “mistérios”precisa tanto de treinamento quanto o jovem dos tempos antigos, que batia à porta de uma corporação; se nossos estadistas e governantes viessem a compreender a Maçonaria como deveriam, e suas possibilidades no mundo, a reconstituição do sistema de aprendizagem em nossa Fraternidade, e uma utilização mais completa e inteligente da mesma, seria uma das suas primeiras preocupações.

Esperar que um homem se torne capaz de compreender ou praticar a Maçonaria sem uma preparação adequada é tão absurdo agora como era quando as corporações maçônicas se dedicavam à arquitetura e às artes de construção. Nós não somos chamados para criar tecidos de madeira e pedra no céu, mas a nossa é uma tarefa ainda mais difícil, pois é nosso dever construir a masculinidade e reorganizar todo o mundo nas formas de fraternidade, com certeza um alto chamado, que exige operários qualificados e exigentes!

O tempo de seu contrato concluído, o aprendiz se formava nas fileiras dos jornaleiros, tornando-se assim um companheiro de ofício, ou seja, com direito às suas liberdades e privilégios em igualdade de condições com os demais. Essa passagem para um grau superior era sinalizada por uma prova de sua habilidade, uma “obra-prima” em muitos casos, ou um exame diante dos vigilantes. (Os vigilantes eram conhecidos como “diáconos” na Escócia, onde alguma de nossa nomenclatura maçônica tem origem.) Na Europa, o jovem jornaleiro saia em uma “viagem”, a fim de ver algo do mundo e das práticas de sua arte em outros lugares, mas esse costume assentou pé na Inglaterra; em geral (em alguns casos, obrigatoriamente) um jornaleiro (às vezes chamado yoeman, “jovem”) empregava-se com algum mestre para dois ou três anos por salários e, em seguida, com um pouco de seu próprio dinheiro, criava sua própria oficina, contratava jornaleiros, adotava aprendizes e se tornava um mestre.

No decorrer do tempo, os mestres, sendo a classe abastada, tenderam a se arrogar mais e mais poder e adotar legislação em seus próprios interesses, e os jornaleiros, como o seu número aumentasse, aprenderam a se combinar para proteger seus próprios interesses, especialmente depois que uma classe assalariada permanente se desenvolveu. Em torno destes jornaleiros começaram a se formar corporações próprias, muitas vezes, apesar das autoridades, uma coisa que se tornou bastante comum no século XV. No continente, especialmente nos centros industriais e na Alemanha, este conflito entre mestres e homens muitas vezes irromperam em batalhas campais com muito derramamento de sangue (a família Médici emergiu de uma confusão desse tipo pelo controle de Florença), mas na Inglaterra a luta era mais tranquila. Até o século XVI, corporações de jornaleiros eram bastante submissas e contentes em permanecer subordinadas aos mestres que se tornaram mais e mais oligárquicos.

Em muitas das grandes cidades, os mestres garantiram todo o controle em suas próprias mãos e, gradualmente, com o advento do capitalismo moderno e da fabricação, todo o sistema de corporações gradualmente deu origem ao nacionalismo, todo o sistema de corporações desmoronou tranquilamente faleceu. Algumas das sociedades artesanais ainda sobreviveram até a segunda metade do século XVIII, mas seus privilégios foram formalmente e finalmente abolidos pelo parlamento em 1835.

O estudo das corporações maçônicas medievais das quais evoluiu a Maçonaria, ou pelo menos com as quais ela tem pelo menos certa continuidade histórica, deve ser reservada para outro capítulo, pois exige mais espaço reservado do que está disponível aqui. No presente contexto, não é necessário chamar a atenção do leitor maçônico para o fato de que qualquer que possa ter sido essa conexão histórica e em que medida o nossa ordem moderna tenha um débito para com o antigo sistema corporativo, a Maçonaria era em seu início uma peça daquele sistema e herdou muitas coisas dele, de modo que é quase impossível compreender nossa Fraternidade atual separada das corporações de ofício antigas, onde aprendizes, companheiros e mestres unidos de um lado, trabalhavam e viviam juntos em fraternidade a fim de que a palavra pudesse ser servida e se habilitando a ganhar um salário de mestre e se aperfeiçoar em seu mistério.

Autor: H.L. Haywood
Tradução: José Filardo

LIVROS CONSULTADOS NA PREPARAÇÃO DESTE ARTIGO

A. Abram, English Life and Manners in Later Middle Ages. J. DeW. Addison. Arts and Crafts in Middle Ages. Ars. Quatuor Coronatorum, II, 159; II, 165; V, 125; IX, 28; XV, 153; XV, 197. F. Armitage, The Guilds of England. W. J. Ashley, An Introduction to English Economic History. E. Bain, Merchant and Craft Gilds. L. Brentano On the History and Development of Gilds. H.M. Chadwick, Studies of Anglo-Saxon Institutions. E.K. Chambers. The Medieval Stage. Jas. Coiston, Incorporated Trades of Edinburgh. H.C. Coote, The Romance of Britain. W. Cunningham, Growth of English Industry and Commerce. W.Denton, England in the Fifteenth Century. O.J. Dunlap, English Apprenticeship and Child Labour. Encyclopedia Britannica, Vol XII, 14. E.A. Freeman, History of the Norman Conquest of Freemasonry; R.F.Gould, Concise History of Freemasonry; History of Freemasonry. N.S.B. Gras, Introduction to Economic History. A.S. Green, Town Life in the Fifteenth Century J.R. Green, Short History of the English People. C. Gross, Bibliography of British Municipal History; Gild Merchant. J.L. and B. Hammond, The Village Laborer. M.D. Harris, Story of Coventry. James Hasting, Encyclopedia of Religion and Ethics, Vol. VI. W.C. Hazlitt, Livery Companies of City of London. K. Hegel, Stadte und Gilden. F.A. Hibbert, Influence and Development of English Gilds. A. Jessop, Coming of the Friars. J.J. Jugseiand, English Wayfaring Life in the Middle Ages. S. Kramer, English Craft Gilds and the Government. J.M. Lambert, Two Thousand Years of Gild Life. Lethaby, Medieval Art. E. Lipson, Economic History of England. A.S. McBride, Speculative Masonry. Machiavelli. Florentine History. Mackey, Revised History of Freemasonry. A.L. Miller,Notes on the Early History and Records of the Lodge, Aberdeen 1 ter. H.B. Morse, Gilds of China. A.W. Pollard, English Miracle Plays. M.B. Reekitt, Meaning of National Guilds. George Renard, Guilds in the Middle Ages. J.E.T. Rogers, Economic Interpretation of History. H.G. Selfridge, Romance of Commerce. L.T. Smith, York Mystery Plays. T. Smith, English Gilds. Edgcumb Staley, The Guilds of Florence, J. Thomson, An Essay on English Municipal History. G. Unwin, Gilds and Companies of England. L.Vibert, Story of the Craft. P. Vinagradoff, Edtr., Oxford Studies in Social and Legal History. A.E. Waite, New Encyclopedia of Freemasonry. Ward, Freemasonry and the Ancient Gods. S. and B. Webb,History of Trade Unionism. H. Zimmern

A Maçonaria e os Mestres Comacinos

No capítulo sobre os Collegia Romanos, referi-me brevemente às guildas de construtores Comacine como sendo uma ponte entre a cultura clássica antiga de Roma e a da civilização medieval, que cresceu após as invasões dos bárbaros ter cessado, deixando a Europa em um estado mais ou menos tranquilo. Agora, para continuar adiante nesse assunto, pois ele é algo que exige exame cuidadoso, sobretudo porque muito está sendo escrito sobre ele nesses dias, a favor e contra. Um amigo e irmão, que tem um nome entre os estudiosos maçons, exclamou em uma recente carta, “Estou cansado de ouvir sobre estes benditos Comacines, e como a Maçonaria surgiu deles, e como eles mantiveram acesa a luz na Idade Média. A verdade é que nada sabemos sobre eles. “Eu não pude concordar com este colega porque ele está, sem dúvida, errado ao dizer que nada sabemos sobre os mestres Comacine – sabemos muito – mas eu posso entender por que ele deveria estar tão impaciente com aqueles entusiastas que reivindicam muito mais para o Comacines que os fatos podem corroborar. Não será nosso propósito aqui tentar resolver o problema de uma forma ou de outra; estabelecer tais fatos como eles são conhecidos, com um breve esboço da teoria relacionada com a sua influência sobre a história da Maçonaria, satisfará nossas necessidades atuais.

A teoria Comacine foi trazida à atenção do mundo maçônico de língua inglesa pela primeira vez por uma mulher, a Sra. Lucy Baxter, que, escrevendo sobre o pseudônimo de Leader Scott, publicou em 1899 um volume notável intitulado Os Construtores de Catedrais; A História de uma Grande Corporação Maçônica, com oitenta e três ilustrações, publicado por Simpson Low, Marston and Company, Londres. O livro está agora, infelizmente, esgotado, e cada vez mais escasso, com o preço aumentando rapidamente. Esta obra de 435 páginas foi seguida em 1910 por uma espécie de aditamento, na forma de um pequeno volume de oitenta páginas, pelo nosso fiel e querido amigo, o irmão W. Ravenscroft, chamado Os Comacines, Seus Antecessores e Seus Sucessores, posteriormente publicado como uma série no THE BUILDER, juntamente com muitas ilustrações, e depois reeditado em formato de livro. Com exceção de referências dispersas em histórias e enciclopédias, esses dois livros constituem a única fonte literária para os maçons de língua inglesa, mas existe uma literatura abundante sobre o assunto em italiano, algumas das quais deveriam ser traduzidas e publicadas nos Estados Unidos.

I. HISTÓRIA DOS COMACINES

Conforme já vimos, as artes e ofícios do Império Romano eram rigidamente organizadas em guildas, ou collegia, cada uma das quais tinha controle monopólico de algum negócio, profissão ou atividade. Estas foram destruídas pelos bárbaros, juntamente com as cidades e as comunidades em que estavam localizadas, mas algumas delas, particularmente em Constantinopla e em Roma sobreviveram ao holocausto. Acredita-se que um collegium, ou alguns collegia de arquitetos e seus operários continuaram na diocese de Como, situada no reino lombardo da Itália do Norte, na e sobre o belo Lago de Como, que incluía os bairros de Mendrisio, Lugano, Bellinzona e Magadino. Por que eles permaneceram ali é um mistério, mas acredita-se que a presença de grandes pedreiras na região foi uma das razões, e que a força e o relativamente elevado desenvolvimento do estado Lombardo era outro. Esta região, muitos supõem, manteve-se como sua sede e centro de séculos, daí seu nome “Comacini”.

A expressão ‘Magistri Comacine’, escreve Rivoira em seu magnífico Lombardic Architecture (Vol. 1, p. 108), “aparece pela primeira vez no código do rei lombardo, Rotharis (636-652), onde, nas leis de número CXLIII e CXLV, eles aparecem como Mestres Pedreiros com amplos e ilimitados poderes para celebrar contratos e subcontratos para obras de construção; ter seus parceiros colegiados ou ‘colegas’, membros da guilda ou fraternidade; chamá-los como quiserem – e, finalmente, seus servos (servi) ou operários e trabalhadores.” Rivoira diz que na região de Como as guildas ou collegia nunca tinha chegado ao fim, e que muitas pedras, mármores e depósitos de madeira ali existiam para atrair estes trabalhadores.

Na sua História da Arquitetura Italiana, Ricci afirma que as guildas Comacine foram tornadas livres e independentes das restrições medievais, e receberam liberdade para viajar à vontade, mas esta afirmação não recebeu confirmação em Bulas Papais, Atos dos Reis Carolíngios, ou em qualquer dos analistas autênticos, embora pesquisa tenha sido conduzida em Roma muito antes de existir qualquer preconceito contra a Maçonaria naquele lugar. Os Comacines estenderam sua influência e atividades da mesma forma que outras guildas, por convite e contrato, e por organização de lojas em novas cidades.

Quando São Bonifácio foi para à Alemanha como missionário, o Papa Gregório II deu-lhe “credenciais, instruções, etc., e enviou com ele uma grande comitiva de monges, versados na arte da construção e irmãos leigos que também eram arquitetos, para ajudá-los”. Os cronistas italianos dizem que, quando o monge agostiniano foi enviado em 598 d.C. como missionário para converter os britânicos, o Papa Gregório enviou vários maçons com ele, e que Agostinho, mais tarde, pediu mais homens capazes de construir igrejas, capelas e mosteiros. Leader Scott acredita que em ambos os casos os trabalhadores enviados eram mestres Comacine, e baseia sua tese em provas de métodos de construção e estilos empregados. Da mesma forma, ela rastreia os Comacines até a Sicília, a Normandia, e todos os grandes centros do Sul da Itália, explicando que dessa forma, através de um círculo expandindo-se gradualmente, a fraternidade Comacine de construtores chegou finalmente a trabalhar em quase todas as partes da Europa e Grã-Bretanha.

Na página 159 de seu livro, Leader Scott apresenta um resumo valioso da história dos Comacines, baseando-se em grande parte em I Maestri Comacini, Vol. I, de Merzario, um tratado que deveria por todos os meios ser traduzido e publicado no país. Vamos reafirmar o argumento brevemente:

  • Quando a Itália foi invadida pelos bárbaros, os Collegia Romana foram suprimidos por toda parte;
  • Diz-se que o colégio de Arquitetura de Roma retirou-se daquela cidade e foi para a República de Como;
  • No início dos tempos medievais, uma das mais importantes corporações maçônicas na Europa era a Sociedade de Mestres Comacine, que na sua constituição, métodos e trabalho era essencialmente romana, e parece ter sido a sobrevivência deste Collegium Romano;
  • Cronistas italianos afirmam que os arquitetos e pedreiros acompanhando Agostinho à terra, e, posteriormente, escritores italianos continentais de renome adotaram essa opinião;
  • Se isso é provado ou não, era habitual para os missionários tomar em sua companhia pessoas com experiência em construção e, se Agostinho fez isso ou não, sua prática era uma exceção ao que parece ter sido uma regra geral. Além disso, um grupo de quarenta monges teria sido inútil para ele, a menos que algum deles pudesse seguir uma vocação secular útil para a missão, pois eles não estavam familiarizados com o idioma inglês e não poderiam agir de forma independente;
  • Os monges maçônicos não eram raros, e havia tais monges associados ao corpo Comacine; de modo que arquitetos qualificados eram facilmente encontrados nas fileiras das ordens religiosas;
  • A partir da narrativa de Beda da missão de Agostinho na Grã-Bretanha, parece claro que ele deve ter trazido com ele arquitetos maçons;
  • Provavelmente, Gregório escolheria arquitetos para a missão que pertencessem à Ordem Comacine, que conservava as antigas tradições romanas de construção, ao invés daqueles de uma guilda Bizantina, e o registro de seu trabalho na Grã-Bretanha prova que ele fez isso;
  • Em saxão, assim como nas primeiras esculturas Comacine, existem representações frequentes de monstros fabulosos, aves e animais simbólicos; os assuntos de algumas destas esculturas sugerem alguns Fisiologistas, tinham origem latina;
  • Nos escritos do Venerável Beda e de Richard, Prior de Hagustald, nos deparamos com frases e palavras que estão no édito do Rei Rotharis de 643, e no Memoratorio de 713 do rei Luitprand, que mostram que esses escritores estavam familiarizados com certos termos da arte utilizados pelos mestres Comacine”.

Se essa narrativa é verdadeira, ela é de importância inestimável para nós, dando uma explicação de como as artes da civilização, que se supunha ter-se tornado extintas durante a Idade das Trevas, nunca foram realmente extintas, mas continuaram a ser preservadas pelos operários e artistas nas corporações Comacine. Aqueles homens eram mais que construtores,pois eram qualificados em muitos outros ofícios, e compreendiam a escultura, pintura,trabalhos ou mosaicos Cosmati, trabalho em madeira e escultura, e também, pode muito bem ser, literatura e música, juntamente com muitas outras realizações pertencentes às artes civis.Como um navio cruzando um mar revolto em que todos os navios irmãos tinham afundado, a organização dos mestres Comacine preservou a arca da civilização até que o furacão amainasse na Europa e as fervilhantes tribos bárbaras se tornassem prontas para a paz e a vida comunitária. Se existe alguma continuidade ininterrupta na história da arquitetura; se as corporações de construtores de um período mais moderno podem ser mapeadas até qualquer uma de suas artes, tradições e costumes das épocas antigas, é através dos Comacines que a cadeia foi mantida intacta durante a Idade das Trevas.

Não se deve supor que tudo isso já tenha sido solidamente estabelecido; a Teoria Comacine continua a ser uma teoria. Rivoira, que é sempre tão cuidadoso, é cauteloso ao aceitar demais. Ele diz que pouco sabemos sobre seu modo de organização, ou sobre os termos ligados a eles, Schola, loggia, etc. Mas, mesmo assim, ele lhes atribui grande importância histórica, não apenas servindo de ligação com os antigos collegia, mas também abrindo caminho para o magnífico renascimento da arte e da civilização que, como vimos em nosso primeiro capítulo desta série, floresceu como arquitetura gótica. Suas seguintes palavras testemunham isso:

“Qualquer que tenha sido a organização das guildas Comacine ou Lombardas, e embora elas possam ter sido afetadas por eventos externos, elas não deixam de existir em consequência da queda do reino lombardo. Com o primeiro sopro de liberdade municipal, e com o surgimento de novas confrarias de artesãos, elas também, talvez, pode ter-se reformado como as últimas que nada mais eram que a continuação do “collegium” da época romana, preservando sua existência através das idades bárbaras, e transformadas, pouco a pouco, na corporação medieval. Os membros podem ter-se visto obrigados a entrar em uma unidade mais perfeita de pensamento e sentimento; vincular-se em um corpo mais compacto e, assim, colocar-se em condições de manter sua supremacia antiga na realização das obras de construção mais importantes na Itália. Mas, nada mais podemos dizer. E mesmo deixando de lado toda a tradição, os próprios monumentos estão lá para confirmar o que dissemos.”

Merzario, não tão cauteloso quanto Rivoira, testemunha da mesma maneira:

“Na escuridão que se estendia por toda a Itália, apenas uma pequena lâmpada permanecia acesa, lançando uma faísca brilhante na vasta necrópole italiana. Ela vinha dos Magistri Comacini. Seus respectivos nomes são desconhecidos; suas obras individuais não são especificadas, mas o sopro de seu espírito pode ser sentido durante todos aqueles séculos, e seu nome coletivamente é legião. Podemos afirmar com segurança que de todas as obras de arte entre 800 e 1000 d.C., a maior e melhor parte se devem àquela irmandade – sempre fiel e, muitas vezes secreta – dos Magistri Comacini. A autoridade e julgamento de homens eruditos justifica a afirmação.”

O Signor Agostino Segredio está igualmente convencido, e assim se expressa em um trecho citado na página 56 de The Comacines de Ravenscroft:

“Assim, embora não haja prova certa de que o Comacines foram a verdadeira matéria de que surgiu pseudo maçonaria de hoje, podemos pelo menos admitir que eles eram uma ligação entre os Collegia clássicos e todas as outras guildas de arte e comércio da Idade Média.”

O Irmão Joseph Fort Newton aceita esta interpretação no The Builder, onde, na página 86, ele escreve:

Com a dissolução do Collegium de Arquitetos e sua expulsão de Roma, deparamo-nos com um período em que é difícil seguir seus caminhos. Felizmente, a tarefa se tornou menos confusa por pesquisas recentes, e se não somos capazes de mapeá-los todo o caminho, muita luz foi lançada na escuridão. Até agora tem havido um hiato também na história da arquitetura entre a arte clássica de Roma, que se diz ter morrido quando o império desmoronou e a ascensão da arte gótica. Dessa forma, na história dos construtores encontra-se uma lacuna de igual dimensão entre os Collegia de Roma e os artistas da catedral. Embora a lacuna não possa ser perfeitamente preenchida, muito tem sido feito nesse sentido por Leader Scott em Os Construtores de Catedrais; A História de um Grande Guilda Maçônica – um livro em si uma obra de arte, bem como de fina erudição. Sua tese é que o elo perdido deve ser encontrado nos Magistri Comacini, uma guilda de arquitetos que, com o desmembramento do Império Romano fugiu para Comacina, uma ilha fortificada no lago de Como, e lá manteve vivas as tradições da arte clássica durante a Idade das Trevas; a partir deles foram desenvolvidos em descendência direta os diversos estilos da arquitetura italiana e que, finalmente, eles levaram o conhecimento e a prática da arquitetura e escultura para a França, Espanha, Alemanha e Inglaterra. Tal tese é difícil e, por sua natureza, não é suscetível de prova absoluta, mas a escritora torna tão certo quanto qualquer coisa possa muito bem ser.”

Do outro lado estão autoridades que negam a existência de qualquer fraternidade como a dos Comacines, ou então lhes conferem um lugar menor na história da arquitetura medieval. R.F. Gould, na edição original de sua História Conche, página 105, diz claramente o que pensa:

“Hoje em dia, a ideia de ter havido, no início do século XIII, collegia de maçons em todos os países da Europa, que receberam a bênção da Santa Sé, sob condição de dedicar sua habilidade para a construção de edifícios eclesiásticos, pode ser demitido como quimérica. Embora eu não deva me esquecer de que, de acordo com o bem conhecido e altamente imaginativo Historical Essay on Architecture (1835) de Mr. Hope – que expande enormemente o significado de duas passagens das obras de Muratori – um corpo itinerante de arquitetos, que vagavam pela Europa durante a Idade Média, recebeu a denominação de Magistri Comacini, ou Mestres de Como, um título que se tornou genérico para todos os daquela profissão. A ideia foi revivida por um recente escritor, que acredita que estes Magistri Comacini eram uma sobrevivência dos Colégios romanos; que se estabeleceram em Como e foram posteriormente empregados pelos reis lombardos, sob cujo patrocínio desenvolveram uma guilda poderosa e altamente organizada, com uma influência dominante sobre toda a arquitetura da Idade Média (Os Construtores de Catedrais). Mas, mesmo que essa teoria tenha alguma probabilidade, estaria longe de esclarecer algumas obscuridades da história da arquitetura medieval, como o autor sugere que seria o caso. Intercâmbios de influência não eram incomuns, mas as obras de escolas locais apresentam uma individualidade demasiadamente marcada para tornar possível que elas poderiam dever muito (ou nada) para a influência de qualquer guilda central.

Na página 175 da mesma obra, Gould se refere a George Edmund Street, dizendo que uma teoria como a dos Comacines “parece-me ser totalmente errônea”; Wyatt Papworth dizendo que “acredito que elas nunca existiram”; e nas páginas anteriores imprime um longo trecho do Dr. Milman com a mesma finalidade.

Parece-me que esta oposição é uma reação a um exagero do argumento Comacine. Leader Scott não reclama para eles que eles mesmos tenham estabelecido a civilização europeia ou fundado a arquitetura gótica (como Dr. Newton parece fazê-lo, e que é certamente um erro), ou que a fundação de todos os estilos arquitetônicos medievais eram obra deles; ela sustenta apenas que dentro e ao redor do Lago de Como existiu por muito tempo uma guilda de arquitetos e, até essa guilda são mapeadas muitas influências; a sua influência em vários países, ela sugere a título de teorias experimentais cautelosas, e nunca se cansa de advertir seus leitores de que ela está tateando na escuridão; e que ela acredita que a história desta guilda Comacine pode ser rastreada até uma época muito antiga, e pode estar muito provavelmente ligada à história dos collegia romanos.

II. OS COMACINES E A MAÇONARIA

Nós, os maçons deixamos a muito de ser movidos pelo desejo vulgar de reivindicar para a nossa Fraternidade uma antiguidade impossível, como se ela tivesse sido organizada por Adão no Jardim do Éden, ou, como um irmão expressou, se difundiu através do espaço antes que Deus tivesse criado o mundo. A Maçonaria é antiga o suficiente como ela é, e bastante honrada, não exigindo que a embelezemos com uma linhagem fabulosa. Sabemos que ela surgiu de forma gradual, como tudo em nosso mundo humano, um pouco aqui e um pouco ali, e que não foi mais milagrosa no passado do que é agora. Ao mesmo tempo, estamos interessados em observar o crescimento e a prosperidade de organizações semelhantes a ela, ou profética dela, onde e quando elas possam surgir.

O uso da cooperação e da fraternidade, o emprego do dispositivo de sigilo e lealdade a objetivos acima dos do presente; a contemplação de tais esforços de nossos esforçados companheiros, trabalhando nos crepúsculos da vida é sempre uma inspiração e ajudam para definir os ideais da nossa própria Maçonaria escondidos nos recessos de nossas almas. É a partir desse ponto de vista, eu acredito, que devemos olhar para a história do Comacines; eu não pude me convencer de que eles eram, de qualquer uso preciso da palavra, Maçons, ou que a nossa própria Fraternidade tenha tido alguma, a não ser as ligações mais tênues e históricas em geral com as lojas destes antigos mestres.

A história da nossa Ordem se confunde com a história da arquitetura, de forma que qualquer nova luz sobre esta última nos ajuda a melhor compreender a evolução da primeira e, neste sentido, e no sentido definido acima, a história do Comacines tem valor para nós, mas não como abrangendo um capítulo na história verídica conhecida da Maçonaria. A guilda Comacine era em muitos aspectos, semelhante às guildas maçônicas que vieram depois, e que serviram de raízes das quais a Maçonaria Simbólica, em última análise desenvolveu-se, mas ver na guilda Comacine a mãe imediata da guilda maçônica não é possível, me parece, a menos que devamos confiar muito para a imaginação ou estejamos dispostos a esticar a palavra “Maçonaria”, para significar mais do que deveria.

Minha própria teoria, que será elaborada passo a passo, à medida que prosseguem esses capítulos, é que a Maçonaria estritamente chamada originou-se na Inglaterra e só na Inglaterra é que ela teve o seu surgimento gradual entre as guildas que cresceram com a arquitetura gótica; que o germe de moralismo, religião e cerimonialismo naquelas guildas, mudando para encontrar-se em um ambiente favorável, superou o elemento operativo nas lojas século XVII até que se tornou totalmente especulativa; que neste momento de transição, novos elementos foram introduzidos a partir de certas fontes ocultas e que essa evolução culminou finalmente em 1717 com a fundação da Grande Loja Mãe em Londres, a partir do qual toda a Maçonaria moderna derivou-se posteriormente. Não tenho sido capaz de satisfazer-me, apesar de ter sido tentado, que a nossa Maçonaria nos tenha sido dada pelos mestres Comacine.

A própria Leader Scott, cujo conhecimento da Maçonaria era ainda menor do que sua opinião sobre ela, foi muito cuidadosa em não confundir a Maçonaria de hoje com o que chamou de maneira pouco rigorosa (muito vagamente, pode-se pensar) de “Maçonaria” da guilda Comacine. O trecho em que ela se expressa é quase sempre citado apena transcrevê-lo inteiro, não só como mostrar sua própria teoria das duas, mas também revelando sua lamentável falta de conhecimento do que existe hoje. O trecho citado começa na página 16 de seu livro:

“Desde que comecei a escrever este capítulo, um acaso curioso trouxe às minhas mãos um antigo livro italiano sobre as instituições, ritos e cerimônias da Ordem dos Maçons. Naturalmente, o escritor anônimo começa com Adoniram, o arquiteto do Templo de Salomão, que tinha tantos operários a pagar que, não sendo capaz de distingui-los pelo nome, dividiu-os em três classes diferentes: noviços, operatori e magistri, e a cada classe deu um conjunto de sinais secretos e senhas, para que a partir delas os seus salários pudessem ser facilmente fixados e a impostura evitada. É interessante saber que, precisamente as mesmas divisões e classes existentes nos Collegia Romanos e na Guilda Comacine – e que, como no tempo de Salomão, os grandes símbolos da ordem eram o nó infinito ou nó de Salomão, e o “Leão de Judá.

Nosso autor continua, para contar sobre o segundo nascimento da Maçonaria, em seu significado atual inteiramente espiritual, e ele dá a Oliver Cromwell, entre todas as pessoas, o crédito por esta ressurreição. Os ritos e cerimônias que ele descreve são os maiores tecidos da superstição medieval, brincadeira de criança, juramentos de gelar o sangue e misteriosos segredos, sem nada para esconder que possa ser imaginado. Todos os sinais da Maçonaria, sem um fiapo de realidade; cada coisa moral mascarada sob um aspecto arquitetônico, e que o ‘Templo feitos sem as mãos’, que é simbolizado por uma loja maçônica nestes dias. Mas, o ponto significativo é que todos esses nomes e emblemas maçônicos apontam para algo real que existiu em algum tempo do passado, e no que diz respeito à organização e nomenclatura, encontramos a coisa toda na sua forma vital e real na guilda Comacine. Nosso italiano desconhecido que revela todos os segredos maçônicos, nos diz que cada loja tem três divisões, uma para os iniciantes, um para o Operatori ou irmãos trabalhadores, e uma para os mestres. Agora, sempre que encontramos o Comacines no trabalho, encontramos a organização tríplice de schola ou escola para os noviços, laborerium para o Operatori, e Opera ou Fabbrica para os Mestres da Administração.

O anônimo nos diz que há um Gran Maestro ou arco-magister na cabeça da ordem inteira, um Capo Maestro ou Mestre-chefe na cabeça de cada loja. Cada loja precisa, além disso, ter dois ou quatro Soprastanti, um tesoureiro e um secretário-geral, além de contabilistas. Este é precisamente o que nós encontramos na organização das lojas Comacine. À medida que as seguimos através dos séculos, veremos que aparecem em cidade após cidade, primeiro totalmente reveladas pelos livros dos tesoureiros e os próprios Soprastanti em Siena, Florença e Milão.

“Assim, embora não haja prova certa de que o Comacines foram a verdadeira matéria de que surgiu pseudo maçonaria de hoje, podemos pelo menos admitir que eles eram uma ligação entre os Collegia clássicos e todas as outras guildas de arte e comércio da Idade Média.”

As analogias entre as duas, brevemente referidas neste trecho citado, podem ser expandidas. Os Comacines tinham lojas, Grão-mestres, segredos (eles mantinham um livro secreto chamado L’Arcano Magistero), usavam aventais, mantinham um tronco, faziam caridade, possuíam meios de identificação, e empregavam muito simbolismo de que alguns itens são familiares para nós, como nó de Salomão, o Leão de Judá, os dois grandes pilares de “J” e “B”; esquadro, compassos, pavimento mosaico, etc. Também havia certa graduação entre eles, semelhantes aos nossos graus, embora eu não tenha conseguido descobrir qualquer prova de uma iniciação. O Irmão Ravenscroft, com quem se evita sempre discordar e que continua suas pesquisas neste campo, pode estar certo em pensar que algumas antigas tradições maçônicas, particularmente, as que tinham a ver com o Templo de Salomão foram preservadas e transmitidas a nós desde a antiguidade pelos Comacines. É uma teoria fascinante para as quais futuras descobertas podem trazer provas mais convincentes; mas parece-me, se eu puder mais uma vez expressar uma opinião particular, que dois fatos contradizem fortemente essa teoria: um é que essas tradições, pelo menos a maioria delas, sempre foram preservadas nas Escrituras e, portanto, disponíveis a qualquer momento, e, o que é mais importante, não havia nenhuma ligação conhecida entre a guilda Comacine, que realizava seu próprio trabalho na Itália, onde o Gótico nunca se estabeleceu, e as guildas entre as quais o Gótico cresceu.

Toda a questão Comacine, até onde se refira à Maçonaria, assim parece, permanece no ar, ou, se se prefere a figura, sobre os joelhos dos deuses. Isto significa que há muito trabalho ainda a ser feito pelos estudantes de hoje, que se encontram em um reino encantado, se voltarem suas atenções para a arquitetura medieval e sua história.

Autor: H.L. Haywood
Tradução: José Filardo

LIVROS CONSULTADOS NA PREPARAÇÃO DESTE ARTIGO

Construtores de catedrais, Leader Scott (Sra. Lucy Baxter).; The Comacines, W. Ravenscroft. A New Encyclopedia of Freemasonry, Vol. I, A. E. Waite. ; A Concise History of Freemasonry, R.F.Gould. ; A Critical Inquiry Into the Condition of the Conventual Builders and Their Relation to Secular Guilds, George F. Fort. ; From Schola to Cathedral, G. Baldwin Brown. ; Lombardic Architecture: Its Origin, Development and Derivatives, G.T. Rivoira. ; History of Italian Architecture, Ricci. ; I Maestri Comacine, Prof. Merzario. ; Handbook of Architecture, James Fergusson. ; Historical Essay on Architecture, Thomas Hope. ; Sacred and Legendary Art, Mrs. Jameson. ; Renaissance of Art: Fine Arts, John Addington Symonds ; A History of Latin Christianity, Milman, A.Q.C. V. p. 229, A.Q.C. XII, p. 124, ; Mackey’s Revised History of Freemasonry, Clegg, ch. 60. ; Guilds of Florence, Staley. ; Memorials of German Gothic Architecture, Moller. Medieval Architecture, Porter. ; Ecclesiastical History, Ancient and Modern, J.L. Mosheim. ; Dictionary of Architecture, C.L. Stieglitz. ; Encyclopedia of Freemasonry, Mackey, Vol. I, p.161. ; A History of Architecture in Italy, C. A. Cummings.

As Old Charges

I. O que são as Old Charges

Acabo de ler um artigo em um dos mais obscuros periódicos maçônicos onde um irmão desconhecido se sai com esta observação muito familiar:

“Quanto a mim, não estou interessado nos documentos antigos mofados do passado. Quero saber o que está acontecendo hoje.”

O contexto deixa claro que ele tinha em mente as Antigas Obrigações. Uma resposta suficiente a este ignorante é que as Antigas Obrigações estão entre as coisas que estão “acontecendo hoje.” Elimine-­as da Maçonaria, como ela funciona hoje e nenhuma loja subordinada, ou Grande Loja, ou qualquer outro corpo maçônico regular poderia absolutamente operar; elas são o que a Constituição deste país é para o Governo dos Estados Unidos, e que seus estatutos são para cada estado da União. Todas as nossas constituições, estatutos, leis, normas, leis e regulamentos, de uma forma ou de outra se referem às Antigas Obrigações, e sem elas a jurisprudência maçônica, ou os métodos de governo e regulação dos assuntos jurídicos da Maçonaria, estariam pendurado, suspensos no ar. Na medida em que líderes maçônicos, Grãos-Mestres, Veneráveis e Comissões de Jurisprudência ignoram ou esquecem, ou não compreendem estes estatutos maçônicos, eles cometem loucuras, e levam a Maçonaria a todos os tipos de empreendimentos selvagens e não maçônicos. Se algum mago pudesse conceber um método pelo qual uma concepção clara das Antigas Obrigações e o que elas representam pudesse ser instalada na cabeça de cada maçom ativo na terra, ele salvaria todos nós de momentos de constrangimento e livraria as Grandes Lojas e outros organismos dos Altos corpos das despesas desnecessárias de centenas de milhares de dólares a cada ano. Se existe uma necessidade prática, uma necessidade básica na Maçonaria hoje, é uma compreensão geral lúcida das Antigas Constituiçõeslandmarks de nossa Ordem.

Entende-­se por Antigas Obrigações (Old Charges) os documentos antigos que chegaram até nós a partir do século XIV e, posteriormente, nos quais são incorporadas à história tradicional, as lendas e as regras e regulamentos da Maçonaria. Eles são chamados de diversas formas “Antigos Manuscritos”, “Antigas Constituições”, “Lendas da Ordem”, “Manuscritos Góticos”, “Antigos Registros”, etc., etc. Na composição física destes documentos são encontrados, às vezes, em forma de papel manuscrito ou rolos de pergaminho, cujas unidades são costuradas ou coladas, folhas escritas costuradas em forma de livro, e na forma impressa familiar de um livro moderno. Às vezes, elas se encontram incorporadas ao livro de atas de uma loja. Eles variam em data estimada, de 1390 até o primeiro quarto do século XVIII, e alguns deles são exemplares em bonita escrita gótica. O maior número deles está sob a guarda do Museu Britânico; a biblioteca maçônica de West Yorkshire, Inglaterra, tem em custódia o segundo maior número.

Como já foi dito, essas Antigas Obrigações (Old Charges – como é o nome mais familiar) formam a base das constituições maçônicas modernas e, portanto, da jurisprudência. Elas estabelecem a continuidade da instituição maçônica por um período de mais de cinco séculos e, ao mesmo tempo, em sinal de sua importância, prova a grande antiguidade da Maçonaria por documentos escritos, que é uma coisa que nenhuma outra ordem existente atualmente pode fazer. Esses manuscritos são tradicionais e lendários na sua essência e, portanto, não devem ser lidos como são as histórias, no entanto, um estudo cuidadoso e crítico deles baseado em provas internas, lança mais luz sobre os primeiros tempos da Maçonaria do que qualquer outra fonte.

Acredita-se que as Antigas Obrigações eram utilizadas na iniciação de um maçom nos tempos operativos; que elas serviram como constituições de lojas em muitos casos, e às vezes funcionavam como o que hoje chamamos de carta constitutiva.

O estudo sistemático desses manuscritos começou em meados do século passado, altura em que a existência de apenas alguns entre eles era conhecida. Em 1872, William James Hughan listava 32. Em grande parte devido aos seus esforços, muitos outros foram descobertos, de modo que, em 1889, Gould pode listar 62, e o próprio Hughan em 1895, tabulou 66 cópias manuscritas, 9 versões impressas e 11 versões perdidas. Esse número foi tanto cresceu nos últimos anos que em “Ars Quatuor Coronatorum”, Volume XXXI, página 40 (1918), o irmão Roderick H. Baxter, hoje Venerável Mestre da Loja Quatuor Coronati, listava 98, número que incluía tanto as versões dadas como perdidas. A lista do Irmão Baxter é peculiarmente valiosa na medida em que ela oferece dados a respeito de quando e onde esses manuscritos foram reproduzidos.

Por uma questão de ser mais capaz de comparar uma cópia à outra, o Dr. W. Begemann classificava todas as versões em quatro “famílias” gerais: A Família Grande Loja, a Família Sloane, a Família Roberts, e a Família Spencer. Estes grupos de famílias, ele subdividia em ramos, e acreditava que a Família Spencer era um desdobramento da Família Grande Loja e a Família Roberts um ramo da Família Sloane. Desta forma geral de agrupamento, o médico erudito foi seguido por Hughan, Gould e seus colegas, e sua classificação ainda se mantém em geral; tentativas têm sido feitas nos últimos anos para alterá-la, mas sem muito sucesso. Um dos melhores gráficos, com base em Begemann, é aquele feito pelo irmão Lionel Vibert, uma cópia do qual será publicada numa edição futura do The Builder.

A primeira referência impressa conhecida dessas Antigas Obrigações foi feita pelo Dr. Robert Plot, em sua História Natural de Staffordshire publicada em 1868. O Dr. A.F.A. Woodford e William James Hughan foram os primeiros a realizar um estudo científico. As Antigas Obrigações de Hughan é até hoje o trabalho padrão em inglês. O capítulo de Gould em sua História da Maçonaria provavelmente seria classificado em segundo lugar em valor, enquanto que os volumosos escritos do Dr. Begemann, com que ele contribuiu para o Zirkelcorrespondez, órgão oficial da Grande Loja Nacional da Alemanha, se eles tivessem sido traduzidos para inglês, nos dariam o tratamento mais exaustivo do assunto jamais escrito.

As Antigas Obrigações são peculiarmente inglesas. Nenhum desses documentos jamais foi encontrado na Irlanda. Sabe-se que os manuscritos escoceses têm origem inglesa. Findel e outros escritores alemães sustentaram certa vez que a versão em inglês, em última análise, derivava-se de fontes alemãs, mas isso foi desmentido. O único ponto conhecido de semelhança entre as Antigas Obrigações e tais documentos alemães, como as Portarias Torgau e as Constituições de Colônia é a Lenda dos Quatro Mártires Coroados, e essa lenda é encontrada entre as versões em inglês apenas no Manuscrito Regius. Como bem diz Gould, o MSS britânico “não têm antecessores, nem rivais”; eles são as coisas mais ricas e raras em todo o campo de escritos maçônicos.

Quando as Antigas Obrigações são colocadas lado a lado, vê-­se imediatamente que na sua narração da história tradicional da Ordem, elas variam em grande número de detalhes, no entanto, elas parecem ter derivado de alguma origem comum, e em geral elas contam a mesma história, que é tão interessante como a história de fadas dos irmãos Grimm. Será que o original da narração tradicional veio de algum indivíduo ou nasceu de uma tradição flutuante, como os contos folclóricos dos povos antigos? As autoridades divergem muito neste ponto. Begemann não só declarou que a primeira versão da história origina­-se de um indivíduo, mas até mesmo definiu o que ele considera serem as fontes literárias utilizadas por esse Grande Desconhecido. Os argumentos do doutor são poderosos. Por outro lado, outros afirmam que a história começou como uma vaga tradição oral geral, e que com o passar do tempo foi reduzida a texto escrito. Em todo caso, por que a história foi escrita? Com toda certeza, uma resposta a essa pergunta nunca será direta, mas W. Harry Rylands e outros eram de opinião que as primeiras versões escritas foram feitas em resposta a um Writ for Return emitido em 1388. As palavras de Rylands podem ser citadas:

“Parece-me não de todo improvável que muito, se não tudo da lendária história foi composto em resposta à Writ for Return emitida para as corporações em todo o país, no ano duodécimo de Ricardo II, 1388 d.C.” (A.Q.C. XVL página 1).

II. Os dois manuscritos mais antigos

Em 1757, o Rei George II apresentou ao Museu Britânico, uma coleção de cerca de 12.000 volumes, o núcleo da qual tinha sido organizado pelo rei Henrique VII e que veio a ser conhecida como a Biblioteca Real. Entre esses livros estava um manuscrito raramente belo escrito à mão em 64 páginas de pergaminho, com cerca de quatro por cinco polegadas, que um catalogador, David Casley, registrou como n º 17 A­1, sob o título: “Um poema de Deveres Morais: aqui intitulado Constitutiones Artis Geometrie Secundem”.

Somente após o Sr. J.O. Halliwell, F.R.S. (depois Halliwell-­Phillipps), um não maçom, “descobri-lo”, é que o manuscrito passou a ser conhecido como um documento maçônico. O Sr. Phillipps leu um artigo sobre o manuscrito diante da Sociedade de Antiquários, em 1839, e no ano seguinte publicou um volume intitulado História Antiga da Maçonaria na Inglaterra (ampliada e revisada em 1844), em que ele incorporava uma transcrição do documento, juntamente com algumas páginas em fac-símile.

Este importante trabalho pode ser encontrado incorporado à conhecida Biblioteca Maçônica Universal, nas rústicas encadernações em pele de carneiro enferrujadas que chamam a atenção em quase todas as prateleiras de livros maçônicos. Este manuscrito ficou conhecido como “O Halliwell”, ou como “Halliwell-Phillipps” até cerca de cinquenta anos atrás, até que Gould o rebatizasse, em honra à Biblioteca Real, em que se encontra, como “Regius”, e desde então este tem sido o apelido mais familiar.

Poema Regius

David Casley, um estudioso especializado em velhos manuscritos, datou o “Regius” como originário do século XIV. E.A. Bond, outro perito, o datou como de meados do século XV. O Dr. Kloss, especialista alemão, colocou-­o entre 1427 e 1445. Mas, a maioria concordou com 1390 como a data mais provável. “É impossível chegar a uma certeza absoluta quanto a este ponto”, diz Hughan, cujas Antigas Obrigações deveriam ser consultadas, exceto que ele provavelmente não é mais velho do que 1390, mas pode ser de uns vinte anos ou mais tarde. O Dr. W. Begemann realizou um estudo do documento que nunca foi igualado quanto ao rigor, e chegou a uma conclusão que pode ser expressa em suas próprias palavras: ele foi escrito “por volta do final do século XIV, ou pelo menos no início do século XV (não em Gloucester em si, por ser muito ao sul) no norte de Gloucestershire, ou vizinhos ao norte de Herefordshire, ou possivelmente até mesmo ao sul de Worcestershire”. (A.Q.C. VII, página 35).

Em 1889, um fac-símile exato deste famoso manuscrito foi publicado no Volume I do Antigrapha produzido pela Loja de Pesquisa Quatuor Coronati, e foi editado pelo então secretário daquela loja, George William Speth, ele próprio uma autoridade brilhante, que forneceu um glossário indispensável para o estudante amador. Com ele foi publicado um comentário de R.F. Gould, um dos mais importantes entre todos os seus trabalhos maçônicos, embora seja irritante por suas divagações e falta geral de conclusividade.

O Manuscrito Regius é a única entre todas as versões a ser escrita em métrica, e pode ter sido composto por um padre, a julgar por algumas evidências internas, embora a questão seja controversa. Há cerca de 800 linhas do poema, a parte estritamente maçônica chegando ao final na linha 576, depois da qual começa o que Hughan chama de um “sermão” sobre deveres morais, no qual existe uma grande veia católica romana, com referências aos “sete pecados”, “a doce senhora” (referindo-se à Virgem) e à água benta. Não há tal Mariolatria específica em qualquer outra versão das Antigas Obrigações, embora a grande maioria delas expresse lealdade à “Santa Igreja” e todos eles, até mesmo a versão familiar de Anderson, sejam especificamente cristãos, até onde a religião esteja em causa.

O autor fornece uma lista de quinze “pontos” e quinze “artigos”, que são instruções bastante específicas sobre o comportamento de um artesão: esta parte é considerada por muitos como tendo sido as obrigações de um iniciado, utilizada no tempo do autor e, por isso, considerada a característica mais importante do livro como nos fornecendo um retrato da regulamentação da Ordem nessa época remota. A Ordem é descrita como tendo surgido como uma fraternidade organizada na “época do Rei Adelstoune”, mas nisso o autor se contradiz, pois ele se refere às coisas “escritas em livros antigos” (modernizei a ortografia das citações) e tem por certo a antiguidade da Maçonaria, que, como em todas as Antigas Obrigações, é sinônimo de Geometria, naqueles dias uma coisa muito diferente da ciência abstrata sobre a qual trabalhamos em nossos dias de escola.

O Poema Regius é, evidentemente, um livro sobre a Maçonaria, ao invés de um documento da Maçonaria, e pode muito bem ter sido escrito por um não maçom, embora não exista uma maneira em que possamos verificar essas teorias, especialmente vendo que nada sabemos sobre o documento, exceto que ele tem a nos dizer sobre si mesmo, que é muito pouco.

Em seu comentário sobre o Manuscrito Regius, R.F. Gould produziu um parágrafo que desde então tem servido como o pivô de um grande debate. Ele diz o seguinte e se refere ao “sermão”, a parte que trata de “deveres morais”:

Essas regras de decoro são lidas de maneira muito curiosa na época atual, mas a sua inaplicabilidade ao caso dos Maçons trabalhadores do século XIV ou XV é imediatamente evidente. Eles se destinavam aos senhores daquela época, e as instruções de comportamento na presença de um senhor – à mesa e em companhia de senhoras – que estava igualmente fora de lugar em um código de boas maneiras elaboradas para o uso de uma Guilda ou Ordem de Artesãos”.

O ponto principal disso é que deve ter existido entre os artesãos da época certo número de homens que não estavam envolvidos com o trabalho e, portanto, eram, como agora os descreveríamos, “especulativos”. Isso seria de imensa importância, se Gould tivesse defendido seu argumento, o que ele não foi capaz de fazê-­lo. As maiores mentes do período em questão dedicavam-se à arquitetura, e não há nenhuma razão para não se acreditar que entre os artesãos existissem membros de boas famílias. Além disso, a Ordem estava em contato com o clero todo o tempo e, portanto, muitos de seus membros podem muito bem ter precisado de regras para a preservação do decoro em grandes casas e entre os membros das classes superiores. Desde Woodford até o presente momento, a grande maioria dos estudiosos maçons acreditou que as Antigas Obrigações foram utilizadas por uma ordem estritamente operativa, e é evidente que eles vão continuar a fazê-lo até que evidências mais conclusivas em contrário sejam mais diretas do que supunha Gould.

Depois do Regius, o manuscrito mais antigo é aquele conhecido como Cooke.

Ele foi publicado por R. Spencer, em Londres, em 1861 e foi editado por Mr. Matthew Cooke, daí o seu nome. No catálogo do Museu Britânico ele é listado como “Manuscrito adicional 23,198”, e foi datado por Hughan em 1450 ou por aí, uma estimativa com a qual a maioria dos especialistas concordou. O Dr. Begemann acreditava que o documento tivesse sido “compilado e escrito na parte sudeste da região das Midlands Ocidentais, por exemplo, em Gloucestershire e Oxfordshire, possivelmente, também no sudeste de Worcestershire e Warwickshire. O ‘Livro de Obrigações’, que constitui a segunda parte do documento é, certamente, do século XIV; a parte histórica, ou primeira parte, muito provavelmente do início do século XV.” (A.Q.C. IX, página 18).

O Manuscrito Cooke esteve certamente nas mãos do Sr. George Payne, quando de seu segundo mandato como Grão-­Mestre, em 1720, ele compilou os “Regulamentos Gerais”, os quais Anderson incluiu em sua própria versão das “Constituições” publicada em 1723. O próprio Anderson, evidentemente, utilizou as linhas 901­960 do Manuscrito.

A Loja Quatuor Coronati republicou o Cooke em fac-símile no vol. II da sua Antigraphaem 1890, e incluiu um ali um comentário de George William Speth que é, em minha humilde opinião, uma peça ainda mais brilhante que o Comentário de Gould sobre o Regius. Algumas das conclusões de Speth são de valor permanente.

O Manuscrito é uma transcrição de um documento ainda mais antigo e foi escrito por um maçom. Havia diversas versões das Obrigações de um maçom em circulação na época. O Manuscrito está em duas partes; a primeira delas é uma tentativa de se fazer história da Arte, a último é uma versão das Obrigações. Desta parte, Speth escreve que é “de longe a versão mais antiga e mais pura das ‘Antigas Obrigações’ que possuímos.” O Manuscrito menciona nove “artigos”, e estes, evidentemente, eram obrigação legal na época, e nove pontos não eram provavelmente juridicamente vinculantes, mas o eram moralmente. Congregações de maçons foram realizadas aqui e ali, mas nenhuma “Assembleia Geral” (ou “Grande Loja”); Grão-Mestres existiam de fato, mas não com esse nome e somente presidiam uma reunião de uma congregação. “Muitos de nossos costumes atuais podem ser rastreados em sua forma original até este artigo.”

III. As Constituições de Anderson e outras versões impressas

Uma das mais importantes de todas as versões das Antigas Obrigações não é, absolutamente, um original antigo, mas uma edição impressa emitida em 1722, e conhecida como Roberts, embora se acredite ser uma cópia de um documento antigo. Sobre ela, escreve WJ Hughan:

“A única cópia conhecida foi comprado por mim na venda de obras maçônicas pelo Irmão Spencer, etc. (Londres, 1875), por £8 10s, em nome do falecido irmão R.F. Bower, e está agora na magnífica biblioteca da Grande Loja de Iowa, nos EUA.”

Este pequeno volume é, sem dúvida, a mais valiosa propriedade literária maçônica na América, e foi publicada como fac-símile exato pela Sociedade Maçônica Nacional de Pesquisa, com uma introdução eloquente pelo Dr. Joseph Fort Newton, em 1916. O reverendo Edmund Coxe editou uma famosa reimpressão em 1871. Ela é uma versão que merece estudo mais cuidadoso por parte do estudante maçom, porque ela teve uma influência decisiva sobre a literatura e a jurisprudência da Ordem, após a sua aparição inicial. Ela apareceu em um dos períodos mais interessantes e importantes da Maçonaria especulativa moderna, ou seja, nos anos entre a organização da primeira Grande Loja em 1717 e o surgimento da Constituição de Anderson em 1723. É a primeira versão impressa das Antigas Obrigações a existir.

Outra versão impressa conhecida é a que foi publicada em 1724 e conhecida como Briscoe.

Esta foi a segunda publicação do gênero. A terceira versão impressa foi publicada em 1728-9 por Benjamin Cole, e conhecida como a Edição Cole. Esta versão é considerada uma joia literária em que o corpo principal do texto é todo gravado no mais belo estilo. Uma edição especial deste livro foi feita em Leeds, em 1897, cujo valor foi realçado por uma das famosas apresentações de W.J. Hughan. Para nossos propósitos modernos e práticos, a mais importante de todas as versões jamais feitas foi aquela compilada pelo Dr. James Anderson em 1723 e conhecida em todos os lugares familiarmente como “Constituição de Anderson.” A segunda edição apareceu, muito alterada e ampliada em 1738; uma terceira por John Entick em 1756, e assim por diante algumas vezes; até 1888, vinte e duas edições tinham sido publicadas. O Reverendo A.F.A. Woodford, colaborador de Hughan editou uma edição de O Livro Constituição de 1723 como Volume I da Biblioteca Arqueológica Maçônica de Kenning, com data de 1878. Esta é uma reprodução correta e detalhada do livro exatamente como Anderson a publicou pela primeira vez, e é importante nesse sentido.

A Página-título de Anderson é uma leitura interessante:

“A CONSTITUIÇÃO, História, Leis, Obrigações, Ordens, Regulamentos e Usos da Venerável e Direita FRATERNIDADE de MAÇONS LIVRES E ACEITOS; coletados a partir de seus REGISTROS gerais, e as suas fiéis TRADIÇÕES de muitas Eras. Para ser lida na Admissão de um NOVO IRMÃO, quando o Mestre ou Vigilante iniciará, ou pedirá a algum outro Irmão que leia o seguinte, etc. “

Após a palavra “seguinte” a própria versão de Anderson da história maçônica começa com esta afirmação surpreendente:

“Adão, nosso primeiro Pai, criado à imagem de Deus, o Grande Arquiteto do Universo, deve ter tido as Ciências Liberais, particularmente a Geometria, inscritas em seu Coração, etc.”.

Assim fez o Dr. Anderson ao lançar sua narrativa agora três vezes familiar da história da Maçonaria, uma narrativa que, salvo nas mãos do mais experiente antiquário maçônico, produz qualquer fato histórico confiável, mas que, devido ao prestígio de seu autor, veio a ser aceita por gerações como uma história de boa-fé da Ordem. Muitos anos ainda passarão até que os maçons em geral aprendam que a “história” do Dr. Anderson pertence ao reino da fantasia em sua maior parte, e nunca foi aceita como qualquer outra coisa por quem tem algum conhecimento.

Os fatos apurados sobre a própria história particular do Dr. Anderson incluem um registro quase tão breve quanto os breves e simples anais dos pobres. O Irmão J.T. Thorp, um dos mais destacados veteranos entre os estudiosos ingleses maçônicos vivos deu-nos um excelente resumo:

“Sobre este distinto Irmão sabemos muito pouco. Acredita-se que ele tenha nascido, educado e iniciado na Escócia, posteriormente estabelecendo-se em Londres como ministro presbiteriano. Ele é mencionado pela primeira vez nos Procedimentos da Grande Loja de Inglaterra em 29 de setembro de 1721, quando foi nomeado para revisar as antigas Constituições Góticas – esta revisão foi aprovada pela Grande Loja de Inglaterra em 29 de setembro de 1723, ano em que Anderson era Segundo Grande Vigilante sob o Duque de Wharton – ele publicou uma segunda edição do Livro das Constituições em 1738, e morreu em 1739. Isto é tudo o que se sabe dele”. (A.Q.C. VII, página 9)

Em sua edição de 1738, Anderson tornou tão ilegível a sua narração da fundação da Grande Loja, e contradisse sua própria história anterior de tal forma, que R.F. Gould estava inclinado a crer que ele tinha se tornado descontente e cheio de melancolia, ou então suas faculdades mentais estavam deterioradas. Seja o que for, as páginas históricas Anderson devem ser lidas com extrema cautela. Sua própria Constituição, ou a parte que trata dos princípios e regulamentos da Ordem é, certamente, uma compilação feita de extratos de outras versões das Antigas Obrigações bastante misturadas com suas próprias ideias sobre as premissas, e de tal forma em desacordo com os costumes anteriores, que sua adoção oficial teria causado muita discórdia entre as lojas, e pode ter tido algo a ver com a ruptura que, finalmente, levou à formação da Grande Loja dos “Antigos” de 1751 ou por volta desta época.

O “Anderson” deste último corpo, que com o tempo tornou-se poderoso, foi Laurence Dermott, um irlandês genial, que, como Grande Secretário era o líder das “Antigas” forças por muitos anos, e que escreveu para o corpo a sua própria Constituição, chamada Ahiman Rezon, título enigmático que se acreditava por alguns significar “Digno Irmão Secretário”. A primeira edição desta versão importante foi preparada em 1756, uma segunda em 1764, e assim por diante até 1813, quando uma oitava foi publicada. Uma coleção completa de todas as edições está na Biblioteca Maçônica na Filadélfia. Algumas de nossas Grandes Lojas, Pensilvânia entre elas, continuam a chamar seu Livro das Constituições, de Ahiman Rezon.

O próprio Anderson ainda está na prateleira da crítica. Irmãos cultos estão verificando suas afirmações (ver artigo do Irmão Vibert no The Builder de agosto), peneirando suas páginas e não deixando pedra sobre pedra, a fim de avaliar corretamente suas contribuições para a história maçônica. Mas não há tanta discórdia sobre a Constituição. Naquele documento, que não satisfez muitos quando de sua aparição, Anderson, como bem disse o irmão Lionel Vibert, “construiu o melhor que pode”, porque ele produziu um documento que até hoje serve como base de quase todas as Constituições de Grandes Lojas com jurisdição sobre a Maçonaria Simbólica, e de uma vez por todas para toda a Maçonaria Especulativa em uma base separada, e sem caráter sectário, tanto da religião quanto da política. Por todos os seus defeitos como historiador (e estas falhas eram tanto provocadas pela sua idade quanto por suas próprias deficiências), Anderson é uma grande figura em nossos anais, e merece um estudo cuidadoso e reverente na mão de cada estudante.

IV. Conclusão

Ao concluir este esboço muito breve e inconclusivo de um grande assunto, volto à minha primeira afirmação. Em todo o círculo de estudos maçônicos não há, para nós, americanos, de qualquer modo, qualquer assunto de tamanha importância quanto este das Antigas Obrigações, especialmente na medida em que elas têm a ver com nossas Constituições e Regulamentos, e isso realmente vale muito. Muitas falsas concepções da Maçonaria podem ser diretamente relacionadas com uma má interpretação inculta ou intencional das Antigas Obrigações, o que elas são, o que significam para nós, e qual é sua autoridade. Neste país, a jurisprudência é um problema de suprema importância, e de certa forma não muito bem compreendida por nossos irmãos em outras partes, que muitas vezes eu me pergunto por que deveríamos ser tão obcecados com ela. Temos quarenta e nove Grandes Lojas, cada uma das quais é soberana em seu próprio estado, e todas devem manter relações fraternas com dezenas de Grandes Corpos estrangeiros, assim como umas com as outras. Estas Grandes Lojas se reúnem a cada ano para legislar sobre a Ordem e, portanto, na verdadeira natureza das coisas, a organização e governo da Ordem é para nós americanos uma coisa muito mais complicada e importante do que ela pode ser em outros países. Saber o que são as Antigas Obrigações, e entender a lei e a prática constitucional Maçônica é para os nossos líderes e legisladores uma necessidade primordial.

Autor: H.L. Haywood
Tradução: José Filardo

Fonte: REVISTA BIBLIOT3CA

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LIVROS CONSULTADOS NA PREPARAÇÃO DESTE ARTIGO

Gould’s History of Freemasonry, Vol. 1, começando na página 56; A.Q.C., I, 127; A.Q.C., I, 147; A.Q.C., I, 152; A.Q.C., IV, 73; A.Q.C., IV, 83; A.Q.C., IV, 171; A.Q.C., V, 37; A.Q.C., IV, 201; A.Q.C, IV, 36,198; A.Q.C., VII, 119; A.Q.C., VIII, 224; Hughan, Old Charges; A.Q.C., IX, 18; A.Q.C., IX, 85; A.Q.C., XI, 205; A.Q.C., XIV, 153; A.Q.C., XVI, 4; A.Q.C., XVIII, 16; A.Q.C., XX, 249; A.Q.C., XXI, 161, 211; A.Q.C., XXVIII, 189; Gould’s Concise History, capítulo V; Gould, Collected Essays, 3; Stillson, History of Freemasonry and Concordant Orders, 157; A.Q.C., XXXIII, 5; The Masonic Review, Vol. XIII, 297; Edward Conder, Records of the Hole Craft and Fellowship of Masons; Vibert, Story of the Craft; Vibert, Freemasonry Before the Era of Grand Lodge; Findel, History of Freemasonry; Hughan, Cole’s Constitutions; Fort, Early History and Antiquities of Freemasonry; Pierson, Traditions, Origin and Early History of Freemasonry; Hughan, Ancient Masonic Rolls: Waite, New Encyclopedia of Freemasonry; Clegg, Mackey’s Revised History; Ward, Freemasonry and the Ancient Gods: A.Q.C., Antigapha, todos os volumes.

REFERÊNCIAS SUPLEMENTARES

Mackey’s Encyclopedia (Revised Edition): Ahiman Rezon, 37; Antients, 55; Ars Quatuor Coronatorum, 80; Arts, 80; Benjamin Cole, 157; Charges of 1722, 143; Congregations, 174; Cooke’s Manuscript, 178; Dr. James Anderson, 57; Dr.Robert Plot, 570; Four Crowned Martyrs, 272; George B.F. Kloss, 383; Gothic Constitutions, 304; Halliwel l Manuscript, 316; John Entick, 246; Laurence Dermott, 206; Legend, 433; Legend of the Craft, 434; Old Charges, 143; Old Manuscripts, 464; Old Records, 612; Old Regulations, 527; Operative Masonry, 532; Parts, 544; Plot Manuscript, 569; Points, 572; Regius Manuscript, 616; Roberts’ Manuscript, 627; Speculative Masonry, 704.